ESTADÃO - 12/01
Toda vez que assume um novo ministro da Fazenda, ele acena com reformas, inclusive a previdenciária e a trabalhista. Não foi diferente com Nelson Barbosa. Os jornais estamparam a sua vontade de instituir a idade mínima de 65 anos para a aposentadoria e fortalecer o papel da negociação coletiva, dando às empresas e aos sindicatos laborais a liberdade para estabelecer regras diferentes da lei.
Se aprovadas, essas duas medidas dariam muito fôlego à economia do País. A primeira (idade mínima) teria efeitos futuros. Porém os agentes econômicos sentiriam maior segurança ao saber que dentro de 5 ou 10 anos as contas da Previdência Social começariam a se equilibrar, evitando, assim, os grandes aportes de recursos que o Tesouro Nacional vem sendo forçado a liberar para pagar os compromissos com os aposentados e pensionistas dos setores público e privado.
A segunda medida (fortalecimento da negociação) tem um efeito imediato, pois empregados e empregadores, por meio de seus sindicatos, buscariam contornar os danos da atual recessão, oferecendo soluções criativas para o emprego e a remuneração dos trabalhadores e desenhando formas de elevar a produtividade.
O tema vem sendo discutido há vários anos. Alguns se referem à prevalência do negociado sobre o legislado. Francamente, não gosto da expressão. Penso que nada pode se sobrepor à lei. O que os países avançados fazem nesse campo é tornar o negociado tão forte quanto a lei. Ou seja, as regras estabelecidas pelas partes têm de ser obedecidas como se obedecem às leis. Mas, quando há desvios, as desavenças são dirimidas pelos mecanismos de conciliação, mediação e arbitragem – e não na Justiça do Trabalho, que, como se sabe, é especializada em fazer o cumprimento de leis aprovadas pelo Poder Legislativo. No caso em tela, as regras não decorrem de leis.
Com isso, o Brasil daria dois passos importantes no campo trabalhista. Instituiria um sistema responsável de negociação coletiva e usaria mecanismos mais expeditos e menos traumáticos de resolução de conflitos.
É interessante notar que as duas medidas estiveram muito próximas de serem aprovadas. A Comissão Especial, ao tratar da MP 680, que criou o Programa de Proteção ao Emprego, aprovou em outubro de 2014 o que o ministro Nelson Barbosa está querendo fazer agora, ou seja, a equivalência do negociado ao legislado.
No mesmo ano, o Congresso Nacional aprovou o uso da arbitragem trabalhista no Brasil, ampliando, assim, o âmbito daquele instituto que vigora desde 1996, quando foi sancionada a Lei 9.307.
Nos dois casos, “a bola bateu na trave”. Isso porque o relatório da Comissão Especial da MP 680 não foi aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados. Uma pena. Mais triste foi receber o veto do presidente em exercício, Michel Temer, ao projeto de lei da arbitragem trabalhista aprovado depois de prolongadas e cuidadosas discussões no Congresso Nacional.
Os dois assuntos merecem ser retomados e com urgência. Para os que atacam a valorização do negociado sob o argumento de que muitos sindicatos laborais ainda são fracos e podem ser cooptados a aprovar o que é prejudicial aos trabalhadores, é bom lembrar que a medida aprovada pela Comissão Especial tinha caráter voluntário e mantinha imutáveis os princípios da Constituição federal e as normas de segurança do trabalho. Havendo discordância, bastaria ao empregado dizer ao seu sindicato que preferia continuar com as regras da lei, e não dos contratos coletivos. Nada seria imposto.
No caso da arbitragem trabalhista, o Congresso foi igualmente sábio ao dar a esse mecanismo um caráter voluntário e restringindo a sua utilização apenas para dirimir questões de ocupantes de cargos altos da estrutura das empresas (gerentes, diretores, conselheiros, etc.).
Ou seja, é possível avançar com segurança nas áreas previdenciária e trabalhista.
terça-feira, janeiro 12, 2016
A santa aliança contra a Lava-Jato CARLOS ALBERTO TORRES
CORREIO BRAZILIENSE - 12/01
A sociedade brasileira, pouco a pouco, vai compreendendo quem são e como reagem os que temem a Operação Lava-Jato. Contra ela se levanta, tacitamente, uma poderosa "santa aliança", que é necessário reconhecer e denunciar.
Essa aliança é poderosa, porque os implicados ocupam ou ocuparam os cargos mais altos e destacados da república, e estão presentes na vida política e empresarial. Ela é "santa" porque não é santa, nem ética; e, acima de qualquer matiz político-ideológico, o que os une é o seu temor à Lava-Jato. A maioria dos parlamentares nem sequer consegue esconder o seu desconforto diante dela. No Congresso Nacional, mesmo os que a apoiam se sentem constrangidos diante de seus pares! Duro dizê-lo, e ouvi-lo, não é verdade? Mas, essa é a realidade.
Os implicados têm muito a perder! Aqui, são patrimônios físicos e financeiros milionários obtidos em operações fraudulentas; ali, mandatos, biografias e relações de negócio construídos a golpes de esperteza e de ilegalidade, raramente conquistados pela capacitação, pelo mérito com o trabalho duro, ou pelo compromisso cidadão! Esses, até aqui, têm se beneficiado da notória tolerância com os criminosos de colarinho branco que assaltam a sociedade brasileira!
Mas, acostumados a escapar impunes, o que realmente os assusta é constatar a inexorabilidade do andamento das ações da justiça. A Lava Jato, que é o símbolo dessas ações, se converteu na mais importante e bem-sucedida operação anticorrupção da história da justiça brasileira. Basta ver o balanço concreto dos seus resultados. Desesperam-se, porque não tem sido mais suficiente a contratação de bons e caros advogados, um ingrediente do estado de direito, para impedir que as ações da justiça estejam expondo e punindo os seus crimes!
Como se chegou à Lava-Jato? Em primeiro lugar, ela representa um fenômeno novo de protagonismo da justiça na luta contra a impunidade dos crimes de colarinho branco, cujo suporte legal é a Constituição de 1988 e a evolução da legislação anticorrupção que a ela se seguiu. Em segundo lugar, porque surgiu uma nova geração de servidores da justiça, filhos legítimos da nova Constituição democrática, policiais federais, procuradores do MPF e juízes federais, dispostos a abraçar a missão da luta contra a impunidade. Eles são jovens e concursados, e o juiz Sérgio Moro simboliza a competência, firmeza e coragem de todo esse time. Poucas vezes, no Brasil, tantos deveram tanto a tão poucos!
Sem reticências, a Operação Lava-Jato está desnudando o papel da corrupção para financiar a conquista e a manutenção do poder político. Essa é a sua importância histórica! Em particular, após a chegada do PT ao poder em 2002, isso ficou mais claro com os fatos trazidos à luz pelo mensalão e pelo petrolão. Ficou evidenciada a existência de um sistema inovador, o da "corrupção estratégica", orientada por um projeto político, e por possuir um comando e planejamento centralizado para atingir os seus objetivos. Ela se diferencia da velha e conhecida "corrupção laissez faire", que não possui comando ou planejamento centralizado.
As ações da "santa aliança" contra a Lava Jato se revelam a cada dia. Para resumir, sem esgotar, tentam: (1) táticas de desmoralização, acusando-a de seletividade, de parcialidade, de "judicializar a política"etc., e colocam em dúvida a seriedade ética dos seus membros; (2) ameaças e intimidações veladas a seus membros e familiares; (3) fragilizar o aparato legal que sustenta as ações anticorrupção, como com o envio para o Congresso, no apagar das luzes de 2015, da MP nº 703, que visa diminuir a prerrogativa do ministério público de celebrar acordos de leniência, e dificultar o instituto da delação premiada; (4) diminuir os recursos para as operações anticorrupção, como aconteceu com a redução em cerca de R$ 100 milhões do orçamento de 2016 destinados à polícia federal.
O que intentam são "acordos por cima" para garantir a impunidade! Se isso acontecer, mais uma vez, serão lesados os interesses dos brasileiros. Estaríamos cegos a isso? A sociedade estaria indefesa? Não creio, a não ser que, com o seu silêncio, ela queira participar, também, dessa conspiração!
Existiria para a sociedade maior radicalidade democrática e republicana do que apoiar e garantir as ações anticorrupção da justiça, e a integridade da Lava-Jato, para construir, passo a passo, a cultura da intolerância contra a impunidade dos crimes de colarinho branco?
A sociedade brasileira, pouco a pouco, vai compreendendo quem são e como reagem os que temem a Operação Lava-Jato. Contra ela se levanta, tacitamente, uma poderosa "santa aliança", que é necessário reconhecer e denunciar.
Essa aliança é poderosa, porque os implicados ocupam ou ocuparam os cargos mais altos e destacados da república, e estão presentes na vida política e empresarial. Ela é "santa" porque não é santa, nem ética; e, acima de qualquer matiz político-ideológico, o que os une é o seu temor à Lava-Jato. A maioria dos parlamentares nem sequer consegue esconder o seu desconforto diante dela. No Congresso Nacional, mesmo os que a apoiam se sentem constrangidos diante de seus pares! Duro dizê-lo, e ouvi-lo, não é verdade? Mas, essa é a realidade.
Os implicados têm muito a perder! Aqui, são patrimônios físicos e financeiros milionários obtidos em operações fraudulentas; ali, mandatos, biografias e relações de negócio construídos a golpes de esperteza e de ilegalidade, raramente conquistados pela capacitação, pelo mérito com o trabalho duro, ou pelo compromisso cidadão! Esses, até aqui, têm se beneficiado da notória tolerância com os criminosos de colarinho branco que assaltam a sociedade brasileira!
Mas, acostumados a escapar impunes, o que realmente os assusta é constatar a inexorabilidade do andamento das ações da justiça. A Lava Jato, que é o símbolo dessas ações, se converteu na mais importante e bem-sucedida operação anticorrupção da história da justiça brasileira. Basta ver o balanço concreto dos seus resultados. Desesperam-se, porque não tem sido mais suficiente a contratação de bons e caros advogados, um ingrediente do estado de direito, para impedir que as ações da justiça estejam expondo e punindo os seus crimes!
Como se chegou à Lava-Jato? Em primeiro lugar, ela representa um fenômeno novo de protagonismo da justiça na luta contra a impunidade dos crimes de colarinho branco, cujo suporte legal é a Constituição de 1988 e a evolução da legislação anticorrupção que a ela se seguiu. Em segundo lugar, porque surgiu uma nova geração de servidores da justiça, filhos legítimos da nova Constituição democrática, policiais federais, procuradores do MPF e juízes federais, dispostos a abraçar a missão da luta contra a impunidade. Eles são jovens e concursados, e o juiz Sérgio Moro simboliza a competência, firmeza e coragem de todo esse time. Poucas vezes, no Brasil, tantos deveram tanto a tão poucos!
Sem reticências, a Operação Lava-Jato está desnudando o papel da corrupção para financiar a conquista e a manutenção do poder político. Essa é a sua importância histórica! Em particular, após a chegada do PT ao poder em 2002, isso ficou mais claro com os fatos trazidos à luz pelo mensalão e pelo petrolão. Ficou evidenciada a existência de um sistema inovador, o da "corrupção estratégica", orientada por um projeto político, e por possuir um comando e planejamento centralizado para atingir os seus objetivos. Ela se diferencia da velha e conhecida "corrupção laissez faire", que não possui comando ou planejamento centralizado.
As ações da "santa aliança" contra a Lava Jato se revelam a cada dia. Para resumir, sem esgotar, tentam: (1) táticas de desmoralização, acusando-a de seletividade, de parcialidade, de "judicializar a política"etc., e colocam em dúvida a seriedade ética dos seus membros; (2) ameaças e intimidações veladas a seus membros e familiares; (3) fragilizar o aparato legal que sustenta as ações anticorrupção, como com o envio para o Congresso, no apagar das luzes de 2015, da MP nº 703, que visa diminuir a prerrogativa do ministério público de celebrar acordos de leniência, e dificultar o instituto da delação premiada; (4) diminuir os recursos para as operações anticorrupção, como aconteceu com a redução em cerca de R$ 100 milhões do orçamento de 2016 destinados à polícia federal.
O que intentam são "acordos por cima" para garantir a impunidade! Se isso acontecer, mais uma vez, serão lesados os interesses dos brasileiros. Estaríamos cegos a isso? A sociedade estaria indefesa? Não creio, a não ser que, com o seu silêncio, ela queira participar, também, dessa conspiração!
Existiria para a sociedade maior radicalidade democrática e republicana do que apoiar e garantir as ações anticorrupção da justiça, e a integridade da Lava-Jato, para construir, passo a passo, a cultura da intolerância contra a impunidade dos crimes de colarinho branco?
CARLOS ALBERTO TORRES: Professor da Universidade de Brasília (UnB)
Do ministro à presidente - JOSÉ CASADO
O GLOBO - 12/01
Monteiro Neto está apenas ajudando a escrever um novo capítulo na biografia de Rousseff: a presidente que transformou o “conteúdo nacional” em “maquila paraguaya”
O desemprego avança nas cidades médias. Volta Redonda (RJ) e Cubatão (SP), por exemplo, estão na expectativa de seis mil demissões nos pátios da CSN e da Usiminas, dois dos maiores produtores de aço dopaís.
A indústria nacional completou cinco anos em declínio constante. Sua participação no conjunto da economia já equivale à do Brasil pré-industrial, na Segunda Guerra, indicam a Fundação Getúlio Vargas e a Federação das Indústrias de São Paulo em pesquisas recentes.
Nesse panorama de decadência precoce, as perdas são significativas e nocivas. Três décadas atrás, o setor industrial era responsável por 27% do total de empregos formais. Agora detém apenas 16% do mercado regido por leis trabalhistas, segundo o governo.
Por ironia da história, a queda do setor mais dinâmico da economia foi acelerada no governo de um ex-líder sindical, Lula, que apostou na valorização do real (em relação ao dólar) como instrumento de controle da inflação.
Dilma Rousseff ampliou a degradação ao tentar compensar os efeitos com extraordinária concessão de benesses do Estado a grupos industriais e agropecuários, privilegiados nas sombras da política eleitoral e partidária. Fez isso no embalo do samba-exaltação sobre o “conteúdo nacional”, que justificou preços 40% acima do padrão mundial num mercado cativo.
A montanha de dinheiro público transferida a cofres particulares, com rarefeita transparência e sem nada exigir em troca, supera gastos somados com os serviços de saúde pública.
O prêmio à ineficiência na produção local custou caro. Sequer garantiu a base de empregos, como demonstram Usiminas e a CSN, e, também, a indústria automobilística, onde são mais notáveis os laços de cumplicidade empresas-sindicatos na drenagem do Erário público.
Resultou no aumento das importações e criação de empregos no exterior, principalmente na China. Entre 2003 e 2014, por exemplo, foram criadas 1,4 mil empresas dedicadas à exportação. Nesse período, o
Brasil viu nascer 22 mil novas importadoras.
Estimulou-se a contínua diminuição do número de empregados nas fábricas brasileiras. Durante o ano passado, o setor industrial demitiu de 8,6 mil pessoas por semana.
Agora, o governo comanda a migração de indústrias e empregos do Brasil para o Paraguai. O ministro da Indústria, Armando de Queiroz Monteiro Neto, tem liderado expedições de empresários interessados nos incentivos paraguaios às “maquiladoras”.
Ali, o custo de mão de obra é 39% inferior ao do Brasil, a eletricidade é 64% mais barata, tem menos burocracia e o mercado preferencial é o brasileiro. Até dezembro, 42 empresas brasileiras atravessaram a fronteira, e o governo paraguaio recebeu mais de 400 consultas — Vale, JBS, Camargo Corrêa, Riachuelo, Bourbon, Eurofarma e Buddemeyer, entre outras.
É natural que empresas procurem maximizar lucros. Estranha é a liderança do ministro brasileiro na migração de indústrias e empregos além-fronteira. Sugere que o governo abdicou de resolver os problemas domésticos de custos de produção e de emprego.
Se assim for, Monteiro Neto está apenas ajudando a escrever um novo capítulo na biografia de Rousseff: a presidente que transformou o “conteúdo nacional” em “maquila paraguaya”.
Monteiro Neto está apenas ajudando a escrever um novo capítulo na biografia de Rousseff: a presidente que transformou o “conteúdo nacional” em “maquila paraguaya”
O desemprego avança nas cidades médias. Volta Redonda (RJ) e Cubatão (SP), por exemplo, estão na expectativa de seis mil demissões nos pátios da CSN e da Usiminas, dois dos maiores produtores de aço dopaís.
A indústria nacional completou cinco anos em declínio constante. Sua participação no conjunto da economia já equivale à do Brasil pré-industrial, na Segunda Guerra, indicam a Fundação Getúlio Vargas e a Federação das Indústrias de São Paulo em pesquisas recentes.
Nesse panorama de decadência precoce, as perdas são significativas e nocivas. Três décadas atrás, o setor industrial era responsável por 27% do total de empregos formais. Agora detém apenas 16% do mercado regido por leis trabalhistas, segundo o governo.
Por ironia da história, a queda do setor mais dinâmico da economia foi acelerada no governo de um ex-líder sindical, Lula, que apostou na valorização do real (em relação ao dólar) como instrumento de controle da inflação.
Dilma Rousseff ampliou a degradação ao tentar compensar os efeitos com extraordinária concessão de benesses do Estado a grupos industriais e agropecuários, privilegiados nas sombras da política eleitoral e partidária. Fez isso no embalo do samba-exaltação sobre o “conteúdo nacional”, que justificou preços 40% acima do padrão mundial num mercado cativo.
A montanha de dinheiro público transferida a cofres particulares, com rarefeita transparência e sem nada exigir em troca, supera gastos somados com os serviços de saúde pública.
O prêmio à ineficiência na produção local custou caro. Sequer garantiu a base de empregos, como demonstram Usiminas e a CSN, e, também, a indústria automobilística, onde são mais notáveis os laços de cumplicidade empresas-sindicatos na drenagem do Erário público.
Resultou no aumento das importações e criação de empregos no exterior, principalmente na China. Entre 2003 e 2014, por exemplo, foram criadas 1,4 mil empresas dedicadas à exportação. Nesse período, o
Brasil viu nascer 22 mil novas importadoras.
Estimulou-se a contínua diminuição do número de empregados nas fábricas brasileiras. Durante o ano passado, o setor industrial demitiu de 8,6 mil pessoas por semana.
Agora, o governo comanda a migração de indústrias e empregos do Brasil para o Paraguai. O ministro da Indústria, Armando de Queiroz Monteiro Neto, tem liderado expedições de empresários interessados nos incentivos paraguaios às “maquiladoras”.
Ali, o custo de mão de obra é 39% inferior ao do Brasil, a eletricidade é 64% mais barata, tem menos burocracia e o mercado preferencial é o brasileiro. Até dezembro, 42 empresas brasileiras atravessaram a fronteira, e o governo paraguaio recebeu mais de 400 consultas — Vale, JBS, Camargo Corrêa, Riachuelo, Bourbon, Eurofarma e Buddemeyer, entre outras.
É natural que empresas procurem maximizar lucros. Estranha é a liderança do ministro brasileiro na migração de indústrias e empregos além-fronteira. Sugere que o governo abdicou de resolver os problemas domésticos de custos de produção e de emprego.
Se assim for, Monteiro Neto está apenas ajudando a escrever um novo capítulo na biografia de Rousseff: a presidente que transformou o “conteúdo nacional” em “maquila paraguaya”.
Deu zika - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 12/01
SÃO PAULO - Grávidas de fetos microcefálicos devem ter o direito de abortar? E mulheres que descobrem ter contraído zika no início da gestação? Pela letra da lei brasileira, não. As exceções previstas são só duas, perigo de vida para a mãe e gravidez resultante de estupro.
A decisão do STF de estender o direito de abortar a portadoras de fetos anencefálicos tampouco ajuda, já que o requisito são malformações incompatíveis com a vida extrauterina, algo que a microcefalia não é.
Ainda assim, o debate é válido. Se nos conformássemos com o que diz a lei, sem tentar modificá-la pela via legislativa, jurisprudencial ou mesmo por revoluções, as Ordenações Filipinas ainda estariam em vigor.
É interessante aqui notar que o legislador de 1940, responsável pelo atual Código Penal, teve a grande sabedoria de não definir absolutos. Não colocou a vida do feto como algo a preservar a todo custo, como fazem certas doutrinas religiosas. Não só estabeleceu a vida da mãe como hierarquicamente superior à do nascituro mas também criou uma cláusula de exclusão de punibilidade baseada em razões psicológicas.
O aborto nos casos de estupro, que a doutrina chama de aborto sentimental, tem como justificativa o fato de que seria desumano obrigar a mulher a carregar no ventre o filho do agressor. Ou seja, o bem-estar psicológico da mulher prevalece sobre a vida do embrião, ainda que apenas em situações especiais, em que a grávida foi forçada ao ato sexual.
Foi ampliando a noção de que a saúde psíquica das mulheres é um bem jurídico a preservar tão valioso quanto a promessa de vida que a esmagadora maioria dos países industrializados chegou à conclusão de que, ao menos nas fases iniciais da gestação, a mulher deve ser livre para decidir sobre a sua continuação.
É um pouco frustrante constatar que as premissas do debate, que hoje se trava em nome de absolutos religiosos, pioraram de 1940 para cá.
SÃO PAULO - Grávidas de fetos microcefálicos devem ter o direito de abortar? E mulheres que descobrem ter contraído zika no início da gestação? Pela letra da lei brasileira, não. As exceções previstas são só duas, perigo de vida para a mãe e gravidez resultante de estupro.
A decisão do STF de estender o direito de abortar a portadoras de fetos anencefálicos tampouco ajuda, já que o requisito são malformações incompatíveis com a vida extrauterina, algo que a microcefalia não é.
Ainda assim, o debate é válido. Se nos conformássemos com o que diz a lei, sem tentar modificá-la pela via legislativa, jurisprudencial ou mesmo por revoluções, as Ordenações Filipinas ainda estariam em vigor.
É interessante aqui notar que o legislador de 1940, responsável pelo atual Código Penal, teve a grande sabedoria de não definir absolutos. Não colocou a vida do feto como algo a preservar a todo custo, como fazem certas doutrinas religiosas. Não só estabeleceu a vida da mãe como hierarquicamente superior à do nascituro mas também criou uma cláusula de exclusão de punibilidade baseada em razões psicológicas.
O aborto nos casos de estupro, que a doutrina chama de aborto sentimental, tem como justificativa o fato de que seria desumano obrigar a mulher a carregar no ventre o filho do agressor. Ou seja, o bem-estar psicológico da mulher prevalece sobre a vida do embrião, ainda que apenas em situações especiais, em que a grávida foi forçada ao ato sexual.
Foi ampliando a noção de que a saúde psíquica das mulheres é um bem jurídico a preservar tão valioso quanto a promessa de vida que a esmagadora maioria dos países industrializados chegou à conclusão de que, ao menos nas fases iniciais da gestação, a mulher deve ser livre para decidir sobre a sua continuação.
É um pouco frustrante constatar que as premissas do debate, que hoje se trava em nome de absolutos religiosos, pioraram de 1940 para cá.
Pau nas reservas? Que má ideia! - EDMAR BACHA
O GLOBO - 12/01
Convém explicar por que isso não faz sentido, antes que mais esse atentado contra as finanças públicas do país seja perpetrado
No final do ano passado, o governo editou uma medida provisória que permitiu ao ministro da Fazenda pagar de uma só vez as chamadas pedaladas fiscais de 2014, usando o dinheiro que o Tesouro Nacional mantém no Banco Central (BC). As pedaladas originaram-se de pagamentos feitos pelos bancos oficiais a beneficiários de programas do governo que não foram devidamente ressarcidos pelo Tesouro na época oportuna.
A maneira natural de o Tesouro obter recursos para ressarcir os bancos oficiais pelas pedaladas seria através da colocação de novos títulos de dívida diretamente no mercado, sem envolver o BC. Em vez disso, o governo editou a medida provisória cancelando leis anteriores que previam que o caixa do Tesouro no BC deveria ser usado preferencialmente para pagar dívida do Tesouro com o próprio BC.
Deste modo, o Tesouro pôde usar o dinheiro que tinha no BC para pagar os bancos oficiais que haviam financiado as pedaladas. Os bancos, é claro, não deixam esse dinheiro parado, sem render juros. Usam o dinheiro para comprar títulos do Tesouro no Banco Central, nas chamadas operações compromissadas. Através delas, o BC recolhe o dinheiro dos bancos e, em contrapartida, repassa a eles títulos do Tesouro, com um compromisso de recompra futura.
Ou seja, quem se endivida com o mercado para pagar as pedaladas é o Banco Central, e não o Tesouro diretamente. Trata-se de uma operação tortuosa, obscura e quiçá inconstitucional.
Agora circula em Brasília a proposta de tentar reativar a economia com a venda das reservas internacionais para financiar um aumento dos gastos do governo. Convém explicar por que isso também não faz qualquer sentido, antes que mais esse atentado contra as finanças públicas do país seja perpetrado.
O BC tem atualmente US$ 373 bilhões de reservas internacionais. Ao mesmo tempo, ele deve US$ 113 bilhões através dos chamados swaps cambiais. Esses são contratos financeiros entre o BC e os bancos, em que o BC troca o principal e os juros em dólar pelo principal mais os juros em reais. O BC tem ganhos se os juros em reais superam a depreciação cambial. Tem perdas se a depreciação supera os juros em reais.
Os swaps cambiais são possíveis porque os bancos entendem que eles estão assegurados pelas reservas internacionais do BC. De fato, eles são uma dedução das reservas internacionais. Diminuindo os swaps das reservas, o valor que fica são US$ 260 bilhões de reservas internacionais efetivas.
As normas prudenciais a respeito da manutenção de reservas internacionais sugerem que elas devam ter um valor equivalente a seis meses de importação, para evitar que o país pare, no caso de uma queda súbita das exportações ou de uma suspensão de créditos externos. Como as importações anuais do país são cerca de US$ 300 bilhões, isso significa que as reservas prudenciais de que necessitamos são iguais a US$ 150 bilhões. Portanto, o excesso das reservas efetivas sobre as reservas prudenciais é igual a 260 menos 150, ou seja, US$ 110 bilhões.
Deste modo, o valor das reservas que o governo poderia em princípio pensar em dispor seria de US$ 110 bilhões, apenas 30% das reservas de US$ 373 bilhões, mas ainda assim um valor significativo.
Considere-se, entretanto, que as reservas são um ativo que o governo adquiriu com a emissão de dívida interna. Para comprar as reservas, o governo teve que vender títulos no mercado interno. O razoável, portanto, seria que a receita obtida com a venda de US$ 110 bilhões das reservas fosse usada para abater a dívida interna. Haveria, nesse caso, uma economia considerável de pagamento de juros por parte do governo.
Supondo que a diferença entre os juros pagos sobre a dívida interna e os recebidos pelas reservas seja de 10% ao ano e que a taxa de câmbio seja igual a R$ 4 por dólar, então a economia anual de juros seria de R$ 44 bilhões de reais (pois: 110 x 0,10 x 4 = 44). Essa seria uma economia que se repetiria todo ano, dependendo da diferença entre os juros internos e externos, ajudando as contas do governo e a rolagem da dívida interna, que seria menor do que antes.
O problema é que querem gastar o dinheiro da venda das reservas não para reduzir a dívida interna, mas para aumentar a despesa do governo, o que é uma péssima ideia.
O pior dos mundos seria usar as reservas para aumentar as despesas correntes do governo, porque estaríamos trocando um ativo valioso por um gasto temporário sem retorno. Se for para despesas de capital, também seria ruim, porque, embora essas despesas aumentem a demanda interna de imediato, não são um impulso que possa se manter à frente, porque as reservas acabariam. A demanda aumentaria num ano, para reduzir-se novamente no ano seguinte. Muito provavelmente, a ponte ficaria pela metade. Perderíamos as reservas e continuaríamos no fundo do poço.
Edmar Bacha é sócio fundador e diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica/Casa das Garças
Convém explicar por que isso não faz sentido, antes que mais esse atentado contra as finanças públicas do país seja perpetrado
No final do ano passado, o governo editou uma medida provisória que permitiu ao ministro da Fazenda pagar de uma só vez as chamadas pedaladas fiscais de 2014, usando o dinheiro que o Tesouro Nacional mantém no Banco Central (BC). As pedaladas originaram-se de pagamentos feitos pelos bancos oficiais a beneficiários de programas do governo que não foram devidamente ressarcidos pelo Tesouro na época oportuna.
A maneira natural de o Tesouro obter recursos para ressarcir os bancos oficiais pelas pedaladas seria através da colocação de novos títulos de dívida diretamente no mercado, sem envolver o BC. Em vez disso, o governo editou a medida provisória cancelando leis anteriores que previam que o caixa do Tesouro no BC deveria ser usado preferencialmente para pagar dívida do Tesouro com o próprio BC.
Deste modo, o Tesouro pôde usar o dinheiro que tinha no BC para pagar os bancos oficiais que haviam financiado as pedaladas. Os bancos, é claro, não deixam esse dinheiro parado, sem render juros. Usam o dinheiro para comprar títulos do Tesouro no Banco Central, nas chamadas operações compromissadas. Através delas, o BC recolhe o dinheiro dos bancos e, em contrapartida, repassa a eles títulos do Tesouro, com um compromisso de recompra futura.
Ou seja, quem se endivida com o mercado para pagar as pedaladas é o Banco Central, e não o Tesouro diretamente. Trata-se de uma operação tortuosa, obscura e quiçá inconstitucional.
Agora circula em Brasília a proposta de tentar reativar a economia com a venda das reservas internacionais para financiar um aumento dos gastos do governo. Convém explicar por que isso também não faz qualquer sentido, antes que mais esse atentado contra as finanças públicas do país seja perpetrado.
O BC tem atualmente US$ 373 bilhões de reservas internacionais. Ao mesmo tempo, ele deve US$ 113 bilhões através dos chamados swaps cambiais. Esses são contratos financeiros entre o BC e os bancos, em que o BC troca o principal e os juros em dólar pelo principal mais os juros em reais. O BC tem ganhos se os juros em reais superam a depreciação cambial. Tem perdas se a depreciação supera os juros em reais.
Os swaps cambiais são possíveis porque os bancos entendem que eles estão assegurados pelas reservas internacionais do BC. De fato, eles são uma dedução das reservas internacionais. Diminuindo os swaps das reservas, o valor que fica são US$ 260 bilhões de reservas internacionais efetivas.
As normas prudenciais a respeito da manutenção de reservas internacionais sugerem que elas devam ter um valor equivalente a seis meses de importação, para evitar que o país pare, no caso de uma queda súbita das exportações ou de uma suspensão de créditos externos. Como as importações anuais do país são cerca de US$ 300 bilhões, isso significa que as reservas prudenciais de que necessitamos são iguais a US$ 150 bilhões. Portanto, o excesso das reservas efetivas sobre as reservas prudenciais é igual a 260 menos 150, ou seja, US$ 110 bilhões.
Deste modo, o valor das reservas que o governo poderia em princípio pensar em dispor seria de US$ 110 bilhões, apenas 30% das reservas de US$ 373 bilhões, mas ainda assim um valor significativo.
Considere-se, entretanto, que as reservas são um ativo que o governo adquiriu com a emissão de dívida interna. Para comprar as reservas, o governo teve que vender títulos no mercado interno. O razoável, portanto, seria que a receita obtida com a venda de US$ 110 bilhões das reservas fosse usada para abater a dívida interna. Haveria, nesse caso, uma economia considerável de pagamento de juros por parte do governo.
Supondo que a diferença entre os juros pagos sobre a dívida interna e os recebidos pelas reservas seja de 10% ao ano e que a taxa de câmbio seja igual a R$ 4 por dólar, então a economia anual de juros seria de R$ 44 bilhões de reais (pois: 110 x 0,10 x 4 = 44). Essa seria uma economia que se repetiria todo ano, dependendo da diferença entre os juros internos e externos, ajudando as contas do governo e a rolagem da dívida interna, que seria menor do que antes.
O problema é que querem gastar o dinheiro da venda das reservas não para reduzir a dívida interna, mas para aumentar a despesa do governo, o que é uma péssima ideia.
O pior dos mundos seria usar as reservas para aumentar as despesas correntes do governo, porque estaríamos trocando um ativo valioso por um gasto temporário sem retorno. Se for para despesas de capital, também seria ruim, porque, embora essas despesas aumentem a demanda interna de imediato, não são um impulso que possa se manter à frente, porque as reservas acabariam. A demanda aumentaria num ano, para reduzir-se novamente no ano seguinte. Muito provavelmente, a ponte ficaria pela metade. Perderíamos as reservas e continuaríamos no fundo do poço.
Edmar Bacha é sócio fundador e diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica/Casa das Garças
A nossa maldição do petróleo - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 12/01
O barril de petróleo pode baixar a US$ 20, alardeiam grandes bancões do mundo em suas previsões. Ontem, baixou a US$ 32. Até meados de 2014, o preço andava pela casa de US$ 100. E daí?
O preço importa, entre vários motivos, pois: 1) Levanta perguntas importantes sobre o que a Petrobras vai ser quando deixar de decrescer; 2) Suscita perguntas ainda mais graves sobre a política de energia do Brasil, não apenas no médio prazo; 3) Indica que há receios importantes sobre o que vai acontecer com a China, o que nos afeta diretamente.
No curto prazo, pelo menos, a queda do preço do petróleo não arrebenta a Petrobras, que vende um diesel quase 50% mais caro que o do mercado internacional (e gasolina 35% mais cara). Porém, o que a empresa planeja fazer da vida, caso o preço permaneça em baixa, além do mais sabendo-se que sua produção não é barata, no pré-sal?
A pergunta sobre os planos futuros da Petrobras não seria tão dramática se a petroleira não fosse amarrada por tantas normas, intervenções e manipulações do governo, que a arruinou, nos anos Dilma Rousseff. A Petrobras é obrigada a comprar máquinas e equipamentos caros por causa de ordem do governo (comprar produto nacional, até certa medida), para ficar num exemplo.
A Petrobras não é uma empresa qualquer. Já foi responsável por mais de 10% do investimento do país. Arruinada como foi, contribuiu para afundar a economia do Brasil. Uma empresa mais livre poderia ter repensado suas estratégias, antes do desastre.
Quais são seus planos, dado que está superendividada, tendo de lidar com essa baixa medonha de seu principal produto, ora sustentada pelo sobrepreço dos combustíveis no mercado nacional, desacreditada, dada a roubança e o excesso de dívida? Aliás, quais são os planos do governo?
Decerto as previsões de preço de petróleo são chutes terríveis, talvez tão ruins quando os prognósticos sobre taxas de câmbio.
A Energy Information Agency, dos EUA, prevê barril a US$ 56 em 2016 (Brent). Há bancões prevendo, na média, US$ 46. Prevê-se que a produção fora da Opep vá baixar neste ano, que os estoques vão crescer menos que em 2015, apesar de a Arábia Saudita ainda comandar o movimento de inundar o mundo de petróleo, a fim de arrebentar a concorrência. Logo, apesar das projeções baixistas de curto prazo dos bancões, em tese haveria recuperação de preços. O curto prazo, porém, não é bom guia para políticas de energia.
Como serão tomadas as decisões de investir em energia no país? O governo vai engessar o mercado a ponto de impedir soluções criativas? O que se deve esperar do pré-sal? A política de preços de combustíveis será razoável o bastante para não arruinar o setor?
Considere-se: no ano passado, o consumo de derivados de petróleo caiu mais de 5% no Brasil. O consumo de etanol subiu 35%, recuperando-se da desgraça dos preços artificialmente baixos e tabelados da gasolina, obra dos anos Dilma que arrebentou tanto a indústria de álcool quanto a Petrobras. No médio e longo prazo, quanta energia virá de petróleo e hidrelétricas, em vez de fontes alternativas mais limpas?
Não há falta de rumo apenas na política econômica. O governo do Brasil todo está atolado.
O barril de petróleo pode baixar a US$ 20, alardeiam grandes bancões do mundo em suas previsões. Ontem, baixou a US$ 32. Até meados de 2014, o preço andava pela casa de US$ 100. E daí?
O preço importa, entre vários motivos, pois: 1) Levanta perguntas importantes sobre o que a Petrobras vai ser quando deixar de decrescer; 2) Suscita perguntas ainda mais graves sobre a política de energia do Brasil, não apenas no médio prazo; 3) Indica que há receios importantes sobre o que vai acontecer com a China, o que nos afeta diretamente.
No curto prazo, pelo menos, a queda do preço do petróleo não arrebenta a Petrobras, que vende um diesel quase 50% mais caro que o do mercado internacional (e gasolina 35% mais cara). Porém, o que a empresa planeja fazer da vida, caso o preço permaneça em baixa, além do mais sabendo-se que sua produção não é barata, no pré-sal?
A pergunta sobre os planos futuros da Petrobras não seria tão dramática se a petroleira não fosse amarrada por tantas normas, intervenções e manipulações do governo, que a arruinou, nos anos Dilma Rousseff. A Petrobras é obrigada a comprar máquinas e equipamentos caros por causa de ordem do governo (comprar produto nacional, até certa medida), para ficar num exemplo.
A Petrobras não é uma empresa qualquer. Já foi responsável por mais de 10% do investimento do país. Arruinada como foi, contribuiu para afundar a economia do Brasil. Uma empresa mais livre poderia ter repensado suas estratégias, antes do desastre.
Quais são seus planos, dado que está superendividada, tendo de lidar com essa baixa medonha de seu principal produto, ora sustentada pelo sobrepreço dos combustíveis no mercado nacional, desacreditada, dada a roubança e o excesso de dívida? Aliás, quais são os planos do governo?
Decerto as previsões de preço de petróleo são chutes terríveis, talvez tão ruins quando os prognósticos sobre taxas de câmbio.
A Energy Information Agency, dos EUA, prevê barril a US$ 56 em 2016 (Brent). Há bancões prevendo, na média, US$ 46. Prevê-se que a produção fora da Opep vá baixar neste ano, que os estoques vão crescer menos que em 2015, apesar de a Arábia Saudita ainda comandar o movimento de inundar o mundo de petróleo, a fim de arrebentar a concorrência. Logo, apesar das projeções baixistas de curto prazo dos bancões, em tese haveria recuperação de preços. O curto prazo, porém, não é bom guia para políticas de energia.
Como serão tomadas as decisões de investir em energia no país? O governo vai engessar o mercado a ponto de impedir soluções criativas? O que se deve esperar do pré-sal? A política de preços de combustíveis será razoável o bastante para não arruinar o setor?
Considere-se: no ano passado, o consumo de derivados de petróleo caiu mais de 5% no Brasil. O consumo de etanol subiu 35%, recuperando-se da desgraça dos preços artificialmente baixos e tabelados da gasolina, obra dos anos Dilma que arrebentou tanto a indústria de álcool quanto a Petrobras. No médio e longo prazo, quanta energia virá de petróleo e hidrelétricas, em vez de fontes alternativas mais limpas?
Não há falta de rumo apenas na política econômica. O governo do Brasil todo está atolado.
A crise na Venezuela e o Brasil - RUBENS BARBOSA
O Estado de S. Paulo - 12/01
A hora da verdade está se aproximando no conturbado cenário político venezuelano. Anos de desgoverno resultaram em crescente violência, inflação galopante, escassez de alimentos e um crescimento negativo quase três vezes maior que o do Brasil. Por tudo isso, nas eleições parlamentares de dezembro passado o governo de Nicolás Maduro sofreu a pior derrota dos últimos 17 anos de populismo bolivariano, com a oposição conseguindo ampla maioria qualificada ao eleger 112 dos 167 parlamentares. Heinz Dieterich, ideólogo do socialismo do século 21, fundado por Hugo Chávez, prevê que 2016 será o ano da batalha final entre o governo de Caracas e a oposição ao regime.
Apesar de declarações iniciais conciliadoras, misturadas com a condenação da “circunstancial perda para a contrarrevolução de direita que tenta sabotar a Venezuela e desestabilizar o governo”, Maduro está tentando perpetuar o seu controle sobre a estrutura do Estado por meio de uma Blitzkrieg institucional preventiva. Ao tomar uma série de medidas antidemocráticas que fraudam o resultado eleitoral, o governo indicou claramente que não quer dialogar, mas, sim, confrontar a oposição para manter o poder a qualquer preço.
- O Tribunal Superior de Justiça (TSJ) decretou a impugnação de três parlamentares oposicionistas, fazendo com que desapareça a maioria de três quintos que daria amplos poderes à Assembleia Nacional. Apesar da decisão do TSJ, os três assumiram seus mandatos e Maduro pediu ao tribunal a anulação de todas as decisões da Assembleia, criando um sério conflito institucional.
- 13 dos 32 magistrados do TSJ foram substituídos para reforçar a influência do Poder Executivo sobre o Judiciário.
- O governo criou um parlamento comunal paralelo para esvaziar a Assembleia Nacional.
- Antes do fim de seu mandato, o Congresso aprovou orçamento que favorece os seus aliados.
- Legislação que proíbe a demissão de funcionários das empresas públicas foi estendida pelo Executivo até 2018, retirando esse poder da Assembleia Nacional.
- Maduro retirou a atribuição da Assembleia Nacional de aprovar a diretoria do Banco Central.
- Nicolás Maduro declarou que não respeitará decisão do Congresso de anistiar os presos políticos.
Essas medidas, que claramente desrespeitam os mais comezinhos princípios democráticos, foram tomadas antes e na primeira semana depois da posse dos congressistas da Assembleia Nacional. Está instaurada uma dura luta de poder entre instituições que deveriam ser independentes e harmônicas. As Forças Armadas terão papel decisivo na “batalha final”, nos próximos meses.
A reação interna foi imediata. O cardeal de Caracas pediu que o governo respeite o resultado eleitoral. A ONU, a Unasul e a União Europeia estão sendo acionadas para fazer com que o governo não frustre a vontade do povo venezuelano. Enquanto isso, no âmbito do Mercosul, o Brasil teria impedido referências negativas à Venezuela no comunicado final da última reunião e apoiou apenas uma declaração com o compromisso de respeito à democracia e aos direitos humanos. A Argentina criticou a prisão de presos políticos pelo regime bolivariano.
O Brasil tem todo o interesse em ajudar a Venezuela, para evitar que a disputa política degenere em ainda maior colapso da economia, desordem e violência, prejudicando não só o país, como criando problemas para as nações fronteiriças.
O governo brasileiro, em seu nível mais alto, há 13 anos sempre declarou que há “excesso de democracia” na Venezuela. Nos últimos meses, sem reação alguma de Brasília, um grupo de senadores brasileiros foi impedido de deixar o aeroporto de Caracas para evitar que mantivesse encontros com o governo e com a oposição; e o ministro Nelson Jobim foi vetado pelo governo venezuelano ao ser designado pelo Tribunal Superior Eleitoral para chefiar missão da Unasul que iria monitorar a eleição parlamentar de dezembro.
Em ajuda a Maduro, antes das eleições parlamentares, Dilma Rousseff enviou carta que, segundo se informa, pediria moderação e respeito aos resultados das urnas. Agora se anuncia o envio de emissário, provavelmente Marco Aurélio Garcia, para uma conversa “franca e definitiva, mas discreta”. O que pode significar “definitiva”?
Em aparente sinal de que a posição compreensiva do governo brasileiro estaria finalmente mudando, o Itamaraty emitiu uma segunda nota (depois de comentário positivo sobre a maneira como transcorreu a eleição e a expectativa de que seu resultado fosse acatado), na qual o governo brasileiro manifestou confiança em que a vontade soberana do povo venezuelano, expressada de forma livre e democrática nas urnas, seja plenamente respeitada. A nota acrescenta, igualmente, a confiança em que serão preservadas e respeitadas as atribuições e prerrogativas constitucionais da nova Assembleia Nacional venezuelana e de seus membros, eleitos naquele pleito. De maneira firme, conclui que não há lugar na América do Sul do século 21 para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia e ao Estado de Direito.
Embora demorada, essa nova postura diplomática, mesmo que inspirada talvez na situação política daqui e na ameaça de impeachment, foi positiva e deve ser apoiada – assim como a decisão de não concessão do agrément ao embaixador de Israel.
Se a nota do Itamaraty manifesta de fato uma mudança de política em relação a Venezuela, o Brasil não poderá mais omitir-se em face do que está ocorrendo na cena política venezuelana e medidas concretas deverão ser propostas, sob pena de aumentar o desgaste e a perda da credibilidade da política externa. O Brasil não pode esperar pela Argentina para invocar a cláusula democrática do Mercosul caso a soberania da Assembleia Nacional continue a ser violentada.
*RUBENS BARBOSA É PRESIDENTE DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP
A hora da verdade está se aproximando no conturbado cenário político venezuelano. Anos de desgoverno resultaram em crescente violência, inflação galopante, escassez de alimentos e um crescimento negativo quase três vezes maior que o do Brasil. Por tudo isso, nas eleições parlamentares de dezembro passado o governo de Nicolás Maduro sofreu a pior derrota dos últimos 17 anos de populismo bolivariano, com a oposição conseguindo ampla maioria qualificada ao eleger 112 dos 167 parlamentares. Heinz Dieterich, ideólogo do socialismo do século 21, fundado por Hugo Chávez, prevê que 2016 será o ano da batalha final entre o governo de Caracas e a oposição ao regime.
Apesar de declarações iniciais conciliadoras, misturadas com a condenação da “circunstancial perda para a contrarrevolução de direita que tenta sabotar a Venezuela e desestabilizar o governo”, Maduro está tentando perpetuar o seu controle sobre a estrutura do Estado por meio de uma Blitzkrieg institucional preventiva. Ao tomar uma série de medidas antidemocráticas que fraudam o resultado eleitoral, o governo indicou claramente que não quer dialogar, mas, sim, confrontar a oposição para manter o poder a qualquer preço.
- O Tribunal Superior de Justiça (TSJ) decretou a impugnação de três parlamentares oposicionistas, fazendo com que desapareça a maioria de três quintos que daria amplos poderes à Assembleia Nacional. Apesar da decisão do TSJ, os três assumiram seus mandatos e Maduro pediu ao tribunal a anulação de todas as decisões da Assembleia, criando um sério conflito institucional.
- 13 dos 32 magistrados do TSJ foram substituídos para reforçar a influência do Poder Executivo sobre o Judiciário.
- O governo criou um parlamento comunal paralelo para esvaziar a Assembleia Nacional.
- Antes do fim de seu mandato, o Congresso aprovou orçamento que favorece os seus aliados.
- Legislação que proíbe a demissão de funcionários das empresas públicas foi estendida pelo Executivo até 2018, retirando esse poder da Assembleia Nacional.
- Maduro retirou a atribuição da Assembleia Nacional de aprovar a diretoria do Banco Central.
- Nicolás Maduro declarou que não respeitará decisão do Congresso de anistiar os presos políticos.
Essas medidas, que claramente desrespeitam os mais comezinhos princípios democráticos, foram tomadas antes e na primeira semana depois da posse dos congressistas da Assembleia Nacional. Está instaurada uma dura luta de poder entre instituições que deveriam ser independentes e harmônicas. As Forças Armadas terão papel decisivo na “batalha final”, nos próximos meses.
A reação interna foi imediata. O cardeal de Caracas pediu que o governo respeite o resultado eleitoral. A ONU, a Unasul e a União Europeia estão sendo acionadas para fazer com que o governo não frustre a vontade do povo venezuelano. Enquanto isso, no âmbito do Mercosul, o Brasil teria impedido referências negativas à Venezuela no comunicado final da última reunião e apoiou apenas uma declaração com o compromisso de respeito à democracia e aos direitos humanos. A Argentina criticou a prisão de presos políticos pelo regime bolivariano.
O Brasil tem todo o interesse em ajudar a Venezuela, para evitar que a disputa política degenere em ainda maior colapso da economia, desordem e violência, prejudicando não só o país, como criando problemas para as nações fronteiriças.
O governo brasileiro, em seu nível mais alto, há 13 anos sempre declarou que há “excesso de democracia” na Venezuela. Nos últimos meses, sem reação alguma de Brasília, um grupo de senadores brasileiros foi impedido de deixar o aeroporto de Caracas para evitar que mantivesse encontros com o governo e com a oposição; e o ministro Nelson Jobim foi vetado pelo governo venezuelano ao ser designado pelo Tribunal Superior Eleitoral para chefiar missão da Unasul que iria monitorar a eleição parlamentar de dezembro.
Em ajuda a Maduro, antes das eleições parlamentares, Dilma Rousseff enviou carta que, segundo se informa, pediria moderação e respeito aos resultados das urnas. Agora se anuncia o envio de emissário, provavelmente Marco Aurélio Garcia, para uma conversa “franca e definitiva, mas discreta”. O que pode significar “definitiva”?
Em aparente sinal de que a posição compreensiva do governo brasileiro estaria finalmente mudando, o Itamaraty emitiu uma segunda nota (depois de comentário positivo sobre a maneira como transcorreu a eleição e a expectativa de que seu resultado fosse acatado), na qual o governo brasileiro manifestou confiança em que a vontade soberana do povo venezuelano, expressada de forma livre e democrática nas urnas, seja plenamente respeitada. A nota acrescenta, igualmente, a confiança em que serão preservadas e respeitadas as atribuições e prerrogativas constitucionais da nova Assembleia Nacional venezuelana e de seus membros, eleitos naquele pleito. De maneira firme, conclui que não há lugar na América do Sul do século 21 para soluções políticas fora da institucionalidade e do mais absoluto respeito à democracia e ao Estado de Direito.
Embora demorada, essa nova postura diplomática, mesmo que inspirada talvez na situação política daqui e na ameaça de impeachment, foi positiva e deve ser apoiada – assim como a decisão de não concessão do agrément ao embaixador de Israel.
Se a nota do Itamaraty manifesta de fato uma mudança de política em relação a Venezuela, o Brasil não poderá mais omitir-se em face do que está ocorrendo na cena política venezuelana e medidas concretas deverão ser propostas, sob pena de aumentar o desgaste e a perda da credibilidade da política externa. O Brasil não pode esperar pela Argentina para invocar a cláusula democrática do Mercosul caso a soberania da Assembleia Nacional continue a ser violentada.
*RUBENS BARBOSA É PRESIDENTE DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP
Política contraditória - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 12/01
Se o Banco Central precisa de sinal verde para subir taxas de juros, da presidente e do ministro da Fazenda, metade do efeito benéfico do aperto monetário se perde. Se, ao mesmo tempo, o ministro da Fazenda está ampliando o acesso ao crédito subsidiado, a outra metade também se perde. Restam apenas os efeitos colaterais do remédio amargo que é a elevação da taxa de juros.
O governo precisa se dar conta de que a inflação está alta demais e que uma taxa de quase 11% é um perigo enorme. A economia ainda é muito indexada, parte da inflação de 2016 virá da inércia. O salário mínimo subiu de acordo com a inflação passada, assim com os benefícios do INSS, e as tarifas públicas começarão a discutir reajustes a partir desses 11%.
Não basta o Banco Central subir os juros se, ao mesmo tempo, a política econômica for no sentido oposto. Se o Banco Central precisar de autorização para fazer seu trabalho, significa que ele pode deixar de tê-la a qualquer momento, e isso tira a potência da política monetária. Autonomia concedida não é autonomia. É liberdade vigiada. Diante desses sinais de fraqueza da autoridade monetária os agentes econômicos passam a apostar que o órgão não poderá o necessário.
As ideias que têm surgido são no sentido de ampliar a fatia do mercado de crédito que não está sob a influência da política de juros do Banco Central. Foi isso que o ministro Nelson Barbosa anunciou em entrevista publicada no domingo na "Folha de S. Paulo". Ele disse que o governo elevará o crédito via banco público. O ministro afirma que não haverá subsídio do Tesouro nas linhas de crédito, mas se os juros forem mais baixos sempre há subsídio. Não há linha de BNDES, por exemplo, que não custe ao Tesouro o diferencial de juros. O FGTS é um dinheiro tão mal remunerado, que pode não haver custo para o Tesouro, mas seu uso abusivo pode desequilibrar o Fundo em época de muitas demissões, quando haverá mais saques. Foi exatamente usando e abusando de bancos e fundos públicos que o governo cometeu erros no passado.
É velho conhecido de qualquer economista o fato de que a ação do BC fica mais fraca quando o mercado de crédito tem taxas especiais, que não são afetadas pela política monetária. A política econômica tem que ter unidade e fazer esforços numa mesma direção.
Na semana que vem, o BC vai se reunir para decidir a taxa de juros e todos os sinais são de elevação, de novo, da Selic, que está em 14,25%. A expectativa é que o Copom suba os juros, principalmente depois da Carta divulgada pelo BC na sexta-feira passada para explicar a inflação de 2015.
Na Carta, o BC culpa a política fiscal, o choque tarifário e a alta do dólar pelo resultado ruim. O problema é que nas inúmeras comunicações que o BC fez ele não alertou com a ênfase necessária para os riscos inflacionários.
Nos últimos cinco anos, desde que a atual diretoria do Banco Central tomou posse, foram várias as declarações de dirigentes do banco de que o repasse cambial para a inflação havia se tornado menor no Brasil, e que, por isso, também diminuía a preocupação com a alta do dólar. O que se viu foi o contrário, e agora o BC admite que permanece forte o repasse cambial.
O BC aponta dois momentos de alta do dólar. Um, no início do ano, outro, no final de 2015. Sobre a alta a partir de setembro, culpa o envio pelo governo do Orçamento deficitário ao Congresso Nacional para o ano de 2016, que derrubou a confiança. Isso levou o país à perda do grau de investimento, pressionando a cotação da moeda americana.
O Banco Central diz que a expectativa de inflação estava caindo até o envio do Orçamento deficitário. Mas àquela altura o país estava com inflação crescente pelo peso do salto da tarifa de energia. O forte aumento dos preços administrados contaminou também os preços livres, pelo encarecimento da energia elétrica e dos combustíveis. É para impedir que haja este contágio que o BC faz alertas e usa os instrumentos que tem.
Sozinho, o Banco Central não conseguirá levar a inflação para a meta. É preciso que a política econômica não reme no sentido contrário. As propostas de usar o dinheiro transferido para os bancos públicos e o FGTS para estimular a economia são a prova da ação contraditória da política anti-inflacionária.
Se o Banco Central precisa de sinal verde para subir taxas de juros, da presidente e do ministro da Fazenda, metade do efeito benéfico do aperto monetário se perde. Se, ao mesmo tempo, o ministro da Fazenda está ampliando o acesso ao crédito subsidiado, a outra metade também se perde. Restam apenas os efeitos colaterais do remédio amargo que é a elevação da taxa de juros.
O governo precisa se dar conta de que a inflação está alta demais e que uma taxa de quase 11% é um perigo enorme. A economia ainda é muito indexada, parte da inflação de 2016 virá da inércia. O salário mínimo subiu de acordo com a inflação passada, assim com os benefícios do INSS, e as tarifas públicas começarão a discutir reajustes a partir desses 11%.
Não basta o Banco Central subir os juros se, ao mesmo tempo, a política econômica for no sentido oposto. Se o Banco Central precisar de autorização para fazer seu trabalho, significa que ele pode deixar de tê-la a qualquer momento, e isso tira a potência da política monetária. Autonomia concedida não é autonomia. É liberdade vigiada. Diante desses sinais de fraqueza da autoridade monetária os agentes econômicos passam a apostar que o órgão não poderá o necessário.
As ideias que têm surgido são no sentido de ampliar a fatia do mercado de crédito que não está sob a influência da política de juros do Banco Central. Foi isso que o ministro Nelson Barbosa anunciou em entrevista publicada no domingo na "Folha de S. Paulo". Ele disse que o governo elevará o crédito via banco público. O ministro afirma que não haverá subsídio do Tesouro nas linhas de crédito, mas se os juros forem mais baixos sempre há subsídio. Não há linha de BNDES, por exemplo, que não custe ao Tesouro o diferencial de juros. O FGTS é um dinheiro tão mal remunerado, que pode não haver custo para o Tesouro, mas seu uso abusivo pode desequilibrar o Fundo em época de muitas demissões, quando haverá mais saques. Foi exatamente usando e abusando de bancos e fundos públicos que o governo cometeu erros no passado.
É velho conhecido de qualquer economista o fato de que a ação do BC fica mais fraca quando o mercado de crédito tem taxas especiais, que não são afetadas pela política monetária. A política econômica tem que ter unidade e fazer esforços numa mesma direção.
Na semana que vem, o BC vai se reunir para decidir a taxa de juros e todos os sinais são de elevação, de novo, da Selic, que está em 14,25%. A expectativa é que o Copom suba os juros, principalmente depois da Carta divulgada pelo BC na sexta-feira passada para explicar a inflação de 2015.
Na Carta, o BC culpa a política fiscal, o choque tarifário e a alta do dólar pelo resultado ruim. O problema é que nas inúmeras comunicações que o BC fez ele não alertou com a ênfase necessária para os riscos inflacionários.
Nos últimos cinco anos, desde que a atual diretoria do Banco Central tomou posse, foram várias as declarações de dirigentes do banco de que o repasse cambial para a inflação havia se tornado menor no Brasil, e que, por isso, também diminuía a preocupação com a alta do dólar. O que se viu foi o contrário, e agora o BC admite que permanece forte o repasse cambial.
O BC aponta dois momentos de alta do dólar. Um, no início do ano, outro, no final de 2015. Sobre a alta a partir de setembro, culpa o envio pelo governo do Orçamento deficitário ao Congresso Nacional para o ano de 2016, que derrubou a confiança. Isso levou o país à perda do grau de investimento, pressionando a cotação da moeda americana.
O Banco Central diz que a expectativa de inflação estava caindo até o envio do Orçamento deficitário. Mas àquela altura o país estava com inflação crescente pelo peso do salto da tarifa de energia. O forte aumento dos preços administrados contaminou também os preços livres, pelo encarecimento da energia elétrica e dos combustíveis. É para impedir que haja este contágio que o BC faz alertas e usa os instrumentos que tem.
Sozinho, o Banco Central não conseguirá levar a inflação para a meta. É preciso que a política econômica não reme no sentido contrário. As propostas de usar o dinheiro transferido para os bancos públicos e o FGTS para estimular a economia são a prova da ação contraditória da política anti-inflacionária.
Morreu porque morreu - CELSO MING
ESTADÃO - 12/01
A carta do Banco Central para justificar o estouro da inflação não chega a apontar a desordem fiscal como principal fator responsável pela disparada dos preços
Ao apresentar sexta-feira a carta com as explicações formais para o descumprimento da meta de inflação em 2015, o Banco Central foi mais sincero do que vinha sendo até agora. Mas, ainda assim, não chegou a reconhecer os erros de base do governo nem os seus próprios, tanto na condução da política monetária (política de juros) quanto na formação da expectativa dos agentes da economia que definem os preços.
A meta de inflação em 2015 era de 4,5%, admitida tolerância para um escape de dois pontos porcentuais. O teto da meta, portanto, era de 6,5%, mas a inflação disparou para 10,67%.
Como principais explicações para esse enorme desvio, o Banco Central apontou o processo de realinhamento dos preços administrados (os que são reajustados por decisões do governo, como as tarifas de energia elétrica, dos combustíveis e da telefonia) e o repasse da alta do dólar no câmbio interno.
Decomposição da inflação
Sozinho, o realinhamento dos preços administrados foi responsável por 4,21 pontos porcentuais na inflação de 10,67%. E o repasse da alta do dólar, por outro pedaço de inflação, da ordem de 1,57 ponto porcentual (veja o gráfico).
Reconheça-se que isso já é mais do que até recentemente vinha admitindo o governo. Ao longo de 2015, a presidente Dilma atribuiu a cavalgada da inflação a choques de oferta, especialmente o produzido pela seca. Ou seja, se foi preciso apontar um culpado, culparam-se adversidades climáticas e não decisões erradas ou omissões do governo. O Banco Central, só atribuiu a choques de oferta 0,86 ponto porcentual da inflação total do ano.
Até aí se trata de falsa explicação. É como dizer que Neves morreu porque o coração dele parou de bater. O desalinhamento dos preços e o atraso cambial são fatores que refletem a existência de problemas mais profundos da economia que, por sua vez, têm como causas graves erros de política econômica. Embora deixe implícita a responsabilidade do governo pela existência dessas distorções, o Banco Central não vai mais fundo.
Quando insiste no impacto das “alterações nas trajetórias para as variáveis fiscais” não deixa de avançar em relação ao que dissera antes. Até agora a retórica era de que as condições das contas públicas tendiam a ser neutras para a produção de inflação. Também reconhece que os desencontros do governo nas definições da política fiscal ao longo do ano contribuíram decididamente para a produção de incertezas e para a deterioração das expectativas e, aí sim, para empurrar a inflação para cima.
Mas a carta não chega a apontar a desordem fiscal como principal fator responsável pela disparada dos preços. Apenas reconhece que o processo de realinhamento dos preços administrados e do câmbio foi mais intenso e mais duradouro do que o previsto. Nem mesmo assumiu seus erros de previsão. Preferiu dizer que ninguém no mercado tinha projetado impacto tão intenso.
Isso expõe os limites da capacidade de avaliação do Banco Central e de ação para neutralizar seus efeitos. Ao insistir em que a inflação de 2016 ficará dentro do teto da meta, enquanto o mercado projeta 6,93%, mostra que segue na rabeira do comboio, incapaz de conduzir as expectativas. (Veja, ainda, o Confira.)
CONFIRA:
Projeções do mercado para 2016
As expectativas em relação ao comportamento da economia brasileira em 2016 continuam em deterioração. Aqui, as projeções do mercado para a inflação e para o PIB.
Mais aumento dos juros
O recado final do Banco Central na carta em que explica as razões do estouro da inflação é o de que terá agora de combater os efeitos secundários dos choques de preços. Portanto, está claro que o Banco Central vai puxar novamente os juros que hoje estão nos 14,25% ao ano. Falta saber se a nova dose será de 0,5 ou de 0,25 ponto porcentual e por quanto tempo.
A carta do Banco Central para justificar o estouro da inflação não chega a apontar a desordem fiscal como principal fator responsável pela disparada dos preços
Ao apresentar sexta-feira a carta com as explicações formais para o descumprimento da meta de inflação em 2015, o Banco Central foi mais sincero do que vinha sendo até agora. Mas, ainda assim, não chegou a reconhecer os erros de base do governo nem os seus próprios, tanto na condução da política monetária (política de juros) quanto na formação da expectativa dos agentes da economia que definem os preços.
A meta de inflação em 2015 era de 4,5%, admitida tolerância para um escape de dois pontos porcentuais. O teto da meta, portanto, era de 6,5%, mas a inflação disparou para 10,67%.
Como principais explicações para esse enorme desvio, o Banco Central apontou o processo de realinhamento dos preços administrados (os que são reajustados por decisões do governo, como as tarifas de energia elétrica, dos combustíveis e da telefonia) e o repasse da alta do dólar no câmbio interno.
Decomposição da inflação
Sozinho, o realinhamento dos preços administrados foi responsável por 4,21 pontos porcentuais na inflação de 10,67%. E o repasse da alta do dólar, por outro pedaço de inflação, da ordem de 1,57 ponto porcentual (veja o gráfico).
Reconheça-se que isso já é mais do que até recentemente vinha admitindo o governo. Ao longo de 2015, a presidente Dilma atribuiu a cavalgada da inflação a choques de oferta, especialmente o produzido pela seca. Ou seja, se foi preciso apontar um culpado, culparam-se adversidades climáticas e não decisões erradas ou omissões do governo. O Banco Central, só atribuiu a choques de oferta 0,86 ponto porcentual da inflação total do ano.
Até aí se trata de falsa explicação. É como dizer que Neves morreu porque o coração dele parou de bater. O desalinhamento dos preços e o atraso cambial são fatores que refletem a existência de problemas mais profundos da economia que, por sua vez, têm como causas graves erros de política econômica. Embora deixe implícita a responsabilidade do governo pela existência dessas distorções, o Banco Central não vai mais fundo.
Quando insiste no impacto das “alterações nas trajetórias para as variáveis fiscais” não deixa de avançar em relação ao que dissera antes. Até agora a retórica era de que as condições das contas públicas tendiam a ser neutras para a produção de inflação. Também reconhece que os desencontros do governo nas definições da política fiscal ao longo do ano contribuíram decididamente para a produção de incertezas e para a deterioração das expectativas e, aí sim, para empurrar a inflação para cima.
Mas a carta não chega a apontar a desordem fiscal como principal fator responsável pela disparada dos preços. Apenas reconhece que o processo de realinhamento dos preços administrados e do câmbio foi mais intenso e mais duradouro do que o previsto. Nem mesmo assumiu seus erros de previsão. Preferiu dizer que ninguém no mercado tinha projetado impacto tão intenso.
Isso expõe os limites da capacidade de avaliação do Banco Central e de ação para neutralizar seus efeitos. Ao insistir em que a inflação de 2016 ficará dentro do teto da meta, enquanto o mercado projeta 6,93%, mostra que segue na rabeira do comboio, incapaz de conduzir as expectativas. (Veja, ainda, o Confira.)
CONFIRA:
Projeções do mercado para 2016
As expectativas em relação ao comportamento da economia brasileira em 2016 continuam em deterioração. Aqui, as projeções do mercado para a inflação e para o PIB.
Mais aumento dos juros
O recado final do Banco Central na carta em que explica as razões do estouro da inflação é o de que terá agora de combater os efeitos secundários dos choques de preços. Portanto, está claro que o Banco Central vai puxar novamente os juros que hoje estão nos 14,25% ao ano. Falta saber se a nova dose será de 0,5 ou de 0,25 ponto porcentual e por quanto tempo.
O BC e os erros de Dilma - EDITORIAL O ESTADÃO
ESTADÃO - 12/01
Diante do risco de inflação ainda acima de 6,5% neste ano, com novo estouro do limite de tolerância, também conhecido como teto da meta, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá anunciar mais um aumento de juros na próxima semana, logo depois de sua primeira reunião de 2016. Com uma alta de 0,5 ponto, a taxa básica, a Selic, chegará a 14,75%, segundo a aposta dominante no mercado. A expectativa de juros menores neste ano foi abandonada há mais de um mês, quando o agravamento da crise política, a incerteza sobre o futuro das contas públicas e a crescente desordem dos preços tornaram mais feias quase todas as projeções para o ano novo. No próximo Natal a taxa básica estará em 15,25%, um ponto acima do nível de hoje, de acordo com a avaliação captada na pesquisaFocus divulgada ontem pelo Banco Central (BC). Essa pesquisa é realizada semanalmente com cerca de cem instituições financeiras e consultorias.
A disposição de continuar aumentando os juros foi reafirmada pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, na carta aberta endereçada ao ministro da Fazenda, na sexta-feira passada, e divulgada depois do fechamento do mercado. A política monetária, segundo a carta, será orientada para garantir dois objetivos – manter a inflação dentro da margem de 6,5% em 2016 e levá-la à meta de 4,5% em 2017. Para isso, o BC agirá “independentemente do contorno das demais políticas”, afirmou Tombini, repetindo uma frase da ata da última reunião do Copom, em novembro.
A inflação chegou a 10,67% no ano passado e o presidente do BC, cumprindo a lei, mandou a carta para explicar por que o aumento de preços foi além do limite de tolerância, de 6,5%, fixado pelo Conselho Monetário Nacional. A explicação, tão razoável quanto poderia ser, passou muito longe de um reconhecimento de culpa ou de atribuição dos males do Brasil a alguma desordem econômica internacional. Fatores externos pesaram, sim, e o melhor exemplo é o aperto gradual da política americana de juros, com reflexos nos mercados de crédito, nos fluxos financeiros e no câmbio. Mas os danos causados ao Brasil seriam muito menores, e isso de alguma forma é dito na carta, se as condições internas fossem menos complicadas.
Tombini aponta, como em outros documentos do BC, a importância da recomposição dos preços administrados, como o da gasolina e da eletricidade, e os efeitos da valorização do dólar. Mas o aumento dos preços administrados (18,06%) foi muito maior que o previsto no começo do ano (7,6%). A taxa final de câmbio, de R$ 3,90 por dólar, ficou muito longe da projetada inicialmente, de R$ 2,75. Houve muito mais do que erros de previsão: a formação de preços foi fortemente afetada por “alterações significativas na trajetória esperada para as variáveis fiscais”. Em linguagem comum: a evolução das contas do governo foi muito pior do que se esperava e isso se refletiu na percepção de risco, na redução da confiança, na variação do câmbio e na formação de preços dos vários tipos de ativos.
Tombini foi bastante diplomático para deixar de lado um detalhe importante – o caráter voluntarista e demagógico do congelamento de preços administrados, como os da eletricidade e dos combustíveis. Mas mostrou como o custo da correção foi ampliado por novos erros do governo. Ele também lembrou um detalhe especialmente significativo, o rebaixamento do Brasil ao grau especulativo por duas agências de classificação, quando o governo, em duas ocasiões, propôs o relaxamento da meta orçamentária para 2016.
Essa referência, no parágrafo 24, denuncia dois dos erros mais graves cometidos pela presidente, com apoio do ministro do Planejamento e futuro ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
Nesta condição, resta ao BC cumprir seu papel “independentemente do contorno das demais políticas”. Que mais pode fazer o BC, quando as projeções indicam inflação de 6,93% em 2016 e 5,20% em 2017 e há tão pouca confiança na gestão das contas públicas?
Diante do risco de inflação ainda acima de 6,5% neste ano, com novo estouro do limite de tolerância, também conhecido como teto da meta, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá anunciar mais um aumento de juros na próxima semana, logo depois de sua primeira reunião de 2016. Com uma alta de 0,5 ponto, a taxa básica, a Selic, chegará a 14,75%, segundo a aposta dominante no mercado. A expectativa de juros menores neste ano foi abandonada há mais de um mês, quando o agravamento da crise política, a incerteza sobre o futuro das contas públicas e a crescente desordem dos preços tornaram mais feias quase todas as projeções para o ano novo. No próximo Natal a taxa básica estará em 15,25%, um ponto acima do nível de hoje, de acordo com a avaliação captada na pesquisaFocus divulgada ontem pelo Banco Central (BC). Essa pesquisa é realizada semanalmente com cerca de cem instituições financeiras e consultorias.
A disposição de continuar aumentando os juros foi reafirmada pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, na carta aberta endereçada ao ministro da Fazenda, na sexta-feira passada, e divulgada depois do fechamento do mercado. A política monetária, segundo a carta, será orientada para garantir dois objetivos – manter a inflação dentro da margem de 6,5% em 2016 e levá-la à meta de 4,5% em 2017. Para isso, o BC agirá “independentemente do contorno das demais políticas”, afirmou Tombini, repetindo uma frase da ata da última reunião do Copom, em novembro.
A inflação chegou a 10,67% no ano passado e o presidente do BC, cumprindo a lei, mandou a carta para explicar por que o aumento de preços foi além do limite de tolerância, de 6,5%, fixado pelo Conselho Monetário Nacional. A explicação, tão razoável quanto poderia ser, passou muito longe de um reconhecimento de culpa ou de atribuição dos males do Brasil a alguma desordem econômica internacional. Fatores externos pesaram, sim, e o melhor exemplo é o aperto gradual da política americana de juros, com reflexos nos mercados de crédito, nos fluxos financeiros e no câmbio. Mas os danos causados ao Brasil seriam muito menores, e isso de alguma forma é dito na carta, se as condições internas fossem menos complicadas.
Tombini aponta, como em outros documentos do BC, a importância da recomposição dos preços administrados, como o da gasolina e da eletricidade, e os efeitos da valorização do dólar. Mas o aumento dos preços administrados (18,06%) foi muito maior que o previsto no começo do ano (7,6%). A taxa final de câmbio, de R$ 3,90 por dólar, ficou muito longe da projetada inicialmente, de R$ 2,75. Houve muito mais do que erros de previsão: a formação de preços foi fortemente afetada por “alterações significativas na trajetória esperada para as variáveis fiscais”. Em linguagem comum: a evolução das contas do governo foi muito pior do que se esperava e isso se refletiu na percepção de risco, na redução da confiança, na variação do câmbio e na formação de preços dos vários tipos de ativos.
Tombini foi bastante diplomático para deixar de lado um detalhe importante – o caráter voluntarista e demagógico do congelamento de preços administrados, como os da eletricidade e dos combustíveis. Mas mostrou como o custo da correção foi ampliado por novos erros do governo. Ele também lembrou um detalhe especialmente significativo, o rebaixamento do Brasil ao grau especulativo por duas agências de classificação, quando o governo, em duas ocasiões, propôs o relaxamento da meta orçamentária para 2016.
Essa referência, no parágrafo 24, denuncia dois dos erros mais graves cometidos pela presidente, com apoio do ministro do Planejamento e futuro ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
Nesta condição, resta ao BC cumprir seu papel “independentemente do contorno das demais políticas”. Que mais pode fazer o BC, quando as projeções indicam inflação de 6,93% em 2016 e 5,20% em 2017 e há tão pouca confiança na gestão das contas públicas?
Barafunda política - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 12/01
Pelo jeitão que está tomando, a próxima disputa presidencial, seja em 2018, ou antes, dependendo do que venha a acontecer, será tão ou mais diversificada do que a de 1989, quando simplesmente todos os principais líderes políticos aquela época participaram da campanha. E deu no que deu, Collor vitorioso, sem condições de governar o país, acabou impedido, contra um Lula que já admitiu que não estava preparado para ser presidente naquele momento.
Se naquela época não se sentia pronto, imagine-se o que faria, diante do que se sabe que fez 13 anos depois. A barafunda que se avizinha pode ser percebida pelos candidatos que se colocam em campo e pela divisão profunda no PSDB, o maior partido de oposição.
Com o senador Aécio Neves dominando a máquina partidária e aparecendo nas pesquisas como o favorito de uma hipotética corrida presidencial, outros líderes tucanos buscam alternativas. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, ele mesmo um potencial candidato do PMDB “se o cavalo passar encilhado”, declarou que gostaria de ver o senador José Serra nas hostes peemedebistas como o candidato oficial do partido.
Essa possibilidade esteve mais visível quando o impeachment parecia mais viável, com Serra podendo tornar-se um superministro da Fazenda num governo de coalizão presidido por Michel Temer. A viabilidade da candidatura dependeria do seu sucesso no cargo, o que desde já parece uma missão impossível: recuperar a economia sem cometer maldades que lhe inviabilizem a candidatura.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmim, outro eterno candidato, começa a se colocar mais claramente, mas parece disposto a cometer o mesmo erro pela segunda vez: se aproxima do MST. Um erro, aliás, que acometeu também Serra na campanha de 20010: tentar se afastar do governo Fernando Henrique e se vender como próximo de Lula, ou da esquerda de maneira geral.
Alckimin em 2006, para rebater as acusações de que era favorável às privatizações até de ícones da esquerda como a Petrobras ou o Banco do Brasil, em vez de defender a lógica das privatizações do governo Fernando Henrique, enfiou-se em um ridículo colete com as logomarcas de todas as estatais, para garantir quer elas seriam intocáveis em um eventual governo seu.
O próprio marqueteiro João Santana, depois de vencida a batalha que parecia ameaçada – Alckmin terminou o primeiro turno com uma votação inesperada de 41%, mas no segundo teve menos votos -, deu entrevistas dizendo-se surpreso com a falta de defesa da privatização da telefonia, por exemplo, que ajudara muito até mesmo os trabalhadores.
Pois agora Alckmin se abraça ao MST, como se fosse possível tirar daí alguma vantagem política. Revelando uma ambigüidade só comparável à sua inabilidade ao implantar uma reforma de ensino sem prévio debate entre educadores e alunos que encaminhasse a mudança de maneira menos autoritária.
Os benefícios que a reforma traria, na opinião de especialistas não engajados politicamente, ficaram ofuscados pela atitude imprudente do governo. Para se ter uma ideia do que a atitude de Alckmin pode produzir, o máximo de elogio que o líder do MST Gilmar Mauro conseguiu dizer foi: "É surpreendente e bom que esse projeto venha de um governo tucano. Isso ajuda a pressionar a esquerda e o governo".
Alckmin estaria disposto a entrar para o PSB, partido de seu vice, para disputar a presidência. E o senador tucano Álvaro Dias, sem espaço, vai para o Partido Verde para ser candidato. Mas não parece ter futuro nesse campo, pois terá pela frente a ex-ministra Marina, a verdadeira candidata ecológica. Só de origem do PSDB teríamos então, num cenário radical, quatro candidatos.
O ex-ministro Ciro Gomes começa a afiar sua língua para se lançar mais uma vez à presidência da República, o que pode ser um trunfo nesse debate que se avizinha, mas também uma fonte de autodestruição, como já aconteceu na eleição de 2002. Sua chegada ao PDT retirou do senador Cristovam Buarque a chance de ser novamente o candidato, e ele busca outra legenda.
A direita já aparece com dois candidatos, Jair Bolsonaro e Ronaldo Caiado. E o PT busca uma candidatura alternativa à de Lula, que pode ser a única opção, mas depende da Operação Lava-Jato e da Zelotes. Os demais potenciais candidatos petistas são abatidos como moscas sempre que tentam voar mais alto, vide o ministro-chefe do Gabinete Civil Jaques Wagner, vítima da maldição da Casa Civil nos governos petistas.
Pelo jeitão que está tomando, a próxima disputa presidencial, seja em 2018, ou antes, dependendo do que venha a acontecer, será tão ou mais diversificada do que a de 1989, quando simplesmente todos os principais líderes políticos aquela época participaram da campanha. E deu no que deu, Collor vitorioso, sem condições de governar o país, acabou impedido, contra um Lula que já admitiu que não estava preparado para ser presidente naquele momento.
Se naquela época não se sentia pronto, imagine-se o que faria, diante do que se sabe que fez 13 anos depois. A barafunda que se avizinha pode ser percebida pelos candidatos que se colocam em campo e pela divisão profunda no PSDB, o maior partido de oposição.
Com o senador Aécio Neves dominando a máquina partidária e aparecendo nas pesquisas como o favorito de uma hipotética corrida presidencial, outros líderes tucanos buscam alternativas. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, ele mesmo um potencial candidato do PMDB “se o cavalo passar encilhado”, declarou que gostaria de ver o senador José Serra nas hostes peemedebistas como o candidato oficial do partido.
Essa possibilidade esteve mais visível quando o impeachment parecia mais viável, com Serra podendo tornar-se um superministro da Fazenda num governo de coalizão presidido por Michel Temer. A viabilidade da candidatura dependeria do seu sucesso no cargo, o que desde já parece uma missão impossível: recuperar a economia sem cometer maldades que lhe inviabilizem a candidatura.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmim, outro eterno candidato, começa a se colocar mais claramente, mas parece disposto a cometer o mesmo erro pela segunda vez: se aproxima do MST. Um erro, aliás, que acometeu também Serra na campanha de 20010: tentar se afastar do governo Fernando Henrique e se vender como próximo de Lula, ou da esquerda de maneira geral.
Alckimin em 2006, para rebater as acusações de que era favorável às privatizações até de ícones da esquerda como a Petrobras ou o Banco do Brasil, em vez de defender a lógica das privatizações do governo Fernando Henrique, enfiou-se em um ridículo colete com as logomarcas de todas as estatais, para garantir quer elas seriam intocáveis em um eventual governo seu.
O próprio marqueteiro João Santana, depois de vencida a batalha que parecia ameaçada – Alckmin terminou o primeiro turno com uma votação inesperada de 41%, mas no segundo teve menos votos -, deu entrevistas dizendo-se surpreso com a falta de defesa da privatização da telefonia, por exemplo, que ajudara muito até mesmo os trabalhadores.
Pois agora Alckmin se abraça ao MST, como se fosse possível tirar daí alguma vantagem política. Revelando uma ambigüidade só comparável à sua inabilidade ao implantar uma reforma de ensino sem prévio debate entre educadores e alunos que encaminhasse a mudança de maneira menos autoritária.
Os benefícios que a reforma traria, na opinião de especialistas não engajados politicamente, ficaram ofuscados pela atitude imprudente do governo. Para se ter uma ideia do que a atitude de Alckmin pode produzir, o máximo de elogio que o líder do MST Gilmar Mauro conseguiu dizer foi: "É surpreendente e bom que esse projeto venha de um governo tucano. Isso ajuda a pressionar a esquerda e o governo".
Alckmin estaria disposto a entrar para o PSB, partido de seu vice, para disputar a presidência. E o senador tucano Álvaro Dias, sem espaço, vai para o Partido Verde para ser candidato. Mas não parece ter futuro nesse campo, pois terá pela frente a ex-ministra Marina, a verdadeira candidata ecológica. Só de origem do PSDB teríamos então, num cenário radical, quatro candidatos.
O ex-ministro Ciro Gomes começa a afiar sua língua para se lançar mais uma vez à presidência da República, o que pode ser um trunfo nesse debate que se avizinha, mas também uma fonte de autodestruição, como já aconteceu na eleição de 2002. Sua chegada ao PDT retirou do senador Cristovam Buarque a chance de ser novamente o candidato, e ele busca outra legenda.
A direita já aparece com dois candidatos, Jair Bolsonaro e Ronaldo Caiado. E o PT busca uma candidatura alternativa à de Lula, que pode ser a única opção, mas depende da Operação Lava-Jato e da Zelotes. Os demais potenciais candidatos petistas são abatidos como moscas sempre que tentam voar mais alto, vide o ministro-chefe do Gabinete Civil Jaques Wagner, vítima da maldição da Casa Civil nos governos petistas.
Bem ao estilo lulopetista - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S. Paulo - 12/01
Jaques Wagner, ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, é o exemplo típico do militante petista, de origem sindical, bem sucedido na vida pública e privada, identificado com o estilo e os métodos do chefão Lula, de quem é considerado, dentro do próprio PT, como uma versão “envernizada”. Hoje é um dos principais protagonistas da cena política e chega a ser apontado, dentro e fora de seu partido, como uma possível opção petista para disputar a sucessão de Dilma Rousseff em 2018, um plano B para a hipótese de Lula desistir de se candidatar.
Tal qual muitos altos dirigentes petistas, Jaques Wagner vê-se às voltas com denúncias de seu envolvimento em transações financeiras estranhas, de acordo com o que revelam mensagens entre ele e o ex-presidente da construtora OAS, Léo Pinheiro, gravadas em aparelhos celulares apreendidos do ex-presidente da empreiteira, já condenado no âmbito da Operação Lava Jato. Além disso, em delação premiada do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró – outro condenado por corrupção – Wagner é acusado de ter recebido recursos desviados da estatal para a campanha de sua primeira eleição ao governo da Bahia, em 2006.
A trajetória política de Wagner, sempre dentro do PT, do qual foi fundador quando ainda era dirigente sindical dos trabalhadores na petroquímica em Salvador, ganhou projeção a partir da eleição de Lula à Presidência da República, quando foi nomeado ministro do Trabalho e, dois anos depois, titular da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, onde passou a ter papel de destaque na coordenação política do governo, logo após a saída de José Dirceu da chefia da Casa Civil. Este último foi substituído por Dilma Rousseff, a quem Lula atribuiu a responsabilidade pela coordenação administrativa. Wagner deixou Brasília para se candidatar ao governo da Bahia em 2006. Reelegeu-se em 2010. Em 2015, quando Dilma assumiu seu segundo mandato, voltou à capital federal como ministro da Defesa. E naquela pasta ficou até outubro último, quando Dilma finalmente cedeu à pressão de Lula e o transferiu para a Casa Civil em substituição ao notório Aloizio Mercadante.
Nas novas funções, Wagner dedicou-se desde logo ao desafio de promover a distensão das relações do PT com seu principal aliado, o PMDB, atendendo à prioridade de esvaziar a campanha do impeachment de Dilma. Sendo a habilidade política a sua principal credencial para o cargo que ocupa, Wagner, em evidente articulação com Lula, passou a fazer declarações calculadamente ousadas, na tarefa de mais longo prazo de recuperar a imagem do PT.
Foi com esse objetivo que, a pretexto de fazer uma autocrítica do partido diante dos erros que resultaram na crise política, econômica e moral em que o País está mergulhado, Wagner admitiu que o PT deixou de fazer as necessárias reformas políticas quando tinha força para isso, porque seus quadros preferiram “lambuzar-se” com as delícias do poder. Esse é o tipo da afirmação que Lula jamais faria – seria abusar da credulidade até dos mais desavisados –, mas, na boca de outro, pode sensibilizar antigos militantes e simpatizantes de boa-fé que estão hoje recolhidos a um constrangido desapontamento diante da evidência de que os governos petistas não conseguiram garantir aos brasileiros honestos as mesmas possibilidades de prosperidade que ofereceram a políticos, funcionários e empresários inescrupulosos.
Assim, o fato de mais um figurão do PT, agora o ministro Jaques Wagner, tornar-se alvo de denúncias de corrupção demonstra apenas o óbvio: a começar por Lula – que se disse traído e pediu desculpas ao País pelo mensalão e depois, do alto de sua enorme popularidade, passou a chamar de “farsa” o escândalo que levou a Suprema Corte a colocar na cadeia uma quadrilha de “guerreiros do povo brasileiro” –, a grande proeza dos petistas e aliados em 13 anos de “lambuzação” no poder foi criar a mais seleta e ousada elite de amigos do alheio que enriqueceram à custa do desvio dos recursos que faltam para a educação, a saúde, a segurança, etc.
A presidente Dilma vive repetindo que é honesta, que não admite e combate a corrupção no governo. Dá para imaginar, então, o enorme constrangimento que lhe é imposto pela obrigação de conviver com pessoas que não sabe se amanhã deixarão de ser apenas suspeitas de graves malfeitos.
Jaques Wagner, ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, é o exemplo típico do militante petista, de origem sindical, bem sucedido na vida pública e privada, identificado com o estilo e os métodos do chefão Lula, de quem é considerado, dentro do próprio PT, como uma versão “envernizada”. Hoje é um dos principais protagonistas da cena política e chega a ser apontado, dentro e fora de seu partido, como uma possível opção petista para disputar a sucessão de Dilma Rousseff em 2018, um plano B para a hipótese de Lula desistir de se candidatar.
Tal qual muitos altos dirigentes petistas, Jaques Wagner vê-se às voltas com denúncias de seu envolvimento em transações financeiras estranhas, de acordo com o que revelam mensagens entre ele e o ex-presidente da construtora OAS, Léo Pinheiro, gravadas em aparelhos celulares apreendidos do ex-presidente da empreiteira, já condenado no âmbito da Operação Lava Jato. Além disso, em delação premiada do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró – outro condenado por corrupção – Wagner é acusado de ter recebido recursos desviados da estatal para a campanha de sua primeira eleição ao governo da Bahia, em 2006.
A trajetória política de Wagner, sempre dentro do PT, do qual foi fundador quando ainda era dirigente sindical dos trabalhadores na petroquímica em Salvador, ganhou projeção a partir da eleição de Lula à Presidência da República, quando foi nomeado ministro do Trabalho e, dois anos depois, titular da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, onde passou a ter papel de destaque na coordenação política do governo, logo após a saída de José Dirceu da chefia da Casa Civil. Este último foi substituído por Dilma Rousseff, a quem Lula atribuiu a responsabilidade pela coordenação administrativa. Wagner deixou Brasília para se candidatar ao governo da Bahia em 2006. Reelegeu-se em 2010. Em 2015, quando Dilma assumiu seu segundo mandato, voltou à capital federal como ministro da Defesa. E naquela pasta ficou até outubro último, quando Dilma finalmente cedeu à pressão de Lula e o transferiu para a Casa Civil em substituição ao notório Aloizio Mercadante.
Nas novas funções, Wagner dedicou-se desde logo ao desafio de promover a distensão das relações do PT com seu principal aliado, o PMDB, atendendo à prioridade de esvaziar a campanha do impeachment de Dilma. Sendo a habilidade política a sua principal credencial para o cargo que ocupa, Wagner, em evidente articulação com Lula, passou a fazer declarações calculadamente ousadas, na tarefa de mais longo prazo de recuperar a imagem do PT.
Foi com esse objetivo que, a pretexto de fazer uma autocrítica do partido diante dos erros que resultaram na crise política, econômica e moral em que o País está mergulhado, Wagner admitiu que o PT deixou de fazer as necessárias reformas políticas quando tinha força para isso, porque seus quadros preferiram “lambuzar-se” com as delícias do poder. Esse é o tipo da afirmação que Lula jamais faria – seria abusar da credulidade até dos mais desavisados –, mas, na boca de outro, pode sensibilizar antigos militantes e simpatizantes de boa-fé que estão hoje recolhidos a um constrangido desapontamento diante da evidência de que os governos petistas não conseguiram garantir aos brasileiros honestos as mesmas possibilidades de prosperidade que ofereceram a políticos, funcionários e empresários inescrupulosos.
Assim, o fato de mais um figurão do PT, agora o ministro Jaques Wagner, tornar-se alvo de denúncias de corrupção demonstra apenas o óbvio: a começar por Lula – que se disse traído e pediu desculpas ao País pelo mensalão e depois, do alto de sua enorme popularidade, passou a chamar de “farsa” o escândalo que levou a Suprema Corte a colocar na cadeia uma quadrilha de “guerreiros do povo brasileiro” –, a grande proeza dos petistas e aliados em 13 anos de “lambuzação” no poder foi criar a mais seleta e ousada elite de amigos do alheio que enriqueceram à custa do desvio dos recursos que faltam para a educação, a saúde, a segurança, etc.
A presidente Dilma vive repetindo que é honesta, que não admite e combate a corrupção no governo. Dá para imaginar, então, o enorme constrangimento que lhe é imposto pela obrigação de conviver com pessoas que não sabe se amanhã deixarão de ser apenas suspeitas de graves malfeitos.
Voluntarismo em torno do dinheiro das ‘pedaladas’ - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 12/01
Usar os recursos para aumentar oferta de crédito é arriscada aposta do Planalto em ajustar as contas sem cortes, apenas pela reativação da economia
O aviso dado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, de que, na economia, “não há coelhos a tirar da cartola”, foi reforçado pela presidente Dilma pouco depois, num café da manhã com a imprensa. Ficou entendido, portanto, que nada será feito de mirabolante, tampouco de surpresa, contra a crise, na inauguração efetiva da gestão de Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda.
O governo sabe que precisa avançar com cautela em terreno minado. Barbosa carrega no currículo a nada abonadora participação na formulação do “novo marco macroeconômico”, o lastro intelectual da desastrosa política econômica aplicada em Dilma 1, fonte de inspiração, já no segundo mandato de Lula, das ações “anticíclicas” aplicadas a partir da eclosão da crise mundial, em fins de 2008.
Plasmado na visão ideológica do intervencionismo voluntarioso, exacerbado devido às eleições de 2014, o “novo marco” deixou de herança à própria Dilma uma cava recessão, inflação de dois dígitos, desemprego ascendente etc. Barbosa e Dilma se preparam para anunciar medidas que reativem a economia, sem seguir o caminho do ex-ministro Joaquim Levy, que dava ênfase ao ajuste fiscal pela redução de gastos.
Para isso, mobilizarão os R$ 55,8 bilhões que o Planalto transferiu, no final do ano, para o BNDES, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica e o FGTS, a fim de zerar “pedaladas” praticadas para maquiar a contabilidade pública.
Em entrevista na “Folha de S.Paulo” de domingo, em que citou infraestrutura, habitação, saneamento e capital de giro de pequenas e médias empresas como áreas a serem irrigadas por esse dinheiro, Nelson Barbosa frisou que não haverá subsídio nessa nova oferta de crédito — a favor da qual Lula e economistas orgânicos do PT tanto se batem. Este coelho não sairia da cartola da heterodoxia fiscal, porque não implicará mais gastos, como garante o ministro. Que, por sinal, renovou o compromisso com a meta de 0,5% do PIB de superávit primário.
A grande aposta do Planalto é reequilibrar as contas públicas menos por meio de cortes e mais pela inversão da curva de queda na coleta de impostos, pela retomada do crescimento. Aqui aflora mais um ato de voluntarismo palaciano.
O próprio ministro reconhece que não há escassez de crédito, mas falta de demanda. Por óbvio: sem credibilidade, o governo não anima o empresário a investir. Isso mudaria caso o Planalto agisse de maneira firme para conter gastos. Não será assim, e por isso pode ser que os bilhões oferecidos via bancos públicos sejam incapazes de fazer mover as engrenagens do crescimento. Por falta de apetite de ressabiados empresários.
Com um agravante: injetar mais crédito numa economia com inflação elevada e grande dispersão na remarcação de preços é o oposto do que se deve fazer nessas circunstâncias. Novamente, a política fiscal irá na contramão da monetária. Já se conhece o final: não dará certo.
Usar os recursos para aumentar oferta de crédito é arriscada aposta do Planalto em ajustar as contas sem cortes, apenas pela reativação da economia
O aviso dado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, de que, na economia, “não há coelhos a tirar da cartola”, foi reforçado pela presidente Dilma pouco depois, num café da manhã com a imprensa. Ficou entendido, portanto, que nada será feito de mirabolante, tampouco de surpresa, contra a crise, na inauguração efetiva da gestão de Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda.
O governo sabe que precisa avançar com cautela em terreno minado. Barbosa carrega no currículo a nada abonadora participação na formulação do “novo marco macroeconômico”, o lastro intelectual da desastrosa política econômica aplicada em Dilma 1, fonte de inspiração, já no segundo mandato de Lula, das ações “anticíclicas” aplicadas a partir da eclosão da crise mundial, em fins de 2008.
Plasmado na visão ideológica do intervencionismo voluntarioso, exacerbado devido às eleições de 2014, o “novo marco” deixou de herança à própria Dilma uma cava recessão, inflação de dois dígitos, desemprego ascendente etc. Barbosa e Dilma se preparam para anunciar medidas que reativem a economia, sem seguir o caminho do ex-ministro Joaquim Levy, que dava ênfase ao ajuste fiscal pela redução de gastos.
Para isso, mobilizarão os R$ 55,8 bilhões que o Planalto transferiu, no final do ano, para o BNDES, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica e o FGTS, a fim de zerar “pedaladas” praticadas para maquiar a contabilidade pública.
Em entrevista na “Folha de S.Paulo” de domingo, em que citou infraestrutura, habitação, saneamento e capital de giro de pequenas e médias empresas como áreas a serem irrigadas por esse dinheiro, Nelson Barbosa frisou que não haverá subsídio nessa nova oferta de crédito — a favor da qual Lula e economistas orgânicos do PT tanto se batem. Este coelho não sairia da cartola da heterodoxia fiscal, porque não implicará mais gastos, como garante o ministro. Que, por sinal, renovou o compromisso com a meta de 0,5% do PIB de superávit primário.
A grande aposta do Planalto é reequilibrar as contas públicas menos por meio de cortes e mais pela inversão da curva de queda na coleta de impostos, pela retomada do crescimento. Aqui aflora mais um ato de voluntarismo palaciano.
O próprio ministro reconhece que não há escassez de crédito, mas falta de demanda. Por óbvio: sem credibilidade, o governo não anima o empresário a investir. Isso mudaria caso o Planalto agisse de maneira firme para conter gastos. Não será assim, e por isso pode ser que os bilhões oferecidos via bancos públicos sejam incapazes de fazer mover as engrenagens do crescimento. Por falta de apetite de ressabiados empresários.
Com um agravante: injetar mais crédito numa economia com inflação elevada e grande dispersão na remarcação de preços é o oposto do que se deve fazer nessas circunstâncias. Novamente, a política fiscal irá na contramão da monetária. Já se conhece o final: não dará certo.