O Globo - 02/06
Foram seis anos perdidos, os do governo Dilma e o começo do período Temer. O PIB, ao voltar ao positivo, no dado divulgado ontem, está com o tamanho que tinha ao fim de 2010, quando Lula deixou o governo. Tecnicamente, é o fim da recessão, o número é bom, como se esperava, mas a alta de 1% no primeiro trimestre não elimina o ambiente recessivo.
Há várias contas que iluminam essa aparente contradição. Sem a agricultura, o país teria crescido apenas 0,3% no primeiro trimestre em comparação com o trimestre anterior, segundo cálculos da economista Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria. Na comparação interanual, do primeiro trimestre de 2017 com o de 2016, que é a melhor conta a fazer, o país permanece com queda do crescimento em 0,4%. Mas se os outros setores não tivessem puxado para baixo e fosse apenas a agricultura, teria acontecido uma alta de 0,8%, calcula a pesquisadora Rebeca Palis, do IBGE.
O governo comemorou, com razão, porque está no seu papel. O Ministério da Fazenda falou em “momento histórico”. Mas é preciso relativizar a comemoração para ficar mais próximo da realidade. Oficialmente, se há um trimestre positivo, é de fato o fim da recessão. Mas nem tudo é assim binário. Mesmo com o positivo no 1% de ontem, há muitos sinais negativos na economia brasileira. O crescimento sustentado ainda não começou e ficou mais distante a partir daquela noite em que o empresário investigado Joesley Batista entrou, sem apresentar documentos, na garagem do Jaburu e usando o codinome de Rodrigo. Aquele encontro jogou o país em mais uma rodada de incerteza política e ela afeta diretamente a economia.
No número positivo, tem uma parte que é resultado dos acertos do governo Temer na economia, principalmente na escolha da equipe da Fazenda, Banco Central, Petrobras e, até a semana passada, o BNDES. Um fato concreto que tanto Rebeca Palis quanto Alessandra Ribeiro ressaltam é que a queda da inflação já teve efeito positivo. É assim, conforme explicou a técnica do IBGE: o desemprego aumentou, mas a massa salarial ficou estável, porque, com a inflação caindo, os trabalhadores tiveram reajustes de acordo com a inflação passada, que era maior. Isso eleva a renda. O consumo das famílias não subiu. A economista da Tendências acha que já é possível ver alguns sinais de alta da renda média real, o que pode levar a um dado positivo no consumo. O efeito dos juros como estímulo econômico leva de seis a nove meses, portanto a maior parte da queda de quatro pontos percentuais na Selic ainda será sentida. Haverá também o impacto dos bilhões do FGTS que ainda serão liberados.
A agricultura deu um salto ornamental no primeiro trimestre, principalmente quando comparado à base baixa do primeiro trimestre de 2016. O volume de exportação de grãos compensou até o fato de os preços não estarem muito bons. A indústria extrativa mineral contou com alta de exportação de petróleo e minério de ferro, em ambiente de preços melhores.
O clima político, contudo, é um ingrediente tóxico na economia. Investimentos que seriam feitos voltaram para as gavetas. Consumo que pode ser deixado para depois foi postergado. O resultado é o que se vê agora: a economia saiu da recessão, oficialmente, mas permanece em clima recessivo. Hoje vai ser divulgado o dado da indústria de abril, e não há expectativa de crescimento. No mês de março, a indústria caiu e agora, no melhor cenário, fica parada. A economia ainda não entrou em um novo momento de recuperação da economia. O crescimento não voltou.
Os dados não deixam dúvidas. Erros de política econômica cobram um preço elevado. Toda a alta do PIB que houve no governo Dilma foi anulada pelos erros da própria ex-presidente. O IBGE disse ontem que a economia voltou aos níveis do fim de 2010. Ao manipular índices de preços, que levou a um tarifaço, maquiar contas públicas, fazer escolhas de investimento erradas, aumentar a dívida pública, seu governo jogou o Brasil na mais longa e penosa recessão da nossa história. Este momento de saída da recessão poderia ser hora de comemoração se o país não tivesse sido jogado em mais uma espiral da crise pelo erro do presidente Temer.
FOLHA DE SP - 02/06
A REPULSA a Michel Temer e hipocrisias fizeram muito comentarista econômico bater no resultado do PIB do primeiro trimestre, que foi bastante bom enquanto durou, no entanto. Dada a imundície política, não sabemos mais o que virá.
Alguns outros, como se tivessem desembarcado ontem no Brasil, vindos de Andrômeda ou do Planeta Mongo, diziam que é "preciso cautela", ou outro clichê, pois a economia cresceu "apenas" com o impulso de agricultura e exportações (e estoques, aliás).
Poderia ter crescido com base no impulso da venda de pão de queijo para a Mongólia ou da construção de pirâmides, tanto faz. Certamente o impulso não viria agora de consumo privado, gasto do governo ou investimento privado. Era óbvio.
Esta nossa situação é o resultado do desastre Dilma Rousseff combinado à política econômica de Michel Temer e seus amigos de Patópolis, os empresários do Pato Amarelo, inimigos de um plano que contasse com aumento de impostos, por exemplo.
Isto posto, o resultado do primeiro trimestre foi bom, no âmbito do que seria possível esperar com realismo para este 2017.
Ou seja, um crescimento no máximo equivalente ao do aumento da população, 0,8%: estagnação do PIB per capita. Com resultados melhorzinhos ao longo do ano, seria possível esperar uma aceleração em 2018, quem sabe para 3%.
Esta seria uma recuperação baseada apenas na redução da taxa de juros e das dívidas de famílias, empresas e governo (sem imposto, a contenção de deficit e dívida fica mais lerda).
Levaria tempo, pois. A maioria dos economistas, que aceitou o plano, não poderia esperar outra coisa, afora milagres.
"Seria", "levaria": futuro do passado. O tumulto político pode estancar o único impulso macroeconômico maior, taxas de juros em baixa rápida.
Além do mais, um choque de confiança pode reforçar a retranca de consumidores, empresas e bancos –até julho, pouco vamos saber disso.
Enfim, ainda bem que a agricultura é capaz. Sim, fazendo estritamente menos de 6% do PIB, não pode carregar a economia nas costas. Mas o aumento da renda agropecuária se disseminava por fabricação de insumos, mesmo máquinas; auxiliou o setor de serviços, como transportes.
A safra ajudou a derrubar a inflação, com o que a massa de rendimentos do trabalho e o consumo das famílias pelo menos pararam de cair, na prática, apesar do desemprego brutal.
A partir daqui, o piparote nos gastos com o dinheirinho do FGTS e a queda de juros poderia manter a economia à tona, embora com água pelo nariz.
O sucesso do plano de estabilização econômica e outros reparos permitiria alguma retomada de consumo e investimento no fim do ano.
Goste-se ou não do plano (há muita crítica razoável), fazia sentido e, até agora, funcionava, em seus limites óbvios. Quais?
O investimento do governo "em obras" vai à míngua, efeito combinado de pindaíba do governo e aversão a imposto novo.
O investimento privado não vem porque há capacidade ociosa e receio; porque o programa de concessões de obras e infraestrutura pública à iniciativa privada não anda.
O desemprego e o medo de demissão contêm o consumo e ajudam a manter bancos na retranca.
Tudo isso era vento contra o crescimento. Caso o choque político perdure, pode virar ventania.
FOLHA DE SP - 02/06
Os efeitos saneadores da Operação Lava Jato e de seus desdobramentos têm potencial para mudar profundamente a relação entre o setor público e o privado, definindo uma nova atitude ética para ambos os lados.
Por isso, deixar que a permanente pressão contra a Lava Jato se sobreponha ao interesse da sociedade compromete seriamente o futuro do país.
Os resultados obtidos até agora, por si sós, não blindam a operação, tampouco impedem a repetição de crimes semelhantes aos que ora são investigados. Isso porque o sistema político, que criou terreno propício para a proliferação de práticas lesivas ao dinheiro público, permanece incólume.
A urgente reforma política deve, por exemplo, estabelecer parâmetros para impedir o acesso indiscriminado de partidos de pouca ou nenhuma representatividade a fundos partidários e horários políticos gratuitos.
É passada a hora de admitir o esgotamento do "presidencialismo de coalizão", que trouxe dificuldades quase intransponíveis para a criação de consensos no Congresso que visem a evolução da nossa legislação, além de ter aberto espaço a um troca-troca espúrio para a formação de base parlamentar.
Outra transformação inadiável reside na mudança das regras eleitorais, com ênfase, sobretudo, na redução dos custos das campanhas e da facilidade de negociação do tempo a que os partidos têm direito na TV.
A atual configuração do Estado brasileiro também favorece a relação incestuosa do setor privado com autoridades e políticos. O poder de definir regulamentações para depois criar exceções deixa a máquina estatal à mercê do assédio dos mais diversos interesses.
O papel de provedor de recursos financeiros, seja para obras de infraestrutura, seja como financiador da atividade empresarial, é outro foco de pressão sobre o Executivo e o Legislativo.
As revelações no âmbito da Lava Jato provam que uma máquina estatal mais simples, transparente, atuando no que é essencial, sem arroubos de Estado empreendedor e regida pela disciplina fiscal, se transformaria num grande obstáculo às práticas ilícitas.
Da mesma forma, a abertura e a modernização da economia, caracterizadas pelo dinamismo na concorrência, tornariam a relação entre o Estado e a iniciativa privada menos viciada.
Seria ilusão acreditar que reformas de tais proporções são exequíveis no movediço cenário político em que nos encontramos. Mas trata-se de uma agenda apropriada para o mandato presidencial e a legislatura que se iniciam em 2019.
Surge, então, outra questão: como fazer a travessia até a eleição de 2018 sem que a economia passe por novos solavancos e exija mais sacríficos à sociedade?
A transição, a nosso ver, terá mais chances de sucesso se enfrentarmos a inacreditável crise política obedecendo irrestritamente à Constituição sem improvisações ou atalhos e sem nos desviarmos do rumo econômico traçado de forma quase consensual nos últimos 12 meses.
As conquistas são muitas diante do caos em que vivíamos. Em diversas ocasiões neste espaço, pude enumerá-las a partir dos sinais que mostravam o início de um ciclo de recuperação, evitando o pior para a economia e a sociedade.
Diante de mais um escândalo que abala e envergonha a todos os cidadãos de bem, resta-nos reunir forças para cobrar a manutenção da agenda econômica e a aprovação das reformas.
Com a economia avançando, criaremos o clima necessário para debater em 2018 o projeto de um Brasil moderno, justo e voltado para todos, e não de um país a serviço dos poucos que se apoderam daquilo que pertence a toda a nação.
ESTADÃO - 02/06
Seria muito mais fácil apostar na continuação do crescimento econômico, neste ano e no próximo, se houvesse alguma segurança quanto ao ritmo de redução dos juros
O Brasil pode ter saído da recessão no primeiro trimestre, puxado pelo excelente desempenho da agropecuária e pela incipiente reanimação da indústria, mas isso foi antes do recrudescimento da crise política. A recuperação pode ter continuado no trimestre seguinte, mas neste momento é inútil consultar as bolas de cristal sobre o futuro próximo: estão embaçadas como nunca estiveram nos últimos 12 meses. A diferença entre o antes e o depois da visita do empresário Joesley Batista ao presidente Michel Temer foi dramaticamente realçada num intervalo de menos de 24 horas. Na manhã de ontem apareceu a boa notícia sobre a economia pré-crise. O Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre foi 1% maior que o dos três meses finais de 2016. Foi o primeiro resultado positivo, depois de oito trimestres de recuo. Na quarta-feira, ao anoitecer, o Banco Central (BC) havia divulgado a redução dos juros básicos de 11,25% para 10,25%. A palavra incerteza foi usada cinco vezes no comunicado. Polidamente, o redator da nota deixou de explicitar a relação entre a nova insegurança e o assédio ao presidente. Nem precisaria ser mais explícito.
Seria muito mais fácil apostar na continuação do crescimento econômico, neste ano e no próximo, se houvesse alguma segurança quanto ao ritmo de redução dos juros. Dinheiro mais barato faz diferença tanto para a expansão do crédito – para o consumo e para o capital de giro das empresas – quanto para o investimento em máquinas, equipamentos e construções. Essa segurança inexiste, neste momento.
Se as incertezas persistirem, o próximo corte de juros, dentro de um mês e meio, poderá ser inferior a um ponto porcentual, padrão seguido ainda nesta quarta-feira pelo Copom, o Comitê de Política Monetária do BC. A advertência está no final da nota distribuída pouco depois da reunião. O novo quadro de insegurança, segundo o comunicado, pode afetar tanto a evolução dos preços como as possibilidades de avanço no ajuste das contas públicas e no programa de reformas.
O “aumento da incerteza sobre a velocidade do processo de reformas e ajustes na economia” é apontado como “fator de risco principal”. O risco é obviamente vinculado ao quadro político. Ministros e parlamentares ligados ao governo têm prometido a manutenção do programa de arrumação fiscal e de reformas, especialmente da Previdência, mas nem os membros do Copom, nem os empresários de qualquer setor, nem os operadores de mercados podem basear suas decisões em discursos como esses.
A insegurança realçada pelo Copom em seu comunicado também afeta, naturalmente, decisões muito importantes para a continuidade da recuperação econômica. A reação observada nos primeiros meses pode ter continuado até o surgimento da crise, mas seria obviamente irrealista, mesmo assim, dar como assegurada uma nova etapa de crescimento. O potencial de expansão da economia brasileira já estava em declínio antes da crise. O potencial de crescimento sem desajustes foi reduzido, segundo estimativa do governo, a uns 2,5% ao ano. Até essa estimativa pode ser otimista.
Para reforçar a musculatura e a agilidade da economia brasileira será preciso investir muito, por vários anos, em equipamentos, máquinas e obras, além de implantar, é claro, padrões muito melhores de educação fundamental e de formação de mão de obra. O primeiro passo será recompor o padrão de investimento – já muito baixo – perdido nos últimos anos. No primeiro trimestre foi investido em recursos físicos, como bens de produção empresariais e obras públicas, o equivalente a míseros 15,6% do PIB. Um ano antes, a proporção era de 16,8%. Uma política razoável deverá visar inicialmente a uns 25%. Isso dependerá da reativação da economia e de uma cooperação eficiente entre governo e setor privado para fortalecimento da infraestrutura.
Nada disso se fará sem racionalidade, criatividade, respeito à aritmética e às limitações de recursos e, é claro, compromisso com a estabilidade monetária e fiscal. Treze anos de populismo devastaram a economia. Mas nem todos aprenderam com os fatos e o risco de retorno à orgia de incompetência, mentira e corrupção está longe de ser desprezível.
ESTADÃO - 02/06
Urgem medidas para reduzir o efeito negativo das notícias falsas no pleito de 2018
A disseminação de notícias falsas com fins políticos não é um fenômeno novo. A antiga “imprensa marrom” já tratava de denegrir a imagem de uns e outros em jornais e revistas. O poder de denegrir ou incensar imagens sempre foi valorizado, daí sempre ter existido uma associação íntima entre poder constituído e imprensa.
Não à toa, no Brasil muitos donos de veículos de comunicação viraram políticos e muitos políticos viraram donos de veículos de comunicação. Era o poder da mídia alavancando candidaturas e/ou a serviço da verdade personalizada de seu político-dono.
Assim, ao abordar o tema nos dias de hoje, devemos olhar o passado e ver o que ele tem a nos ensinar. E considerar que o problema agora é mais sério porque mais intenso, uma vez que a internet e as redes sociais expandiram o horizonte de circulação das informações a níveis impensáveis décadas atrás.
Indo direto ao ponto, sabemos que o Facebook, por exemplo, foi essencial para a vitória de Donald Trump, nos Estados Unidos, e a do Brexit, no Reino Unido. Sabemos também que as redes sociais impulsionaram boatos, factoides, mentiras e pós-verdades de forma avassaladora em ambas as campanhas.
Sabemos, ainda, que serviços como Google, Amazon, Spotify, Netflix e YouTube, entre outros, têm como descobrir nossos gostos e preferências. Sabem onde moramos e sabem como personalizar os anúncios que vemos quando vamos aos sites de notícias ou de compras. Assim, podem saber o que queremos ler ou escutar. E até mesmo deduzir a tendência do nosso voto.
Imaginem uma ação coordenada por hackers destinada a poluir as redes sociais de inverdades de cunho político devidamente personalizadas... Dizem que aconteceu nos Estados Unidos. Pode acontecer aqui também. Estamos preparados, no Brasil, para lidar com tal situação? Claro que não.
Recentemente, sites oficiais de governos e empresas, inclusive no Brasil, foram alvo de um mega-ataque cibernético. Imaginem se isso ocorre durante o nosso processo eleitoral, que será excepcionalmente curto e durante o qual as inverdades terão pouco tempo para serem digeridas...
O problema é gravíssimo pela crescente importância das mídias sociais no cotidiano. Dizem que o Facebook tem mais de 100 milhões de usuários no Brasil e que o Google fatura 10% de sua receita mundial por aqui. O sucesso do Google como veículo reside em sua capacidade de segmentar a mensagem publicitária. Tamanha precisão pode ser, de algum modo, utilizada a favor da viralização de notícias falsas. Mas o problema não está, apenas, na capacidade de as redes sociais multiplicarem inverdades.
O problema, numa dimensão maior, deve abranger as notícias propositalmente imprecisas, as notícias falsas e a sua difusão. Como tratar? Não há solução fácil. Nem única. Até mesmo pelo fato inconteste de que o tema trafega no campo da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa.
Por outro lado, as notícias falsas impactam as verdadeiras e, sobretudo, as decisões reais de cidadãos. Além do mais, a mescla de notícias falsas com verdadeiras cria o que chamo de uma espécie de dimensão da “para-realidade”, em que não se sabe o que é verdadeiro e o que não é.
O que proponho para o tratamento da questão? A meu ver, três tipos de providências deveriam despertar a atenção dos Poderes Legislativo e Judiciário, dos veículos de comunicação, dos megassites e das redes sociais. Refiro-me a providências de natureza autorregulatória, de natureza legislativa e de natureza processual.
No âmbito da questão autorregulatória, os principais vetores das redes sociais devem estimular comportamentos que limitem os efeitos das notícias falsas e até mesmo reparem o dando causado. Recentemente o Facebook anunciou que vai contratar 3 mil moderadores com o objetivo de evitar o uso da rede para disseminar crimes, imagens pornográficas ou violentas e a apologia ao terrorismo. É um início.
As demais redes sociais deveriam fazer o mesmo, adotando comportamentos e processos que minimizem a circulação de notícias mentirosas e permitam a pronta identificação dos sites que as propagam. O Google deveria investigar sites que tradicionalmente divulgam inverdades, ao invés de financiá-los por meio de pagamento por anúncios vistos.
Os grandes grupos de mídia também precisam estar atentos. Na França, no recente período pré-eleitoral os principais sites de notícias atuaram coordenados para combater a difusão de informações falsas. Deveriam ir além, visando a educar sobre o dano que a imprecisão e a manipulação das meias-verdades podem causar ao processo eleitoral.
No âmbito legislativo, deve ser considerada a aprovação de um projeto de lei que reforce o marco legal da responsabilização pela divulgação de notícias inverídicas e permita que as autoridades policiais e judiciais identifiquem e punam os autores rapidamente. Há de se cogitar, também, de um procedimento diferenciado para o direito de resposta no caso das inverdades difundidas pelas redes sociais. Não sei como fazer. Mas sei que a mentira vulnera a democracia.
Por fim, deveria ser criada uma força-tarefa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com a participação da Polícia Federal tendo em vista, desde já, se preparar para enfrentar o problema ao longo do processo eleitoral de 2018.
Sabemos que existem leis e resoluções, inclusive do TSE, que trataram do tema nas eleições passadas. Devemos, porém, ir além e, ao lado da legislação existente, incentivar uma atitude proativa das autoridades competentes, da mídia tradicional e das grandes operadores das redes sociais a fim de reduzir o efeito negativo que as notícias falsas vão provocar em nosso processo eleitoral e em nossa nascente democracia.
*Advogado, consultor, jornalista, cientista político e doutor em sociologia pela UNB
ESTADÃO - 02/06
Boa parte dos políticos está muito próxima de um diagnóstico de internação compulsória
Foz do Iguaçu, Cascavel, Maringá, Londrina. Tenho discutido a crise brasileira em algumas cidades, a propósito do lançamento de um livro. Nessas conversas, a primeira parte é sempre mais fácil. Trata de uma análise dos fatos e erros que nos jogaram nesta crise e secaram as esperanças inspiradas pelo movimento das Diretas-Já. A segunda parte, que trata de uma saída para a crise, é bem mais nebulosa. Repito a imagem de uma navegação na neblina, com todos os perigos que ela implica, inclusive o risco de o barco encalhar.
A Constituição é uma bússola, mas segui-la apenas não supera todos os obstáculos do caminho. Não há nada na Constituição, por exemplo, que impeça a escolha de um idiota para o cargo de presidente. Da mesma maneira, a Constituição não nos protege das tentativas do governo de controlar e bloquear as investigações da Polícia Federal (PF). Falta nela um dispositivo que garanta a autonomia da PF, para protegê-la desses ataques.
Dilma trocou o ministro da Justiça duas vezes. Temer, na mesma situação, utiliza a velha tática. Eles nos colocam numa situação delicada. De modo geral, em situações difíceis somos obrigados a contar com a ajuda de desconhecidos.
As escolhas de Dilma e Temer nos obrigam a espancar desconhecidos. Eles escolhem pessoas que mal conhecemos, com a tarefa de enfrentar e neutralizar a Lava Jato.
De acordo com os grampos, Aécio Neves, por exemplo, conspirando com Temer, queria que o ministro da Justiça escolhesse os delegados para os inquéritos envolvendo políticos. Era uma forma de neutralizar as investigações.
Os delegados da PF já perceberam o que está em jogo. Temer, na mesma operação, designou Osmar Serraglio para o Ministério da Transparência. Houve resistência dos próprios funcionários. Como sair chamuscado da Carne Fraca e assumir um cargo vital no combate à corrupção? Serraglio saltou fora.
Os derradeiros movimentos de presidentes em queda costumam ser patéticos. O medo está implícito em suas decisões: é mais importante sobreviver no cargo do que considerar a gravidade e a urgência dos problemas nacionais.
A Constituição prevê a escolha indireta de um novo presidente até 2018. Mas quem teria força para vencer no Congresso? A tendência é escolher o candidato que mais atenda aos anseios dos políticos, e não da sociedade. O programa desse período-tampão não importa tanto, mas, sim, o que fazer para evitar que a polícia os alcance e, mais ainda, que ela não possa deter os futuros processos de corrupção.
A solução desse impasse, para quem gosta de saídas simples, são as eleições diretas. Outro dia ouvi alguém defender diretas para o período até 2018 e diretas de novo em 2018. Num país com 14 milhões de desempregados, duas eleições nacionais quase seguidas são um remédio com grande chance de matar o paciente.
É difícil o Congresso eleger alguém que se comprometa a apoiar a Lava Jato. Assim como nas manobras presidenciais a tendência é procurar um nome que enfrente a polícia e a Justiça. É compreensível que atuem assim. Os presos querem fugir da cadeia, os investigados querem escapar das suspeitas. Mas é uma reação de desespero.
Os danos políticos sobre o sistema político-partidário são indeléveis. O destino legal de cada investigado leva mais tempo para se definir.
As eleições de 2018 podem se tornar uma hecatombe para todos. Há um caso da eleição de 1973 na Dinamarca, que derrotou os principais partidos e abriu caminho para novas forças. Ficou célebre.
Quando escrevo isto, imediatamente me vem à cabeça: o Brasil não é a Dinamarca. Mas os fatos que o País acompanha desde o governo petista são estarrecedores. Não creio que exista nada parecido no mundo.
Nas ruas ouço muito a expressão “não temos para onde correr”. Mas, quem sabe, essa situação se altera, gente da própria sociedade dá um passo adiante e enfrenta a tarefa? No momento, todos têm medo de se confundir com os políticos. Se conseguirem se distanciar deles, talvez o fardo seja menor.
Uma coisa é certa: presidentes e políticos jogam sempre com a possibilidade de deter investigações, trocar delegados, intimidar procuradores.
Não estão conseguindo. Sua escolha é um equívoco. Não percebem que a luta contra a Justiça piora sua situação política. Supõem que, abafando agora, todos se esquecerão num futuro próximo e o tradicional processo de acusações recíprocas nas eleições acabará funcionando como um escudo.
Por isso a sucessão de Temer será um momento decisivo. O Congresso pode querer utilizá-la para entrar em guerra com a Lava Jato e a maioria da sociedade que apoia as investigações. Nesse caso, a instabilidade apenas prosseguirá e não é totalmente descartável que mais um presidente caia antes de 2018.
Lembro-me dos asilados bolivianos na Europa. Eles voltavam para viver um novo governo na Bolívia, mas não jogavam fora o cartão mensal do metrô europeu. Era sempre possível voltar antes do fim do mês.
O cinismo de grande parte dos políticos, sua insistência em impedir que o Brasil faça justiça a quem o lesou são fatores muito delicados. Eles estão muito próximos de um diagnóstico de internação compulsória. Não só representam um perigo para a sociedade, como sua miopia implica também um perigo para a própria vida, em caso de revolta popular.
Lembro-me de um western em que um mexicano pendurava um americano numa corda, apontava a arma para ele e dizia: “Gringo, vou ter de matá-lo para mostrar que gosto de você”. Aqui, vamos precisar interná-los para proteger sua vida.
Eles não andam na rua, não sentem o pulso das mudanças que acontecem no espírito dos brasileiros. Acham que, desmantelando a PF, contratando bons marqueteiros para contar sua história, tudo recomeçará como antes. São ilusões perigosas, devastadoras.
*Jornalista
O Globo - 02/06
Congresso tem de voltar a esta agenda, para que o crescimento ganhe sustentação e o Banco Central possa fazer cortes mais amplos das taxas
É mesmo para ser comemorado o resultado positivo do PIB, obtido no trimestre inicial deste ano, o primeiro neste tipo de comparação desde 2014. O 1% de expansão de janeiro a março, sobre o trimestre anterior, o último de 2016, é relevante porque pode representar uma inflexão na enorme recessão de aproximadamente 8%, em dois anos, com um saldo, até agora, de 14 milhões de desempregados, e uma esteira de dramas pessoais.
O presidente Michel Temer exaltou o fim da recessão. As circunstâncias, porém, não estimulam excesso de otimismo. Há questões objetivas que aconselham pés no chão. Uma delas é que este bom resultado trimestral se deve, em grande medida, à excelente safra, responsável por elevar o PIB da agropecuária em 13,4%. Ótima notícia, mas que não se repetirá até o final do ano, por viver o setor de ciclos.
Colhida e comercializada a safra, os efeitos positivos sobre o PIB, ainda mais nesta dimensão, cessam. Ao lado disso, o consumo das famílias continua fraco — queda de 1,9% no trimestre —, dado coerente com o enorme desemprego. E um importante fator de estímulo à expansão, o investimento, está na mesma situação (queda de 3,7%). Neste sentido, o dado positivo da indústria (mais 0,9%) deve ser relativizado, pois baixos investimentos não ajudam o setor.
Indiscutível que, diante da herança recebida de Dilma Rousseff e suas heterodoxias lulopetistas — foi tão forte a recessão provocada por ela e “desenvolvimentistas” que o PIB retrocedeu e patina no nível de 2010 —, o crescimento do primeiro trimestre pode sinalizar alguma luz no fim do túnel, mas não se sabe a extensão dele, em função do quadro político.
Diante deste mesmo pano de fundo, a diretoria do Banco Central, reunida no Conselho de Política Monetária (Copom), anunciou anteontem mais um corte na taxa básica de juros (Selic), a sexta consecutiva, de um ponto percentual, reduzindo-a de 11,25% para 10,25%. Antes de a crise deflagrada a partir da conversa nada protocolar entre Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS, revelada pelo GLOBO, e seus desdobramentos, apostava-se em um corte maior. A cautela do BC foi justificada em nota pelo uso, cinco vezes, da palavra “incerteza”. Pois a incerteza política atingiu as estratégicas reformas da Previdência e trabalhista, em diversos estágios de tramitação no Congresso. É crucial que a base do governo, independentemente de Temer, se reorganize para aprová-las em definitivo.
Pode parecer ingênuo, a esta altura, clamar para que se comece a votar na Câmara a PEC da Previdência e se finalize no Senado a reforma trabalhista. Mas esta é uma questão de Estado e da sociedade, não do governo. Estão em jogo a consolidação da retomada do crescimento e a volta do emprego.
ESTADÃO - 02/06
É difícil encontrar o que não seja ficção no plano de petistas e associados para a economia
O lugar escolhido para o lançamento do “Plano Popular de Emergência”, proposto pela Frente Brasil Popular para “restabelecer a ordem constitucional democrática, defender a soberania nacional, enfrentar a crise econômica, reverter o desmonte do Estado e salvar as conquistas históricas do povo trabalhador”, não poderia ser mais apropriado: um teatro.
É difícil encontrar o que não seja ficção ou encenação nos 76 itens do tal plano, apresentado no Tuca, o teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, na noite de segunda-feira passada. Mas não havia o menor risco de que alguém ali cometesse a indelicadeza de lembrar que tudo o que consta do plano contraria a realidade. Afinal, a plateia, formada por representantes de diversos movimentos sociais, estava ali para aplaudir a farsa.
Refugiados nas suas fantasias, os petistas e seus associados, mesmo depois de tudo o que protagonizaram desde 2003, quando Lula da Silva chegou ao poder e deu início a essa era trevosa cujos efeitos ainda se fazem sentir um ano depois de encerrada, consideram-se aptos a apresentar soluções para resolver os graves problemas econômicos, políticos e morais que eles mesmos criaram. Seria uma comédia se não fosse uma tragédia – pois ainda há quem acredite nesse teatro do absurdo.
No “Plano Popular de Emergência” da Frente Brasil Popular – um consórcio de gângsteres sindicais, agitadores profissionais, baderneiros em geral e inocentes úteis a serviço do PT – lê-se que seu objetivo é “inverter, no mais curto espaço de tempo, os indicadores econômicos, sociais e políticos que resultaram do interregno golpista”. Isto é, para esses bufões, a profunda crise em que o País está metido é obra do atual governo, que tem apenas um ano, e não dos governos petistas, que ficaram longuíssimos 13 anos no poder.
Mas a afronta à realidade não termina aí. Depois de ter ajudado o governo petista a arruinar a economia nacional, a trupe que se apresentou naquele palco garante ser capaz de “implementar um projeto nacional de desenvolvimento que vise a fortalecer a economia nacional” e promover “o desenvolvimento autônomo e soberano”. Para isso, em primeiro lugar, eles defendem “a revogação de todas as medidas de caráter antipopular, antinacional e antidemocrático aprovadas durante o governo usurpador” – justamente as ações que reduziram o ritmo de destruição das contas públicas e restituíram um pouco de credibilidade à administração federal, depois de anos de pedaladas, contabilidade criativa e política econômica doidivanas.
No faz de conta da Frente Brasil Popular, tudo é muito simples. Basta adotar “uma nova política econômica, tendo como vetor o desenvolvimento, adequando as taxas de juros, o câmbio e a política fiscal à realidade da economia brasileira e dentro de padrões internacionais, buscando elevar os investimentos a 25% do PIB no prazo de quatro anos”. A menção à “realidade”, aqui, é apenas um “caco” – isto é, uma palavra introduzida pelo ator em sua fala para gerar efeito cômico. Pois todo o resto do tal “plano de emergência” é um compilado da política dolosamente irresponsável de Lula da Silva e de Dilma Rousseff.
Lá estão os mesmos erros fundamentais da “nova matriz econômica” petista, desde “a adoção de um plano de desenvolvimento industrial que articule investimentos estatais, política cambial, créditos de bancos públicos e incentivos à iniciativa privada” até a “expansão e barateamento do crédito para produção e consumo (...) em movimento comandado pelos bancos públicos”, passando pelo “restabelecimento das regras de conteúdo nacional na indústria de petróleo e gás, extensiva ao setor elétrico e minerário”, sem falar, é claro, da “expansão de gastos e investimentos sociais”.
Não se pode subestimar a capacidade que essa trupe tem para angariar simpatia, pois eles sabem muito bem vender suas miragens. Em tempos de crise aguda, como o atual, é muito mais confortável acreditar nos desvarios dessa gente inconsequente do que aceitar a aridez do mundo como ele é.
FOLHA DE SP - 02/06
Nunca houve nem haverá criminosos como os irmãos Joesley e Wesley Batista, os controladores da J&F. Escrevi em meu blog que eles não se fizeram poderosos vendendo boi, frango ou porco. Sua principal mercadoria é gente! Eles se tornaram multibilionários traficando a carne barata dos brasileiros "pobres de tão pretos e pretos de tão pobres", como já cantaram Gilberto Gil e Caetano Veloso, que agora virou animador de comícios golpistas.
O Ministério Público tentou bater bumbo para a maior delação da história, acostumada que está a fazer salivar o rancor dos broncos: R$ 8 bilhões em grana e R$ 2,3 bilhões em projetos sociais. Tudo isso ao longo de 25 anos. Ficou emocionado? Que bom!
Antes da patuscada criminosa que colheu o presidente Michel Temer, vítima da delinquência de Joesley, da conivência com ilegalidades de Rodrigo Janot e Edson Fachin e da condescendência de Cármen Lúcia, dava-se como certo que a taxa Selic teria uma redução 1,25 ponto percentual. O Copom resolveu ser prudente, dado o cenário: apenas 1 ponto. E sinaliza que é hora de prudência.
Sabem quanto esse 0,25 ponto de juro representa para os cofres públicos em 12 meses? R$ 6,5 bilhões! Em um ano, não em 25! O PIB de 2016 foi de R$ 6,266 trilhões. A cada 0,1% a menos que a economia vier a crescer em razão da arquitetura golpista, isso custará aos pobres de tão pretos e pretos de tão pobres R$ 6,266 bilhões.
E os senhores procuradores esperam que as pessoas saiam soltando foguetório? Calma! Conforme apontou esta Folha, a correção da multa se fará pelo IPCA apenas, que está em 4,08% no acumulado de 12 meses. A taxa de retorno da JBS chega a 12,34%. Marcos Piellusch, professor de finanças, sacou a calculadora e descobriu que, para pagar a dita-cuja, bastaria aos irmãos Batista investir hoje R$ 5,3 bilhões no próprio negócio.
A carnificina promovida pela Operação Lava Jato não se limita ao Estado de Direito e à política. Ela também é de natureza moral. Aquela delação premiada indecorosa tem de ser revista.
"Ah, então não se deve promover investigação nenhuma para não prejudicar a economia?" Ora, essa seria a conclusão do néscio. Que se investigue, sim! Mas para punir os culpados, não para lhes garantir impunidade e vida boa, enquanto o país vai à breca. É um escândalo e um acinte que a Lava Jato resolva, porque ancorada no clamor público, aplicar as próprias leis.
E tenho, claro!, de encerrar esta coluna com uma nota quase pessoal. Tentaram me fazer pagar caro, como sabem, por apontar os desmandos e descaminhos da operação.
A extrema-direita que ronca e fuça nunca suportou as minhas críticas às mamatas concedidas a delatores. A esquerda estúpida inventou a falácia, que o histórico desta coluna desmente, de que só me insurgi contra os atos atrabiliários quando estes alcançaram os tucanos.
O PT contribuiu, sim, em 2006, para fechar minha revista. Mas nunca conseguiu me tomar um emprego. A Lava Jato levou dois dos quatro que eu tinha num único dia. O estoque foi reposto no seguinte. Sou filho da classe operária que considerava o trabalho um dever moral. "A vergonha é a herança maior que meu pai me deixou."
Meu blog agora está hospedado na página da RedeTV!, no Portal UOL. Desde segunda, ancoro na rede de rádio BandNews o programa "O É da Coisa", entre 18h e 19h para todo o Brasil e até as 19h20 para São Paulo. Nesta quinta, comecei a fazer comentários no jornalístico matutino da emissora.
Erraram, mais uma vez, os que apostaram que eu teria de depender da boa vontade de estranhos.
ESTADÃO - 02/06
Palocci e Mantega inovaram: operavam para Lula, Dilma e o PT dentro da Fazenda
Além do tucano Aécio Neves e de Rocha Loures, assessor de Temer, as duas bolas da vez são Antonio Palocci e Guido Mantega, que agregam grande dose de suspeição sobre os governos do PT. Não bastassem os ex-presidentes da República enrolados e os ex-presidentes e ex-tesoureiros do partido condenados e presos, agora são os ex-ministros da Fazenda (da Fazenda!) que têm muito o que explicar – e contar.
Pela delação de Marcelo Odebrecht, Palocci era o único com poderes para definir quando, de quanto e para quem eram os saques na conta “Amigo” que a empreiteira mantinha para Lula. Pela de Joesley Batista, Mantega era o administrador das contas de US$ 150 milhões da JBS para Lula e Dilma Rousseff no exterior. Eram US$ 70 milhões para ele e US$ 80 milhões para ela, ou o contrário? Joesley não lembra. Afinal, o que são “só” US$ 10 milhões?
Os ministros da Fazenda eram ocupadíssimos. Tinham de traçar a política econômica, cuidar dos cofres e contas públicas, definir projetos de lei, emendas constitucionais e medidas provisórias da economia, negociar financiamento de empresas para o PT, achacar os “campeões nacionais” do BNDES e ainda servir de gerentes para as contas dos chefes. Dureza...
Além disso, e de calibrar o fluxo entre o BNDES, empresas aliadas, campanhas e bolsos alheios, cabia aos ministros da Fazenda alimentar o guloso Leão da Receita Federal, que devora nacos importantes da renda de quem produz, vende, compra e trabalha. Mas, tão ocupado com Lula, Dilma, PT e JBS, Mantega se esqueceu de declarar US$ 600 mil.
Se o senhor e a senhora deixarem de declarar uma renda qualquer, ou errarem em R$ 400 o valor de um aluguel, vão ter uma dor de cabeça infernal, mas o domador do Leão pôde se dar ao luxo de esquecer uma bolada dessas. Segundo ele, a origem foi a venda de um imóvel herdado do pai, provavelmente italiano. O dinheiro, porém, não está em bancos da Itália nem do Brasil, mas sim da Suíça, paraíso de recursos duvidosos.
Escândalos com deputados, senadores, prefeitos e governadores já fazem parte do cotidiano no Brasil, mas com ministros da Fazenda?! Soa como se estivessem fazendo negociatas não só com estatais e fundos de pensão, mas com o próprio País, com a economia nacional. Em nome do quê? De uma ideologia, de um projeto de poder? Ou de interesses bem mais comezinhos?
O certo é que Palocci e Mantega sabem das coisas, de muitas coisas do submundo dos governos Lula e Dilma. Sabem, principalmente, como Lula agia e se salvava algum bônus para ele próprio. Daqui e dali, lê-se e ouve-se que Palocci quer entregar o sistema financeiro e duas dezenas de empresas. Tudo bem. E o chefe?
José Dirceu é um quadro político, com uma biografia pujante, e engoliu calado o título de “chefe de quadrilha”, o mensalão, o petrolão e a cadeia. Mas Palocci não é Dirceu, e Mantega não chega a ser nem mesmo um Palocci. Palocci vai falar, Mantega está recobrando a memória e ambos vão rugir. O PT acha que já chegou ao fundo do poço, mas a força-tarefa da Lava Jato tem certeza de que não.
Afogados. É constrangedor Aécio forçar reuniões para dar a impressão de que tudo continua como antes e ele ainda manda no PSDB e nas bancadas depois de ser gravado, aos palavrões, pedindo R$ 2 milhões para a JBS.
E o que dizer de Lula, que comanda o PT, define Gleisi Hoffmann para presidir o partido e se prepara para disputar a Presidência da República mesmo depois de virar réu cinco vezes por pedir, não dois, mas muitos milhões para contas, triplex, apartamento, reformas e terreno do seu instituto, além de ajeitar a vida dos filhos? Ninguém se constrange?