sábado, junho 08, 2019

Neymar! Ou caindo ou trepando! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 08/06

Ele só dá mancada! Dentro e fora de campo! Vive mancando!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!

Piada Pronta: "Natal e Ano-Novo são presos por homicídio em Betim". O Natal matou o Papai Noel. E o Ano-Novo matou 2019! Matou um morto! Rarará! E duas as razões para todas as encrencas do Neymar: Neymar Pai e Neymar Pau! Rarará!

E a única conclusão que um amigo tirou do caso Neymar: o quarto do Sofitel é muito pequeno! Rarará! E eu nunca vi tanto advogado como nesse caso Neymar! Parece congresso da OAB! Rarará!

E o que o Bolsonaro foi fazer na Argentina? Fazer piada: dar o boné da selecinha brasileira pro Macri. E o Macri devia retribuir com uma camiseta do Maradona! Rarará!
Fê/Folhapress

Apesar do Macri, os argentinos continuam com o consumismo. Con su mismo salário e con su mismo coche! Rarará!

E o Guedes com os empresários. Ainda tem empresário na Argentina? Sobrou algum? "Guedes propõe moeda única para América do Sul: peso real!". Aí vira peso virtual! E depois peso-pena. E por fim, peso morto! Eu sugiro: MOERDA! MOERDA ÚNICA! Rarará! E terminou cantando: "Não chores por mim, Argentina, que amanhã somos nóis na latrina". #tamojunto!

E o Neymar só dá mancada! Dentro e fora de campo! Vive mancando! Tornozelo, dedinho, joelho, da cintura pra baixo ele quebra tudo! Rarará!

E só joga em duas posições: ou caindo ou trepando! E o Código de Trânsito! Sensacionalista: "Bolsonaro muda Código de Trânsito para continuar dirigindo o país na contramão". A 100 km por hora avançando dois sinais! Um ás no volante. Ops, um asno volante! Rarará!

Agora é 40 pontos na carteira e 20 pontos na testa! E o principal: Carlucho não precisa mais ir na cadeirinha! Rarará!

E ontem flagraram um motorista na marginal a mais de 100 km por hora, com a cara pra fora e gritando MIIIIITO! Pá! Poste! SAMU! Quem mais vai trabalhar no Código de Trânsito é a ambulância do Samu!

E a Doidamares! "Damares prega abstinência sexual e critica Popeye." Entre a Damares e a abstinência sexual, eu fico com a abstinência sexual! E ela disse pra BBC Brasil que vai cortar o cabelo e entrar no Tinder. Um amigo diz que pegava! Rarará!

Nóis sofre, mas nóis goza!

Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

José Simão
Jornalista, precursor do humor jornalístico.

Mea-culpa - RODRIGO CONSTANTINO

REVISTA ISTO É

A tensão entre governo e imprensa é inevitável. Jornalismo não é fazer propaganda, mas é possível uma cobertura mais justa



“Todos estão procurando um motivo para não assumir a responsabilidade por suas próprias ações”, disse Clint Eastwood certa vez. A evasão, a busca por bodes expiatórios, a tentativa de sempre culpar os outros são tão antigas quanto a humanidade. Que diferença faz a coragem de admitir os próprios erros!

O Brasil vive um momento extremamente delicado. Nosso Estado faliu e a principal causa é o rombo previdenciário, apesar de não ser a única. Qualquer pessoa sensata vai reconhecer que precisamos de um choque de produtividade, de redução da ingerência estatal e do resgate de certos valores morais. A decadência deixada pelo petismo é econômica e também cultural.

Há divergências quanto aos métodos para se resgatar o crescimento e os valores, já que numa democracia o pluralismo é saudável. Ninguém é dono da verdade. Mas é consensual a necessidade de mudanças, de uma agenda propositiva comum para recolocar a economia nos trilhos, de conter os gastos públicos e estancar a baixaria nos costumes.

A pauta liberal-conservadora isso faz sentido. Mesmo progressistas moderados podem aceitar essa realidade. As principais lideranças do País, portanto, têm a obrigação moral de encontrar esse denominador comum para salvar o Brasil do caos. Mas poucos têm adotado essa postura agregadora.

O próprio presidente, influenciado por sua militância, investe em discursos que geram mais cizânia do que qualquer outra coisa. Boa parte do Congresso, por outro lado, demonstra pouco patriotismo e tenta preservar os velhos privilégios. Já a imprensa acaba exagerando na dose das críticas por causa de sua antipatia ao presidente.

Carlos Alberto Di Franco escreveu condenando a má vontade de Bolsonaro com a imprensa, mas reconhecendo que os jornalistas também não ajudam nada: “nós, da imprensa, talvez ressentidos pelo estilo polêmico do presidente, sobretudo pela agressividade dos seus filhos, não estamos captando os sinais do governo. Por isso temos sido excessivamente críticos com uma administração que está nos começos e carregando uma herança para lá de incompetente, corrupta e irresponsável”.

A tensão entre governo e imprensa é inevitável onde há liberdade de expressão e não é papel do jornalismo fazer propaganda. Mas é possível ser mais justo, como diz Di Franco: “Os leitores, com razão, manifestam cansaço com o tom sombrio das nossas coberturas. É possível denunciar mazelas com um olhar propositivo”. É hora de todos fazerem uma reflexão e um mea-culpa, aparando arestas e focando naquilo que importa. O Brasil tem pressa!

O peso real de um delírio - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 08/06


O fato de, na cotação mais recente do mercado cambial, o peso argentino custar menos de 10 centavos de real (ou, inversamente, o real brasileiro custar mais de 11 pesos argentinos) mostra uma discrepância numérica e momentânea entre as duas moedas que não inviabilizaria a busca de sua unificação – o que para o presidente Jair Bolsonaro seria a concretização de um “sonho”. No entanto, a despeito de os dois países fazerem parte do Mercosul – um bloco econômico que teoricamente, mas apenas teoricamente, se caracteriza como uma união aduaneira –, outras discrepâncias de natureza macroeconômica entre Brasil e Argentina, ainda mais acentuadas do que as observadas entre as duas moedas, fazem tal “sonho” parecer um delírio.

Na década de 1980, os governos do Brasil e da Argentina chegaram a falar em moeda única, que se chamaria “gaúcho”, que seria utilizada exclusivamente nas transações entre os dois países, mas a ideia foi abandonada, por completa falta de condições para sua adoção. A ideia voltou a ser discutida no âmbito do Mercosul em 1998, quando os países-membros do bloco assinaram o Protocolo de Ushuaia, que previa a criação da moeda única, mas sem definir data para sua concretização, dadas as dificuldades políticas para isso.

Por algum motivo, os atuais governos do Brasil e Argentina ressuscitaram a ideia. Durante sua visita oficial à Argentina, na quinta-feira passada, Bolsonaro comemorou o que considerou o primeiro passo para a criação da moeda única dos dois países, que se chamaria “peso real”. O tema foi apresentado pelo ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, durante encontro empresarial em Buenos Aires de que participaram o presidente Jair Bolsonaro e ministros argentinos. “A reação dos empresários argentinos foi de que isso deve ser feito logo”, disse Guedes após o encontro. Em seguida, ponderou que a criação da moeda é “conjectura”. Em outro momento, disse que isso é “algo que poderia acontecer em um prazo de 20 anos”.

Bolsonaro parece encantado com a ideia. De volta ao Brasil, afirmou que a criação de uma moeda única poderia se estender para toda a América do Sul, afirmando tratar-se de uma proposta que vem sendo debatida desde 2011 por Guedes. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), demonstrou ceticismo com a ideia: “Será? Dólar valendo R$ 6,00? Inflação voltando? Espero que não”.

De fato, observando-se a realidade econômica dos dois países, é muito difícil imaginar que ambos venham a adotar uma moeda única num horizonte previsível. A cotação do dólar, lembrada por Maia, é apenas uma das grandes diferenças, não pela grande discrepância da cotação da moeda americana em peso e em real, mas pela velocidade de desvalorização da moeda argentina.

A inflação acumulada de 12 meses no Brasil está abaixo de 5%; na Argentina alcança 55%. Daí a pergunta de Maia a respeito de trazer de volta a inflação da qual o País tanto lutou para se livrar. Por esta e por muitas outras razões – inclusive a necessidade de preservação da política monetária que vem assegurando inflação próxima da meta sem necessidade de apertar o controle da moeda –, o Banco Central (BC) do Brasil tratou de divulgar nota afirmando que não há projetos ou estudos em andamento para uma união monetária com a Argentina. “Há tão somente, como é natural na relação entre parceiros, diálogos sobre estabilidade macroeconômica, bem como debates acerca de redução de riscos e vulnerabilidade e fortalecimento institucional”, completou o BC.

Não se esperaria que a instituição responsável pela preservação da estabilidade da moeda brasileira se manifestasse de outra maneira. Então, por que a ideia foi relançada, e defendida com entusiasmo, por Bolsonaro? A hipótese mais lembrada é o desejo do presidente brasileiro de dar apoio a seu colega argentino Mauricio Macri. Candidato à reeleição, enfrenta séria crise econômica e vai mal nas pesquisas eleitorais. Mas o que a estabilidade da economia brasileira tem a ver com isso?

Mirradas tetas - JULIANNA SOFIA

FOLHA DE SP - 08/06

No país de 13,2 milhões de desempregados, amigo de Bolsonaro ganha boquinha de R$ 55 mil



Há dez anos, o escândalo dos atos secretos do Senado escancarava a existência de boletins usados sorrateiramente pela cúpula da Casa para nomear cupinchas e familiares de senadores e funcionários a sinecuras legislativas. Um sorvedouro de dinheiro público. O processo dormitana segunda instância da Justiça Federal, sem solução.

O Brasil de hoje, com 13,2 milhões de desempregados, pouco mudou.

Um amigo do presidente Jair Bolsonaro teve o nome descartado para uma gerência da Petrobras no início deste ano depois de passar pelo escrutínio da governança da estatal. Foi constatado que ele não tinha experiência para o cargo. Neste mês, no entanto, o chegado do presidente ganhou sua prebenda. Embolsará R$ 55 mil mensais como assessor da presidência da petroleira.

Assim como o caso do companheiro de Bolsonaro, outros ululam entre praticantes da nova política —cuja retórica, acertadamente, volta-se contra desperdício dos recursos do Estado e mordomias bancadas pelo povo. Um grupo de deputados federais do partido Novo, por exemplo, aderiu a benesses da velhacaria.

Desfruta sem reservas de auxílio-moradia —um dos privilégios combatidos pela legenda na campanha eleitoral—, registra gastos excessivos com passagens aéreas financiadas pela União, além de despesas supérfluas da chamada cota parlamentar. No gabinete de um deles, uma assessora usou transporte pago pela Câmara para ir a um shopping da capital federal em pleno domingo.

No país da mamata, o esbanjamento não conhece fronteiras. NaAssembleia Legislativa de Minas, encontrou-se um mecanismo para driblar a exigência de concurso público para o provimento de cargos de natureza técnica. Os postos viraram cabide de emprego para atender a loteamento político. Os apaniguados são contratados para cumprir funções em vagas políticas, mas acabam em posições de perfil técnico.

Diante do quadro fiscal falimentar, não se envergonham os finórios em mamar nas mirradas tetas da viúva.

Julianna Sofia
Jornalista, secretária de Redação da Sucursal de Brasília

Em busca do método - HELIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 08/06

Identificar a motivação de Bolsonaro para seus atos é uma tarefa desafiadora


“Apesar de isso ser loucura, há método nela”, escreveu Shakespeare. Quando se trata de Jair Bolsonaro, não temos muita dificuldade em identificar as loucuras, mas encontrar um método nelas é tarefa das mais desafiadoras.

O presidente atira para todos os lados. Ele representa a direita nacionalista, dirão alguns. Não duvido. Bolsonaro inscreveu o “Brasil acima de tudo” em seu dístico de campanha, ameaçou tirar o país de tratados internacionais, desconfia dos chineses e tem fixação pelo nióbio. Mas ele agora está falando em adotar uma moeda comum para o Mercosul, ideia das mais internacionalistas, que deveria causar arrepios em qualquer nacionalista legítimo.

Ele é um punitivista reacionário, proclamarão outros. De novo, a observação faz sentido. Bolsonaro acaba de vetar a única parte decente da nova lei sobre drogas, que permitiria a redução de até dois terços da pena para pequenos traficantes. Mas, quando tratou de trânsito, o presidente revelou-se um verdadeiro anarcolibertário, disposto a apagar qualquer traço de autoritarismo da lei.

Bolsonaro não está só. Gostamos de nos imaginar como seres coerentes que agem segundo princípios, mas não é o que se vê na prática. Até os blocos ideológicos, que deveriam guiar-se por ideias unificadoras, parecem ser incapazes de fazê-lo.

São bandeiras caras à esquerda, por exemplo, a liberação do aborto e das drogas e a condenação à pena de morte e ao porte de armas. Já a direita sustenta exatamente o contrário. Conciliar ambos os conjuntos de posições com uma narrativa linear exige ginástica mental. Se é o princípio da sacralidade da vida que prepondera, deveríamos ser contra os quatro pontos. Já a defesa intransigente da autonomia individual recomendaria a aprovação de todos.

O que torna Bolsonaro um caso único é que ele não parece obedecer nem a princípios, nem a alinhamentos históricos e nem ao oportunismo. Suas posições podem ser descritas como a resultante do caos.

O insustentável peso real - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 08/06


A moeda única não está sendo negociada e, do ponto de vista monetário, hoje tudo nos distancia da Argentina

A possibilidade de uma união monetária entre Brasil e Argentina é nenhuma. Os dois países são seres inteiramente diferentes nesta área. O presidente Bolsonaro falou que isso está em estudo, achando que assim ajuda o presidente Mauricio Macri na sua campanha eleitoral. O Brasil tem US$ 380 bilhões de reservas e contas externas equilibradas, a Argentina depende de empréstimos do FMI para cumprir seus compromissos cambiais. Eles têm 55% de inflação e nós estamos voltando aos 4%.

O mesmo ministro Paulo Guedes que, durante a transição, disse que o Mercosul não era nossa prioridade, agora ecoou o presidente e disse que tem realmente a ideia de união monetária, apesar de o Banco Central brasileiro não a estar estudando. Ter ideia para um futuro remoto é diferente de afirmar que isso está acontecendo após um encontro presidencial. Dá uma impressão de concretude ao projeto que ainda não existe.

A ex-presidente argentina Cristina Kirchner cometeu todos os desatinos econômicos possíveis. A inflação voltou e como resposta ela interferiu no instituto de estatísticas argentino. Mentes autoritárias brigam com termômetros. Depauperou os cofres públicos e quis usar as reservas. Quando o presidente do Banco Central discordou, ela derrubou o presidente quebrando a lei de autonomia do BC. Mentes autoritárias não gostam da autonomia dos órgãos do Estado.

Mauricio Macri assumiu prometendo organizar a economia do país, tirar o Estado de onde ele não deveria estar, trazer de volta a verdade das estatísticas econômicas que haviam sido fraudadas. O problema é que ele fez os primeiros movimentos e depois parou. Apesar de se dizer liberal, recentemente decretou o congelamento de preços numa medida populista com olho nas urnas deste ano.

As pesquisas, contudo, favorecem Kirchner. A ex-presidente finge ser candidata só a vice na chapa de Alberto Fernández. Nos anos 1970, Hector Cámpora se elegeu presidente para que Juan Perón pudesse voltar à presidência. A Argentina adora repetir erros e enredos.

O que fez Bolsonaro anunciar a união monetária, uma ideia ainda não concebida, e nem remotamente possível no momento, foi seu sonho de costurar uma aliança conservadora na América Latina. Alianças por razões ideológicas dão tão errado na direita quanto na esquerda. Os países se unem por razões menos efêmeras e menos conjunturais.

O liberalismo de Macri não resistiu às agruras do poder, o liberalismo do Bolsonaro não existe. Ele nunca professou a mesma fé que o seu ministro da Economia e vai empurrado para a reforma da Previdência. O presidente brasileiro ao falar da reforma só repete frases feitas. Se fosse obrigado a explicá-la estaria em dificuldades.

Por outros caminhos, o Brasil deu um passo importante nesta última semana para uma economia com menor presença do Estado. Não foi do Executivo, mas sim do Judiciário. O STF, ao dar o veredito na quinta-feira depois de três longas sessões destinadas a discutir a liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowsky contra a privatização, favoreceu a interpretação mais liberal da Constituição. Para a maioria dos ministros, a exploração de atividades econômicas pelo Estado deve ser a exceção e não a regra. A venda de estatais matrizes exige um pedido ao Congresso, mas o mesmo não é necessário na alienação de suas subsidiárias. A venda pode ser de diversas formas, desde que haja ampla publicidade e competição entre os possíveis compradores. O debate foi acirrado. O que estava em jogo era que tipo de economia a lei maior favorece. As teses do estatismo ficaram vencidas, tanto nos votos, quanto na formulação do resultado.

Ter um caminho de maior integração regional é bom e vem sendo perseguido há muito tempo. Diminuir a presença do Estado na economia é tarefa à qual o Brasil se dedicou de 1990 a 2002, mas de forma lenta. Os governos Collor de Mello, Itamar Franco e Fernando Henrique privatizaram e abriram um pouco a economia. As administrações petistas criaram tantas estatais quanto a ditadura militar. Os polos se assemelham. O melhor a fazer na atual administração é trocar a pregação liberal pela prática. E quanto ao proselitismo de fronteira é bom que fique bem longe da moeda que foi conquistada há 25 anos por um governo social-democrata.

A moeda "peladona" - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 08/06


Integração monetária de Argentina e Brasil exigiria uma série de decisões, como unificar políticas fiscal e cambial



A idéia de criar uma moeda única de Brasil e Argentina parece mais esdrúxula ainda quando o presidente Bolsonaro a classifica como “uma trava a aventuras socialistas na região”.

O ministro da Economia Paulo Guedes, que hoje parece gostar da idéia, antes mesmo de assumir o cargo provocara um mal-estar com a Argentina quando afirmou que o Mercosul não era prioridade para o novo governo brasileiro porque é "muito restritivo, o Brasil ficou prisioneiro de alianças ideológicas, e isso é ruim para a economia".

Ele se referia a um bloco que só negociava com quem tinha "inclinações bolivarianas". Como a proposta de uma moeda única fora feita em 2011 no governo de Dilma Rousseff, quando Cristina Kirchner era presidente da Argentina, mais uma vez o governo Bolsonaro faz o que critica em seus antecessores.

Se o PT queria criar uma moeda única na região para fortalecer as “repúblicas bolivarianas”, agora Bolsonaro a quer para evitar a volta ao poder dos “bolivarianos” que foram varridos dos governos da região pelo voto popular.

A moeda única dos dois países poderia evoluir para uma moeda do Mercosul, comentou o presidente Bolsonaro. O Mercosul, aliás, também já esteve na mira do governo Temer, quando o tucano José Serra assumiu o Ministério das Relações Exteriores.

Na posse, disse que “a diplomacia voltará a refletir os valores da sociedade brasileira, e estará a serviço do Brasil e não das conveniências e preferências ideológicas de um partido político e seus aliados no exterior”.

Serra já havia anunciado, quando candidato à presidência da República, querer transformar a união aduaneira numa área de livre comércio, permitindo a seus membros fazer acordos comerciais de forma isolada, sem a concordância e adesão dos demais sócios.

Essa também é uma idéia que agrada Bolsonaro e Macri, para aproximação com a Aliança do Pacífico. O acordo com a União Européia ainda não saiu pela necessidade de adesão de todos os membros do Mercosul, o que atrasa a inserção comercial do Brasil no mundo.

Criado em 1991 pelo Tratado de Assunção, o Mercosul é hoje o terceiro maior bloco do mundo, depois do Nafta (México, Canadá e Estados Unidos) e da União Européia, com um PIB de US$ 2,8 trilhões (R$ 10,4 trilhões) em 2018. Se fosse um país, o Mercosul seria a quinta maior economia do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China, Japão e Alemanha.

Na ocasião de sua criação, o Mercosul provocou várias gozações, hoje conhecidos como memes no mundo digital. A brincadeira sobre o possível nome da nova moeda, que seria Peso Real, mas deveria ser, segundo os internautas, “peladona”, uma junção de Pelé e Maradona, faz lembrar o que dizia à época.

Eu mesmo escrevi um artigo intitulado Mercosul F.C. onde ironizava as vantagens que tal união poderia nos trazer: fazer uma seleção de futebol com Zico e Maradona. Hoje, assim como o Mercosul poderia ser a quinta economia do mundo, mas não é, também poderia organizar uma seleção de futebol capaz de enfrentar os europeus, que venceram as últimas quatro Copas do Mundo. Repetir na seleção do Mercosul o antigo trio atacante MSN do Barcelona, o argentino Messi, o uruguaio Suarez e o brasileiro Neymar seria uma grande vantagem competitiva.

O fato é que o Mercosul, como uma área de livre-comércio, eliminou barreiras alfandegárias e aumentou o fluxo comercial entre seus membros, mas essa proteção, que acabou sendo o principal objetivo do grupo, fez com que a indústria desses países perdesse a competitividade.

A integração monetária entre Brasil e Argentina, e depois com os demais países do Mercosul, exigiria uma série de decisões, como unificação de políticas fiscal e cambial. O euro, moeda da União Européia, nasceu em 2002, 14 anos depois de o Conselho Europeu ter confirmado a união monetária em 1988, e décadas depois do início das negociações.

A nova moeda exigiria instituições para cuidar do setor financeiro e da política fiscal dos países, inicialmente Brasil e Argentina, depois os demais do Mercosul, o que vai de encontro às idéias do governo Bolsonaro, contrárias aos organismos internacionais, que impediriam às nações desenvolverem suas próprias institucionalidades. Por essa razão, o governo brasileiro acabou com o passaporte e a placa de automóveis do Mercosul.

Chernobyl: quanto custa a mentira? - RODRIGO CONSTANTINO

GAZETA DO POVO - PR - 08/06

Terminei nesta quinta a minissérie “Chernobyl”, da HBO, que conta a história da tragédia causada pela explosão da usina nuclear na União Soviética em 1986. Em apenas cinco episódios, cada um com cerca de uma hora de duração, a série retrata com realismo os acontecimentos terríveis que espalharam radiação, matando milhares de pessoas, e mostra como a burocracia engessada pelo comunismo esteve no epicentro dos problemas.

O que rege os funcionários sob o comunismo é o medo, sempre o medo. E como a ambição humana não desaparece por conta do regime político, ela é apenas canalizada de uma forma diferente. No comunismo, todos precisam puxar o saco dos superiores para subir na hierarquia, que independente do mérito individual.

No capitalismo, um empreendedor preconceituoso pode se ver na “obrigação” de premiar um funcionário de quem não gosta se ele for produtivo. Se ele não o fizer, o concorrente pode contrata-lo e tomar seu negócio, sendo mais eficiente. No comunismo não funciona assim. A eficiência não faz parte da equação. É um processo de bajulação entre “camaradas” para ver quem detém o poder, sem qualquer preocupação com o mercado, os clientes, os outros.

Tudo é pelas aparências, especialmente em tempos de Guerra Fria. Regimes comunistas precisam aparentar força externa, capacidade militar e tecnológica. Por isso o simbolismo tão grande do Sputnik, e por isso o próprio Gorbachev considerou o acidente em Chernobyl uma das principais causas do fim do império soviético: expôs com humilhação a fragilidade do sistema, calcado em segredos de estado que, na prática, serviam para esconder a incompetência e a falta de recursos.

Era muito caro construir mecanismos de maior proteção na usina, como tinham no Ocidente capitalista. Era vergonhoso admitir que houve falhas detectadas nos reatores, e por isso era melhor ocultar esses “detalhes”, mesmo que culminassem na explosão de 1986. Os funcionários mais preparados, que sabiam dos riscos do teste, não tinham como bater de frente com os superiores, num sistema hierárquico e sem respaldo na meritocracia.

Todo fracasso complexo como esse tem camadas de erros, normalmente. Falhas humanas que vão se somando, problemas técnicos, até que o impensável ocorre. Claro que acidente nuclear – ou qualquer outro tipo – não é exclusividade do modelo comunista. Mas o que a minissérie mostra com perfeição é como tudo parece conspirar contra nesse regime, dando uma magnitude sombria ao que poderia ser contido. O regime comunista é todo montado em cima de mentiras, e eis a mensagem essencial da minissérie.

Foi Malcolm Gladwell, se não me engano, que mostrou num de seus livros como acidentes de avião ocorrem com mais frequência em países com cultura hierárquica demais. O motivo é simples: um copiloto com coragem de desafiar o mau julgamento do piloto oferece mais chances de evitar o pior, enquanto numa cultura calcada no medo excessivo, disfarçado de respeito pelos superiores, o silêncio será muitas vezes preferível, ainda que com o custo de um acidente fatal.

Indivíduos, porém, fazem a diferença, agindo com coragem heróica para desafiar um sistema de terror imposto pelo estado. É o que mostra também a minissérie. Cientistas, que costumam ser movidos pela curiosidade, pela busca imparcial da verdade, não aceitam facilmente se curvar diante da ideologia – ou não deveriam. Alguns vão para o sacrifício pessoal em prol da verdade, e isso é heroísmo.

Não obstante, e evitando contaminações ainda piores, a explosão em Chernobyl matou ao menos quatro mil pessoas, podendo chegar a quase cem mil considerando efeitos indiretos, como o elevado aumento na taxa de câncer na população. O regime soviético considerava apenas 31 mortes oficiais. Democracias possuem mecanismos de pesos e contrapesos, partidos de oposição, imprensa livre, e raramente conseguem esconder a verdade de tanta gente por tanto tempo.

Há uma cena logo no primeiro episódio que relata com perfeição a típica mentalidade comunista. As autoridades estão reunidas para debater o que fazer, cada um transferindo responsabilidades, todos preocupados apenas em se safar, quando o velhinho quieto no canto bate com sua bengala no chão, exigindo a palavra. Todos se calam para escuta-lo, pois é o superior do partido ali. Ele, então, faz um discurso ditatorial e desumano, sobre proteger os “interesses do estado”, ainda que impondo ao povo a escravidão. E é, claro, aplaudido por todos, de pé. Isso é o comunismo na prática.

A minissérie é entretenimento da melhor qualidade, e ainda dá uma aula de ciência aos leigos. Não é leve, até porque seria impossível retratar tanto drama de forma suave. Achei que se perdeu apenas no quarto episódio, mais arrastado e também muito “trash”, em que um jovem é escalado para eliminar os bichos de estimação da cidade, incluindo filhotes. Fora isso, e o fato de que a língua original escolhida foi o inglês em vez do russo, nota dez! Não percam.

A batalha pelo imposto sindical continua - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

Gazeta do Povo - PR - 08/06

Com a reforma trabalhista de 2017, o sindicalismo se viu desafiado pelo fim da cobrança obrigatória que até então era imposta a todos os trabalhadores de uma determinada categoria com a finalidade de sustentar o respectivo sindicato – independentemente de o funcionário ser ou não filiado à entidade. O chamado “imposto sindical” chegou a movimentar R$ 3,5 bilhões anuais, destinados a sindicatos e centrais sindicais que às vezes estavam mais preocupados em fazer política partidária que em lutar pelos direitos dos trabalhadores que diziam representar. Com a reforma, o desconto passou a depender de autorização expressa e individual do funcionário.

Essas entidades poderiam ter seguido o exemplo de sindicatos com grande filiação e tradição de combatividade em favor de sua categoria, reinventando-se para conquistar novos membros que estivessem voluntariamente dispostos a sustentá-las. Mas, em vez disso, preferiram recorrer a truques legais para burlar a intenção da lei e garantir a continuação da cobrança indiscriminada. Sindicatos passaram a realizar “assembleias extraordinárias”, com presença nem sempre numerosa, em que aprovavam o desconto na folha de todos os trabalhadores da categoria.

É inexplicável a atitude de sindicatos, procuradores e juízes que insistem em passar por cima da lei e das decisões do STF para prejudicar o trabalhador

Para conseguir manter a cobrança, as entidades alegavam a “prevalência do negociado sobre o legislado”, princípio saudável das relações trabalhistas – mas distorcido neste caso, pois seria preciso deturpar o texto de partes da CLT que tratam do desconto, como os artigos 579 e 545, que condiciona o desconto do imposto sindical à “autorização prévia e expressa” dos trabalhadores. Para os sindicatos, a redação dos textos, que usa o plural ao se referir a “empregados”, daria margem a uma autorização coletiva, e não individual. Claro que, para tal, seria preciso atropelar o artigo 611-B da CLT, segundo o qual ninguém pode sofrer desconto de valor algum “sem sua expressa e prévia anuência”, um direito que não pode ser anulado por convenções coletivas.

Infelizmente, a rebelião ideológica contra a reforma trabalhista dentro do Ministério Público do Trabalho e da Justiça do Trabalho permitiu que a tese da cobrança coletiva, ainda que completamente desprovida de amparo legal e já descartada pelo Supremo Tribunal Federal em 2018, pudesse prevalecer nos casos em que os sindicatos buscaram o Judiciário. Até mesmo a segunda instância, os Tribunais Regionais do Trabalho, tem tomado decisões neste sentido. Mas as empresas obrigadas a fazer o desconto em folha começaram a reagir, e um dos casos chegou ao STF.

No fim de maio, a ministra Cármen Lúcia concedeu liminar a pedido de uma metalúrgica do Rio Grande do Sul, derrubando uma decisão do TRT da 4.ª Região que tinha beneficiado um sindicato do setor. Ela lembrou o julgamento realizado no próprio Supremo a respeito da constitucionalidade de trechos da reforma trabalhista, ocasião em que o entendimento da corte foi pela necessidade de autorização individual para a cobrança do imposto sindical. Assim, o Supremo consolida a jurisprudência a respeito do tema, tornando ainda mais inexplicável a atitude de sindicatos, procuradores e juízes que insistem em passar por cima da lei e das decisões do STF para prejudicar o trabalhador.

A disputa jurídica em torno da cobrança do imposto sindical levou o governo Jair Bolsonaro a publicar, no início de março deste ano, a Medida Provisória 873/19, que buscou eliminar qualquer possível ambiguidade na CLT e deixar ainda mais claro que é o trabalhador, de forma individual e voluntária, que tem de autorizar o desconto. No entanto, a MP ainda introduziu exigências totalmente desnecessárias e desproporcionais, como a necessidade de cobrança por boleto, em vez do desconto direto em folha – uma formalidade totalmente dispensável, se levarmos em conta que o empregador já manifestou sua intenção de realizar o pagamento.

A MP ainda aguarda a escolha de um relator na comissão mista de deputados e senadores, e corre o risco de caducar no fim de junho. Por mais que o artigo 611-B da CLT e o Supremo já sejam claros, o texto publicado por Bolsonaro serviria para acabar de vez com as dúvidas sobre a autorização individual para a cobrança; por isso, o ideal seria que os congressistas aprovassem a MP, eliminando dele os trechos excessivos, como o referente ao boleto bancário. Quanto aos sindicatos, que saibam cumprir a lei, esforçando-se para conquistar mais filiados, e não para buscar vitórias duvidosas nos tribunais.


Congresso ressurge - JOÃO DOMINGOS

O Estado de S.Paulo - 08/06

Atualmente, agenda positiva está nas mãos de deputados e senadores


Observa-se hoje na relação entre os poderes Executivo e Legislativo uma inversão do que ocorreu no Brasil desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, quando o Palácio do Planalto impôs sua supremacia sobre o Congresso, tornando-o quase que só um carimbador das iniciativas do governo. Iniciativas estas tomadas a partir da edição de medidas provisórias, projetos de lei e até de emendas constitucionais, como as que levaram a reformas que mudaram a ordem econômica, permitindo a privatização do sistema Telebrás e o fim do monopólio de pesquisa, lavra e refino de petróleo pela Petrobrás. Sem falar na que permitiu a reeleição de presidente da República, governadores e prefeitos.

No governo de Lula não foi diferente. Ele fez o que quis no Congresso. Nem a CPI dos Correios, que em 2005 desvendou o esquema de compra de partidos (escândalo do mensalão) pelo governo petista, o perturbou. Ante a pressão política, Lula ampliou sua base de apoio com partidos de centro-direita, distribuindo ministérios, e se manteve soberano. Já o governo de Dilma Rousseff começou com uma base de sustentação com mais partidos do que a de Lula, pois incorporou o PRB ao Ministério, mas os erros da então presidente foram tantos que ela perdeu tudo, até o mandato, tirado dela por um processo de impeachment aprovado por velhos aliados. Com Michel Temer, o vice que substituiu Dilma, não foi diferente. Aprovou reformas como a trabalhista, e só não avançou na da Previdência porque teve de usar seu capital político para se livrar de suas ações penais pedidas pela Procuradoria-Geral da República.

O presidente Jair Bolsonaro optou por não montar uma base de sustentação no Congresso, sob o argumento de que não negociaria seu governo com os partidos políticos. Cumpriu a palavra. Bolsonaro costuma dizer que as negociações políticas levam à corrupção. Não se pode dizer que essa é uma regra geral. É possível fazer boa política e bons acordos, tudo no chamado espírito republicano. Mas esse é um argumento que não convence o presidente. Quem tem a caneta é ele. Então, que seja assim.

O fato é que, se Bolsonaro não tem articuladores políticos, deputados e senadores estão fazendo política como há tempos não faziam. Nesse espírito, são eles que impõem a agenda de trabalho, uma agenda que busca ser positiva para o País, como as reformas da Previdência e tributária, a primeira já em fase adiantada, mas do jeito que o Congresso quer, e não do jeito que o governo queria, a segunda sem esperar por Bolsonaro.

Hoje os congressistas fazem política de tal modo e com tal rapidez que nós antigos e difíceis de desatar têm sido desatados em tempo muito rápido. Como ocorreu na quarta-feira, quando a Câmara aprovou por votação unânime ou esmagadoramente a favor, duas emendas constitucionais que aumentam muito a força do Legislativo e tiram poder do Executivo.

Uma das emendas, conhecida por emenda do Orçamento impositivo, torna obrigatória a liberação do dinheiro de emendas ao Orçamento apresentadas por bancadas dos Estados e do Distrito Federal. Na prática, tira do Executivo um forte instrumento de barganha, no velho estilo “libero o dinheiro e você vota a meu favor”. A outra muda a forma de tramitação das medidas provisórias, o que também retira poder do presidente da República. O tempo para uma MP caducar agora será mais breve.

Há de se destacar que as duas emendas constitucionais foram aprovadas em poucas horas, com acordo para se pular o interstício que se dá entre a votação do primeiro para o segundo turno. Aprovar duas emendas constitucionais num mesmo dia, e em dois turnos, é algo nunca visto no Congresso.

STF abre fissura no estatismo brasileiro - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 08/06

Julgamento sobre regras para privatizações pode permitir ao país se afastar do capitalismo de Estado


A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de, por maioria de votos, oito a três, permitir a privatização de subsidiárias de estatais sem precisar de aval do Congresso, tem importante aplicação imediata, porque a Petrobras segue um plano estratégico de venda de empresas e ativos avaliados em US$ 32 bilhões. Além de existir um programa de venda de estatais, no governo Bolsonaro, como forma de também ajudar a economia a sair da crise fiscal.

No caso da Petrobras, os recursos estão sendo aplicados no abatimento da elevada dívida da estatal, contraída no período de desvarios lulopetistas em investimentos bilionários mal feitos, usados para o desvio de dinheiro público, com a ajuda de empreiteiras. Destinado para campanhas políticas, projetos de poder e bolsos privados. Os autos da Lava-Jato contam a história.

A empresa foi usada, ainda, como instrumento de política anti-inflacionária, por meio do congelamento de preços de combustíveis, bancado pela companhia, causa de um enorme rombo no seu caixa. Ninguém reclamou à Justiça. Mas quando foi lançado o programa de venda de refinarias, de parte da BR — operações também para afinal injetar concorrência no mercado de distribuição — e de subsidiárias na área de gás, interesses corporativistas terminaram sendo contrariados, e sindicatos correram ao STF.

Escolhido relator do caso, o ministro Ricardo Lewandowski concedeu liminar para exigir que qualquer privatização precise de permissão do Legislativo. Ora, seria o mesmo que proibir as desestatizações, não só porque corporações sindicais têm razoável influência no Congresso, como também há políticos que usam empresas públicas para exercitar o clientelismo e até mesmo fazer negócios. Depois, reclamação semelhante foi entregue para o ministro Edson Fachin relatar, especificamente contra a venda já acertada de uma subsidiária da área de gás (TAG).

O julgamento pelo plenário da Corte, encerrado quinta-feira, corrigiu o rumo das liminares: subsidiárias não precisam de lei específica para ser negociadas, nem de licitações, apenas as “empresas-matrizes”. Nesses dois casos, seria a Petrobras.

Numa perspectiva mais ampla, o STF ajuda a fechar um longo ciclo histórico em que o Brasil sempre esteve mais próximo do capitalismo de Estado do que de um regime econômico liberal. Como se tenta agora. E foi esta visão estatista — um “fetiche”, segundo o ministro Luís Roberto Barroso —que plasmou a própria Constituição de 1988, embora ela conceda a primazia no sistema produtivo ao setor privado.

Esta ideologia da predominância do Estado sobre a sociedade tem raízes tão profundas que une a esquerda e a direita. A política econômica do general Geisel sempre contou com simpatias no PT, tanto que Lula e Dilma aplicaram a receita geiselista de substituição de importações na Petrobras. Outra causa da desestabilização da empresa. O STF agora estabelece um marco para o país se afastar deste passado.

Estímulo de curto prazo é como dar cachaça para alcoólatra parar de tremer - MARCOS MENDES

FOLHA DE SP - 08/06

Com essa opção, em 5 anos estaremos preocupados com 20 milhões de desempregados


Com a frustração do crescimento previsto para 2019, ouve-se cada vez mais que “o governo precisa fazer alguma coisa”. Infelizmente, estamos presos no baixo crescimento justamente porque “o governo fez algumas coisas”.

Aliás, muitas coisas. Erradas. As consequências da década da insensatez (2005-15) estão sendo sentidas agora e vão travar o crescimento por muitos anos à frente.

Na lógica política, passados quatro anos do fim dos desatinos, não cabe mais culpar os antecessores. Mas a realidade econômica não é essa: os erros do passado criam problemas que perduram por muito tempo.

A dívida pública foi aumentada em R$ 416 bilhões para transferir dinheiro ao BNDES e financiar empréstimos subsidiados que promoveram má alocação de capital: investimento que não gera produto, como Sete Brasil (R$ 10 bilhões), refinarias premium inviáveis(R$ 10 bilhões) ou empréstimos de Cuba e Venezuela em default (R$ 4 bilhões).

Foram sete anos dando crédito com juros negativos para a compra de caminhões. A frota cresceu 35% entre 2009 e 2016, enquanto o PIB só cresceu 10%. Temos excesso de oferta de frete, que derruba o preço e torna o país refém, por vários anos à frente, da ameaça de greve dos caminhoneiros e da tabela do frete.

A Petrobras foi presa de populismo tarifário e investimentos inviáveis. A relação entre endividamento líquido e geração operacional de caixa saltou de 1, em 2010, para 5, em 2015. Desde então, uma dura política de ajuste levou o indicador para 2,3 em 2018. Se estivesse com saúde, poderia estar investindo. Mas está lutando para digerir os abusos do passado.

Os subsídios do Tesouro pularam de 3% do PIB em 2003 para 6,7% em 2015. Com muito esforço para aprovar projetos no Congresso, foi possível reduzi-los para 5,4% do PIB. Quantos anos mais para zerar essa conta?

Os fundos de pensão das estatais financiaram projetos inviáveis de amigos do governo, que deixaram prejuízo de R$ 113 bilhões entre 2013 e 2018.

No caso do fundo da Caixa, por exemplo, para cobrir a perda, os 57 mil participantes terão que pagar contribuições extras, que chegam a 20% do rendimento bruto, ao longo de quase 18 anos! Serão muitos anos de renda e consumo perdidos.

Um contrato malfeito de “cessão onerosa” gerou contencioso entre Tesouro e Petrobras que bloqueia a licitação de 6 bilhões de barris de petróleo. Investimento e renda que poderiam estar jorrando nos últimos cinco anos. O mesmo vale para a interrupção, de 2008 a 2013, de todas as rodadas de licitação de petróleo.

Os estados se endividaram em excesso com a aquiescência da União. De uma média anual de empréstimos contratados de R$ 6 bilhões por ano, em 2007-8, pulou-se para R$ 36 bilhões no período 2009-12. Boa parte mediante autorizações especiais de endividamento, dadas pelo ministro da Fazenda, para estados que não tinham nota de crédito suficiente para tomar novos empréstimos. A incerteza sobre a solvência do setor público paralisa investimentos privados.

Uma única MP desestruturou todo o setor elétrico. Concessões de aeroportos e estradas mal desenhadas acabaram em concessionárias quebradas e investimentos travados.

Capital desperdiçado em investimentos ruins, dívida pública em rota explosiva. É preciso cumprir a difícil agenda da reabilitação. Resolver os problemas deixados e avançar nas reformas.

Buscar estímulos de curto prazo, hoje, é como dar cachaça para o alcoólatra parar de tremer. Se escolhermos essa opção, daqui a cinco anos estaremos preocupados com 20 milhões de desempregados.

Marcos Mendes
Doutor em economia, é consultor do Senado. Foi assessor especial do ministro da Fazenda (2016-2018)

Oposição responsável - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 08/06


Mesmo que tenha sido apenas lampejo, a negociação entre governo e oposição para a aprovação da MP 871 mostrou qual é o único caminho viável para o País.


Se o governo parece, finalmente, dar sinais de ter alguma disposição para o diálogo político, tendo negociado a aprovação da Medida Provisória 871, que manda auditar os benefícios pagos pelo INSS, também é digna de nota a abertura da oposição para aceitar um acordo com os governistas. Em se tratando de um governo errático e muitas vezes hostil aos políticos, e de um Congresso repleto de neófitos despreparados para o duro trabalho parlamentar, não se deve comemorar antes da hora; no entanto, sobretudo diante do histórico de trombadas entre o Executivo e o Legislativo, é essencial registrar que houve, nos últimos dias, um inegável avanço.

A oposição deu inestimável colaboração para a melhora do quadro político ao apoiar a medida governista em troca da inclusão de uma mudança no projeto de reforma da Previdência com vista a dar maior prazo para que os trabalhadores rurais se adaptem às novas regras. Ambas as partes consideraram os respectivos pleitos aceitáveis e estabeleceu-se ali um consenso mínimo – sem o toma lá da cá e sem a truculência que tanto marcaram a história recente das relações entre o governo e o Congresso.

O acordo, feito no Senado, foi articulado pelo líder da Minoria, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), com o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Não se pode atribuir ao senador Randolfe nenhum pendor governista – ao contrário, é ferrenho crítico do atual governo. Mas ele e o bloco que lidera parecem ter percebido que o caminho do diálogo pode dar melhores frutos que o confronto puro e simples.

Há outros parlamentares da oposição igualmente dispostos a negociar com o governo. É o caso dos deputados que subscreveram emenda para destinar à primeira infância parte da economia que resultar da reforma da Previdência. Entre os autores destacam-se os jovens deputados Felipe Rigoni (PSB-ES) e Tabata Amaral (PDT-SP). Mesmo sendo da oposição, ambos dizem reconhecer como necessária a reforma da Previdência e, malgrado serem parlamentares de primeira viagem, mostram maturidade para reconhecer que o caminho da negociação tende a ser o mais produtivo para seus projetos políticos.

Tudo isso contrasta, e muito, com o comportamento do PT e de seus satélites. Fiel à sua natureza autoritária, o partido do presidiário Lula da Silva desconsidera a legitimidade de qualquer governo que não seja o seu. Nem se dá ao trabalho de formular propostas alternativas às encaminhadas pelo presidente Jair Bolsonaro, já que não pretende, a sério, negociar nada com o governo. Sua única intenção é prejudicar a tramitação de tudo o que emanar do Palácio do Planalto. E seu único projeto para o País se resume ao slogan “Lula livre”, com o qual inclusive tentou capturar as manifestações estudantis contra os cortes orçamentários nas universidades federais. Assim, segue sendo o velho PT de sempre, que não apoiou o Plano Real, que pediu o impeachment de todos os presidentes sempre que esteve na oposição e que jamais se dispôs a negociar senão na base do grito ou do talão de cheques.

Felizmente, parece que os partidos que se dedicarem a esse tipo de oposição destrutiva tendem ao isolamento, pois várias lideranças oposicionistas se recusam a aderir ao método petista de sabotar governos e demonstram genuína disposição para conversar.

É fato que o governo, nas suas relações com o Congresso, demonstra frequentemente a tendência de considerar que a vontade do presidente Bolsonaro deve ser automaticamente convertida em lei, e isso cria ruídos mesmo com os parlamentares de inclinação governista. Por outro lado, há também uma tendência de parte da oposição de considerar necessariamente ruim tudo o que é encaminhado pelo Palácio do Planalto, sem nem ao menos conhecer os projetos. Um clima desses não é propício para o diálogo. Por isso, mesmo que tenha sido apenas um lampejo, a recente negociação entre governo e oposição é alvissareira, pois mostrou qual é o único caminho viável para o País. Espera-se que as lideranças políticas responsáveis tenham entendido que não há outra maneira de alcançar o entendimento necessário para começar a tirar o Brasil de sua profunda crise, com a qual só os delinquentes morais lucram.