quarta-feira, março 10, 2010

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO


Meia-sola na exportação
O Estado de S. Paulo - 10/03/2010

O governo quer ver os dólares da exportação entrando em grandes volumes no Brasil, mas não se dispõe a montar uma política séria de comércio exterior. Neste momento, funcionários do Ministério da Fazenda estudam mais um expediente ? mais um remendo, de fato ? para facilitar as vendas externas e estimular mais empresários a buscar o mercado estrangeiro. A preocupação é oportuna. O superávit comercial acumulado até a primeira semana de março, US$ 727 milhões, é 50,9% menor que o de igual período do ano passado.

Com a retomada do crescimento econômico, a importação volta a aumentar mais velozmente que a exportação. Essa era a tendência em 2008, antes do primeiro impacto da crise internacional. Com a retração das atividades, a procura de bens importados perdeu impulso no ano passado, mas essa fase terminou.

Agora, especialistas estimam para 2010 um saldo comercial de apenas US$ 10 bilhões, menos que metade do alcançado em 2009. Para 2011 a projeção é muito mais baixa: US$ 3 bilhões, embora a expansão econômica prevista deva recuar de 5,5% neste ano para 4,5% no próximo.

A forte redução do superávit comercial seria muito menos preocupante se o país não fosse deficitário na conta de serviços. Essa conta inclui o pagamento de juros e a remessa de lucros e de royalties, além dos gastos com viagens, seguros e fretes. Por isso, quanto menor o saldo comercial, maior o déficit na conta corrente do balanço de pagamentos. Para 2010 os técnicos do mercado financeiro projetam um buraco de US$ 52 bilhões. Para 2011, a expectativa é de um rombo de US$ 60 bilhões. Estima-se que o investimento estrangeiro direto ficará em US$ 38 bilhões neste ano e em US$ 40 bilhões no próximo. Será insuficiente, portanto, para compensar o desequilíbrio na conta corrente e a cobertura dependerá de financiamentos mais caros.

Nenhuma dessas projeções configura um desastre iminente, mas a redução da segurança para o crescimento econômico é indiscutível. Se os números efetivos, neste e no próximo ano, ficarem próximos dos valores estimados, o País ficará muito mais vulnerável a qualquer piora do humor no mercado financeiro.

A mera percepção do novo quadro brasileiro poderá afetar suas condições de financiamento. O Brasil atravessou a crise sem danos muito graves e isso se deveu em boa parte à sua imagem de solidez. Uma piora de imagem poderá ter um custo elevado para o País.

A melhor maneira de evitar esse risco é promover desde já um forte aumento das exportações. Essa política seria desejável mesmo se as projeções das contas externas fossem mais favoráveis do que têm sido nos últimos meses. Essas projeções são, no entanto, mais um forte argumento a favor de uma política bem mais eficiente de comércio exterior.

O governo estuda a ampliação do conceito de "empresa preponderantemente exportadora". Para entrar nessa categoria, uma empresa precisa obter no comércio exterior pelo menos 60% de seu faturamento. Isso lhe permite comprar insumos sem recolher PIS-Cofins. As outras companhias são obrigadas a recolher o tributo. Têm direito a uma compensação, quando exportam, mas podem levar até cinco anos para receber de volta o dinheiro. A ideia é reduzir aquela exigência para 40% do faturamento.

Uma política racional eliminaria os encargos tributários sobre a exportação. Isso implicaria uma liberação imediata do crédito tributário. Mas seria preciso ir além. No Brasil, paga-se imposto para investir em máquinas e equipamentos. Isso não tem sentido, quando se trata de promover a competitividade.

Uma política bem concebida enfrentaria esses problemas de forma clara e direta e promoveria ações mais eficientes para a modernização da infraestrutura. O governo federal tem sido incapaz de cumprir essas tarefas, apesar do falatório sobre desoneração fiscal e obras do PAC. Para atuar nessas frentes, no entanto, o governo deveria conter os gastos improdutivos e melhorar consideravelmente a gestão do dinheiro público. Mas como poderia, nesse caso, favorecer os companheiros e praticar o populismo?

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