quinta-feira, maio 14, 2020

Bolsonaro inocula na PF o vírus da esculhambação - JOSIAS DE SOUZA

UOL - 14/05

Dizer que Jair Bolsonaro frauda o discurso em defesa da ética que ostentou na campanha presidencial é muito pouco para traduzir o que sucede em Brasília. O presidente executa uma metódica e gradativa investida contra o aparato do Estado que ajudou a escancarar a roubalheira nacional.

Depois de retirar o Coaf da vitrine, escondendo-o nos fundões do organograma do Banco Central, Bolsonaro coloca a Polícia Federal num respirador, inoculando na instituição o vírus da esculhambação. O processo de asfixia conta com a luxuosa cumplicidade de um grupo de generais.

Nesta quarta-feira, ao depor no inquérito que apura as denúncias de Sergio Moro contra Bolsonaro, o delegado Alexandre Saraiva, chefe da PF no Amazonas, disse ter sido sondado, "no início do segundo semestre de 2019", para assumir o comando do órgão no Rio de Janeiro. Respondeu que "evidentemente aceitaria o convite."

A sondagem não veio de Maurício Valeixo, então diretor-geral da PF. Tampouco foi feita por Moro, então ministro da Justiça. Quem sondou Alexandre Saraiva foi o xará e também delegado Alexandre Ramagem, chefe da Abin e amigo da família Bolsonaro.

O delegado Saraiva contou em seu depoimento detalhes sobre um encontro que teve com Moro no aeroporto de Manaus. Disse ter sido "inquirido" pelo então superior hierárquico da PF. "Saraiva, que história é essa de você no Rio de Janeiro?", indagou Moro. O delegado relatou, então, o telefonema que recebera de Ramagem.

Quer dizer: Bolsonaro testava os limites de Moro desde o ano passado. Fez picadinho da imagem do ex-juiz da Lava Jato porque encontrou material. Moro poderia ter chamado o caminhão de mudança quando Bolsonaro declarou, em agosto de 2019, no cercadinho do Alvorada, que seria "um presidente banana" se não pudesse trocar o chefe da PF do Rio e, no limite, até o diretor-geral do órgão.

A pressão exercida por Bolsonaro no ano passado resultou numa solução intermediária. O então superintendente da PF no Rio, Ricardo Saadi, foi transferido para Brasília. Mas assumiu o posto não o preferido de Bolsonaro, mas um delegado escolhido pelo então diretor-geral Valeixo: Carlos Henrique Oliveira.

Carlos Henrique também prestou depoimento nesta quarta. Ecoando o que Valeixo e o antecessor Saadi disseram ao depor na véspera, confirmou que não havia problema de baixa produtividade na PF do Rio, como alegou Bolsonaro na ocasião. Ao contrário, a superintendência estadual obteve "sua melhor classificação durante a gestão do delegado Saadi."

O doutor acaba Carlos Henrique de sofrer uma queda para o alto. Com a saída de Moro da pasta da Justiça, foi convidado a trocar a chefia da PF no Rio pela diretoria-executiva do órgão em Brasília. Talvez não dure muito na nova função, pois desmentiu Bolsonaro num segundo ponto do seu depoimento.

Há dois dias, Bolsonaro declarou aos repórteres, numa inusitada aparição vespertina na rampa do Planalto: "A Polícia Federal nunca investigou ninguém da minha família, certo? Isso não existe no vídeo [que exibe a reunião ministerial de 22 de abril, peça central do inquérito]. Estão sendo mal informados."

De acordo com Carlos Henrique, houve, sim, uma investigação eleitoral relacionada a Flávio Bolsonaro, o primogênito do presidente. Envolvia suspeita de enriquecimento ilícito. O inquérito foi encerrado sem indiciamento. No caso da rachadinha, o Zero Um também é investigado pelo Ministério Público do Rio por enriquecimento desmesurado. Varejam-se transações imobiliárias suspeitas.

A despeito das evidências em contrário, Bolsonaro empenha-se no momento em negar que tenha emparedado Moro na reunião ministerial de 22 de abril. Construiu uma versão que não fica em pé. "Não existem as palavras Polícia Federal em todo o vídeo", disse Bolsonaro aos repórteres, referindo-se à filmagem do encontro. "Não existe a palavra superintendência. Falo sobre segurança da família e meus amigos."

Relator do caso Moro versus Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello decidirá se a gravação da reunião será divulgada na íntegra ou apenas parcialmente. Enquanto o conteúdo não vem à luz, Bolsonaro sustenta que a cobrança que fez no encontro não era dirigida a Moro, mas ao general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, responsável pela segurança do presidente e de seus familiares.

Quem assistiu ao vídeo diz que Bolsonaro soltou um palavrão e declarou que não esperaria que sua família e amigos fossem prejudicados para fazer mudanças no Rio de Janeiro. De fato, usou a expressão "segurança no Rio" em vez de superintendência da Polícia Federal. Mas o contexto não deixa dúvidas de que ele se dirigia a Moro, não ao general Heleno.

A versão de Bolsonaro ofende a inteligência alheia duas vezes. Na primeira, embora reconheça que fez menção à segurança da família e de amigos, o presidente se abstem de explicar um detalhe: o GSI fornece proteção a Bolsonaro e sua família, mas não fornece guarda-costas para amigos. Significa dizer que não era de segurança pessoal que o presidente falava na reunião.

No segundo atentado, Bolsonaro ignora o Diário Oficial. Não há vestígio de mudança na equipe de seguranças do GSI. O general Heleno continua comandando uma mesa de ministro no Planalto. Na Polícia Federal, entretanto, todas as ameaças de Bolsonaro se concretizaram.

O presidente exonerou o diretor-geral Maurício Valeixo. Sergio Moro trocou a função de ministro pela de delator. Bolsonaro nomeou Alexandre Ramagem, o amigo da família, para o lugar de Valeixo. A troca só não foi efetivada porque o STF barrou a posse. Foi alçado ao cargo Rolando Alexandre de Souza, que era subordinado de Ramagem na Abin.

O primeiro ato de Rolando como chefão da PF foi mexer na superintendência do Rio. Alvejado por uma investigação no Supremo, Bolsonaro ainda não se animou a acomodar no seu Estado, berço das aflições familiares, o preferido Alexandre Saraiva, do Amazonas. Sob holofotes, teve de digerir outro nome: Tácio Muzzi.

Numa tabelinha com Bolsonaro, os generais do Planalto esforçaram-se para enfiar nos autos do inquérito versões compatíveis com o lero-lero segundo o qual o presidente falou na fatídica reunião de 22 de abril sobre segurança pessoal, não sobre troca da chefia da Polícia Federal.

Os generais Braga Netto (Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Augusto Heleno (GSI) tropeçaram em algumas contradições. Mas, no geral, deram cobertura à versão do chefe, que tem a consistência de uma porção de gelatina.

Bolsonaro e seus auxiliares não parecem preocupados com os rumos do inquérito. Há no Planalto uma sólida, uma consistente, uma inabalável confiança na disposição do procurador-geral da República Augusto Aras de enviar o caso para o arquivo.

Confirmando-se essa percepção, Bolsonaro terá completado o ciclo do abafamento. Já desligou o Coaf da tomada. Esculhamba a autonomia funcional da PF. Só falta a confirmação de que, ao indicar Aras para a chefia da Procuradoria, valorizou uma área do Ministério Público que a Lava Jato havia desativado: o setor do arquivo. O barulhinho que se ouve ao fundo são os aplausos do centrão.

Vendas no varejo caem menos em SP - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 14/05

Tombo no país foi menor do que o esperado, mas bola de neve mal começou a rolar


As vendas no varejo em São Paulo não caíram em março, caso único entre os estados do país. Sim, março é o passado distante e não foi inteiramente contaminado pelo coronavírus. Além do mais, quando se incluem as vendas de veículos e de material de construção, o colapso foi grande e geral, embora o resultado paulista não tenha sido dos piores, ao contrário, e abaixo da média brasileira.

Não é resultado para animar ninguém. Pode ser mais um indício de desigualdade. Com renda mais alta e mais reservas financeiras, talvez os paulistas tenham podido manter parte do consumo, em especial em mercados e farmácias, talvez até fazendo mais estoques. Pode ser ainda que as pessoas tenham mais meios em geral de fazer compras virtuais, pela internet, tendo mais dinheiro e cartões de crédito ou débito.

Em março, as vendas no varejo paulista foram 0,7% superiores a fevereiro e espantosos 5,4% maiores que em março de 2019. Na média brasileira, quedas de 2,5% e 1,2%, respectivamente.

No varejo dito “ampliado”, que inclui vendas de veículos e material de construção, a baixa paulista foi de 11,1% em relação a fevereiro, oitavo pior resultado nacional, mas acima do resultado do Brasil, que foi de queda de 13,7%.

As vendas dos setores “hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo” cresceram, no país, 14,6%, de fevereiro para março; de farmácia, perfumaria e produtos médicos e ortopédicos, 1,6%. No varejo restrito, sem veículos e material de construção, as vendas dos supermercados têm peso de metade do resultado final.

O restante dos setores foi do desastre maior ao menor, mas desastre, com queda de mais de 42% nas lojas de roupas, tecidos e calçados, por exemplo.

No geral, o tamanho da catástrofe foi um pouco menor do que a esperada pelas projeções de economistas, no entanto muito mais desorientadas por um choque deste tamanho e inédito. Ainda assim, os números de março no comércio, na indústria e nos serviços acabaram por rebaixar ainda mais várias projeções relevantes para o ritmo do PIB, que estão chegando perto da 5% de queda. É terrível, mas as revisões para baixo ainda não têm data para acabar.

Abril foi um mês inteiro tomado pelas paralisações de atividades, de retração do consumo pelo medo e pela queda abrupta de renda e do nível de emprego. Algum mínimo sinal de despiora? Os indicadores mais recentes de atividade econômica são quase inexistentes; os números, de resto, podem estar todos perturbados, tanto ou mais quanto a vida e a perspectiva de sobrevivência das pessoas.

Um número que tem saído com frequência é o do valor de compras com cartão, débito ou crédito. Na primeira semana da paralisação da epidemia, haviam caído mais de 52% em relação a semana equivalente de fevereiro. Houve uma ligeira despiora nas semanas seguintes. Nas semanas finais de abril, as baixas andavam pela casa de 35% de baixa (sempre em relação a semana equivalente de fevereiro).

Os dados são da Cielo, de compras com cartão no varejo. No total, o valor dessas compras equivale a cerca de 40% do que nas contas nacionais, no PIB, se chama de “consumo das famílias”.

Ainda assim, apesar dessa aparente despiora, não dá para dizer o que foi abril no varejo e menos ainda no restante da economia. O efeito bola de neve mal começou. Demissões e cortes de salários reduzem o consumo e provoca mais medo do futuro, o que coloca os consumidores restantes na retranca.​

Vinicius Torres Freire
Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Presidente da General Motors: o foco é na sobrevivência - CELSO MING

ESTADÃO - 14/05

Carlos Zarlenga, presidente da GM na América do Sul, afirma que situação da economia brasileira e do setor automotivo tende a piorar

Para o presidente da General Motors (GM) na América do Sul, Carlos Zarlenga, a situação da economia brasileira e do setor ficou ruim, mas tende a piorar.

“Em abril, foram emplacados apenas 55 mil carros, quando se esperavam 230 mil. E, ainda assim, esses números são enganosos. Uma vez consumada a compra pelo consumidor, o processo de emplacamento leva entre 10 e 15 dias. Isso significa que boa parte dos emplacamentos de abril correspondeu a compras de semanas anteriores. Feitas as contas, a uma média de preço de US$ 13 mil por veículo, foram US$ 3 bilhões que sumiram.”

Zarlenga avisa que o impacto negativo sobre o caixa das montadoras, num momento em que ainda tinham de pagar seus fornecedores, empurrou o passivo do setor junto à rede bancária interna, que era de R$ 50 bilhões de acordo com levantamentos da Anfavea, para cerca de R$ 90 bilhões.

Essa queda brusca da demanda não deve ser vista como simples adiamento das compras pelo consumidor. A procura, argumenta ele, não vai voltar ao que era, porque aumentou o desemprego, o consumidor perdeu renda e patrimônio e há as incertezas que vão levá-lo a desistir de comprar um zero-quilômetro. Muitas empresas que compõem toda a rede do setor não terão condições de sobreviver e a inadimplência tende a aumentar. Mesmo se a vacina contra o vírus vier a ficar disponível mais rapidamente do que os técnicos afirmam, os desdobramentos da crise durarão de três a cinco anos. Não se deve esperar recuperação em V, como alguns economistas têm projetado.

Os investimentos engatilhados pelo setor pararam abruptamente, afirma Zarlenga. O ciclo para início de produção de um produto é de quatro anos. Ninguém pode agora arcar com compras de máquinas para os próximos dois ou três anos. A hora é de pagar as dívidas primeiro. Os lançamentos de produtos que estavam prontos têm de seguir, assim como não vai parar o desenvolvimento de tecnologias novas, como as de obtenção de baterias mais eficientes e as do carro autônomo. Mas o resto fica para quando der.

Em crises assim, alguns analistas entendem que estão criadas condições para uma mudança de paradigma que, possivelmente, começa a ser identificada a partir de certa atitude dos jovens, que já não cobiçam carros como antes. Mas Zarlenga não vê assim. Antes do coronavírus, a demanda de veículos pelas novas gerações era forte. O que muda, diz ele, é a enorme queda do poder aquisitivo dos jovens. Mas ele não vê, a partir daí, tendência de mudanças relevantes no paradigma de consumo.

Ao atual quadro de incertezas produzido pelo coronavírus é preciso acrescentar outra. A forte redução dos preços do petróleo não deve ser revertida tão cedo.

O carro elétrico é bem mais caro para o consumidor, e rodar em veículos movidos a derivados de petróleo ficou mais em conta. Isso obrigará a indústria a reexaminar os cronogramas de substituição da frota movida a combustíveis fósseis por carros elétricos. Mas, a esta altura da crise, ninguém tem segurança de longo prazo.

Nessas horas, todos olham para os governos em busca de socorro. Mas não convém esperar demais, adverte ele. Por toda parte, os governos, sejam eles quais forem, emergirão dessa crise com uma situação fiscal muito pior e não haverá alívio para todos.

Outra área que levanta preocupação é a da garantia de fornecimento de peças e insumos. Bastou o alastramento de um vírus para desarticular as redes globais de suprimentos em que o setor está inserido. “A integração com a China não está funcionando. Em parte, essas conexões poderão se refazer, mas ficou o problema da falta de segurança. Como a indústria lidará com isso ainda está para ser avaliado”, afirma.

E ele conclui: “O Brasil ainda tem enorme vantagem em relação a outros países, que é o tamanho do seu mercado. Mas o momento é de manter o foco na sobrevivência e avaliar a destruição de riqueza. É cedo para o resto”.

Tiro no pé - ZEINA LATIF

ESTADÃO - 14/05

É necessário evitar ações que gerem mais distorções e efeitos colaterais na economia

Somos uma sociedade mais propensa a apontar vilões do que a enfrentar os problemas com base em diagnósticos corretos. A crise atual explicita essa fraqueza.

Há preocupações de todos os lados, mas é necessário evitar ações que poderão gerar mais distorções na economia e efeitos colaterais perversos, sem produzir o benefício desejado.

Os bancos – desde sempre no topo da lista de arqui-inimigos - são acusados de “empoçar” recursos e não liberar crédito a empresas e famílias, e são pressionados a bancar parte da fatura da crise. Enquanto isso, pouco esforço é feito para compreender o funcionamento de um setor essencial ao funcionamento da economia.

Os dados do mercado de crédito em março mostram que as críticas são precipitadas, ainda que haja um descompasso entre o aumento brutal da demanda de crédito e a capacidade de atendimento dos bancos.

A concessão (fluxo) de crédito livre para PJ subiu 60% em março em relação a fevereiro, sendo que quase metade está associada à demanda por capital de giro e antecipação de receitas das empresas.

Na PF, o resultado não foi melhor por conta da natural retração de demanda, como na aquisição de veículos e no cartão de crédito (à vista). Como o endividamento dos indivíduos está nas máximas históricas, acima de 45% da renda anual, o espaço para elevações adicionais é limitado, por conta do risco de inadimplência adiante.

O crédito está fluindo, com liderança dos bancos privados – alta de 3,5% no estoque, ante 2,1% dos bancos públicos –, o que ocorre com folga desde 2019. Tem também aumentado a capilaridade do crédito em favor das micro, pequenas e médias empresas, o que poderá ser afetado com a crise.

É a saúde do setor bancário – índices de liquidez e de capitalização adequados e elevada cobertura dos (elevados) ativos problemáticos – que permite a reação favorável do setor às medidas de estímulo do Banco Central. Além de essencial para o bom funcionamento da economia, é um importante ingrediente de sustentação da nota de crédito do Brasil pelas agências de risco.

Não podemos perder isso. Ameaças não faltam, no entanto. Como se não bastasse o inevitável aumento de inadimplência este ano, há o risco de reações inadequadas à crise.

Há no Congresso iniciativas preocupantes, como a suspensão do pagamento do crédito consignado e a elevação da CSLL de 20% para 50% para bancos, um setor com carga tributária superior ao restante da economia. São medidas que elevam a insegurança jurídica e ameaçam a estabilidade financeira, a oferta de crédito e a agenda de desconcentração bancária.

Há também uma proposta de emenda constitucional de iniciativa de vários senadores que estabelece um fundo de combate à pobreza, de forma que, caso limites definidos de pobreza infantil sejam desrespeitados, serão acionados gatilhos para elevar a transferência de renda aos pobres. Além de dotações orçamentárias, o recurso do fundo viria da taxação dos bancos, com alíquotas progressivas da CSLL, que poderiam atingir 70% a depender do lucro da instituição. O resultado seria crédito mais escasso, pois os bancos precisam adicionar capital para poder emprestar, o que ficaria prejudicado. Com isso, menos crescimento e empregos.

Há problemas de diagnóstico e desenho dessa medida, muito diferente do que ocorre no Bolsa Família, que poderia ser aprimorado e tem a vantagem de exigir que a criança frequente a escola, para não se perpetuar a pobreza.

Transferir renda pode ajudar no curto prazo, mas não permite o combate à pobreza de forma sustentada. Para isso, é necessário garantir o acesso dos mais vulneráveis a serviços públicos de qualidade. O Brasil precisa de igualdade de oportunidades para reduzir a pobreza.

De quebra, a medida é constitucional, o que agravaria a já elevada rigidez orçamentária.

Certamente, há espaço para elevar a progressividade dos impostos, mas é necessário trabalho sério para evitar mais distorções no sistema tributário.

Apontar vilões e buscar saídas fáceis é atitude infantil. Precisamos discutir mais seriamente nossos problemas.

CONSULTORA E DOUTORA EM ECONOMIA PELA USP

Equilíbrio precário e perigoso - WILLIAM WAACK

ESTADÃO - 14/05

Uma combinação de fatos não deixa prosperar, por enquanto, ações para derrubar Bolsonaro


A rigor, o que já se sabe do que está no vídeo da reunião ministerial trazido à tona por Sérgio Moro não surge ainda como prova, mas comprova. Criminalistas experientes lembram que até provas materiais do tipo “conclusivo” são, nos procedimentos judiciais, passíveis de “interpretações”. E são poucas aquelas “provas técnicas” que, neste momento, poderiam produzir a “interpretação” necessária para sustentar uma denuncia pelo procurador-geral da República contra o presidente da República.

Do ponto de vista político, porém, o vídeo é uma comprovação didática de que o governo é comandado sem foco e preso ao que o chefe do Executivo acha que lhe é vantajoso dos pontos de vista político de curto prazo e pessoal. Além daquilo que ele vocifera como se comandasse um bando, as vozes mais eloquentes nesse vídeo são de ministros incompetentes, apegados a teorias malucas, dispostos a pronunciar frases de lacração na internet do tipo “prendam ministros do STF”, “prendam governadores”, como se decidissem na mesa de um bar quem brada estupidezes de forma mais contundente.

Sozinho, o vídeo não é uma bala de prata e, para compor a “interpretação” que levaria a uma denúncia da PGR que levaria a Câmara a aprová-la e afastar o presidente, é preciso avaliar se e como se daria um rompimento do precário equilíbrio com o qual hoje Bolsonaro se mantém no poder. Esse equilíbrio é dado, por um lado, pelo Congresso, obviamente desinteressado no momento em um processo de impeachment – mas disposto a lucrar no sentido literal da palavra com a fragilização política de um presidente cujas opções de ação e popularidade vão diminuindo, mas que mantém um núcleo duro de cerca de 20% do eleitorado.

De outro, está ação motivada institucional e politicamente por integrantes do STF, hoje o principal perigo para Bolsonaro. O presidente conseguiu unir integrantes da cúpula do Judiciário, notoriamente divididos entre si, na convicção de que ele, Bolsonaro, é o maior perigo institucional por se recusar a aceitar que não é detentor do “poder imperial” para fazer o que bem entender. Alguns desses ministros viram no inquérito solicitado pelo PGR para investigar interferência ilícita do chefe do Executivo na Polícia Federal – um evento que não estava no radar de ninguém apenas um mês atrás – a oportunidade de desencadear um processo político a partir de um procedimento judicial.

Do jeito que as coisas estão, esse impulso não vai prosperar, por conta da combinação dos fatos de que o Congresso, por enquanto, não quer, os ministros militares continuam dando suporte ao presidente e a PGR não vê, ainda, motivos para oferecer uma denúncia. De onde eventualmente viria, então, o empurrão que alteraria o precário equilíbrio atual? Um grande risco para Bolsonaro é Bolsonaro mesmo, como demonstra a situação que criou ao demitir Moro ou, por exemplo, ao levar governadores e desafiá-lo e desobedecê-lo abertamente, tornando ainda mais difícil falar de “pacto federativo” na já gravíssima crise econômica e de saúde pública.

Esses dois últimos fatores (crise econômica e de saúde pública), que estão fora do controle de qualquer agente político, têm condições de alterar o equilíbrio e criar ambiente propício para “interpretações” de provas que levem rapidamente a juízos políticos. A evolução da crise de saúde pública indica que o País viverá em prazo breve o triste placar de mil mortos por dia pelo coronavírus, conta que será associada a um governo que passou os momentos iniciais da tragédia afirmando que ela não aconteceria. Os efeitos negativos da recessão virão em “time delay”, isto é, a devastação trazida pela inédita retração da atividade econômica deve se fazer sentir com mais força a partir do segundo semestre.

É difícil imaginar que Bolsonaro e seu governo saiam intactos do outro lado dessa dupla catástrofe.

Triste Brasil - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 14/05

Em termos rasteiros, Bolsonaro exige a volta à normalidade sem esboço de um plano responsável


Enquanto o sr. Jair Bolsonaro finge (e mal) ser um presidente da República preocupado com o destino de todos os brasileiros, e não só com o dele e o dos que estão no seu círculo afetivo, o Brasil ultrapassou a marca de 12 mil mortos por covid-19 no início desta semana. Já são quase 178 mil casos confirmados da doença no País, fora a subnotificação.

Em vez de demonstrar empatia e juízo diante de um quadro tão desolador, Bolsonaro reforçou sua opção pela afronta e pela irresponsabilidade. Sem apresentar à Nação qualquer planejamento seguro para a retomada das atividades econômicas, o presidente tornou a vociferar contra governadores que mantêm a quarentena em seus Estados e exigiu, em termos rasteiros, a imediata volta ao trabalho. “O povo tem de voltar a trabalhar. Quem não quiser trabalhar que fique em casa, porra. Ponto final”, disse Bolsonaro à saída do Palácio da Alvorada na manhã de ontem, para delírio da meia dúzia de apoiadores que batem ponto no local.

Autoridades em saúde pública alertam que o ritmo de crescimento do número de óbitos por covid-19 no Brasil é bastante similar ao dos EUA, país que hoje lidera o triste ranking de vítimas fatais do novo coronavírus, com mais de 83 mil mortos. A continuar assim, não é improvável, dizem os especialistas, que o Brasil iguale ou até ultrapasse essa nada honrosa posição, a depender das medidas de combate à pandemia que sejam adotadas no País. A partir da confirmação do primeiro óbito (26/2), o País levou 74 dias para atingir a marca de 10 mil mortes. Os EUA, 73 dias. Embora esta diferença de apenas um dia seja desprezível, conta em desfavor do Brasil o fato de o primeiro óbito nos EUA ter ocorrido mais de um mês antes (22/1). Ou seja, ao que parece, o novo coronavírus matou mais rápido aqui do que lá, por uma série de razões.

De acordo com uma projeção feita pelo Instituto de Métricas e Avaliação de Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington, o País deverá chegar a agosto com quase 90 mil mortos em decorrência da covid-19, caso o porcentual de cidadãos que se mantêm em isolamento não aumente. Independentemente dos números projetados, que variam a depender da instituição e da metodologia, é dever do Estado, em todas as esferas de governo, e da sociedade agir, cada um na medida de suas responsabilidades, para evitar que as projeções mais funestas se tornem realidade.

É chocante ver ruas País afora apinhadas de gente, como se um vírus potencialmente mortal não estivesse em franca disseminação. Municípios que decidiram flexibilizar as regras de isolamento observaram um salto no número de casos de covid-19. Não é hora de relaxar. Mínimos descuidos podem ser fatais. “Estou vendo governadores ameaçarem a população com lockdown (bloqueio total). Isso é um absurdo”, reclamou o presidente Bolsonaro. Não é, caso as medidas adotadas até agora pelos governos locais para preservar a saúde das pessoas e a capacidade de atendimento do sistema público de saúde se mostrem ineficazes.

O País já vive as agruras das crises sanitária e econômica sem precedentes na história recente. Incapaz de ajudar, por má vontade e incompetência, Bolsonaro ainda atrapalha ao adicionar ao quadro uma crise política e federativa. O presidente ameaçou processar os governadores e prefeitos que insistem em ser responsáveis e ignoram os decretos inconsequentes que brotam do Palácio do Planalto. A autonomia dos entes federativos para tomar as ações necessárias ao combate à pandemia foi reconhecida pelo STF.

O continente americano ultrapassou a Europa em número de casos confirmados de covid-19. Os EUA têm 1,4 milhão de infectados. O Brasil, quase 178 mil. Os dois países representam 85% dos casos registrados nas Américas. Tamanha concentração de casos não é coincidência. Tanto Donald Trump como Jair Bolsonaro, este praticamente um ventríloquo daquele, desde o primeiro momento desdenharam do potencial ofensivo do novo coronavírus e fazem de tudo para sobrepor seus interesses particulares ao interesse público. Mal ou bem, os EUA já passaram pela fase mais crítica da pandemia. Triste Brasil.

O resgate do respeito - MARIA HERMÍNIA TAVARES

FOLHA DE SP - 14/05

Reconstruir nossa política externa exigirá mais que a volta a princípios consagrados


Na semana passada, os principais jornais brasileiros publicaram importante artigo pedindo a reconstrução da política externa do país. Assinaram o texto todos os ex-ministros de Relações Exteriores desde o governo Sarney, um notável diplomata e um ex-secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

Com a cacife de quem conduziu a diplomacia nacional nos últimos 28 anos, o grupo critica implacavelmente a destruição de nossa autoridade além-fronteiras, levada a cabo pelo atual governo. E propõe que a atuação do país volte a se pautar pelos princípios que desde muito cedo vertebraram a conduta e a identidade nacional diante do mundo: autonomia frente às nações poderosas, universalismo, multilateralismo e defesa da solução pacífica de conflitos.

Assim como a Covid-19, mais dia, menos dia, este governo passará —e com ele o chanceler que tão bem o espelha na mediocridade e na fúria descerebrada contra as melhores tradições diplomáticas brasileiras. Mas as circunstâncias sob as quais o país terá de reconquistar o respeito alheio posto abaixo pelo obscurantismo serão provavelmente muito diversas daquelas que favoreceram nossa ascensão internacional nas últimas décadas.
"É tudo histeria e conspiração", diz Bolsonaro, aplaudido pela morte e pelo coronavírus em charge do jornal alemão Stuttgarter Zeitung - Luff

As projeções mais razoáveis sobre o estado do mundo pós-pandemia apostam não em mudanças radicais, mas no acirramento de tendências já presentes antes da chegada da peste. Elas parecem apontar para a erosão do que os estudiosos denominaram a ordem internacional liberal --o conjunto de normas, regras e organizações supranacionais de natureza econômica e política, estabelecidas ao término da 2ª Guerra Mundial. As instituições de Bretton Woods e as que surgiram e se multiplicaram no âmbito das Nações Unidas definem sua arquitetura multilateral.

O definhamento do apoio dos Estados Unidos a tais instituições, que Trump não iniciou, mas acentuou —bem como sua preferência por ações unilaterais, além da encarniçada disputa com a China—, as enfraquecem e deslegitimam. Basta ver a campanha xenófoba do presidente americano contra a Organização Mundial da Saúde desde a eclosão da pandemia. Tais organismos decerto não haverão de perecer, mas talvez ofereçam espaço menor para países como o Brasil buscarem reconhecimento e protagonismo.

Nesse ambiente adverso, reconstruir a política externa brasileira demandará mais do que voltar aos princípios consagrados: será imperativo traduzi-los em novas formas de ação. Algo que nem passa pela cabeça do patético chanceler, mas desafia todos quantos aspirem a que o país resgate o respeito internacional perdido.

Maria Hermínia Tavares
Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

Bolsonaro é risco ao investimento - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 14/05

Bolsonaro alimenta a fuga de capitais do Brasil, pela capacidade inesgotável de produzir crises. Real é a moeda que mais perde valor


O presidente Jair Bolsonaro eleva o risco de investir no Brasil. A crise da saúde, as turbulências diárias que ele cria, os ataques às instituições democráticas, tudo tem sido colocado na balança pelo investidor estrangeiro, que sairá desta crise com uma desconfiança ainda maior sobre a economia brasileira. O real é a moeda que mais se desvaloriza este ano e ontem o dólar bateu novo recorde nominal. O grau de investimento ficou mais distante, com a perspectiva negativa na nota de crédito do governo pela agência Fitch. O risco-país saiu de 100 para 350 pontos de dezembro para cá. O que diferencia o Brasil de outros emergentes é a capacidade do presidente Jair Bolsonaro de produzir crises políticas constantes.

O dólar disparou 47% este ano, em relação ao real, saindo de R$ 4,01 no dia 31 de dezembro para R$ 5,90 no fechamento de ontem. Na média, explica a economista-chefe do banco Ourinvest, Fernanda Consorte, a valorização sobre as moedas de países exportadores de commodities está em torno de 15%. Ou seja, há um fator de risco que diferencia o Brasil de outros emergentes.

— Tem a recessão da pandemia, que é comum a todos. A queda dos juros, também, porque o BC brasileiro reduziu a Selic, mas outros países também baixaram. O que só existe no Brasil é o componente político. É a queda de braço do executivo com o Congresso, do governo federal com estados e municípios. A demissão do Mandetta, agora do Sergio Moro — explica Consorte.

Em geral, essa é a avaliação feita entre os economistas, a de que o presidente em si, com sua inesgotável capacidade de criar conflitos, até dentro de sua própria administração, é um ponto desfavorável num momento em que há um nítido movimento de aversão ao risco. Com tantas incertezas, o capital corre para título americano, ouro, moedas fortes e sai de mercados emergentes. Para fugir do Brasil há uma razão a mais: o presidente faz uma direção temerária do país em meio a uma pandemia e uma recessão. Houve muita saída de capital externo, principalmente da bolsa, desde o começo do governo, quando ficou claro que ele continuava apostando na polarização extrema. Esse movimento se acentua este ano. No pregão da segunda-feira, saíram R$ 711 milhões, maio já está negativo em R$ 4 bilhões e no ano a saída é de R$ 73 bilhões. A bolsa subiu no ano passado, mas impulsionada basicamente por investidores locais.

Para haver a volta do investimento, só se ocorresse o cenário de retomada da agenda de reformas, com mais protagonismo dos presidentes da Câmara e do Senado, como no ano passado. Outro cenário seria o início de um processo de impedimento do presidente Jair Bolsonaro, que traria instabilidade no curto prazo, mas que poderia desanuviar o ambiente à frente.

— Alguma coisa vai ter que mudar depois da pandemia. Do contrário, não haverá investimento externo. A saída mais extrema, que seria o impeachment, balançaria as estruturas no curto prazo, mas o país passou por isso recentemente e deu certo. Talvez o mercado se acalme porque não será um evento novo — disse Consorte.

A agência Fitch, que na última semana colocou a nota da dívida soberana sob viés negativo, chamou de “volátil” a relação do Executivo com o Congresso e afirmou que esses “constantes atritos” reduziram a previsibilidade econômica e as perspectivas de reformas. A dívida bruta do governo vai disparar com os gastos emergenciais para lidar com a crise, e isso significa que o esforço fiscal terá que ser maior do que o projetado no início do governo Bolsonaro. As denúncias de interferência na Polícia Federal, feitas pelo ex-ministro Sergio Moro, “contaminaram” ainda mais o ambiente político, na visão da Fitch.

A imprensa internacional tem feito corrosivos comentários sobre a presidência de Jair Bolsonaro. O jornal “Washington Post”, em editorial, apontou Bolsonaro como o pior gestor da pandemia. A revista “Economist” chegou a falar em “insanidade” do presidente brasileiro. Uma das mais renomadas revistas científicas do mundo, a “Lancet”, escreveu que Bolsonaro é uma ameaça ao combate à Covid-19. O “Financial Times”, em editorial, falou que Bolsonaro está em processo de autodestruição. Toda essa exposição negativa do presidente brasileiro afeta a escolha do local para se investir. O risco Bolsonaro pesa sobre o próprio Brasil.

Limites e responsabilidades - ANTONIO HAMILTON MARTINS MOURÃO

ESTADÃO - 14/05

Com sensibilidade das mais altas autoridades é possível superar a grave situação que vive o País


A esta altura está claro que a pandemia de covid-19 não é só uma questão de saúde: por seu alcance, sempre foi social; pelos seus efeitos, já se tornou econômica; e por suas consequências pode vir a ser de segurança. A crise que ela causou nunca foi, nem poderia ser, questão afeta exclusivamente a um ministério, a um Poder, a um nível de administração ou a uma classe profissional. É política na medida em que afeta toda a sociedade e esta, enquanto politicamente organizada, só pode enfrentá-la pela ação do Estado.

Para esse mal nenhum país do mundo tem solução imediata, cada qual procura enfrentá-lo de acordo com a sua realidade. Mas nenhum vem causando tanto mal a si mesmo como o Brasil. Um estrago institucional que já vinha ocorrendo, mas agora atingiu as raias da insensatez, está levando o País ao caos e pode ser resumido em quatro pontos.

O primeiro é a polarização que tomou conta de nossa sociedade, outra praga destes dias que tem muitos lados, pois se radicaliza por tudo, a começar pela opinião, que no Brasil corre o risco de ser judicializada, sempre pelo mesmo viés. Tornamo-nos assim incapazes do essencial para enfrentar qualquer problema: sentar à mesa, conversar e debater. A imprensa, a grande instituição da opinião, precisa rever seus procedimentos nesta calamidade que vivemos. Opiniões distintas, contrárias e favoráveis ao governo, tanto sobre o isolamento como a retomada da economia, enfim, sobre o enfrentamento da crise, devem ter o mesmo espaço nos principais veículos de comunicação. Sem isso teremos descrédito e reação, deteriorando-se o ambiente de convivência e tolerância que deve vigorar numa democracia.

O segundo ponto é a degradação do conhecimento político por quem deveria usá-lo de maneira responsável, governadores, magistrados e legisladores que esquecem que o Brasil não é uma confederação, mas uma federação, a forma de organização política criada pelos EUA em que o governo central não é um agente dos Estados que a constituem, é parte de um sistema federal que se estende por toda a União.

Em O Federalista – a famosa coletânea de artigos que ajudou a convencer quase todos os delegados da convenção federal a assinarem a Constituição norte-americana em 17 de setembro de 1787 –, John Jay, um de seus autores, mostrou como a “administração, os conselhos políticos e as decisões judiciais do governo nacional serão mais sensatos, sistemáticos e judiciosos do que os Estados isoladamente”, simplesmente por que esse sistema permite somar esforços e concentrar os talentos de forma a solucionar os problemas de forma mais eficaz.

O terceiro ponto é a usurpação das prerrogativas do Poder Executivo. A esse respeito, no mesmo Federalista outro de seus autores, James Madison, estabeleceu “como fundamentos básicos que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário devem ser separados e distintos, de tal modo que ninguém possa exercer os poderes de mais de um deles ao mesmo tempo”, uma regra estilhaçada no Brasil de hoje pela profusão de decisões de presidentes de outros Poderes, de juízes de todas as instâncias e de procuradores, que, sem deterem mandatos de autoridade executiva, intentam exercê-la.

Na obra brasileira que pode ser considerada equivalente ao Federalista, Amaro Cavalcanti (Regime Federativo e a República Brasileira, 1899), que foi ministro de Interior e ministro do Supremo Tribunal Federal, afirmou, apenas dez anos depois da Proclamação da República, que “muitos Estados da Federação, ou não compreenderam bem o seu papel neste regime político, ou, então, têm procedido sem bastante boa fé”, algo que vem custando caro ao País.

O quarto ponto é o prejuízo à imagem do Brasil no exterior decorrente das manifestações de personalidades que, tendo exercido funções de relevância em administrações anteriores, por se sentirem desprestigiados ou simplesmente inconformados com o governo democraticamente eleito em outubro de 2018, usam seu prestígio para fazer apressadas ilações e apontar o País “como ameaça a si mesmo e aos demais na destruição da Amazônia e no agravamento do aquecimento global”, uma acusação leviana que, neste momento crítico, prejudica ainda mais o esforço do governo para enfrentar o desafio que se coloca ao Brasil naquela imensa região, que desconhecem e pela qual jamais fizeram algo de palpável.

Esses pontos resumem uma situação grave, mas não insuperável, desde que haja um mínimo de sensibilidade das mais altas autoridades do País.

Pela maneira desordenada como foram decretadas as medidas de isolamento social, a economia do País está paralisada, a ameaça de desorganização do sistema produtivo é real e as maiores quedas nas exportações brasileiras de janeiro a abril deste ano foram as da indústria de transformação, automobilística e aeronáutica, as que mais geram riqueza. Sem falar na catástrofe do desemprego que está no horizonte.

Enquanto os países mais importantes do mundo se organizam para enfrentar a pandemia em todas as frentes, de saúde a produção e consumo, aqui, no Brasil, continuamos entregues a estatísticas seletivas, discórdia, corrupção e oportunismo.

Há tempo para reverter o desastre. Basta que se respeitem os limites e as responsabilidades das autoridades legalmente constituídas.

ANTONIO HAMILTON MARTINS MOURÃO É VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

O Brasil precisa saber - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 14/05

Se é verdade que o tal registro não revela nenhuma irregularidade cometida pelo presidente, como Bolsonaro diz e repete, então nada deveria obstar sua publicidade voluntária e imediata

É imprescindível que o inteiro teor do vídeo da reunião do presidente Jair Bolsonaro com seu Ministério em 22 de abril seja tornado público. E essa iniciativa deveria partir não de uma ordem judicial, e sim do próprio presidente, certamente o maior interessado no esclarecimento dos fatos; afinal, se é verdade que o tal registro não revela nenhuma irregularidade cometida pelo presidente, como Bolsonaro diz e repete, então nada deveria obstar sua publicidade voluntária e imediata.

“Vocês vão se surpreender quando esse vídeo aparecer”, disse Bolsonaro. A Nação mal pode esperar para ser surpreendida. Por ora, os brasileiros conhecem apenas a versão fornecida por alguns dos espectadores do referido vídeo, exibido para procuradores da República, investigadores da Polícia Federal (PF) e o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, autor de denúncias contra o presidente e que citara a tal reunião como evidência de suas acusações. E a versão dessas testemunhas não surpreende ninguém: segundo algumas delas, Bolsonaro deixou claro que queria interferir na chefia da Superintendência da Polícia Federal no Rio para proteger sua família, que, segundo ele, estaria sendo “perseguida” pela PF. Tudo isso permeado por palavrões, gritaria, desrespeito e ameaças de demissão - ou seja, um dia comum na Presidência de Jair Bolsonaro.

Surpreendente, mesmo, seria se o vídeo mostrasse um chefe de governo equilibrado, consciente da função que desempenha e reverente em relação não apenas à liturgia do cargo, mas aos princípios básicos da República que preside - aquela em que ninguém, por mais poderoso que seja, pode se considerar acima da lei. Como até mesmo os camisas pardas que veneram Bolsonaro sabem a esta altura que isso é impossível, o único interesse no vídeo é verificar se o presidente realmente cobrou do então ministro Sérgio Moro que fizesse mudanças na Polícia Federal com o intuito de blindar seus filhos e amigos, enrolados com a Justiça - o que, segundo Moro, o motivou a pedir demissão do Ministério da Justiça.

Enquanto o vídeo não vem à luz na sua integralidade, para que se possa verificar o contexto de cada declaração, será a palavra de Bolsonaro - que nega tudo - contra a das testemunhas, e é ocioso discutir em quem se deve acreditar neste momento. O fato, por ora, é que há grossas suspeitas de que o presidente pode ter cometido delitos em série, e a divulgação do vídeo certamente ajudará a mostrar onde está a verdade.

Até que isso aconteça, é preciso muita prudência. A falta dela quase derrubou um governo, o do presidente Michel Temer, vítima de um escândalo irresponsável criado a partir da interpretação equivocada - maldosa até, pode-se dizer - de um diálogo dele com o empresário Joesley Batista, em 2017. Quando o diálogo afinal se tornou público, percebeu-se que nada havia ali que comprometesse o presidente a ponto de interromper seu mandato.

Espera-se que o procurador-geral da República, Augusto Aras, aja com a responsabilidade que faltou a Rodrigo Janot quando este, na condição de procurador-geral, fez as denúncias contra Michel Temer movido pelo desejo incontido de criminalizar toda a classe política, a começar pelo presidente.

Assim, o procurador Augusto Aras deve se ater exclusivamente às evidências e solicitar quantas diligências forem necessárias para ter um quadro completo. Se as provas forem frágeis, como afirma Bolsonaro, então o caso obviamente não pode seguir. Entretanto, se houver razões para levar adiante as investigações e oferecer uma denúncia contra o presidente, Augusto Aras - indicado para o cargo por Bolsonaro - deve fazê-lo, com a independência que a Constituição garante ao Ministério Público.

Processar e eventualmente cassar um presidente da República não é uma brincadeira inconsequente. É a mais séria das decisões políticas num regime presidencialista, razão pela qual é preciso ter sólidos argumentos para consumá-la. A incivilidade e o despreparo do presidente Bolsonaro, por mais que envergonhem o País, não são motivos para isso. Advocacia administrativa, prevaricação, obstrução da justiça, coação, falsidade ideológica e crime de responsabilidade são.

O personagem e o roteirista Jair Bolsonaro fracassaram - ROBERTO DIAS

FOLHA DE SP - 14/05

Nem o uso de pseudônimos sustenta mais sua narrativa


O personagem Jair Bolsonaro já não dá mais conta do enredo que o roteirista Jair Bolsonaro criou para sua vida.

Para contar essa história inacreditável, é preciso agora recorrer ao Airton, ao Rafael e ao 05. Depois há o trabalho de convencer o espectador e um ministro do STF-- de que os três são mesmo pseudônimos.

Até a pandemia, a fórmula do roteiro vinha se segurando: era tirar da cartola alguma historinha lateral e emendar na anterior. Agora já não funciona. Bolsonaro tentou pautar uma discussão sobre aborto, mas só os espectadores mais atentos de suas redes e alguns militantes do WhatsApp perceberam.

A caneta mágica do filho Carlos, fundamental no caminho até o Planalto, tem menos tinta. A popularidade nas redes dá sinais de queda. Bolsonaro já se repete no vexame de ser um raríssimo chefe de Estado com posts classificados de fake news pelas plataformas. Em perfis onde antes se liam defesas do presidente, hoje se veem pedidos para que não abra a boca.

Até porque cada vez que o faz cria um novo alvo para as edições Tomahawk do Jornal Nacional, que justapõem as falas contraditórias de Bolsonaro em som e imagem claríssimos para um público imenso.

E o personagem se desmente sem ter tempo de trocar a gravata. O que ele fala na rampa do Planalto perde a validade minutos depois, na porta do Alvorada —foi assim quando tentou explicar a surpresa do ministro da Saúde com o decreto para reabrir academias e salões de beleza.

A reação imediata ao presidente é não acreditar. Sua versão sobre a tal reunião com os ministros muda a cada dia. A última tirada foi dizer que não vai ter mais reunião ministerial, e isso vale até a próxima reunião ministerial.

O personagem Bolsonaro e o roteirista Bolsonaro fracassaram. O primeiro embutiu o descrédito como parte de si. O segundo parece sentir, finalmente, que o enredo fugiu de suas mãos.

Reunião fatídica - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 14/05

Impõe-se divulgação na íntegra de vídeo a fim de esclarecer conduta de Bolsonaro


A apuração acerca das circunstâncias da saída de Sergio Moro do governo Jair Bolsonaro envolve, até aqui, uma batalha de versões.

O ex-ministro da Justiça forneceu mensagens de aplicativos para ajudar a montar seu relato de que o presidente quis exercer ingerência política na Polícia Federal.

Apontou duas circunstâncias em que o fato poderia ser aferido: a reunião ministerial de 22 de abril, antevéspera de seu pedido de demissão, e o encontro dele com ministros militares no dia seguinte.

O vídeo que registrou a reunião mencionada mobiliza agora as atenções de Brasília. Bolsonaro ensaiou divulgá-lo e depois recuou, alegando questões de segurança nacional debatidas na gravação.

Talvez elas existam, mas o que se vazou a respeito da peça sugere um pouco de tudo: ministros do Supremo Tribunal Federal sendo ameaçados, ofensas a governadores e à China, palavrões à mancheia.

No ponto central, até onde se pôde apurar, está uma fala de Bolsonaro sobre a intenção de mudar a chefia da Polícia Federal no Rio —e, se necessário para tal, de trocar o diretor ou Moro— para cuidar de interesses de seus filhos e amigos.

O vídeo foi assistido pela Procuradoria-Geral da República, porém ainda não liberado pelo condutor do inquérito, o ministro do Supremo Celso de Mello. À gravação foram juntados depoimentos de envolvidos no enredo e também dos três generais citados por Moro.

Na visão deles, o ex-ministro se equivocou. Bolsonaro se referiu à segurança de sua família no Rio, que seria responsabilidade do Gabinete de Segurança Institucional. “Eu não falo Polícia Federal. Falo sobre segurança da família e meus amigos”, afirmou o presidente.

À parte o fato de que não é atribuição do GSI cuidar de amigos do chefe de Estado, a defesa do Planalto se ampara numa questão interpretativa —Moro teria entendido errado o que foi dito na reunião.

Os generais palacianos corroboraram a versão de Bolsonaro, mas disseram que a PF foi, sim, tema da reunião, segundo Augusto Heleno (GSI) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). O mandatário correu a dizer que o último havia se enganado.

Impõe-se, em tal cenário, a pronta divulgação integral do vídeo, a despeito de constrangimentos políticos para o governo, a fim de dirimir, perante a sociedade, as dúvidas quanto à conduta do presidente na ocasião. Do ponto de vista jurídico, o inquérito ainda terá mais dados e testemunhos a considerar.

As negativas de Bolsonaro, de todo modo, destoam de seus atos. Afinal, ele fez exatamente o que Moro antecipou na saída do governo, ao trocar o diretor-geral e o superintendente da unidade fluminense da Polícia Federal.

O quebra-cabeça - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 14/05

A versão de que o presidente se referia à sua segurança pessoal não se sustenta, pois quem cuida dela é o GSI

A novela da reunião ministerial só terá seu fim se o ministro Celso de Mello autorizar a divulgação integral do vídeo. Só assim será possível entender o contexto em que as frases foram ditas.

Além do mais, a disposição do presidente Jair Bolsonaro de distribuir uma versão oficial editada dos melhores momentos contribui para toldar mais ainda o ambiente político.

A versão de que o presidente se referia à sua segurança pessoal não se sustenta, pois quem cuida dela é o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), chefiado pelo General Augusto Heleno com homens do Exército e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Se sua insatisfação fosse nesse âmbito, quem deveria ter sido demitido seria o General, não Moro. E o delegado Alexandre Ramagem, chefe da Abin. Ao contrário, Ramagem foi indicado por Bolsonaro para comandar a Polícia Federal, com vastos elogios.

Essa versão, que surgiu do nada, de repente, após a exibição do vídeo, foi corroborada pelo chefe do Gabinete Civil, General Braga Neto. Mas não casa com o que aconteceu depois da reunião. O então ministro Sergio Moro, logo depois da reclamação do presidente em termos agressivos, deixou a reunião.

Depois, procurou os três ministros de origem militar que trabalham no Planalto – General Augusto Heleno, General Braga Neto e General Luiz Eduardo Ramos – para mostrar sua indignação com a tentativa de Bolsonaro de intervir na Polícia Federal. Segundo confirmação nos depoimentos, os ministros palacianos pediram que ele se acalmasse, e aceitasse as mudanças.

Se tivessem entendido que a preocupação do presidente era com sua segurança pessoal, por que não tentaram acalmar Moro dizendo que a reclamação não era contra ele, mas contra o General Heleno?

Além do mais, Bolsonaro admite que falou em segurança de seus familiares e aliados. Desde quando aliados do presidente têm direito a segurança institucional? Não é bom esquecer a mensagem que Bolsonaro enviou a Moro, com uma informação do site O Antagonista reproduzindo uma notícia sobre uma coluna minha que informava que 10 a 12 deputados bolsonaristas estavam na mira da Policia Federal no inquérito do Supremo sobre fake news. Bolsonaro escreveu: “Mais um razão para a mudança”.

Tudo indica que será difícil arquivar esse processo, pois as provas se acumulam. O constitucionalista Gustavo Binemboim, muito antes do caso do vídeo da reunião ministerial, escreveu um artigo em que explica os padrões decisórios consolidados para situações de incerteza no direito processual penal: in dúbio pro societate (em dúvida, a favor da sociedade), pelo recebimento da denúncia, no início do processo; in dúbio pro réu (em dúvida, a favor do réu) quando do julgamento final.

“Na instauração da ação penal, prefere-se correr o risco de processar suposto inocente a inocentar possível culpado. No veredicto final, havendo dúvida razoável, prefere-se inocentar eventual culpado a condenar virtual inocente”.

O Procurador-Geral da República, Augusto Aras, é o dono da ação penal, e cabe a ele fazer uma denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) ou arquivar o processo. Ele está pressionado pelas duas partes. Por um lado, a pressão interna dos procuradores é pela denúncia, depois de terem visto o vídeo e interrogado as testemunhas. Há informações de que, ao receber os primeiros detalhes sobre o vídeo, o Procurador-Geral soltou um palavrão de espanto diante dos relatos.

De outro lado, o Palácio do Planalto pressiona Aras com recados indiretos. O presidente Bolsonaro teria comentado com pessoas próximas que o Procurador-Geral seria um bom nome para uma vaga do Supremo Tribunal Federal, mas a indicação dependeria de sua atuação.

Toda investigação é um quebra-cabeça que vai sendo montado peça por peça, e se alguma for esquecida, não se forma a figura final. O Procurador-Geral da República, por isso, não pode deixar de levar em conta as atitudes pregressas do presidente Bolsonaro, que desde agosto fala publicamente que queria mudar a superintendência da Polícia Federal do Rio. E também não pode deixar de analisar o ambiente todo da reunião ministerial.

Bolsonaro disse que em nenhum momento se referiu à Policia Federal, já os ministros Braga Neto e Luiz Eduardo Ramos dizem que ele falou, sim, mas em outro momento da reunião, em outro contexto. É preciso ver o vídeo inteiro para juntar as peças do quebra-cabeça. Um bom passatempo na quarentena.

Bolsonaro na difícil busca por uma saída - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 14/05

Versão inverossímil do que disse o presidente na reunião de ministros reflete a gravidade da situação

A contestação feita pelos ministros militares do Planalto do entendimento de Sergio Moro, e de pessoas que também assistiram à exibição anteontem do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, não acaba com as dificuldades de Bolsonaro diante da acusação do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública de que ele o pressionou a fazer mudanças na Polícia Federal de interesse pessoal, até chegar ao ponto de demiti-lo e também o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo.

A desconfiança de que, para proteger o presidente, foi construída a versão do suposto mal-entendido sobre o que disse Bolsonaro na reunião terá de ser confrontada com a íntegra da gravação, a ser liberada ou não pelo ministro do STF Celso de Mello, que preside este inquérito. Ajudará na busca da verdade se a liberar. A defesa que os ministros militares Braga Netto, da Casa Civil; Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo; e Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), fazem de Bolsonaro choca-se com a lógica e o transcorrer dos fatos depois daquela reunião, a começar pelas demissões de Moro e de Valeixo.

Este vídeo é a prova com a qual Moro quer fundamentar a acusação de uma grave ação patrimonialista de Bolsonaro para poder usar um braço importante de segurança do Estado em benefício próprio e do seu governo. Nem mesmo os choques entre o ex-juiz e o ex-capitão eram desconhecidos. Sabia-se da intenção do presidente de afastar o delegado Maurício Valeixo do cargo de diretor-geral da PF e/ou de mudar o superintendente da Polícia no Rio de Janeiro — “meu estado”. Foi feita uma troca no Rio em comum acordo entre Bolsonaro, Moro e Valeixo, saindo Ricardo Saadi, entrando Carlos Henrique Oliveira. Mas Bolsonaro continuou querendo no Rio e na cúpula da PF um delegado com quem ele pudesse “interagir”. As pressões continuaram — o que também era acompanhado pela imprensa—, até o presidente não aguentar mais e, na reunião de 22 de abril, anunciar que poderia afastar Valeixo e Moro. Assim foi entendido, mas testemunhas do presidente usam a palavra “segurança” dita por Bolsonaro para garantir que a irritação do presidente era com a guarda pessoal dele e da família. Mas os ministros Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno citaram a PF nos depoimentos que prestaram.

Sobre Ramos, Bolsonaro esclareceu que ele se “equivocou”, e não foi contestado pelo general. Os ministros militares não contestam o presidente, mas foram Moro e Valeixo que saíram do governo, e não Augusto Heleno, do GSI, que responde pela segurança do presidente e de parentes próximos. Acredite quem quiser na versão de conveniência. Diante da incoerência, Bolsonaro se esquiva.

Já se testemunhou a criação de embustes. Um deles, o “empréstimo” de US$ 3,7 milhões supostamente obtido pelo presidente Collor no Uruguai para campanha eleitoral. Era “lavagem” de dinheiro das propinas de PC Farias. Nunca se acreditou na “Operação Uruguai”, e Collor terminaria cassado. Devem-se guardar as diferentes peculiaridades históricas dos dois casos.