segunda-feira, fevereiro 01, 2010

RUY CASTRO

Morrer de prazer

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/02/10

RIO DE JANEIRO - No outro domingo, o Mais! pediu aos entendidos que citassem sequências marcantes do cinema. O resultado apontou as inevitáveis -a da escadaria em "O Encouraçado Potemkin", a da morte de Annie Girardot em "Rocco e Seus Irmãos", a do corte do osso para a nave em "2001"- e outras menos lembradas, todas de filmes "clássicos".
Fui um pouco discrepante, escolhendo uma sequência de "O Homem do Sputnik", uma chanchada nacional, gênero extinto há 50 anos e ainda meio visto como vira-lata, mas de encantos mil para mim e para o Sérgio Augusto. Poderia ter citado também Oscarito e Grande Otelo como Romeu e Julieta em "Aviso aos Navegantes" (1951).
O duro é escolher uma sequência entre milhares. Talvez por óbvias, ninguém se lembrou de Gene Kelly cantando na chuva ou de Dooley Wilson carbonizando corações com "As Time Goes By" em "Casablanca". Mas, e Harold Lloyd escalando o edifício e se pendurando no relógio em "O Homem-Mosca" (1923)? E Maurice Chevalier saindo para a farra em "A Viúva Alegre" (1934)? E o duelo a espadas entre Stewart Granger e Mel Ferrer em "Scaramouche" (1952)? E a luta a socos entre Alan Ladd e Van Heflin, em meio aos cavalos, em "Os Brutos Também Amam" (1953)?
E o que dizer da sequência inicial de "Meu Tio" (1958), com os meninos e os cachorros pelas ruas? De Silvana Mangano com água pelas pernas em "Arroz Amargo" (1949)? Da primeira aparição de Orson Welles em "O Terceiro Homem" (1949)? De Cyd Charisse descobrindo o capitalismo em "Meias de Seda" (1957)? Ou de Mario Reis, maravilhoso, cantando "Cadê Mimi?" em "Alô, Alô, Carnaval!" (1935)? E muitas mais.
Hoje, com o DVD, é possível assistir a essas e a todas as outras numa única sessão. Corre-se apenas o risco de morrer de prazer.

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