FOLHA DE SP - 19/08
Cartilha do PT anuncia rompimento com a democracia e tem de levar à luta armada
O PT tem de ter a coragem de romper com o simulacro de democracia que se vive no Brasil e optar pela luta armada. É o que evidencia uma cartilha que escreveu. A conspiração golpista tomou tal proporção e contaminou de tal sorte a sociedade que os puros, os justos e os éticos nada mais têm a perder senão os grilhões. Onde será o novo Araguaia do futuro Éden?
Há palavras que não se dizem. Há cartas que não se escrevem (imaginem se Getúlio Vargas tivesse sido malsucedido naquele tiro...). Há cartilhas que não se publicam. Feitas determinadas escolhas, por dever de coerência, ou se adere ao ato extremo ou se cai, vencido, de joelhos, aceitando o peso da espada do vencedor.
Ainda que o PT tivesse planejado meticulosamente a sua própria destruição, o ato final não poderia ser mais coerente. Depois de a defesa de Lula ter recorrido à ONU (!) contra a suposta perseguição a seu cliente, o partido elaborou uma cartilha em que falsifica a história em quatro idiomas. Ali se denuncia ao mundo, como vai no título, uma caçada judicial ao ex-presidente, com destaque para cinco verdugos: Sérgio Moro, Rodrigo Janot, Gilmar Mendes, o Congresso e a imprensa.
Notaram? O partido acusa uma conspiração a unir, na prática, os Três Poderes da República – aproximo, no caso, o Ministério Público Federal do Executivo, que seria ocupado por um usurpador – e aquele que se costumava chamar, nas democracias, o "Quarto Poder".
Para que o projeto do partido se realizasse na sua plenitude; para que suas utopias ganhassem consequência; para que as mudanças necessárias se operassem, forçoso seria quebrar as pernas do Congresso, que, afinal, dá um golpe parlamentar; fazer uma limpeza no Judiciário, que aplica a lei de maneira seletiva; pôr, como defendeu Lula, o Ministério Público "no seu devido lugar", cassando-lhe prerrogativas, e censurar a imprensa, que conspira contra o poder popular.
Hão de me permitir folhear a própria obra. Em centenas de textos de "O Pais dos Petralhas I e II" e de "Objeções de um Rottweiler Amoroso", denunciam-se as sistemáticas tentativas do partido de encabrestar a democracia; de recorrer às prerrogativas do próprio regime para solapá-lo; de cercear o debate nem que seja pela força da patrulha – e nisso eles são ainda bem-sucedidos.
Tive se enfrentar, por óbvio, a estridência dos apologistas do regime e a desconfiança dos frouxos. Afinal, diziam estes, eu exagerava na caracterização do autoritarismo petista e via tentações hegemônicas no que seria nada mais do que o exercício natural da política.
Que bom que a ópera petista chega ao último ato, com o próprio partido chamando os inimigos por seus respectivos nomes. É o PT quem me dá razão, não os que concordavam comigo. A sigla evidencia, assim, a sua congênita incompatibilidade com a democracia e tira as vestes do farsante.
Tão logo a Afastada nos brinde, numa versão desta vez realmente ridícula dos versos da poeta Cecília Meireles, com o seu "patético momento", é chegada a hora de o PT se apresentar às armas.
E só vê na palavra "patético" uma ofensa, em vez de um lamento piedoso, quem ignora o sentido mesmo da palavra, que foi parar na Sinfonia nº 6 de Tchaikovsky, tão sofrida e tão sem saída. Dilma vai falar no Senado. Ela busca a "sombra de som curtindo o seu próprio lamento".
Depois, é tiro, porrada e bomba.
FOLHA DE SP -19/08
Alguns jornalistas americanos na Rio-2016 ficaram chocados com os biquínis e sungas dos brasileiros nas praias e piscinas — para eles, reduzidos demais. É mesmo? Bem, este é um assunto sobre o qual os EUA não podem legislar fora do seu feudo. Enquanto o Brasil mantiver a soberania sobre as virilhas nacionais, nossos rapazes e moças continuarão a se exibir como quiserem.
Os EUA parecem ter um problema com o corpo humano. No filme "Aconteceu Naquela Noite" (1934), de Frank Capra, Clark Gable ia passar uma noite (perfeitamente inofensiva) com Claudette Colbert. Quando se despiu para se deitar e surgiu na tela de peito nu, milhões de pascácios americanos descobriram estarrecidos que Clark Gable não usava camiseta sob a camisa social. E só então aderiram à prática, com o que a indústria de camisetas como roupa de baixo quase faliu.
Em "O Rei dos Reis" (1961), de Nicholas Ray, Jeffrey Hunter como Jesus Cristo passa boa parte do filme pregado na cruz, em andrajos, de braços abertos e com as axilas à mostra. A abundância de pelos no peito e debaixo dos braços era inadmissível para as famílias americanas. Daí Jeffrey Hunter sofreu uma depilação em regra e fez o Cristo mais glabro da história do Novo Testamento.
Sem falar em "O Círculo do Medo" (1962), de J. Lee Thompson, em que Robert Mitchum vive um vilão tão cruel quanto assustador. Mas, em certo momento, ele é levado a uma delegacia, ordenado a tirar a roupa, e o que se vê? Um homem sem calças e sem camisa, fortíssimo, mas com uma cueca gigante que lhe sai quase dos sovacos e vai até os joelhos. E, pior, de sapato e meias pretas. A plateia brasileira tinha uma explosão de riso e lá se ia o pavor que Mitchum despertava — porque, em 1962, já ninguém por aqui usaria tal cueca.
Hoje, muito menos. Exceto, talvez, alguns jornalistas americanos.
ESTADÃO - 19/08
A enorme abundância de dólares deveria ser encarada como janela de oportunidades, mas ela está sendo desperdiçada
Há pouco mais de dois anos, certo número de analistas da economia brasileira previa a iminência de uma tempestade perfeita.
Entre os estragos que se diziam inevitáveis não estavam apenas o tamanho do rombo das contas públicas e a depressão que se viram depois, mas, também, a forte valorização do dólar nos mercados que se seguiria ao aumento dos juros em preparação pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos).
De lá para cá, o sistema produtivo brasileiro entrou em parafuso, como todos sabemos, o desemprego alcança hoje 11,3% da força de trabalho, a renda do brasileiro está sendo dilapidada e as desgraças vão se sucedendo por opções equivocadas. No entanto, não aconteceu a tão temida operação de enxugamento de liquidez a ser colocada em prática pelo Fed. Se tivesse acontecido, produziria certo sumiço de dólares no mercado de câmbio do Brasil e a alta das cotações da moeda estrangeira.
Essa operação vem sendo sucessivamente adiada, à espera de melhores condições para isso. Quarta-feira, a ata da última reunião do Fed mostrou forte divergência entre seus membros. Há os que argumentam que o nível de desemprego está perto de cair e que essa seria a senha para iniciar o processo de alta de juros. E há os que advertem não só que uma alta dos juros derrubaria ainda mais a inflação que hoje vai girando abaixo da meta de 2,0% ao ano mas, também, que a retomada da atividade econômica dos Estados Unidos continua frágil e não deveria ser restringida por um aperto monetário.
O adiamento do processo de alta dos juros nos Estados Unidos deixa enormes disponibilidades de recursos nos mercados internacionais de câmbio, agora ainda mais incrementadas pela atuação de outros bancos centrais. O Banco Central Europeu, por exemplo, continua injetando recursos não só para enfrentar a recessão, mas, também, os problemas novos produzidos pelo Brexit, a decisão dos ingleses de abandonar a União Europeia. Pelo mesmo motivo, o Banco da Inglaterra (banco central) também afrouxou sua política monetária. Mas há mais bancos centrais poderosos no mesmo caminho, como o Banco do Japão e o Banco Nacional da Suíça.
Muitos por aqui encaram essa impressionante liquidez global como problema, na medida em que injeta mais moeda estrangeira no câmbio interno e concorre para valorização do real (baixa do dólar), situação que derruba a competitividade do produto brasileiro e, assim, prejudica a indústria.
No entanto, essa enorme abundância de dólares deveria ser encarada como janela de oportunidades a ser aproveitada pelo Brasil. E, todavia, ela está sendo desperdiçada.
Poderia servir para atrair capitais de investimento, especialmente para projetos de infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e saneamento), mas os leilões de concessão estão emperrados, pela falta de regras confiáveis de jogo e pela falta de projetos claros. Quando os bancos centrais afinal voltarem a enxugar essa dinheirama, ficará bem mais difícil encontrar financiamento para os investimentos de que o Brasil tanto precisa.
CONFIRA:
Aí está a evolução da produção agrícola pelos números do IBGE.
Recuperação
Na semana passada, Conab e IBGE apontaram queda de 9,8% na atual safra de grãos em consequência da estiagem no Centro-Oeste. Mas nesta quinta-feira, 18, o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Néri Geller, declarou que o governo espera ampla recuperação. Para ele, a próxima safra atingirá 210 milhões de toneladas de grãos, cerca de 12% acima da anterior. A próxima safra começará a ser semeada em setembro e outubro, quando começar a estação das chuvas.
FOLHA DE SP - 19/08
Enquanto seu lobo não vem, na falta de conversas decisivas, a gente voltou a discutir o que o Banco Central vai fazer da taxa de câmbio, do "preço do dólar". Mas o BC não vai nem tem como fazer nada de muito relevante, a não ser que cometa maluquices estrambóticas.
Claro que a taxa de câmbio é um preço central. Que o "dólar" muito volátil ou barato, em especial nos anos Dilma 1 (R$ 1,60!) ajudou a quebrar as pernas ou uma canela da indústria, um motivo desta economia trôpega.
Para começar, o dólar está barato porque há oceanos de dinheiro barato sobrando no mundo rico, de taxas de juros zero ou menos que isso.
É dinheiro vadio à procura da vida fácil, como a dos juros a 14,25% ao ano do Brasil. Dada a calmaria relativa na praça mundial e até no Brasil (menor "aversão a risco"), os donos do dinheiro grosso vêm tomar caipirinhas no nosso sol de quase setembro.
Mais da metade da variação do preço da moeda brasileira tem dependido de fatores externos, de como o dinheiro reage às idas e vindas das economias centrais, EUA, Europa, China, e ao preço de commodities. Por vezes, o real varia no mesmo passo da taxa dos títulos do governo americano, como em 2013, quando o BC dos Estados Unidos ameaçou pela primeira vez elevar a taxa de juros em sete anos.
O que o BC poderia fazer, em breve? Ficar comprador de dólar (com derivativos ou comprando mais reservas)? Trocando em miúdos: aumentar ainda mais a dívida pública para investir em títulos americanos, juro real zero, pagando juro brasileiro, mais de 14%? Não parece razoável, para dizê-lo de modo ameno.
Fechar as fronteiras do dinheiro, mais ou menos, ou intervenções assemelhadas? Entre outros muitos problemas básicos, não parece uma boa ideia para um país que deseja atrair investimentos e, ainda pior, que mal se recupera da má fama e da ruína deixadas por políticas econômicas malucas.
A não ser para economistas ditos heterodoxos, resta a fazer apenas o básico. Baixar o quanto antes e muito a taxa de juros, o que depende hoje, crucialmente (mas não apenas), de evitar que a dívida pública cresça sem limite, como agora. No mais, o que resta, parece, é aparar arestas, evitar flutuações demasiadas da moeda e efeitos secundários dos corcoveios no câmbio.
Alguns dos economistas apelidados de heterodoxos acreditam que é possível manter a taxa de câmbio em uma determinada banda, por meio de intervenções variadas. Baixar a taxa básica de juros na marra e controlar o fluxo de capitais é em geral o núcleo dessas propostas, trocando a coisa em miúdos grossos.
"Tudo mais constante", diga-se ironicamente, juros menores e porteiras fechadas poderiam permitir um controle do "preço do dólar". Porém, nada mais ficaria constante. Resta explicar ao público interessado os efeitos colaterais (o que seria da inflação? O que seria dos juros de longo prazo, que afetam decisões de investimento? Como ficaria a rolagem da dívida pública? Etc.).
Quem sabe existam meios de lidar com esses problemas destrutivos (sem criar outros, como tabelar preços, fazer "política de rendas", fechar o país, quiçá centralizar o câmbio). A gente espera uma explicação sobre os desdobramentos desses planos de colocar cabresto no câmbio.
ESTADÃO - 19/08
Reformas são retomadas em ambiente em que esquerda populista perdeu prestígio
À época em que o governo Fernando Henrique fez importantes mudanças na Constituição, o PT, que comandava a oposição, adotou a postura de “fechar questão” contra todas as principais propostas legislativas do Executivo. Isso significava obrigar todos os parlamentares petistas a votar de acordo com a decisão do partido, sob pena de exclusão.
Ainda assim, é muito comum a interpretação de que as dificuldades de FHC em passar suas reformas constitucionais deveram-se quase que inteiramente à resistência corporativista dos grupos de interesse afetados, e muito pouco à oposição ideológica às propostas. Afinal, a bancada do PT e de outros partidos de esquerda, que se opunham ferrenhamente ao programa tucano, tinha dimensão insuficiente para barrar as emendas constitucionais.
Um fator pouco considerado, porém, é que o Congresso Nacional à época de FHC – e ainda hoje – tinha uma grande massa amorfa de parlamentares sem posição ideológica clara, que votavam contra ou a favor de determinada reforma ao sabor de seus cálculos e interesses do momento.
Sempre se enfatiza muito que esse tipo de político se deixa levar pelos interesses “fisiológicos”, isto é, vota a favor de quem tenha atendido seus interesses particulares ou de sua paroquial base de eleitores. Presta-se menos atenção ao fato de que os fisiológicos também são os que mais se deixam levar pelos ventos políticos em constante mutação, já que não se sentem vinculados à nenhuma ideologia específica.
Assim, à época das reformas de FHC, o PT e a esquerda no Congresso eram de fato uma minoria sem votos para brecar reformas, mas que formavam um grupo muito barulhento e com forte credibilidade política, fruto da percepção pós-ditadura de que a esquerda era impoluta e representava os interesses dos oprimidos contra os dos opressores. Era um grupo com o poder de glorificar os votos antirreforma como a “coisa certa” em defesa dos interesses populares contra o governo “neoliberal”.
Esse glamour a mais podia ser muitas vezes o que faltava para que a balança de interesses de um parlamentar fisiológico pendesse para a defesa dos interesses corporativos, e não para o voto pró-reforma acompanhado de alguns “presentinhos” do governo. Em outros casos, podia ser o contrário. Mas o fato é que, em muitas reformas de FHC, cerca de metade dos parlamentares do aliado PMDB, o partido fisiológico por excelência, votou contra o governo.
No campo reformista, por outro lado, naquela época e ainda hoje, a única arma é o surrado discurso tecnocrático que explica que os números não fecham e que, sem mudanças, o País não tem como melhorar no médio e longo prazos. É um trabalho de água mole em pedra dura, mas que muito aos pouquinhos funciona, tanto que reformas foram realizadas até o início do governo Lula.
Em 2006, porém, Guido Mantega assumiu o Ministério da Fazenda dizendo que a reforma da Previdência não era necessária. Até 2014, no impulso do boom de commodities que produziu a economia mágica de 2004 a 2010, o distinto público ouviu do seu governo que reformas fiscais eram desnecessárias e que, para crescer, bastava vontade e ousadia.
Agora, em meio a uma catastrófica ressaca do experimento voluntarista, um governo ainda provisório retoma o caminho das reformas, num ambiente em que a esquerda populista já não tem o prestígio político e moral de outrora, para dizer o mínimo.
É certo que os interesses corporativos e mesmo de grandes grupos, como os aposentados, vão resistir e que tudo será difícil. Mas hoje talvez seja mais fácil caracterizá-los pelo que são: interesses de grupos, e não o interesse coletivo da sociedade no médio e longo prazos. Assim, é possível que o governo Temer, apesar do desafio de se legitimar, tenha sido brindado com condições políticas particularmente favoráveis para travar esse embate ideológico – e não deve desperdiçá-las.
O Globo 19/08
O fundo do poço da economia foi em abril, diz o empresário Flávio Rocha, presidente das Lojas Riachuelo. A longa temporada de números negativos nas vendas de varejo começou no fim de 2014 e será deixada para trás depois de setembro. “O Natal já vai ser melhor”, aposta ele. O setor perdeu 500 mil vagas na crise e, segundo o empresário, poderia estar gerando muito mais empregos.
OIndicador Antecedente de Vendas (IAV) mostra exatamente essa trajetória, como se pode conferir no gráfico abaixo. O índice é resultado de consulta a 600 gerentes de compras das grandes empresas de varejo e antecipa tendências. Pelo gráfico, se vê que o que foi previsto pelo índice acompanha bastante o que realmente aconteceu nas verificações do IBGE, na Pesquisa Mensal do Comércio (PMC). As piores expectativas foram em abril, quando os executivos consultados esperavam uma queda de 10,9% nas vendas. A PMC mostrou que a redução acabou sendo de 9%. Para os meses cujos dados não saíram, a previsão é de quedas menores. Em setembro, a expectativa é de quase estabilidade (-0,6%).
O varejo teve altas muito fortes durante o governo do PT. De 2003 a 2013, as vendas cresceram 120%, mas as empresas que fazem parte do Instituto para o Desenvolvimento de Varejo (IDV) aumentaram as vendas em 700%. Mesmo com esse desempenho, Flávio Rocha sempre foi crítico do governo Dilma, defendeu o impeachment, e acha que as perspectivas para o governo Temer são boas. Acredita que o presidente interino, se for efetivado, tentará fazer reformas necessárias, como a trabalhista. Faz uma comparação impressionante.
— O varejo americano emprega 42 milhões de trabalhadores e o do Brasil empregava 7 milhões e agora caiu para 6,5 milhões. Como os EUA têm 50% mais população, o Brasil poderia contratar muito mais. O problema é que a legislação trabalhista no Brasil foi feita para a indústria que trabalha de segunda a sexta e acumula estoques. O varejo não é assim e deveria ter liberdade de contratar para as suas necessidades — disse ele, numa entrevista que me concedeu na Globonews. Segundo Rocha, a reforma trabalhista tem que ter apenas um princípio: o de que o negociado entre trabalhador e empresa se sobrepõe ao legislado.
O Brasil vive um longo vale em todas as áreas, mas nada é pior do que o que está acontecendo no mercado de trabalho. Havia 6,4 milhões de desempregados em dezembro de 2014 e pelos dados do segundo trimestre de 2016, divulgados pelo IBGE, há 11,6 milhões. É urgente a criação de mais empregos, mas o que os economistas estão prevendo é que a taxa continuará subindo nos próximos meses porque a recuperação será muito lenta. Flávio Rocha acha que a situação da economia vai melhorar e rapidamente.
— Não está havendo uma troca de governo apenas, mas o fim de um ciclo que apostou no aumento do tamanho do Estado e elevou impostos. A recuperação será rápida, será em “V”— disse.
Há dúvidas sobre se a retomada será assim tão rápida. As famílias estão endividadas, o desemprego é um freio ao consumo, até de pessoas que não foram diretamente atingidas, e as próprias empresas estão endividadas. O governo não poderá ampliar investimentos por estar em um enorme déficit fiscal. Mesmo assim, a expectativa dos empresários de varejo é que nos setores de bens de menor valor, como vestuário, calçados, livrarias e artigos esportivos, haja em agosto um resultado positivo de 1,8% e em setembro de 2,8%. Mais rápido ou mais devagar, o importante é que o país está começando a sair da longa recessão.
ESTADÃO - 19/08
A dias do impeachment definitivo de Dilma Rousseff e a dois anos da eleição de 2018, num cenário de enorme confusão partidária e muitas interrogações envolvendo políticos, o PMDB de Michel Temer joga ao vento um nome novinho em folha e fora do circuito político para a sucessão presidencial: o do empresário Josué Gomes da Silva.
O objetivo imediato é dissipar as nuvens cinzentas que pairam sobre o Planalto desde que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu a candidatura de Temer em 2018. A turma do presidente fez fila para desmentir, mas aliados passaram a falar no ministro Henrique Meirelles como alternativa.
Diante desse “Temer ou Meirelles”, o PSDB, principal partido da base do governo, deu um pulo e engrossou a voz, pois o acerto com Temer foi feito em cima do compromisso de que ele não disputaria em 2018 e abriria espaço para um nome tucano. Daí por que o senador José Aníbal (PSDB-SP) desandou a criticar o Planalto e a área econômica (leia-se Temer e Meirelles) por afrouxarem as rédeas fiscais para favorecer uma categoria profissional daqui, governos estaduais dali. Aníbal não falava sozinho.
Como tudo neste governo, o imbróglio foi parar na mesa do Palácio do Jaburu. Na quarta-feira, Temer jantou com os senadores tucanos e levou Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima e Moreira Franco. Atenção, o jantar foi para “senadores tucanos”. Significa que foi para Aécio Neves, o mais reticente do trio-mor do PSDB a aderir à transição com Temer. José Serra e Geraldo Alckmin não foram convidados, “senão, seria preciso convidar outros ministros e governadores”. E os deputados tiveram de se contentar com uma única presença, e de última hora.
Entre uma garfada e outra, os tucanos repetiram que o ajuste fiscal é ponto zero da recuperação econômica, mas o governo vem cedendo muito, privilegiando seus interesses políticos em detrimento das urgências econômicas. Paciente, Temer discorreu sobre pressões, ônus e bônus e equilíbrio entre política e economia. Sem força política e base sólida, alegou, terá dificuldades para aprovar alguma coisa no Congresso. E, batendo de frente com o Judiciário, com o funcionalismo e com os estados, aí é que não aprova nada mesmo.
O presidente interino reforçou seu compromisso com o equilíbrio das contas públicas e anunciou que fará um pronunciamento à Nação no dia 7 de Setembro sobre o que encontrou ao assumir e o que pretende fazer já efetivado no governo. No fim do jantar, estava selado o armistício com o PSDB do Senado. Sabe-se lá até quando.
Mas voltemos a Josué Gomes da Silva, da poderosa Coteminas, filho do mítico José Alencar, vice de Lula, filiado ao PMDB desde 2013 e com uma particularidade: nasceu justamente num 25 de dezembro, em 1963, e sua mãe, dona Mariza, muito católica, teve certeza de que isso era um sinal. A família nunca a contrariou.
Além de ser útil agora, para acalmar os tucanos e tirar da cabeça de demais aliados que Temer será candidato ou apoiará Meirelles, Josué fica na prateleira. Com o desgaste dos políticos e a falta de alternativas óbvias no próprio PMDB, vai que cola... Tudo, claro, depende do principal: o governo dar certo, a economia reagir, Temer efetivamente descartar a candidatura e ter força suficiente para patrocinar um nome viável para a sucessão. Resumo da ópera: jogar o nome de Josué ao ar é para tirar o foco de Temer e Meirelles, mas sempre pode ventar.
Histórias. Reação de Tancredo Neves quando o Triângulo Mineiro tentou se separar de Minas: “Ok, me digam se a capital será em Uberaba ou Uberlândia e eu toco em frente”. Nunca voltaram. A lembrança é do Planalto, quando o PSDB exige apoio antecipado ao seu candidato em 2018 e Temer pensa: “Ok, me digam se será Aécio, Serra ou Alckmin e eu apoio”. Não voltarão tão cedo.
FOLHA DE SP - 19/08
SÃO PAULO - Nas Olimpíadas incentivamos os atletas a buscarem a excelência máxima, que é recompensada com a medalha de ouro. Até ensaiamos um discurso mais politicamente correto, que assevera que o importante é competir. O ar de decepção daqueles que não conseguem subir no pódio, porém, sugere que ganhar é mesmo bem melhor do que perder.
Não poderia haver contraste maior entre o que ocorre nas Olimpíadas e a tendência, cada vez mais presente nas escolas de educação infantil, de fazer com que os pequenos não experimentem nenhum tipo de sensação de derrota ou de exclusão. Nas competições esportivas escolares, todas as crianças recebem medalhas, pouco importando se chegaram em primeiro ou último lugar na corrida.
Nos EUA, onde essa moda chegou ao paroxismo, surgem situações ainda mais estranhas. O velho sistema pelo qual os times eram montados por escolhas alternadas entre os dois capitães de equipe foi aposentado, para que os últimos alunos a ser chamados não sofressem. Professores de arte já se queixam da dificuldade que é encontrar uma peça para encenar no final do ano, já que os novos tempos exigem que todas as crianças participem e tenham o mesmo número de linhas de diálogo.
A ideia por trás dessas esquisitices é que não devemos golpear a autoestima dos pequenos. Mas será que não devemos mesmo? Ser o último a ser escolhido para o time pode ser doloroso, mas revela uma informação útil: você não é um bom atleta; procure dedicar-se a atividades para as quais está mais talhado.
A própria autoestima precisa ser relativizada. Psicólogos que estudam a violência apontam o excesso de autoestima como a mais prevalente causa de conflitos interpessoais.
Precisamos encontrar um meio-termo entre o espírito ultracompetitivo que reina nas vilas olímpicas e a atonia um pouco ingênua que parece pautar a nova puericultura.
ESTADÃO - 19/08
O Brasil que produz e cria empregos está sendo morto a chutes. Como isso foi possível?
Sim, a festa está linda, mas não é do Brasil, é só noBrasil. Quando acabar estaremos de volta àquele Rio de Janeiro de sempre, com R$ 3 bilhões a menos de segurança pública por quinzena, onde errar o caminho é morte certa.
Aquela abertura foi, sim, uma síntese, mas do nosso velho drama roteirizado. A mais moderna tecnologia emprestando cintilância à mais retrógrada e opaca das mensagens assinada, proverbialmente, pelos noveleiros da Globo ultraespecializados nesse tipo de embalagem. Um gostinho para o mundo da antiutopia que, desde os idos de 1936, é entoada diariamente como um mantra sagrado em todas as escolas e “meios de difusão de cultura da burguesia”: a quase centenária “recriação”stalinista das supostas “raízes” de um Brasil sem empreendedores, só com usurpadores de um lado e escravos do outro, que repudia a superação, sonha apenas com a “hegemonia” da favela.
Esse “Brasil” dos “intérpretes”, complacente com a derrota – como provou que não o é cada um dos atletas verde-amarelos na Olimpíada disputada na Vila construída pelos empreendedores “que não há” –, é o único representado em Brasília. O que suava nas quadras e pistas em busca de glória e remissão pelo esforço individual não tem quem fale por ele na capital mundial do horror ao mérito, que a Olimpíada honra, porque meritocracia pressupõe a morte do “Sistema”que vive da distribuição e venda de privilégios.
No Brasil Real, onde a casta dos funcionários públicos vence sempre e é contra a lei evitar o suicídio orçamentário, haja o que houver, há sangue na água e os predadores se assanham. Com a inflação comendo por baixo 9% do valor do trabalho ao fim de oito trimestres consecutivos de queda da produção e mais de 100 mil brasileiros da 2.ª Classe se juntando à legião dos desempregados a cada 30 dias, os bancos comem soltos. O volume de crédito concedido caiu 4,4%, mas a“receita com clientes” subiu 4,2%. A cada“renegociação” das dívidas de empreendedores a quem a única garantia dada pelo “governo de salvação nacional” é a de que nada na equação entre contribuintes e “contribuídos” vai mudar senão para pior, aumenta forte o “spread” entre juros pagos e juros cobrados. Os quatro maiores bancos “lucraram” R$ 31,7 bilhões no segundo trimestre, volume de drenagem que se vem somar aos R$ 60 bilhões recém- chupados pela União para garantir que os seus funcionários permaneçam fora da crise que criaram e aos outros R$ 50 bilhões que vão custar a renegociação sem contrapartidas das dívidas dos Estados. Na fila os governos municipais, só 42 dos quais, em quase 6 mil, têm folhas de pagamento menores que a própria arrecadação, apesar do frenesi de multas com que caçam o povo pelas ruas e estradas de todo o País. Jogue-se por cima disso a tempestade de “ações trabalhistas” que o desemprego em massa precipita, montando, este ano, a algo em torno de R$ 70-80 bilhões, e tem-se um retrato parcial do estupro coletivo que o País que trabalha vem sofrendo.
Bolsa subindo, dólar caindo? No mundo da“arbitragem de instituições” é assim: “Tá caro produzir aqui? A lei não garante? Empregar é expor-se à chantagem? Bora produzir em outro lugar”! E na contramão: “Tá fácil ganhar dinheiro no mole? É o juro mais alto do mundo? Vamos lá, enquanto durar!”. Não tem nada que ver com a economia real. O Brasil que produz e cria empregos está sendo morto a chutes.
Nunca tantos foram tão estraçalhados por tão poucos. Como foi que isso se tornou possível?
O “Sistema” produz exatamente o resultado para o qual foi desenhado. Partindo da falsificação constitucionalmente imposta da base de toda a estrutura de representação da sociedade civil a partir dos sindicatos que dispensam simpatizantes porque são sustentados por impostos, o esquema criado por Getúlio Vargas foi clonado, a partir de 1988, pelos partidos políticos. E isso fez da nossa tão propalada“democracia” uma farsa em que os “representantes” se podem dar impunemente o luxo de dispensar o endosso dos “representados” aos seus atos. Fechado em si mesmo, “O Sistema” tem lá os seus mecanismos de processamento de lutas intestinas, mas o respeito à hierarquia interna, uma vez estabelecida, é sagrado sob pena de “morte”, por condenação aberta quando possível, por chantagem e assassinato de personagem quando necessário. Desse momento em diante garantir“o seu” e o “dos seus” à custa dos “de fora”, tão certo quanto que o sol nascerá amanhã, é o que os unirá a todos, para além do falatório, nos momentos de decisão. O conjunto é absolutamente blindado contra qualquer interferência externa, sobretudo dos eleitores, tanto antes, no processo de seleção dos candidatos a cargos eletivos, futuros “hubs” de distribuição de acesso a privilégios, prerrogativa exclusiva dos grandes caciques segundo critérios inconfessáveis, porém explícitos, quanto depois do momento fugaz da eleição.
Esperar que o próprio “Sistema” atue contra si mesmo é, portanto, uma ilusão de noiva. Enquanto a imprensa ou pelo menos uma parte dela resistiu denunciando os avanços da casta que parasita a Nação e amplificando a voz dos que pagam a conta, sobreviveram, aos trancos e barrancos, elementos de democracia nas instituições brasileiras. Depois que a ética corporativa substituiu a ética jornalística e a função institucional da imprensa, último bastião dos desvalidos, cedeu lugar a uma conta de chegar na ordem das prioridades das empresas de comunicação, o caminho ficou livre.
Enquanto a imprensa, a reboque da guerra de “acessos”aos dossiês com que as partes em disputa pelo controle do “Sistema” se alvejam umas às outras, seguir tratando a corrupção como causa, e não como efeito, da sujeição do País à ditadura de uma casta com direitos e deveres totalmente diferenciados dos do resto do povo que ela está dispensada de expor como o que de fato é, as atenções e as energias da Nação abusada seguirão dispersas e erráticas como estão hoje e não haverá meio de pôr um fim à opressão.
O Globo - 19/08
Uma das frases mais conhecidas sobre política é a do ex-senador e ex-governador mineiro Magalhães Pinto, que comparava sua volatilidade à das nuvens, que mudam de configuração a cada momento. Nada melhor para definir as posições mutantes do presidente interino, Michel Temer, e da presidente afastada, Dilma Rousseff, neste momento.
Temer, que se dizia preparado para as vaias que de fato recebeu na abertura dos Jogos Olímpicos no Rio, desistiu de ir ao encerramento, já prevendo que será vaiado novamente. Dilma, que já anunciara que não compareceria à sessão no Senado de seu julgamento, temendo enfrentar as perguntas da situação, decidiu que irá.
Michel Temer comete um gafe diplomática, pois é tradição que o presidente do país que realiza a Olimpíada transmita simbolicamente a missão ao dirigente do país que sediará a próxima edição, desta vez o Japão, em 2020. Para tanto, o primeiro-ministro Shinzo Abe estará no Rio no domingo, e receberá no Maracanã do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, o bastão simbólico da Olimpíada.
A vaia que certamente seria direcionada a Temer, o será a Maia, que pagará assim o mico presidencial neste momento conturbado da vida política nacional, uma espécie de taxa de insalubridade que lhe permitirá assumir o cargo de presidente interino quando Temer viajar ao exterior.
A decisão de Temer de não comparecer ao estádio — como dizia Nelson Rodrigues, no Maracanã se vaia até minuto de silêncio — é um erro político inexplicável. Ele abre mão das obrigações do cargo que ocupa para se preservar, criando uma imagem de fragilidade que não ajuda na tarefa árdua que terá quando assumir definitivamente a Presidência da República.
Não há uma explicação razoável para a sua falta, ainda mais quando ela cria até mesmo embaraços diplomáticos. Os cerimoniais das duas chancelarias estão tentando montar um encontro entre Temer e Abe fora das vistas do público, para minimizar a consequência da decisão do presidente brasileiro, que mais parece um adolescente malcriado do que um experiente político que tem noção das suas responsabilidades.
Já a presidente afastada fez muito bem, de seu ponto de vista, em mudar de ideia. Sua ausência na sessão do Senado corroboraria a imagem de fraqueza pessoal, justamente o que ficará colado à imagem do presidente interino.
Dilma está tentando reescrever sua história, montando uma narrativa heroica para o que não passa de uma situação normal em democracias maduras. Seu impedimento é resultado de burlas específicas à legislação brasileira, e mostra que nenhum político, por mais popular que seja — não é seu caso — ou por mais votos que tenha tido, não tem o direito de presidir o país sem obedecer às leis.
Mas ela insiste na tese do golpe parlamentar, e é essa visão que estará registrada no livro que pretende escrever, no documentário que está sendo feito por seguidores seus e que está na carta que divulgou recentemente. Não importa se ninguém, além dos militantes da esquerda no Brasil e no exterior, acredita nisso, para ela o importante é seguir nessa toada até o final, quando, perdidos os direitos políticos por oito anos, estará relegada a um rodapé da História brasileira.
Só será protagonista quando se contar o descalabro ocasionado por seus anos de governo, que colocaram o país na pior recessão econômica já registrada em toda nossa História, e no caos político em que vivemos. Dilma terá na sessão do Senado oportunidade de exercitar mais uma vez o papel de perseguida política, de uma mulher honesta que está sendo condenado por um bando de corruptos que, aliás, fizeram parte de seu governo até outro dia.
Se der sorte, e os governistas não forem cuidadosos em seus questionamentos, poderá repetir a cena de quando, acusada pelo líder do DEM, Agripino Maia, de ser mentirosa com base em declarações em que admitia ter mentido muito a seus interrogadores quando esteve presa, teve um momento de brilho político ao transformar em um bumerangue a acusação.
É improvável que um imprevisto mude o resultado do julgamento, mas, para Dilma, ir até o fim na defesa de seus pontos de vista é uma saída melhor do que se esconder. Mesmo que sua versão da História não resista às delações premiadas do marqueteiro João Santana e do empreiteiro Marcelo Odebrecht, entre outros, que a estão culpando de diversos atos de corrupção, que ainda serão cobrados pela Justiça.
O Globo - 19/08
Marca da ideologia dirigista, as 41 empresas criadas de 2003 até o ano passado gastaram muito com salários e geraram um majestoso prejuízo. Era esperado
Nos 13 anos de lulopetismo no poder, o Tesouro (leia-se, o contribuinte, a sociedade) recebeu pesada conta: os prejuízos bilionários causados por esquemas de corrupção que dilapidaram estatais e o resultado da execução de políticas equivocadas como a da criação subsidiada de “campeões nacionais” via BNDES, além de outras aventuras estatistas.
Por exemplo, a construção da “supertele” a partir da Telemar, o provável embrião do retorno da Telebras como empresa de economia mista, mas que resultou na Oi, uma das maiores falências do mercado. Como entre os caloteados estão os de sempre — bancos estatais e fundos de pensão de empresas públicas, área cativa de influência do braço sindical petista, a CUT —, cedo ou tarde este e outros rombos deixados de herança pelo lulopetismo baterão às portas do Tesouro.
Mas há também outra despesa enorme contratada em nome do Tesouro: a criação desbragada de estatais, muitas dependentes do sobrecarregado Tesouro Nacional, para sobreviver e continuar a empregar companheiros e apaniguados em geral.
Pesquisa feita pelo Instituto Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, contabilizou, entre 2003, primeiro ano do governo Lula, e 2015, antes do afastamento de Dilma do Planalto, a criação de 41 estatais, segundo o jornal “Valor”.
No período, excluindo empresas do ramo financeiro, este conjunto de companhias gerou um prejuízo acumulado de R$ 8 bilhões. Para se comparar, são dois bilhões a mais que a primeira baixa feita pela Petrobras, em balanço, devido aos desfalques que sofreu do esquema lulopetista que assaltou a companhia. Também no período, elas pagaram, ao todo, R$ 5,5 bilhões em salários, quase tanto quanto o prejuízo.
A composição desse conjunto de empresas é variada. Há uma fábrica de semicondutores instalada no Rio Grande do Sul, e uma subsidiária da Petrobras, criada para produzir álcool e biodiesel, mas que produz mesmo é prejuízo. O mesmo ocorre com a Cietec, de Porto Alegre, destinada a produzir chips para o rastreamento bovino e identificação de veículos.
Uma das joias dessa coroa de estatais é a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), destinada a absorver tecnologia de trem-bala e executar o projeto da ligação de alta velocidade de Rio a São Paulo. Delirante desde o início, a ideia, como muitas outras, gerou apenas prejuízos e não projetou sequer um dormente. A EPL foi congelada, mas o governo Temer pensa em ativá-la para atuar no programa de parcerias público-privadas em projetos de infraestrutura. Isso teria de ser debatido.
A debacle do projeto do PT está exposta na crise econômica, no impeachment, mas também na criação desvairada de estatais, onde se vê a marca da ideologia dirigista do lulopetismo. E também no seu resultado: empreguismo e prejuízos pesados para o contribuinte.
ESTADÃO - 19/08
Na fábula de Esopo, depois de muito estrondo a montanha pariu um rato. Dilma Rousseff repetiu a proeza com a divulgação da “mensagem” com a qual pretende convencer de sua inocência o mundo
Na fábula de Esopo, depois de muito estrondo a montanha pariu um rato. Dilma Rousseff repetiu a proeza com a divulgação da “mensagem” com a qual pretende convencer de sua inocência o mundo e especialmente os senadores que vão decidir sobre o impeachment no fim do mês. Mas, depois de tanta hesitação, Dilma acabou escolhendo um mau momento para falar de inocência e se apresentar, mais uma vez, como uma mulher honesta, pois, simultaneamente, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o Ministério Público a abrir inquérito contra ela, o ex-presidente Lula, os ex-ministros Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo e dois ministros do STJ, destinado a investigar a tentativa de obstrução da Justiça no âmbito da Operação Lava Jato.
Na mensagem lida no Palácio da Alvorada, a presidente afastada reitera, candidamente, seu “compromisso com a democracia e com a necessidade da “superação do impasse político que tantos prejuízos já causou ao País”. Parecia estar falando de um outro país e de outra pessoa que não ela, cuja biografia revela total falta de compromisso com a democracia e a proeza de ter arruinado o Brasil. Finalmente, fez um apelo patético a seus julgadores: “Não se faça a injustiça de me condenar por um crime que não cometi”. A uma plateia de jornalistas a quem proibiu de fazer perguntas, Dilma repetiu a necessidade de “diálogo”, defendeu um plebiscito e a delirante ideia da antecipação das eleições presidenciais. Distanciou-se assim, ainda mais, da Nação e até da posição oficial do PT. Promete, agora, comparecer ao Senado para defender-se pessoalmente.
O melancólico evento mostrou ao País exatamente a mesma Dilma cujos defeitos seis anos na Presidência da República só fizeram acentuar: a arrogância, a teimosia, a hipocrisia mal disfarçada na tentativa de parecer humilde, a falta de senso crítico que a impede de se ver como responsável por erros e omissões graves cometidos no catastrófico exercício da Presidência da República. Quando, logo nas primeiras linhas, menciona o “impasse político que tantos prejuízos causou ao País”, fala sobre sujeito indeterminado para não ter que admitir o seu autoritarismo empedernido que envenenou as relações do Executivo com o Legislativo e, depois, com toda a Nação.
O argumento central da defesa de Dilma no processo de impeachment, por ela insistentemente repetido na tal carta, é o de que, como presidente da República, não cometeu nenhum crime de responsabilidade e não pode ser julgada pelo “conjunto da obra”. O julgamento do impeachment pelo Parlamento, no entanto, é essencialmente político, sustentado pela comprovação jurídica do crime de responsabilidade. No caso de Dilma o crime de responsabilidade foi reconhecido, por ampla maioria de deputados e senadores, nas votações de admissibilidade do processo.
A defesa tem, é claro, o direito de alegar que não houve crime e tentar provar isso. Cabe aos jurados, no caso os senadores, em sessão presidida pelo chefe do Poder Judiciário, decidir pela culpa ou pela absolvição. Trata-se, portanto, não de um golpe, mas de um procedimento público – na verdade, escancarado – regido pela Constituição e pelas leis e que segue rito determinado pelo Poder Judiciário.
Mas esse está sendo um julgamento essencialmente político, alega Dilma. É claro que é, pois se refere a um crime de responsabilidade. Os crimes de responsabilidades imputados à presidente são inexpressivos, protestam os dilmistas. As pedaladas fiscais e a liberação de recursos sem autorização prévia do Congresso objetos do processo não são fatos isolados nem corriqueiros. Foram violações flagrantes da lei que constituem, na verdade, o modus operandide um governo autoritário que desprezava o papel constitucional e as finalidades precípuas do Parlamento como órgão da soberania nacional e de representação do povo.
A patética manifestação epistolar de Dilma Rousseff é um conjunto de frases feitas, tiradas retóricas, expressões piegas. De platitudes e obviedades que inevitavelmente assomam em discursos políticos que, por falta de conteúdo fático e genuinamente programático, abusam de falsidades demagógicas na tentativa de conquistar o ouvinte pela emoção. Mas a paciência do povo brasileiro com o ilusionismo lulopetista está esgotada.