terça-feira, setembro 12, 2017

Caso Jucá-Renan-Sarney prova que Janot é um fanfarrão: ele inventou a “denúncia preventiva” - REINALDO AZEVEDO

REDE TV UOL

Depois de pedir prisão preventiva dos três, procurador-geral admite que nada há contra eles. Para escárnio do bom senso, diz que só não cometeram crimes porque foram denunciados antes. Ele enlouqueceu no poder!


Apertem os cintos, o procurador-geral enlouqueceu e já não diz coisa com coisa
Ah, deixem-me ver qual escândalo, entre os fabricados pela Força Tarefa, consegue mobilizar mais os nossos ódios, ainda que depois não venham as provas. Ah, que tal a conclusão do inquérito do quadrilhão do PMDB? Olhem, querem implicar o presidente Michel Temer naquele rolo. Quem está surpreso? Ou, então, vamos nos indignar com a denúncia de Rodrigo Janot — contra Temer, é claro! —, feita com base nas acusações de Lúcio Funaro… O bandido diz que nunca falou com o presidente, mas que Eduardo Cunha fazia acusações contra o chefe do Executivo… E assim seguimos.

Janot, ainda procurador-geral da República, é um fanfarrão como nunca houve na história da República. Lembram-se de quando ele pediu nada menos do que a prisão dos senadores Romero Jucá (PMDb-RR) e Renan Calheiros (PMDB-AL) e do ex-presidente José Sarney? Qual a acusação? Bem, gravados por Sérgio Machado, o primeiro “Joesley Batista” da carreira de Marcelo Miller, o trio era acusado de ter tentado obstruir a Lava Jato.

E o que havia de concreto contra eles? Resposta: nada! Janot apenas interpretava conversas. Numa delas, Machado diz que é preciso fazer alguma coisa sobre a crise política. E Jucá dá uma resposta genérica: “É preciso estancar essa sangria”.

Muito bem! Isso custou o cargo a Jucá, então ministro do Planejamento. Bem, afirmei aqui à época que não havia como ele ficar — a questão era política —, mas que a fala, em si, não trazia crime nenhum.

Pois bem: a Polícia Federal investigou. Não encontrou sinal de que os três tenham tentando obstruir investigação nenhuma. E o próprio Janot pediu ao ministro Edson Fachin que o caso seja simplesmente arquivado.

A explicação do procurador-geral ao pedir o arquivamento é realmente insólita. Prestem atenção:
“A vinda à tona da gravação e dos depoimentos de Sérgio Machado revelou publicamente toda a estratégia então planejada. Em decorrência dele, sabe-se que os eventuais projetos de lei apresentados por vezes sob a roupagem de aperfeiçoamento da legislação terão verdadeiramente por fim interromper as investigações de atos praticados por organização criminosa. Certamente, se năo fosse a revelação, os investigados tentariam levar adiante seu plano”.

É um absurdo completo!

Janot, que já usa a prisão preventiva como lhe dá na telha, agora inventou a denúncia preventiva. Consiste no seguinte: acuse alguém de um crime que a pessoa ainda não cometeu porque, assim, assustada pela acusação, ela deixará de cometê-lo, entendem?

Isso dá conta da loucura que tomou conta da Procuradoria-Geral da República nestes dias. Quando, à época, afirmei que se tratava de uma acusação sem fundamento, tomei pancada de todo lado. E, no entanto, a coisa está aí.

E o que é mais fabuloso nisso tudo? Essa acusação compunha, vamos dizer assim, a menina dos olhos da “delação premiada” de Sérgio Machado. Como se nota, a dita-cuja não se comprovou. Ao contrário: feita a investigação, aquilo que o mais premiado dos delatores, depois de Joesley, denunciou simplesmente não havia acontecido nem aconteceu depois.

Mais: se fizesse sentido o que diz Janot, então ele teria celebrado com Sérgio Machado um acordo de delação premiada sobre crimes que poderiam vir a acontecer. Estamos diante de um caso flagrante de falta de vergonha na cara mesmo.

Eis um caso em que fica patente, sim, senhores!, o abuso de autoridade. E só por isso Janot não quer mudar a lei que pune tais abusos, que é velha, de 1965.

Eis aí, meus caros! Nem o terror francês inventou a acusação falsa como remédio preventivo para o cometimento de crimes.

A coisa mais próxima de que se tem notícia são os Processos de Moscou, a série de ações judiciais movidos pelo Estado Soviético, sob o comando de Stálin, entre 1936 e 1938. Os acusados tinham duas alternativas: admitir a conspiração e morrer; não admitir e… morrer. O Brasil ainda é uma democracia, e o nosso Stálin que visita espeluncas e se esgueira atrás de caixas de cerveja vai encontrando o seu ocaso.

Janot foi o pior flagelo que sofreu o Estado de Direito no país desde a redemocratização.

Eu avisei: Janot tenta conter a própria danação - CARLOS ANDREAZZA

O GLOBO - 12/09

Janot insiste em agir como se a PGR fosse acabar ao fim de seu mandato, típico de indivíduo cuja ascensão tem como escada o rebaixamento da instituição que representa


É inacreditável que ainda seja procurador-geral da República; que não tenha renunciado depois daquela que escolheu como grife para sua gestão à frente do Ministério Público Federal, o acordo de colaboração do bando da J&F, ter ruído por obra de sua — sou generoso — incompetência. Mas o Janot que se aferra à réstia de seu mandato, que dispara denúncias ineptas para se defender e que — neste momento — bebe cerveja com o advogado de Joesley Batista é representação mais próxima do que ele verdadeiramente seja do que aquele arqueiro corajoso libertado pelo impeachment de Dilma Rousseff, em junho de 2016.

Convém lembrar, pois, a conduta do valente à época em que ainda não fora obrigado a surfar a onda da Lava-Jato imposta desde Curitiba. Em dezembro de 2014, por exemplo, a revista “IstoÉ” informava que havia sete meses Janot mantinha excêntricos encontros com prepostos das empreiteiras agentes no esquema de corrupção na Petrobras então incipientemente investigado pela operação.

Àquela altura, o procurador-geral, empossado em setembro 2013, parecia simpático à tese formulada pelo ex-ministro lulista Márcio Thomaz Bastos segundo a qual as empreiteiras deveriam se antecipar: assumir que formavam um cartel — para superfaturar contratos com a petroleira — e propor um acordo que lhes permitisse continuar disputando obras públicas e encerrasse as investigações em troca do pagamento de multa. E — digo eu — antes que a devassa chegasse ao governo petista.

Essa proposta de conchavo embutia um presente ao PT: porque, ao admitir a cartelização na pilhagem à estatal, as empresas reduziriam o papel do governo ao de vítima do petrolão, protagonizado por empresários, burocratas e políticos desgarrados. “Se arrecadar R$ 1 bilhão para fazer dez penitenciárias, estou satisfeito” — teria dito Janot a Bastos a propósito do acordo, segundo relato do advogado José Francisco Grossi e conforme publicado por este O GLOBO em março de 2016.

Seria provavelmente o fim da Lava Jato — e certamente sem que qualquer político relevante fosse pego. O arranjo, porém, não prosperou; porque logo viria a delação de Paulo Roberto Costa, que fez enfim pipocar nomes de políticos, e a pressão vinda da força-tarefa curitibana — vigorosa, mas nem sempre virtuosa — sobrepôs-se à acomodação de Brasília.

Naquele tempo, Janot, conciliador-geral, tinha margem de adaptação — inclusive para se tornar herói de feitos alheios. Hoje, sob desconfiança, não mais. É à luz dessa condição — a de um homem acuado — que suas recentes flechadas devem ser compreendidas. Ou alguém acha que viria a público tratar dos novos áudios encontrados no gravador de Joesley se tivesse opção?

Que nos lembremos: ele não queria que a geringonça fosse periciada; Fachin tampouco considerara importante. A dupla quase derrubou um presidente sem que o aparelho tivesse sido examinado. Mas a Polícia Federal o fez; e conseguiu recuperar o material apagado. O resto é Joesley, com medo, correndo para entregar as gravações que ocultara. O resto é Janot, com medo, correndo para tentar conter a própria danação.

Ah, sim: ele pediu a prisão (atenção) temporária de Joesley e de Ricardo Saud, o que, aceito por Fachin, suspendeu a imunidade prevista no acordo que firmaram com o MPF. Estão já presos. (A prisão do ex-procurador Marcelo Miller não foi decretada.) Muito bem. É notícia velha. Mas há quem ainda veja decência na ação de Janot. No entanto, pergunto: tinha alternativa? Poderia nada fazer sobre a cambada da J&F, o que significaria deixar que sua sucessora tomasse as providências — todas, desde o início — a respeito?

Que não nos esqueçamos: ele passará o comando da PGR, na próxima segunda, a Raquel Dodge — que não é sua aliada. Daí por que indago: poderia arriscar que ela desse encaminhamento mais severo à apuração sobre a bizarria em que consiste o contrato de colaboração dos Batista etc.? Poderia arriscar ver sua substituta dar à investigação sobre as origens e a cronologia do acordo — sobre as relações entre Janot e Miller, e deste com Joesley e Saud — o mesmo peso dado ao pedido de prisão dos açougueiros? A resposta é não. Ainda assim, insiste em se comportar como se a PGR fosse acabar ao fim de seu mandato — modo típico de indivíduo cuja ascensão tem como escada o rebaixamento da instituição que representa. Objetivamente, entretanto, desde que se ouviu o conteúdo da gravação em que Joesley e Saud se referem ao trato com o MPF como instrumento para a realização de negócios, tudo quanto Janot fizesse estaria sob suspeita, seria enfraquecido e só teria algum efeito se para a narrativa desesperada com a qual tenta não ser incriminado — o que resultaria em impacto deletério sobre os interesses do Brasil.

Isso serve — acima de tudo — para as denúncias que apresentou a partir de então. Ou haverá outra forma de se encarar, por exemplo, a que lançou contra os petistas — e por que só agora? — senão como um favor a Lula, Dilma etc.?

Esse é o lugar ao qual seu — sou generoso — projeto de poder levou a PGR. A novidade é que, antes do que se imaginava, ele também encontrou seu lugar, sua nota de rodapé, na história — a forma como o maior inimigo da Lava-Jato será lembrado ainda em 2017: Janot do Joesley.


O jogo virou - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 12/09

Até sábado, Joesley Batista se achava capaz de dar as cartas. Pouco antes de ser preso, o empresário havia partido para a chantagem explícita. Começa a perceber que o jogo virou


Até sábado, Joesley Batista se achava capaz de dar as cartas. Pouco antes de ser preso – depois que veio a público gravação de edificante diálogo no qual fica clara sua intenção de manipular autoridades para atingir seu grande objetivo, que era obter imunidade total para não ter de responder pelos inúmeros crimes que confessou ter cometido –, o empresário havia partido para a chantagem explícita. Mandara dizer que, ou bem o obsceno acordo que o tornou livre como um passarinho continuava de pé, ou então ele se recusaria a continuar sua colaboração com a Justiça – e isso incluía até mesmo deixar de entregar gravações inéditas que o empresário dizia ter em seu poder.

O certo a fazer seria deixar bem claro a Joesley Batista que, nesse caso, ele passaria muito tempo na cadeia – exatamente como aconteceu com o empreiteiro Marcelo Odebrecht, que também se julgava capaz de constranger a Justiça a aceitar seus termos, mas desde junho de 2015 enfrenta os rigores da carceragem da Polícia Federal em Curitiba, onde chegou a dividir a cela com um traficante de drogas.

Mas Joesley, ao contrário de Marcelo Odebrecht, tinha razoáveis motivos para acreditar que não seria abandonado, embora sua situação não fosse nada confortável. Desde o início do imbróglio que protagoniza, o empresário inspirou confiança no procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que teve incomum disposição para acreditar nas intenções do bem-sucedido açougueiro goiano e dar a ele tudo o que pediu, sem titubear.

A tabelinha entre Joesley e Janot produziu uma das maiores crises políticas da história do País e quase derrubou o presidente Michel Temer, ao impingir-lhe grossas acusações de corrupção – baseadas em flagrantes armados pelo empresário, munido de seu já célebre gravador. Com o passar do tempo, contudo, avolumaram-se suspeitas de que a delação de Joesley fora feita sob medida para que o empresário pudesse se proteger da Justiça e para que Janot conseguisse denunciar Michel Temer como o chefe da “maior e mais perigosa organização criminosa deste país”.

Deveria ser um jogo de ganha-ganha: Joesley, depois de ter comprado políticos e expandido seus negócios à custa de relações camaradas com os governos lulopetistas, poderia tocar a vida em liberdade, manter o filé de seus negócios e ainda jactar-se de ser “intransigente com a corrupção”; Janot, por sua vez, passaria à história como o herói da luta contra a corrupção e desinfetador da política nacional.

Mas então surgiu a famosa gravação em que Joesley e um executivo da JBS, Ricardo Saud, revelam de que maneira se deu a articulação entre eles e o time de Janot na Procuradoria-Geral para a realização da delação. Ficou claro, ali, que Joesley pretendia usar a delação como forma de se safar da Justiça. Para isso, bastava “falar a língua” dos procuradores, conforme ele mesmo diz na gravação. Tudo isso, aparentemente, sob as instruções de um dos principais assessores de Janot, então procurador Marcelo Miller, que mais tarde viria a integrar a banca de advogados da JBS.

A divulgação da gravação obrigou um constrangido Janot a vir a público para dizer que ali havia fatos “gravíssimos” – como se os anteriores, nessa história toda, já não fossem – e a pedir a prisão de Joesley, do executivo Ricardo Saud e do ex-procurador Marcelo Miller. Mas o procurador-geral foi compreensivo com seu colaborador premiadíssimo e pediu apenas prisão temporária, que pode se estender por dez dias, no máximo. Não teve o mesmo tratamento, por exemplo, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), igualmente grampeado por Joesley. Contra o parlamentar tucano, Janot pediu prisão preventiva – isto é, sem prazo determinado – sob o patético argumento de que o senador estava articulando a aprovação de projetos de lei para minar as investigações contra a corrupção.

É perfeitamente natural, portanto, que Joesley tenha mantido a atitude de quem acha que está no controle da situação, até a véspera de sua prisão. Afinal, o esperto empresário habituou-se à complacência geral. Começará a perceber que o jogo virou.

O orçamento das federais - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 12/09

Os governos Lula e Dilma converteram o ensino superior em bandeira eleitoral

Dirigentes de universidades federais, alguns dos quais escolhidos por governos lulopetistas, estão reclamando do corte de recursos orçamentários para investimentos e despesas de custeio determinado pelo atual governo. Entre 2014 e 2017, o orçamento para investimento e pagamento de salários e manutenção das 63 instituições de ensino superior mantidas pela União caiu de R$ 10,72 bilhões para R$ 7,34 bilhões.

Essa diminuição de R$ 3,38 bilhões comprometerá o desempenho dos cursos de graduação e pós-graduação das universidades federais, afirmam seus dirigentes, depois de lembrar que o número de seus alunos dobrou, passando de 589 mil, em 2006, para 1,1 milhão em 2015. Também alegam que a diminuição dos recursos porá em risco o andamento de pesquisas científicas, prejudicando com isso o desenvolvimento do País.

“Não teríamos o sucesso que temos na produção de alimentos, na exploração de petróleo em áreas profundas e em outras áreas sem pesquisa”, diz Emmanuel Zagury, reitor da Universidade Federal do Pará e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior.

Esses argumentos precisam ser bem ponderados. A começar pelo fato de que os números apresentados pelos reitores padecem de enviesamento político. Como 2006 e 2014 foram anos eleitorais, os governos Lula e Dilma converteram o ensino superior em bandeira para suas respectivas reeleições, o que os levou a aumentar significativamente os gastos com o ensino superior público. “Foi uma orgia orçamentária”, diz o ministro da Educação, Mendonça Filho. Já em 2017 o cenário é outro – há uma crise decorrente da recessão econômica e da subsequente queda da receita fiscal, frutos dos graves equívocos cometidos pelo lulopetismo em matéria de política econômica e finanças públicas, e o governo foi obrigado a elaborar um orçamento bem mais realista.

O quadro é agravado pelo modo irresponsável como os governos Lula e Dilma trataram o ensino superior público em suas gestões. Deixando-se levar mais pelo marketing político do que por levantamentos técnicos bem fundamentados em matéria de custos, eles criaram novas universidades federais onde não havia demanda. Sem planejamento, expandiram as universidades já existentes, matriculando alunos antes que existissem edifícios e instalações adequadas.

Sem um mínimo de racionalidade, pressionaram as universidades públicas a fazer concursos para contratar mais docentes, sem avaliar se havia, ou não, candidatos qualificados, à época. Também ampliaram o sistema de cotas, o que obrigou as universidades federais a investir em bolsas-auxílio, restaurantes universitários e alojamentos estudantis, desviando recursos da atividade-fim para a atividade-meio. E ainda cederam às pressões de docentes e servidores, concedendo-lhes generosos reajustes salariais.

Desse modo, com gastos perdulários e uma expansão maior do que as universidades federais poderiam suportar, seus custos explodiram. E, quando sobrevieram as dificuldades econômicas, seus gestores não se revelaram capazes de se adaptar às novas condições, estabelecendo prioridades e identificando fontes de receitas extraordinárias. Acostumados ao dinheiro fácil, entoam o mantra de que o realismo orçamentário do atual governo não passa de um expediente para promover “um retrocesso sem precedentes na história da educação” – o que é uma falácia.

“A crise das federais tem a ver com o comportamento da economia e com os cortes do orçamento. Mas certamente é consequência de uma falta de previsibilidade e cuidado na expansão do sistema educacional dois ou três anos atrás, quando havia uma ideia de que o dinheiro ia crescer, que a receita ia aumentar para sempre”, afirma Renato Pedrosa, coordenador do Laboratório de Estudos em Educação Superior da Unicamp. No que tem toda razão.

Lula, o Maluf da esquerda - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 12/09
SÃO PAULO - A confissão de Antonio Palocci acaba com Lula? Bem, acho que dá para dizer que ela não ajuda o ex-presidente, mas me parece precipitado afirmar que encerre a carreira política do líder petista, que já conseguiu livrar-se de situações que pareciam impossíveis.

O primeiro ponto a considerar é que a bomba lançada por Palocci ainda está no terreno das declarações. O que ele diz tem peso por vir de quem vem, mas não chega a ser um "batom na cueca" como o vídeo de Rocha Loures com a mala de dinheiro.

Mais importante, a narrativa que Lula vinha usando para explicar seu envolvimento na Lava Jato —"tudo não passa de perseguição política promovida pelas elites que não querem ver a vida dos pobres melhorar"— pode, sem grandes malabarismos, acomodar a transformação de Palocci: depois de sofrer meses de "tortura psicológica" ao ser mantido injustamente na cadeia, ele desabou e agora acusa o ex-presidente apenas para deixar o cárcere.

Isso basta para que os petistas convictos, determinados a absolver o ex-presidente de qualquer pecado, continuem a crer na inocência de seu líder. A ideologia não precisa de mais do que um fiapinho de verossimilhança para nele agarrar-se até o fim.

A questão é que nem todo o mundo é igualmente ideológico. O grau com que as pessoas se prendem ao discurso de partidos (e religiões) segue uma distribuição normal, sendo que só uma minoria se mostra invulnerável a evidências empíricas contrárias a suas inclinações.

A multiplicação dos delatores que entregam o ex-presidente e das situações que ele próprio não consegue explicar a contento, um processo que teve início em 2005, tende a tornar Lula cada vez mais dependente de uma militância ideológica —exatamente o contrário da guinada para o centro que o elegeu em 2003. Minha impressão é que ele vai se transformando numa espécie de Maluf da esquerda.

Conversa de botequim - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 12/09

Uma mera coincidência, segundo os personagens, reuniu neste sábado (9) o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e Pierpaolo Bottini, advogado do delator Joesley Batista, da JBS, numa mesa de bar em Brasília.

Flagrados pela câmera de um frequentador do local, os dois disseram nada terem conversado sobre temas profissionais —muito menos, presume-se, acerca do pedido de prisão, apresentado no dia anterior pelo primeiro, do empresário cliente do segundo.

"Apenas amenidades", segundo a nota emitida pela Procuradoria, "entre duas pessoas que se conhecem por atuarem na área jurídica".

Consumado no domingo, o encarceramento de Joesley Batista e Ricardo Saud, também executivo da JBS, teve origem em diálogo gravado entre ambos, este de teor etílico mais elevado, e nos esclarecimentos que prestaram a esse respeito na semana passada.

Em depoimento, Saud disse ter recebido orientação de um então procurador, Marcello Miller, durante as tratativas para o acordo de delação premiada da JBS. Miller, ex-auxiliar direto de Janot, deixaria depois o cargo público para ingressar em um escritório de advocacia contratado pelo grupo controlador do frigorífico.

Joesley Batista, por sua vez, afirmou que dispõe de outros áudios capazes de incriminar terceiros, incluindo conversa com o ex-ministro José Eduardo Cardozo (Justiça).

Devido aos indícios de omissão anterior de informações como essas, Janot pediu —e o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, determinou— a suspensão do bombástico acordo fechado em maio com os delatores.

A providência se mostra correta no momento; decisão definitiva sobre o futuro da delação, porém, demanda análise mais cuidadosa.

Não apenas por isso, a tarefa não deve ficar a cargo de Janot, que, em sua derradeira semana no posto, há muito não exibe o necessário distanciamento diante do caso.

Primeiro, a injustificável imunidade penal concedida a Joesley Batista, no aparente afã de produzir acusação contra o presidente Michel Temer (PMDB); agora, sua proximidade com Marcello Miller.

A futura procuradora-geral, Raquel Dodge, decerto disporá de tempo e elementos para definir se propõe o cancelamento ou a renegociação do acordo com a JBS. O maior risco é o de a Justiça invalidar, por eventual ação ilícita, provas entregues pelos delatores.

São gravíssimos os indícios coletados sobre as condutas de Temer e aliados. Investigações precisam prosseguir, mesmo que só após o término do mandato do presidente —dado que este ganhou fôlego político com o descrédito de Janot.