quinta-feira, janeiro 28, 2016

Corrupção pornográfica - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 28/01

A Polícia Federal já é conhecida pela criatividade com que nomeia suas operações. Às vezes manda recados, como na Operação "Erga omnes" (Vale para todos), em que prendeu os presidentes das maiores empreiteiras, incluindo Marcelo Odebrecht; ou adverte, como na Nessun Dorma (Ninguém Durma) da ópera Turandot de Puccini.

A ironia estava presente na Operação "Que País é esse?" exclamação do ex-diretor da Petrobras Renato Duque ao ser preso, ou na Operação Passe Livre, que prendeu o amigo de Lula José Carlos Bumlai, que tinha passe livre no Palácio do Planalto.

Nada mais bem aplicado, porém, quanto o nome dado para a 22? operação, a Triplo X, que tanto pode ser lido como uma referência ao triplex atribuído a Lula no Edifício Solaris, quanto à classificação dos filmes de pornografia pesada. Porque nada mais pornográfico do que esse escândalo dentro do escândalo envolvendo a Bancoop, denunciado no GLOBO pelo repórter Germano Oliveira, e que Lula tentou parar na Justiça, tendo sido derrotado em seu intento.

Uma cooperativa de trabalhadores presidida primeiro por Ricardo Berzoini e depois por João Vaccari Neto, a alta direção do PT, que quebrou devido à corrupção e deixou literalmente abandonadas mais de 3 mil pessoas que haviam colocado suas economias na arapuca desses sindicalistas que sempre trabalharam em proveito próprio.

Fundada em 1996 pelo ex-presidente do PT e atual ministro da Secretaria de Governo da Presidência Ricardo Berzoini, a cooperativa dos bancários é investigada pelo Ministério Público de São Paulo desde 2007, por crimes de lavagem de dinheiro, com desvio de recursos para o caixa dois do Partido dos Trabalhadores, que controla a máquina sindical dos bancários.

Os fundos de pensão controlados também por representantes do PT perderam muito dinheiro investindo na Bancoop, até que a empreiteira OAS assumiu o empreendimento a pedido de Lula, segundo denúncias que estão sendo apuradas. O fato é que apenas o edifício Solaris foi terminado, coincidentemente onde Lula e dona Marisa tinham apartamento, também João Vaccari Neto, parentes seus, e até Freud Godoy, ex-segurança de Lula envolvido no escândalo dos aloprados.

O triplex de Lula, o 164 - A, foi incluído pela Polícia Federal entre os imóveis com "alto grau de suspeita quanto à sua real titularidade". As investigações já realizadas pela força-tarefa de Curitiba e também pelo Ministério Público de São Paulo indicam, segundo relatório oficial, que "manobras financeiras e comerciais complexas envolvendo a empreiteira OAS, a cooperativa Bancoop e pessoas vinculadas a esta última e ao Partido dos Trabalhadores apontam que unidades do condomínio Solaris podem ter sido repassadas a título de propina pela OAS em troca de benesses junto aos contratos da Petrobras"

O Ministério Público do Estado de São Paulo considera que já tem provas suficientes para denunciar o ex-presidente Lula e sua mulher, dona Marisa, por ocultação de propriedade, e não é coincidência que a Operação Lava-Jato tenha chegado ao estágio em que chegou justamente na semana em que o Ministério Público de São Paulo anunciou sua decisão. As duas investigações estão sendo compartilhadas.

O promotor de Justiça de São Paulo Cássio Conse-rino foi apenas menos cauteloso que os procuradores da Lava-Jato, que ontem somente incluíram o apartamento atribuído a Lula na investigação quando perguntados diretamente, e mesmo assim deixando claro que todas as unidades que teoricamente pertencem à OAS serão investigadas.

Os promotores paulistas já têm depoimentos de pessoas que estiveram com o ex-presidente e sua família durante a reforma do apartamento, financiada pela OAS, e sabem até mesmo, como o site "O Antagonista" revelou, onde as cozinhas foram compradas, por quem, e quanto custaram, possibilitando um interessante cruzamento com um sítio em Atibaia que também é dito pertencer a Lula, mas está no nome de outros proprietários, provavelmente laranjas. As mesmas cozinhas foram compradas na mesma loja, pela mesma pessoa, ligada à OAS, no mesmo dia.

Explicações de Lula sobre triplex não têm nexo - JOSIAS DE SOUZA

BLOG DO JOSIAS DE SOUZA - 28/01

A deflagração da 22ª fase da Lava Jato deixou Lula irritado. Em nota, ele reclamou da “tentativa de envolver seu nome em atos ilícitos.” O problema é simples de resolver. Se não quiser ser importunado, basta que o ex-presidente demonstre que não é o dono do triplex número 164 A, do edifício Solaris, no Guarujá. Sua assessoria já tentou várias vezes desvincular Lula do imóvel. Mas falta às explicações oficiais algo essencial: nexo.

Batizada de Triplo X, a nova fase da Lava Jato apura a suspeita de que a empreiteira OAS usou apartamentos do agora célebre edifício do Guarujá para camuflar o pagamento de propinas extraídas da Petrobras. Entre eles o triplex que Lula diz não possuir. Vão abaixo as perguntas que o morubixaba do PT já poderia ter respondido:


1. Por que a assessoria de Lula admitiu que ele era o dono do triplex do Guarujá em dezembro de 2014?

Em notícia veiculada no dia 7 daquele mês, o repórter Germano Oliveira informou: a Bancoop, Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo, que deixara cerca de 3 mil pessoas na mão por causa de fraudes atribuídas ao seu ex-presidente, João Vaccari Neto, entregara a Lula o triplex do Guarujá. Com a falência da cooperativa, a OAS assumira as obras.

O edifício ficara pronto em dezembro de 2013. Mas o apartamento de Lula recebera um trato especial. Coisa fina. Antes unidos apenas por uma escada interna, os três andares foram atravessados por um elevador privativo. O piso ganhou revestimento de porcelanato. E a cobertura foi equipada com um ‘espaço gourmet’, ao lado da piscina.

Ouvida nessa época, a assessoria de Lula declarou: “O ex-presidente informou que o imóvel, adquirido ainda na planta, e pago em prestações ao longo de anos, consta na sua declaração pública de bens como candidato em 2006.” Candidato à reeleição naquele ano, o então presidente Lula de fato havia informado à Justiça Eleitoral que repassara à Bancoop R$ 47.695,38, uma cifra que não ornava com o valor de um triplex.

2. Por que a assessoria de Lula mudou a versão sobre a posse do triplex cinco dias depois de reconhecer que o imóvel pertencia a Lula?

Sob os efeitos da repercussão negativa da notícia segundo a qual Lula tornara-se o feliz proprietário de um triplex à beira mar, na praia de Astúrias, uma das mais elitizadas do litoral paulista, o Instituto Lula divulgou, em 12 de dezembro de 2014, uma “nota sobre o suposto apartamento de Lula no Guarujá.”

Primeiro, o texto cuidou de retirar a encrenca dos ombros de Lula. Anotou que foi a mulher dele, Marisa Letícia, quem “adquiriu, em 2005, uma cota de participação da Bancoop, quitada em 2010, referente a um apartamento.” A previsão de entrega era 2007. Em 2009, com as obras ainda inacabadas, os cooperados “decidiram transferir a conclusão do empreedimento à OAS.”

O prédio ficou pronto em 2013. Os cooperados puderam optar entre pedir o dinheiro de volta ou escolher um apartamento. “À época, dona Marisa não optou por nenhuma destas alternativas”, escreveu o Instituto Lula. “Como este processo está sendo finalizado, ela agora avalia se optará pelo ressarcimento do montante pago ou pela aquisição de algum apartamento, caso ainda haja unidades disponíveis.” Nessa versão, a família Lula da Silva estava em cima do muro.

3. Por que a mulher de Lula pegou as chaves de um apartamento que dizia não lhe pertencer?

Em 17 de dezembro de 2015, cinco dias depois da nota em que o Instituto Lula alegara que Marisa Letícia ainda hesitava entre requerer o dinheiro investido na Bancoop ou escolher um apartamento no edifício Solaris, moradores do prédio informaram ao repórter Germano Oliveira que a mulher de Lula apanhara as chaves do triplex número 164 A havia mais de seis meses, em 5 de junho. “Todos pegamos as chaves no dia 5 de junho, inclusive dona Marisa”, disse, por exemplo, Lenir de Almeida Marques, mulher de Heitor Gushiken, primo do amigo de Lula e ex-ministro Luiz Gushiken, morto em 2013.

4. Por que Marisa Letícia demorou seis anos para decidir se queria ou não o apartamento do Guarujá?

Só em 8 de novembro de 2015 veio à luz a notícia sobre a decisão da mulher de Lula acerca do apartamento do edifício Solaris. Nessa data, o repórter Flávio Ferreira informou que Marisa desistira do triplex. Os assessores de Lula esclareceram que ela acionaria seus advogados para reinvindicar a devolução do dinheiro que aplicara no empreendimento. Considerando-se que a OAS assumira as obras do edifício Solaris em 2009, a ex-primeira dama levou arrastados seis anos para decidir. Cooperados menos ilustres tiveram de decidir na lata, sob pena de perder o direito de exercer a opção de compra.

5. Por que Lula e sua mulher não divulgam os documentos da transação imobiliária e de sua rescisão?

Afora a declaração à Justiça Eleitoral, em que Lula informara o pagamento de R$ 47.695,38 à Bancoop até aquela data, não há documentos disponíveis sobre a transação imobiliária e seu distrato. Nenhum contrato, nenhuma rescisão. Nada de recibos. O Instituto Lula informou que Marisa realizou desembolsos até 2010. Quanto pagou? Isso ninguém informa. Tampouco veio à luz uma petição qualquer na qual os advogados da família Lula da Silva reivindiquem a devolução do numerário.

6. Por que Lula, Marisa e Lulinha, primogênito do casal, inspecionaram as obras de reforma do triplex?

Inquérito conduzido pelo Ministério Público de São Paulo, sem vinculação com a Lava Jato, revelou indícios de que o triplex do Guarujá integra o patrimônio oculto do casal Lula e Marisa. Eles seriam os proprietários escondidos atrás da logomarca da OAS. Ouviram-se no inquérito uma dezena de testemunhas.

Chama-se Armando Dagre Magri uma das testemunhas. É dono da Talento Construtora. Contou à Promotoria que a OAS contratou sua empresa para reformar o triplex número 164 A. Orçou a obra em R$ 777 mil. Realizou o serviço entre abril e setembro de 2014. Não esteve com Lula. Mas avistou-se com Marisa. Estava reunido no apartamento com um representante da OAS quando, subitamente, a mulher de Lula deu as caras. Estava acompanhada de três pessoas. Descobriria depois que eram o filho Fábio Luís, o Lulinha, um engenheiro da OAS e ninguém menos que o dono da empreiteira, Léo Pinheiro, hoje condenado a 16 anos de cadeia na Lava Jato. Inspecionaram a reforma, atestaram sua conclusão e deram a obra por encerrada.

Zelador do prédio desde 2013, José Afonso Pinheiro relatou ao Ministério Público que Lula também inspecionou as obras do triplex. Esteve no apartamento, por exemplo, no dia da instalação do elevador privativo. Contou que a OAS limpava o prédio, ornamentando-o com flores, nos dias de visita de Marisa. Uma porteira do edifício disse à Promotoria ter visto Lula e Marisa juntos no local em fins de 2013. Em suas notas oficiais, o Instituto Lula não explica o inusitado interesse pela reforma de um imóvel cuja propriedade o casal nega.

7. Por que a OAS devolveria dinheiro à família Lula da Silva depois de ter borrifado R$ 777 mil apenas na reforama do triplex?

Levado ao ar pelo Jornal Nacional, na noite desta quinta-feira, o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, reiterou: “Esse imóvel não é do ex-presidente Lula e de nenhum parente do ex-presidente Lula. A família do ex-presidente Lula comprou uma cota de um projeto da Bancoop. É só isso que existe. Ele pagou essa cota. Essa cota está declarada no imposto de renda do ex-presidente Lula.”

Inquirido a respeito da reforma feita pela OAS, sob supervisão de Marisa Letícia, o doutor absteve-se de responder. Poderia ter dito, enfaticamente: Lula, Marisa e o filho do casal jamais inspecionaram reforma do predio do Guarujá. O doutor preferiu tergiversar: “Eu não tenho a menor ideia porque houve uma reforma e quem fez esta reforma. Simplesmente porque este imóvel não é do ex-presidente Lula ou de qualquer parente do ex-presidente Lula. O ex-presidente Lula tinha uma cota de um projeto da Bancoop e depois, quando este projeto foi transferido para uma outra empresa, ele tinha duas opções: pedir o resgate da cota ou usar a cota para a compra dum imóvel no edifício Solaris. E ele fez a opção, a família fez a opção, pelo resgate da cota.” De duas, uma: ou a OAS converteu-se de empreiteira em instituição de caridade ou alguém ficará no prejuízo. Ou, por outra, a Lava Jato içará à tona uma terceira versão, a verdadeira.

A nova (velha) matriz. Por R$ 1,50 - CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O GLOBO - 28/01

Tombini de novo foi surpreendido por cenário mundial adverso e resolveu suspender a alta de juros que vinha anunciando



Se não for uma frase de Mario Henrique Simonsen, deveria ter sido: “Uma experiência que dá errado várias vezes deve ser repetida até dar certo”.

Trata-se de mais uma daquela série de leis que Simonsen foi inventando para caracterizar a burrice brasileira, em particular, e da América Latina, em geral, no manejo das políticas econômicas.

Pois está acontecendo outra vez. O governo Dilma reapresenta a “nova (velha) matriz econômica”. As coincidências são notáveis, mas a repetição é bem mixuruca.

Em 2012, por exemplo, a presidente Dilma deu uma mexida para valer no setor elétrico e aplicou uma redução de 16% na conta de luz residencial e de 28% para a indústria.

Agora, o máximo que conseguiram foi cortar R$ 1,50 a cada 100kw/h consumidos.

E quer saber? Melhor assim. No ano passado, a conta de luz chegou a subir 80% em algumas regiões — 51% na média nacional — para cobrir os buracos causados nos balanços de geradoras e distribuidoras depois daquela baita redução forçada de 2012. Agora, uma derrubadinha de R$ 1,50 não deve causar tanto estrago, não é mesmo?

Na política de juros também não tem muito mais o que estragar. No final de 2011, o presidente do BC, Alexandre Tombini, alegou uma piora surpreendente no mundo para iniciar uma forte derrubada da taxa básica de juros. Digamos que foi uma coincidência especial entre essa avaliação e o objetivo que havia sido anunciado por Dilma — chegar a um juro real, descontada a inflação, de 2% ao ano. Tombini acabava de descobrir que isso era possível.

E lá se foi a taxa abaixo, até inéditos 7,25% nominais ao ano, 2% reais, também em 2012, período da queda da conta de luz.

E se a tarifa teve de subir de volta — para pagar o rombo do setor — também os juros precisaram voltar escada acima, correndo atrás de uma inflação que disparava. Chegaram a 14,25%, com inflação passando dos 10%.

Pois agora em janeiro, Tombini de novo foi surpreendido por um cenário mundial adverso e resolveu suspender a alta de juros que vinha anunciando e aplicando. Não deu para já iniciar a derrubada. Assim, a manutenção da taxa básica em 14,25% — ou seja, o não aumento — foi como o R$ 1,50 de queda na conta de luz.

Mesma coisa no quesito concessão de crédito. Como em 2011/12, o governo Dilma está anunciando a abertura de crédito nos bancos públicos para irrigar alguns setores da economia. Mas se lá atrás a conta era de centenas de bilhões de reais — só o BNDES recebeu R$ 500 bilhões do Tesouro — agora os volumes são quase uma mixaria. O governo fala em R$ 50 bilhões “novos” — de novo, na proporção do R$ 1,50 na conta de luz.

Reparem: mesmo quando quer fazer coisa errada, o governo tem pouco espaço. Ele quer voltar aos tempos da “nova (velha) matriz”. Mas topa com enormes limitações — recessão, juros na Lua, inflação idem, rombo nas contas públicas — causadas justamente pela ... tal matriz.

Simonsen tem razão mais uma vez.

MOSQUITO

O ministro da Saúde, Marcelo Castro, num acesso de lucidez, disse que o Brasil está perdendo a guerra contra o mosquito. O pessoal do Planalto ficou nervoso, não por estar perdendo a guerra, mas pelo fato de o ministro dizer isso.

Típico cacoete. O fato, a guerra contra o mosquito, não importa. Importa o que se fala disso. Daí o gosto pelo marketing, pelos anúncios oficiais.

Assim, o governo resolveu convocar produtores de repelentes a Brasília para saber se eles tinham mercadoria em quantidade suficiente para distribuir para 400 mil grávidas do Bolsa Família. Também precisava saber quanto custava. Deu prazo para os produtores responderem.

Para que a reunião? Não bastava destacar uns funcionários para ligar e perguntar?

Mas não. A sequencia vai no anúncio da reunião, anúncio do pedido, anúncio da cobrança e ... depois? Bom, depois vai ter orçamento, licitação, encomenda — e lá vai o mosquito ganhando a guerra.

E PODE?

Em São Paulo, o pessoal do Movimento Passe Livre, que luta contra o aumento da condução, tem feito pelo menos duas manifestações por semana, paralisando regiões importantes da cidade. Turma organizada. Tem até uma cartilha sobre como “travar” uma grande avenida.

Pelo jeito, não tem nada demais. As autoridades estaduais (tucanas) e as municipais (petistas) apenas tentam convencer os manifestantes a, pelo menos, dar o roteiro da manifestação; pode ser na hora mesmo do protesto.

Congestionamentos de quilômetros e horas paradas, gente perdendo hora no emprego, na escola, na ida ao hospital.

Qual o problema?

Nenhum. Aliás, é até coisa pequena. Reparem: depois de dois anos de investigação, com depoimentos de 300 testemunhas, a polícia paulista não conseguiu indiciar nenhum daqueles black blocs que destruíram ônibus, agências bancárias e concessionárias de automóveis nas manifestações de 2013/14.

O que queriam? Os caras estavam mascarados.

O fantasma Celso Daniel -ROGÉRIO GENTILE

Folha de SP - 28/02

Celso Daniel foi sequestrado no dia 18 de janeiro de 2002 quando voltava de um restaurante em carro blindado. O corpo do prefeito de Santo André foi achado cerca de 32 horas depois.

À época, Lula disse que o assassino queria "amedrontar" o PT. "Você [Daniel] não foi vítima do acaso. Possivelmente tem gente grossa por detrás disso", afirmou. Três anos depois, na Presidência, citando investigações policiais, Lula afirmou que o crime foi comum. "Não acredito em crime político em hipótese alguma."

O caso voltou a ser notícia com Marcos Valério, que, tentando reduzir as penas do mensalão, disse que o PT pediu em 2004 sua intermediação em um empréstimo.

O dinheiro seria repassado ao empresário Ronan Maria Pinto, que estaria chantageando Lula e Gilberto Carvalho com dados que ligariam o PT à morte do prefeito, o que Ronan nega. Valério disse ter recusado o pedido, mas que o pecuarista José Carlos Bumlai topou.

Preso pela Lava Jato, Bumlai confirmou que conseguiu um empréstimo de R$ 12 milhões junto ao banco Schahin em 2004 e que o valor foi destinado ao caixa dois do PT. Posteriormente, disse ter sabido que R$ 6 milhões seriam usados para calar um suposto chantagista

Salim Schahin, um dos acionistas do banco, por sua vez, afirmou aos investigadores que perdoou a dívida em troca de um contrato bilionário com a Petrobras. Contrato que, disse, foi obtido com aval de Lula.

Já o ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, disse que Lula deu-lhe um novo cargo, em 2008, na diretoria financeira da BR Distribuidora em reconhecimento pela ajuda que prestou ao contratar o Banco Schahin, quitando o empréstimo para o PT.

Lula tem razão ao reclamar das delações. Se é verdade o que ele diz, é vítima de um complô incrível, tantos são os testemunhos e os detalhes que se complementam. Se é verdade o que eles dizem, está numa enrascada. Nas duas situações, Lula não pode mesmo gostar da Lava Jato.

Uma alma desonesta - DEMETRIO MAGNOLI

O GLOBO - 28/01

Há muitas coisas incomuns nas atividades de Lula e nos negócios de seus filhos .

A melhor coisa do Brasil é Lula, segundo Lula. “Se tem uma coisa de que eu me orgulho neste país, é que não tem uma viva alma mais honesta do que eu”, confessou o ex-presidente a uma plateia de blogueiros aduladores. Na conversa, ninguém produziu uma tentativa de distinção entre honestidade pessoal e honestidade política. Mas são conceitos diferentes. No plano pessoal, o julgamento da honestidade de Lula não cabe a ele – e permanece em suspenso. No plano político, provavelmente “não tem uma viva alma” mais desonesta que ele “neste país”.

Um boneco de FHC com trajes de presidiário surgiu muitos anos atrás, carregado por sindicalistas da área de influência de Lula. O precedente não torna menos reprováveis os “pixulecos” que representam Lula em condições similares. Aquilo que, nos tempos de oposição, o PT classificava como parte da luta política legítima deve ser entendido como um elemento da degeneração sectária de nossa vida democrática. Lula é inocente até que, eventualmente, sua culpa seja provada no curso do devido processo legal. Mas, como disse Dilma Rousseff, o ex-presidente não está acima da lei e pode ser investigado, tanto quanto qualquer cidadão.

Não é, aparentemente, o que pensa o próprio Lula. Dias atrás, seu fiel escudeiro Gilberto Carvalho denunciou uma suposta “politização” das investigações que miram Lula e seus familiares. De acordo com ele, tudo não passaria de uma sórdida campanha destinada a impedir a “volta de Lula” no ano da graça de 2018. As declarações, altamente “politizadas”, implicam uma grave acusação contra o Ministério Público, que comanda as investigações, a Polícia Federal, que as conduz, e o Poder Judiciário, que as controla. Carvalho, a voz de Lula, está sugerindo que as três instituições operam segundo um ardiloso plano político-partidário. É uma alegação paralela à de Eduardo Cunha – e um sintoma de temor típico dos que têm algo a esconder.

Há muitas coisas incomuns nas atividades de Lula e nos negócios de seus filhos. Quando um ex-presidente que continua a exercer influência decisiva no governo profere palestras patrocinadas por empreiteiras condenadas no escândalo do petrolão e remuneradas em valores extraordinários, emerge uma natural desconfiança. Quando os negócios de um de seus filhos recebem impulso notável de uma empresa de telefonia beneficiada por alteração no marco regulatório decidida pelo governo de Lula, algo parece fora de lugar. Quando os negócios de outro filho se misturam aos de um lobista preso por corrupção, a coincidência solicita investigação. Lula é, pessoalmente, desonesto? A pergunta tornou-se razoável, mas uma resposta negativa carece de fundamento e, antes de um processo, deve ser marcada com a etiqueta da calúnia.

A imputação de desonestidade política, por outro lado, depende da opinião pública e, em certos casos, do Congresso, não dos tribunais. O tema pertence ao universo da ética e varia, no tempo e no espaço, ao sabor dos valores sociais hegemônicos. Nas repúblicas democráticas contemporâneas, a sujeição do Estado a interesses políticos particulares e o desvio de recursos públicos para fins partidários caracterizam a desonestidade política. Nesse sentido, Lula é uma alma desonesta.

As provas estão à vista de todos, a começar da “entrevista” concedida aos bajuladores. A existência de blogueiros chapa-branca não é um problema, mas seu financiamento com recursos de empresas estatais (a Petrobras, a Caixa, o Banco do Brasil, os Correios) infringe o princípio da impessoalidade da administração pública. A nomeação de diretores da Petrobras segundo critérios partidários, conduta defendida por Dilma, que está na raiz do petrolão, é uma forma de privatização do Estado. O uso da Petrobras como patrocinadora do Fórum Social Mundial, um encontro de ativistas de esquerda simpáticos ao PT, faz parte da mesma classe de práticas. Jaques Wagner nunca criticou tais iniciativas, mas reconheceu que o PT “se lambuzou” no poder. Lula chefiou a farra dos “lambuzados”, assegurando para si mesmo um lugar de honra no panteão de nossa “elite de 500 anos”.

“A curiosidade é condição necessária, até mesmo a primeira das condições, para todo trabalho intelectual ou científico”, escreveu Amós Oz, acrescentando que “em minha opinião a curiosidade é também uma virtude moral”. Uma face ainda mais relevante, se bem que menos evidente, da desonestidade política de Lula é seu esforço para, em nome de seus interesses políticos, abolir a curiosidade do debate público brasileiro. Lula instaurou um paradigma nefasto na linguagem política que consiste em retrucar a qualquer crítica por meio de uma acusação de preconceito dirigida ao crítico.

O argumento do interlocutor não interessa. Ele critica para reagir à ascensão ao poder de um pobre que conheceu a fome, de um operário metalúrgico filho de mãe analfabeta. Ou para contestar a competência da primeira mulher a chegar à Presidência. Ou, alternativamente, com a finalidade de sabotar as políticas de combate à pobreza, de inclusão dos negros ou de proteção aos índios. O crítico é intrinsecamente mau. Se não o for, está a serviço da elite, de ambições estrangeiras ou de ambas. A linguagem política lulista, um relevo inescapável na paisagem brasileira, espalhou-se tão rapidamente quanto a dengue, as obras superfaturadas e o vício do crack. O assassino de nossa curiosidade é uma alma desonesta.

Lula colhe os frutos da árvore que plantou e, metodicamente, irrigou. Os fabricantes de “pixulecos” aprenderam a lição de sectarismo que ele ensinou. Aceitaram a divisão do país segundo as linhas do ódio político. Chamam-no de “ladrão” e “bandido” para circundar o caminho difícil do argumento. No país do impropério, do grito e da palavra de ordem, identificaram a escada do sucesso. O principal legado do lulismo é essa espécie peculiar de devastação ambiental.

Os males da falta de lei - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 28/01

Depois de quase quatro meses de paralisação, os médicos peritos do INSS retornaram ao trabalho na segunda-feira à meia-boca. A categoria reivindica redução da jornada semanal de trabalho de 40 horas para 30 horas e reajuste salarial de 27,5% - hoje o piso é de R$ 11 mil e evolui para R$ 16 mil no último nível da carreira. Sem avanço nas negociações com o governo, os profissionais se mantêm em estado de greve, o que implica a não retomada plena da atividade.

Cerca de 2 milhões de trabalhadores (segundo o INSS, 1,3 milhão) foram prejudicados em relação aos benefícios previdenciários ou ao retorno à atividade profissional. A volta dos peritos, porém, pouco amenizou as dificuldades. O atendimento é seletivo. Tem prioridade quem precisa de atestado para retomar o trabalho. Pedidos de aposentadoria, auxílios-doença, entre outras urgências, ficam de lado.

O tempo de espera para requerer benefícios se multiplicou. Passou de 20 para 89 dias. Enquanto isso, a vida das pessoas vira nó cada vez mais apertado. Aposentadorias são adiadas. Pagamento de salário é interrompido. Obtenção de auxílio-maternidade não se concretiza. Atestado de acidentes de trabalho fica na fila de espera. Para o prejuízo causado aos trabalhadores não há reparação justa e merecida.

O abuso se deve, em grande parte, à não regulamentação do direito de greve dos servidores públicos, previsto na Carta de 1988. O projeto se arrasta há 26 anos no Congresso Nacional. No fim de 2014, a Comissão de Consolidação da Legislação Federal e Regulamentação da Constituição, composta por senadores e deputados, aprovou parecer final que contempla vasto conjunto de reivindicações dos sindicatos da categoria. Mas a última versão do relatório não foi levada à votação em 2015.

Regulamentar a paralisação dos servidores públicos é tarefa urgente do Congresso Nacional. Deve figurar na pauta da abertura da sessão legislativa em fevereiro. Procrastinar o cumprimento da tarefa tem duas consequências. De um lado, pune o cidadão, que fica privado de serviços necessários à normalidade do dia a dia. De outro, apequena o Legislativo, cuja função é legislar.

Sem fazê-lo, abdica da missão para a qual foi criado e abre espaço para que os outros poderes legislem. O Executivo, com medidas provisórias. O Judiciário, com decisões que seriam da alçada da Câmara e do Senado. É o que os brasileiros veem com indesejável frequência em questões polêmicas ou espinhosas. Entre elas, a união homoafetiva e o aborto de anencéfalos. A greve, vale lembrar, é direito legítimo do trabalhador. Mas precisa de regras.

Lula na mira - BERNARDO MELLO FRANCO

Folha de SP - 28/01

A 22ª fase da Lava Jato teve um alvo claro, embora não declarado. Os investigadores deram mais um passo na direção do ex-presidente Lula, que se descreveu na semana passada como a "viva alma mais honesta" do país.

A nova operação foi batizada de Triplo X, em referência explícita ao tríplex visitado pela família do petista em um edifício no Guarujá. O empreendimento pertence à construtora OAS, enrolada no petrolão.

Em relatório, a Polícia Federal apontou "alto grau de suspeita" sobre a titularidade de imóveis no prédio. "Há indicativos que um tríplex pertence a ele [Lula], mas temos de avançar na investigação", disse o delegado Igor Romário de Paula.

"Se houver um apartamento lá que esteja em seu nome [de Lula] ou que ele tenha negociado, vai ser investigado como todos os outros", emendou o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.

A posse do tríplex já era investigada pelo Ministério Público de São Paulo, que parece apostar corrida com a força-tarefa de Curitiba. Na semana passada, o promotor paulista Cássio Conserino anunciou que denunciará Lula por ocultação de patrimônio, embora ele ainda não tenha sido ouvido sobre o caso.

A defesa do ex-presidente diz que ele não é dono do tríplex. Afirma que sua mulher comprou uma cota do edifício, declarada à Receita, mas desistiu do negócio.

Aliados alegam que Lula é vítima de perseguição, em complô para afastá-lo da sucessão de 2018. A oposição sonha em vê-lo com roupa de presidiário, como o boneco inflável das manifestações contra o PT.

A ofensiva jurídica fez o ex-presidente perder a imagem de intocável. Nos últimos meses, ele suspendeu as palestras e teve que prestar depoimentos sobre três escândalos diferentes: o petrolão, a suposta compra de medidas provisórias e a teia política da Odebrecht. Pode ser que nenhuma acusação seja provada, mas o estrago político já está feito.

Sarna pra se coçar - JOSÉ SERRA

ESTADÃO - 28/01

Projeto de lei (PL) que tramita no Congresso permite, numa só tacada, o funcionamento de cassinos, bingos, até mesmo por vídeo, jogos eletrônicos e, por que não, o jogo do bicho, além das loterias já exploradas pelo governo. O governo Dilma anunciou que quer aprová-lo. A defesa dos supostos benefícios da medida, sem considerar custos, é ilustrativa da maneira apressada como se discutem políticas públicas em nosso país.

Quais os argumentos a favor da liberação geral dos jogos de azar? Primeiro, ela permitiria o controle daquilo que hoje corre solto na clandestinidade. Segundo, quem vai jogar no exterior ficaria por aqui. Terceiro, atividades acessórias ao jogo expandiriam empregos e impostos para os três níveis de governo. Quarto, o turismo interno e de estrangeiros bombaria. Por último, seriam fortalecidas políticas regionais de desenvolvimento.

O primeiro argumento é equivocado. A descriminalização sempre aumenta o consumo do que era proibido. Isso vale tanto para as drogas quanto para os jogos. Se estes já são um problema hoje, imaginem as proporções que assumiriam se o Executivo, nos termos desse projeto de lei, viesse a credenciar até 35 cassinos no País, no mínimo, um por Estado. Vou abordar mais de perto esta que é a mais emblemática das modalidades de exploração do jogo.

A fim de supostamente limitar a instalação de cassinos, o PL prevê que cada um seja acoplado a uma espécie de shopping center com serviços de hotelaria. Alguém duvida, no entanto, que às vésperas de votação importante no Congresso (nem precisa ser impeachment...) o governo acabaria cedendo à pressão de bancadas para autorizar mais este ou aquele cassino?

Quanto aos empregos, cabe a pergunta: de onde viria a receita dos cassinos? Evidentemente, do bolso dos jogadores, principalmente da classe média para baixo. Não haveria riqueza nova, apenas o desvio da renda já existente. As pessoas deixariam de gastar em outras coisas para perder seu dinheiro nas roletas e nos caça-níqueis. Ou seja, empregos gerados pelo jogo eliminariam outros, vinculados a outras atividades. O bem-estar das famílias dos jogadores diminuiria, assim como seu consumo e seus investimentos em saúde, educação ou na compra da casa própria. Perderiam as famílias e o País como um todo. Fato comprovado: a introdução dos cassinos em Atlantic City – que só perde em jogatina para Las Vegas – reduziu em 25% os empregos nos demais setores. Apenas em 1995 Illinois perdeu U$ 287 milhões no balanço de benefícios e malefícios econômicos causados pelos cassinos.

Quanto ao turismo, vamos ser francos: algum ricaço brasileiro vai deixar de perder dinheiro em Montecarlo ou Las Vegas para se expor a fiscais da Receita e concidadãos xeretas com suas câmeras nos cassinos verde-amarelos? E por que um ricaço estrangeiro trocaria sua rota de jogo do Hemisfério Norte pela que vai do Oiapoque ao Chuí?

Quanto às divisas, também não cabe ilusão: o jogo geraria déficits significativos. O setor é intensivo em importação de equipamentos especializados. Além disso, tenderia a ser controlado por estrangeiros. As promessas de receitas abundantes – e ilusórias – passam ao largo das despesas e perdas reais que o jogo vai provocar.

Embora o PL vede benefícios fiscais, é evidente que eles ocorrerão. Primeiro, porque há normas vigentes que criam essa possibilidade – até na Constituição, como no caso dos fundos regionais de desenvolvimento. Segundo, porque benefícios podem ser camuflados em concessões de terrenos e ofertas de infraestrutura pelo poder público. Terceiro, por causa da regra sem exceção de que o Executivo sempre abre exceções em vésperas de votações importantes.

De mais a mais, as despesas com segurança crescerão, pois as atividades de jogo tendem a estimular o crime e a articulação de redes de narcotráfico e lavagem de dinheiro. No Estado de Wisconsin, os crimes aumentaram 6,7% após a abertura dos cassinos. Segundo o Instituto Americano de Seguros, 40% dos crimes de colarinho branco nos Estados Unidos têm raízes no jogo. Entre 1977, quando os cassinos foram autorizados a operar fora de Las Vegas, e 1996 as taxas de criminalidade nos Estados Unidos, para seis de sete tipos de crimes violentos, cresceram.

Além disso, o vício do jogo cria seus dependentes, tal como o álcool e as drogas, e a assistência à massa de jogadores compulsivos também drenaria recursos. Em Iowa, em 1995, 5,4% da população tinha algum problema mais sério com o jogo, número três vezes maior do que antes da abertura dos barcos cassinos na região. Em Las Vegas, 8% da população adulta também tem problemas ligados ao jogo – faltam ao serviço para jogar, gastam dinheiro do aluguel ou cometem algum tipo de fraude para prosseguir jogando. Em New Jersey, um serviço público telefônico recebeu, em 1996, 26 mil chamadas de jogadores desesperados por dívidas. Atrás dessas dívidas vêm perda de produtividade e desfalques. Muitos jogadores param de pagar impostos. Em 1990, esses efeitos provocaram prejuízos de US$ 1,5 bilhão ao Estado de Maryland.

A essas evidências sobre os Estados Unidos se somam as inferências que podemos fazer com base na praxe das decisões públicas no Brasil. A permissão ampla, geral e irrestrita de jogos de azar exige um debate bem informado, que pondere cuidadosamente custos e benefícios. Se essa prática já é escassa entre nós, imagine-se o atropelo dos fatos e da lógica se uma decisão for tomada no atual ambiente de salve-se quem puder, com o governo Dilma e sua base acossados por depressão econômica, desemprego avassalador, retrocesso das políticas sociais, a começar pela saúde, pela insegurança em relação ao crime e pelos grandes escândalos administrativos. É procurar sarna pra se coçar.


Lula cada vez mais cercado - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

Gazeta do Povo - PR - 28/01

No mesmo dia em que um relatório da Transparência Internacional mostra o Brasil em 76.º lugar no ranking de percepção da corrupção, a Operação Lava Jato deflagrou sua 22.ª fase, cumprindo seis mandados de prisão temporária, dois de condução coercitiva e 15 de busca e apreensão. Esta nova etapa da operação vai fechando o cerco sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e deve causar mais desconforto ao PT.

A força-tarefa da Lava Jato suspeita que apartamentos de luxo podem ter sido repassados como forma de pagamento de propina, por meio de manobras financeiras e comerciais envolvendo a empreiteira OAS, a cooperativa Bancoop – que já foi presidida pelo ex-tesoureiro do PT João Vacari Neto – e o PT. Entre os oito apartamentos investigados, “com alto grau de suspeita”, está um tríplex ligado ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Até o momento, segundo os investigadores, não há provas materiais contra o ex-presidente. Mas a situação pode mudar quando os investigadores se debruçarem sobre os documentos apreendidos nesta nova fase.

Toda essa situação tem tirado Lula do normal estado de equilíbrio. No fim de semana, seus advogados disseram estar estudando medidas judiciais contra o promotor paulista Cassio Conserino, que investiga o tríplex ligado ao ex-presidente no Guarujá (litoral paulista) e que disse ter indícios suficientes para apresentar denúncia contra Lula por lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.

Curiosamente, na semana passada, Lula recebeu blogueiros chapa-branca no instituto que leva seu nome para uma entrevista que mais parecia uma defesa antecipada. Disse que iria processar todos aqueles que, em seu entendimento, o estão difamando. Mas foi além. O ex-presidente praticamente canonizou a si próprio, cascateando não haver “uma viva alma mais honesta” que ele no país. O discurso de Lula parecia incompreensível. Mas, lido agora, em retrospecto, começa a fazer sentido.

Passa a ser compreensível também outra declaração de Lula na ocasião. Numa crítica à Lava Jato, teve o disparate de afirmar que hoje a violação de direitos humanos seria muito pior que na ditadura. Diferentemente do que declara Lula, as descobertas feitas pela força-tarefa da Lava Jato têm sido cruciais para romper com o sistema corrupto que seu partido ajudou a consolidar. Foi inclusive o escândalo da Petrobras que fez o Brasil cair sete postos no ranking de percepção de corrupção, que inclui 168 países e foi divulgado na quarta-feira pela Transparência Internacional. Nesse sentido, a queda do país no ranking não é uma má notícia, e sim um ponto de ruptura no combate à corrupção e na forma como o aparato judicial se comporta perante ela.

As críticas do ex-presidente aos procedimentos usados pela força-tarefa em nada têm relação com a defesa de valores republicanos e democráticos. Lula se mostra mais preocupado em desqualificar investigações contra si e contra companheiros – numa tentativa já exaurida de manter sobre si uma aura de santidade e, sobre PT, o papel de vítima – que com a defesa do Estado Democrático de Direito.

Diálogo para boi dormir - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 28/01

A presidente Dilma Rousseff passou o primeiro mandato inteiro menosprezando qualquer opinião que não fosse a sua, impondo ao País, sem dar ouvidos a ninguém, uma política econômica desastrosa, cujos efeitos daninhos dificilmente serão revertidos sem um imenso esforço nacional a ser empreendido quando sua ruinosa gestão acabar. Afinal, dia após dia, ela demonstrou não ser capaz de fazer o que a hora exige. Nesses anos todos, ademais, a presidente demonizou sistematicamente a oposição, atribuindo-lhe intenções perversas contra os trabalhadores e contra as trombeteadas conquistas sociais proporcionadas pelo lulopetismo. Agora, no momento em que o projeto delirante de Dilma e do PT está sendo atropelado pela dura realidade dos fatos, num fracasso tão esmagador que nem mesmo a competente máquina de propaganda petista é capaz de negar, a presidente mandou espalhar que gostaria de “conversar” com a oposição.

Que “conversa”, senão a que faz o boi dormir, pode querer uma presidente que, a todo momento, chama os opositores de “golpistas”? Que pode querer Dilma com esse “diálogo” senão um sócio para dividir a responsabilidade pelas medidas impopulares que ela inevitavelmente terá de adotar para amenizar os danos de sua trágica administração? Seu apelo à oposição tem o mesmo valor que suas promessas de campanha – serve somente para enganar os incautos.

Não é de hoje que Dilma tenta posar de estadista. No primeiro discurso após a reeleição, conquistada numa campanha eivada de mentiras contra seus adversários, a petista se disse “disposta ao diálogo”, algo que, segundo ela, faz parte de uma “democracia madura”. Para perceber o embuste daquele pronunciamento, nem é preciso notar que Dilma cometeu a indelicadeza de não mencionar, em nenhum momento, o candidato derrotado Aécio Neves (PSDB-MG), que havia obtido expressivos 51 milhões de votos e que lhe teria telefonado para felicitá-la pela vitória. Basta lembrar que, até aquele momento, as maiores críticas sobre a indisposição de Dilma ao diálogo partiam de sua própria base de apoio no Congresso.

Mais recentemente, os assessores de Dilma divulgaram que a presidente perguntou a seu vice, Michel Temer, o que ele achava da ideia de convidar a oposição para discutir soluções para os problemas do País. Também espalharam que o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, havia sido incumbido pela petista de convencer a bancada oposicionista no Congresso a aprovar as medidas que ela considera necessárias para debelar a crise.

Foi com esse ímpeto conciliador, tão autêntico quanto uma nota de três reais, que Dilma, numa entrevista à Folha de S.Paulo (23/1), voltou a dizer que espera conversar com a oposição e enfatizou que “é impossível ter uma democracia madura se não pudermos discutir alguns assuntos em comum”.

De fato, democracias são “maduras”, para usar a expressão de Dilma, quando, do embate de ideias, surgem consensos que são transformados em políticas de Estado. Esse cotejo só se realiza e dá bons frutos se houver genuíno desejo de colaboração, ainda que dentro da luta pelo poder. Não é o caso de Dilma e muito menos é o de seu partido, o PT.

Há décadas o PT é o exemplo mais bem acabado de partido que boicota qualquer tentativa de diálogo. Sua trajetória demonstra profunda indisposição para colaborar com projetos que não sejam de sua lavra. É uma legenda conduzida por uma ideologia prepotente, que de saída despreza o contraditório, pois julga ter o monopólio da verdade.

Quando seus interesses ou planos são contrariados, o PT não se vexa nem mesmo de boicotar o governo cuja presidente é sua filiada. Na mais recente resolução de sua Executiva Nacional, a cúpula petista avisou a Dilma que “o Partido dos Trabalhadores somente apoiará soluções que sejam negociadas e pactuadas com o sindicalismo, as organizações populares e os movimentos sociais”.

Portanto, mesmo que realmente quisesse dialogar, Dilma teria problemas não com a oposição, que tenta articular seu impeachment e dificultar-lhe a vida no Congresso, mas sim com seu próprio partido – que chantageia a presidente e, de olho nas urnas, está a um passo de tratá-la como adversária.