sexta-feira, março 05, 2010

DORA KRAMER

Resistência à transparência 


O Estado de S.Paulo - 05/03/2010


Lançando mão do benefício da dúvida, é de se imaginar que a reação de políticos às normas baixadas pelo Tribunal Superior Eleitoral para o pleito de outubro próximo seja fruto de falta de reflexão, atribulados que estão com os preparativos das campanhas eleitorais.

Se não pensaram antes de falar, sempre é tempo de recuar. Mas se as queixas foram produto de firme convicção configura-se generoso com o Congresso o último resultado da pesquisa Datafolha indicando que só 14% dos consultados aprovam a atuação do Parlamento.

De um modo geral suas excelências não gostaram de ver a Justiça Eleitoral obrigar os partidos a fornecer a folha corrida criminal de todos os candidatos nem de serem proibidos de receber doações financeiras sem a identificação de quem doa e de quem recebe.

Para o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, as restrições só facilitam o aumento das transgressões. Segundo informou, a experiência lhe diz que o tiro sairá pela culatra. "Sou contrário a qualquer tipo de restrição à doação legal porque isso facilita a doação ilegal."

Ou o senador não entendeu o espírito da coisa ou se fez de desentendido. Como também o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia, que desenvolveu um enigmático raciocínio sobre a contradição entre decisão anterior que deu posse dos mandatos aos partidos e o fortalecimento da "estrutura pessoal" da obrigatoriedade de identificação nas doações.

Aos oposicionistas associou-se o líder do governo na Câmara, o petista Cândido Vaccarezza: "A decisão não tem base constitucional, pois está previsto na lei que pode haver doações para os partidos." Pode sim, desde que legais.

O campeão no quesito "João sem braço" foi o presidente do PTB, Roberto Jefferson. Para ele, a "Justiça não tem que se meter na decisão sobre o destino do dinheiro recebido pelo partido".

O ex-deputado denunciante e beneficiário do mensalão do PT sabe melhor do que ninguém que não se trata de examinar o destino, mas de identificar a origem.

É de espantar a resistência de políticos de todos os matizes à transparência, conceito cristalino em que se baseou o TSE para baixar as resoluções sobre doações e fichas criminais. Com uma, busca aumentar o grau de lisura dos financiamentos.

Se os partidos preferem reagir no lugar de contribuir já avisando que ante a existência da lei a única saída é descumprir a lei, realmente vamos mal.

Com a outra resolução, o tribunal tenta ajudar o eleitor na tarefa de limpar o ambiente, já que o Congresso se recusa sequer a examinar a proposta de iniciativa popular que veda candidaturas de gente com contas abertas na Justiça.

Faz também um trabalho que deveria ser dos partidos quando da solicitação de legenda pelos postulantes a candidatos. A uma folha corrida limpa preferem os que podem carrear recursos ou votos para as agremiações. Depois, na hora do escândalo, se fazem de surpreendidos.

Os políticos se queixam da interferência do Poder Judiciário, mas são os primeiros a demonstrar repetidas vezes que a sociedade precisa que lhes sejam impostas balizas.

Se deixados à vontade, fazem da política uma atividade que diz respeito apenas a eles e às suas conveniências.

Agem, e agora deram mais uma prova disso, como quem acredita que quanto pior forem os parâmetros, quanto mais frouxos os critérios, quanto mais desmoralizada fica a política, melhor para o Congresso.

É o contrário. Nesse aspecto o Judiciário tem sido um bom conselheiro.

Resta um

O dia mais provável para o anúncio da candidatura a presidente do governador José Serra é 30 de março.

Examinadas as possibilidades de data, é a única viável. Não fosse o dia da mentira, 1º de abril é véspera de feriado, quando não circula o Diário Oficial. A próxima edição sai no dia 5, já fora do prazo legal para desincompatibilização.

Dia 31 de março marca a passagem dos 46 anos do golpe militar de 1964. Não ficaria bem.

Portanto, se tiver de ser será na terça, 30. O que significa ainda 25 dias de agonia para o PSDB e adjacências.

Cálculo

Se a população de Minas clama pela candidatura de Aécio Neves à Presidência - como se procurou demonstrar ontem com as manifestações durante a inauguração do centro administrativo do Estado -, se acha secundária e ofensiva a Vice-Presidência, por que haveria de se contentar em vê-lo como senador?

Note-se, apenas um entre outros 80 se o PSDB perder a eleição. A menos que Dilma Rousseff, eleita presidente, convença sua base partidária das vantagens de ter a oposição na presidência do Senado.

Na maciota

O governador Aécio Neves disse que empurrado não vai. O que na visão de tucanos esperançosos pode significar que, com jeito, vai.

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