segunda-feira, janeiro 25, 2010

BRASIL S/A

Obamacho 2010

Ricardo Allan
Correio Braziliense - 25/01/2010
O novo Barack Obama terá que ser mágico para chegar ao fim do mandato em condições de se reeleger


Na semana passada, nasceu um novo presidente dos Estados Unidos. Considerado fraco e vacilante aos olhos do norte-americano médio, Barack Obama deve adotar uma atitude mais incisiva. A intenção não é abater a recessão, mas crescer politicamente. Um ano após a posse que levou o mundo a imaginar que, afinal, os EUA seriam governados por um intelectualizado pacifista defensor do meio ambiente de centro-esquerda, seus fãs estão frustrados. Não por acaso, a popularidade presidencial caiu de 70% para 49%. O time político da Casa Branca, com o assessor David Axelrod e o chefe de gabinete Rahm Emanuel à frente, está remodelando sua imagem, criando um homem forte, capaz de impedir a provável vitória dos republicanos nas eleições para o Congresso em novembro.

O primeiro lance na estratégia vem sendo a pendenga com o setor financeiro. Primeiro, ainda fiel ao papel de conciliador, o presidente convocou os figurões dos 12 maiores bancos do país para conversar. Lembrando que seus negócios foram salvos pelo dinheiro do contribuinte, pediu que voltassem a financiar empresas e consumidores. Nada aconteceu. A reação presidencial foi propor ao Congresso a criação de um imposto de 0,15% sobre os ativos dos bancos. O movimento mais recente foi a elaboração de dois projetos limitando enormemente a atividade bancária, impedindo o uso do capital próprio no mercado derivativo. Quanto mais os executivos chiam, mais Obama recupera pontos na opinião pública, que culpa os “especuladores” pela recessão.

Ao mesmo tempo em que segue as orientações de Axelrod e Emanuel, Obama põe de escanteio seu time econômico liberal, capitaneado pelo secretário do Tesouro, Timothy Geithner, e o chefe da assessoria econômica, Larry Summers. Paul Volcker, ex-presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) e atual conselheiro presidencial, ganhou relevo. Ele é daqueles economistas que se dizem da “velha escola”, do tempo em que a economia era mais produção industrial e menos impulsos eletrônicos movimentando dinheiro. Ao anunciar os projetos, o presidente tinha atrás de si um sorridente Volcker e constrangidos Geithner e Summers. A proposta principal foi apelidada de “Regra de Volcker”: os bancos não poderão ter, gerir ou patrocinar fundos de hedge (proteção) ou de private equity (capital de risco).

Confronto aberto
Se o Congresso topar, volta-se ao modelo de separação entre bancos comerciais e de investimento em funcionamento até o democrata Bill Clinton revogá-lo em 1999. Foi em sua gestão que a regulação começou a ser desmontada, dando origem à “orgia” vista nos últimos 10 anos. No discurso na quinta-feira, Obama entrou em confronto direto com o setor. “O que vi nas últimas semanas foi um exército de lobistas de Wall Street indo ao Congresso para tentar bloquear regras básicas e de bom senso que protegeriam nossa economia e o povo americano. Se esse pessoal quer briga, essa é uma briga que eu estou pronto para encarar.” Segundo ele, o contribuinte não será mais refém de nenhum banco “grande demais para quebrar”.

Brigar com banqueiros é algo que enche os olhos do eleitorado de qualquer lugar. O Partido Democrata precisa de uma bandeira popular. Perdeu a vaga ocupada por 46 anos pelo senador Ted Kennedy para um inexpressivo candidato republicano, Scott Brown, num dos mais democratas estados norte-americanos, Massachusetts. Com 40 senadores, a oposição passou a ter o poder de impedir votações, o que dificultará a aprovação dos planos do governo. As perspectivas para novembro não são boas. Se não houver uma reação, é provável que Obama seja responsável pelo fim da maioria absoluta no Congresso. A reforma do sistema de saúde, uma das únicas promessas de Obama que começaram a sair do papel, pode sofrer um grave retrocesso.

Boas intenções
Para os milhões que choraram em frente ao Capitólio e a aparelhos de televisão no mundo inteiro, na posse de Obama um ano atrás, a palavra amena para definir o saldo até agora é “decepcionante”. A equipe de idealistas que chegou ao poder se chocou com a realidade: governar exige mais do que boas intenções. Fazendo campanha em poesia, Obama prometeu tirar as forças armadas do Afeganistão e do Iraque, fechar a prisão de Guantánamo, determinar rapidamente a redução dos índices de poluição e salvar os empregos dos trabalhadores. Na base da retórica, venceu tanto a democrata Hillary Clinton, considerada mais pragmática, quanto o republicano John McCain.

Administrando em prosa, mandou mais soldados para o Afeganistão, prorrogou a permanência no Iraque, adiou o fim de Guantánamo e negociou com a China o enterro da Cop-15, conferência que fixaria metas para a redução do aquecimento global. Para livrar a cara, na última hora costurou com o Brasil um documento que virou motivo de piada: não obriga ninguém a emitir menos poluentes. O desemprego subiu para 10%. Só muitos meses após despejar US$ 700 bilhões para socorrer os bancos, fez um modesto programa para ajudar os mutuários. Tarde demais. Eles já haviam sido despejados. O crédito não flui, o consumo está parado e as indústrias produzem menos. O país está condenado a crescer muito pouco nos próximos três anos. O novo Barack Obama terá que ser mágico para chegar ao fim do mandato em condições de se reeleger.
Ricardo Allan é repórter de economia

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