sexta-feira, agosto 07, 2015

Efeitos do dólar - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 07/08

O dólar já passou a ser o novo perigo inflacionário que entrou nos radares dos analistas. E até do Banco Central, pelo que se depreende da Ata do Copom. O dólar subindo mais do que o previsto tem impacto no índice de preços, que já subiu por outros reajustes, como o da energia. Por enquanto, a previsão mais frequente é que os juros não vão cair, mas também não vão subir mais até o fim do ano.
Há quem diga que o dólar já fez estragos suficientes e pode haver novo aumento de juros, mas é cedo para dizer com segurança. O que a Ata da última reunião, divulgada ontem, informa é que os preços administrados terão um aumento maior do que o Banco Central previa há um mês e meio. No último encontro, calculava que subiria 12,7%. Agora, acha que esses preços subirão, em média, 14,8%.

Curioso é o eufemismo do Banco Central para falar da recessão brasileira. Diz que "o processo de ajustamento macroeconômico" leva a um "crescimento abaixo do potencial" e que há um "processo de distensão no mercado de trabalho". O Brasil está, na verdade encolhendo, e não crescendo abaixo do potencial, e no ano que vem não se espera crescimento. Isso não será efeito do ajuste, mas do desajuste feito anteriormente.

Para o ano que vem, o BC está otimista em relação à inflação. Na Ata, registra que está se fortalecendo o cenário de convergência para 4,5% no final de 2016. Diz que o efeito defasado da alta de juros ajudará no esforço para se atingir o centro da meta e ressalta que as projeções dos analistas são de desaceleração do índice.

Essa é a boa notícia no meio de um cenário nebuloso. As expectativas são de que no ano que vem se conseguirá derrubar vários pontos no IPCA. A taxa terminará acima de 9% este ano, e as projeções do mercado, capturadas pela pesquisa Focus, são de que ela chegará ao final do ano que vem em 5,4%.

A última reunião do Copom aconteceu logo depois da decisão do governo de reduzir a meta de superávit primário. Na época, muitas previsões eram que os juros subiriam 0,25%. A partir da decisão, as projeções subiram para 0,5%, o que, de fato, aconteceu. O BC admitiu ontem que essa piora do quadro fiscal é prejudicial ao controle da inflação.

Hoje, o IBGE divulga a inflação de julho, e a expectativa é que a taxa seja menor do que a de junho. O problema é que, ainda assim, será muito mais alta do que julho de 2014, que foi de 0,01%, e isso fará o índice acumulado em 12 meses escalar de 8,89% para perto de 9,5%. Quanto mais tempo a inflação ficar nesse patamar, mais ela se fortalece pela indexação; mais renda tira dos trabalhadores; mais desconfiança leva aos empresários.

O novo problema agora é o dólar porque ele passa a ser um novo fator a se juntar a vários outros que têm pressionado os índices de preços. Há poucos meses, foi a crise hídrica que afetou as lavouras e aumentou o custo dos alimentos. Também houve o impacto do preço da energia, que o BC calcula que aumentará 50% este ano. As pressões têm se revezado sobre o índice, e por isso a taxa de juros foi elevada.

A preocupação do BC com o câmbio levou o diretor da Política Monetária, Aldo Mendes, a dizer ao "Valor Econômico" que considera a cotação "esticada demais", fora dos fundamentos. Isso fez a moeda cair em relação à máxima do dia. Há uma semana, o dólar valia R$ 3,33, no dia da última reunião do Copom. Ontem, chegou a ser vendido por R$ 3,57 e fechou em R$ 3,53. Os cenários de referência de mercado, analisados também pelo Banco Central, estimam a moeda em R$ 3,25. Ou seja, tanto o Copom quanto os bancos e as consultorias terão que refazer as projeções de inflação caso o dólar se mantenha no patamar atual.

Essa alta também tem impacto sobre os custos e as dívidas das empresas. A Petrobras divulgou uma queda de 90% no seu lucro do segundo trimestre porque, entre outros motivos, o dólar mais caro encarece os derivados que importa. A sua dívida bruta subiu 18% desde dezembro, saltando de R$ 350 bilhões para R$ 415 bi. Cerca de 80% da dívida está em moeda estrangeira.

Mas a mais importante fonte de incerteza na conjuntura atual, entretanto, é a crise política, porque ela aumenta o risco de perda do grau de investimento. Isso reduz a entrada de investidores e eleva a pressão sobre o câmbio. Existem outros motivos que influenciam no dólar, como a recuperação da economia americana, com provável alta de juros, e a desaceleração da China. O principal fator, no entanto, é a incerteza interna.

Desfecho político domina toda a pauta econômica - CLAUDIA SAFATLE

VALOR ECONÔMICO - 07/08

Ao contaminar uma economia já frágil, mergulhada em recessão, sob forte desequilíbrio fiscal e em meio à batalha para derrubar a inflação de mais de 9%, a crise política de desfecho ainda desconhecido assume o centro das preocupações dos responsáveis pela política econômica do governo.
Para o Banco Central vem daí, e não dos fundamentos econômicos, a razão para a forte desvalorização do real frente ao dólar que ontem chegou a ser cotado a R$ 3,5702. Primeiro o BC avisou que a taxa que estava sendo praticada era um exagero. No final do dia, a instituição aumentou a rolagem dos "swaps" cambiais de 60% para 100% a partir de hoje.

Na hora do almoço o diretor de Política Monetária, Aldo Mendes, passou uma mensagem cristalina ao mercado. Ele disse ao Valor PRO: "O nível atual da taxa de câmbio está muito além, ou muito acima, do que seria explicado pelos fundamentos econômicos do país, mesmo considerando o delicado momento politico. O preço do dólar está claramente esticado. Entendo que os agentes estão agindo aparentemente com pouca racionalidade". E alertou: "Comprar moedas nesses níveis pode representar um risco potencial de perda no médio prazo". O recado era o sinal de que o BC atuaria mais no mercado de câmbio, que está pressionado pela escassez de liquidez.

O dólar, depois de testar a máxima, encerrou o dia com valorização de 1,34% diante do real, cotado a R$ 3,5361. Ainda não se sabia da rolagem integral dos swaps, anunciada pelo BC no início da noite.

A crise política associada às incertezas na economia deu início a um movimento de saída de recursos do país. Dados do BC apontam que o fluxo de julho foi negativo em US$ 3,9 bilhões, gerado sobretudo pela saída de US$ 8,37 bilhões pelo financeiro. Há uma demanda por dólar físico de quem quer deixar o Brasil e, talvez, só a rolagem de "swaps" cambiais não atenda a esse mercado. Em situações semelhantes do passado o BC fez leilões de linha com compromisso de recompra e vendeu reservas cambiais, mediante "ração diária" ou leilão.

A turbulência política não está explícita no balanço de riscos da inflação que o BC cita na ata do Copom, divulgada ontem, mas permeia a avaliação do câmbio, da atividade econômica e está na raiz da obliteração do objetivo fiscal.

A ata reproduz o comunicado da última reunião que elevou os juros para 14,25% ao ano. "O Comitê entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficientemente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no final de 2016", diz a ata.

Ao conceito de "suficientemente prolongado", porém, o Copom agregou uma nova expressão: "desvios significativos". Ou seja, os riscos para que as projeções de inflação do comitê convirjam com segurança para a meta de 4,5% em 2016 "são condizentes com o efeito defasado e cumulativo da ação de política monetária, mas exigem que a política monetária se mantenha vigilante em caso de desvios significativos das projeções de inflação em relação à meta".

Assim, o BC deixou aberta a porta para uma retomada do ciclo de aperto monetário caso a inflação escape da meta e quis manter ambíguo o quanto considera ser um desvio significativo.

A avaliação da autoridade monetária é que o mercado fez a leitura correta da ata. Há quem tenha enxergado, também, um indício de que a convergência estrita para a meta de 4,5% em dezembro de 2016 talvez não seja mais um imperativo a ferro e fogo.

"A análise do balanço de riscos me diz que o hiato do produto vai se ampliar e fazer com que as projeções do BC cheguem em 4,5%, mesmo que o câmbio não jogue a favor. Essa é uma análise subjetiva do balanço de risco, com a qual pode-se concordar ou não, mas que os banco centrais podem e devem fazer", disse um ex-diretor do BC que viu, nessa questão, uma mudança em relação ao que vinha sendo dito até agora.

Nesta semana os movimentos dos partidos da base aliada e das oposições se intensificaram na busca de uma solução política que abrevie a crise. As declarações do vice-presidente Michel Temer, os elogios ao PSDB e pedido de apoio, feitos pelo chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, em comissão na Câmara dos Deputados, na quarta feira, foram interpretados como o sinal mais evidente do desânimo que tomou conta do governo e, mais especificamente, do Palácio do Planalto.

Dilma tentou reagir na semana anterior, com a reunião dos governadores e nesta, em uma articulação de um encontro com os maiores empresários do país para antes do dia 16, data de convocação dos protestos de rua. As primeiras sondagens sobre a realização desse encontro com os representantes do PIB não foram muito animadoras. O risco é de haver mais ausência do que presença.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem dito a interlocutores que "a questão politica é passageira, a mudança do cenário econômico, com o fim do ciclo das commodities, é duradoura".

Diante das dificuldades que enfrenta no Congresso para ter aprovadas as medidas de ajuste fiscal, e tendo na presidência da Câmara o deputado Eduardo Cunha, totalmente hostil a uma agenda que não seja a sua, Levy tem argumentado com algumas as lideranças políticas que o curto prazo não pode desviar totalmente a atenção do que é estratégico para o país, que é "a necessária preparação da economia para que o Brasil possa enfrentar e prosperar em um mundo mais competitivo e de baixo crescimento".

Passados 70 anos da destruição de Hiroshima e Nagasaki, não faltou quem, em um ato de dramaticidade, comparasse o que pode vir a acontecer com o governo às duas bombas atômicas jogadas nas cidades do Japão no fim da Segunda Guerra Mundial: a primeira, " little boy", e, três dias depois, a segunda, "fat man".

Aos amigos petistas - NELSON MOTTA

O GLOBO - 07/08

Nunca perdi um amigo por causa de política. Tenho vários amigos petistas que merecem meu afeto e respeito, alguns até minha admiração, e convivemos bem porque quase nunca falamos de política, talvez por termos assuntos mais interessantes a conversar. Mas agora o assunto é inevitável. E eles estão mais decepcionados do que eu.


Também tenho amigos tucanos, comunistas, conservadores, não meço a qualidade das pessoas pelo seu time, religião ou suas crenças políticas, em que sonhos, idealismo e equívocos se misturam com ambição, desonestidade e incompetência para provocar monstruosas perdas de vidas, dignidade e dinheiro ao coitado do povo que todos eles dizem amar.

O PT está caindo aos pedaços, depois de 13 anos no poder, com grandes conquistas e imensos desastres, mas a perspectiva de ser governado pelo PMDB ou pelo PSDB não é animadora. Claro que há gente decente e competente nos dois partidos, mas a maioria de seus quadros e dirigentes não é melhor do que os piores petistas, e vice-versa.

Chegamos finalmente ao “nós contra eles” que Lula tanto queria ... quando era maioria ... e agora se volta contra ele, perseguido como os judeus pelos nazistas e os cristãos pelos romanos ... rsrs.

Se não fosse tão arrogante e autoritária, Dilma mereceria pena, porque não é desonesta, mas é mentirosa e sua incompetência nos dá mais prejuízos do que a corrupção. Suas falas tortuosas são a expressão da sua confusão mental.

E se Lula não fosse tão vaidoso e ambicioso, tão irresponsável e inescrupuloso, não teria jogado a sua história na lama por achar que está acima do bem e do mal e que nunca descobririam que ele sempre soube de tudo.

Petistas inteligentes e informados sabem que o sonho acabou, game over, zé fini, não por uma conspiração da CIA, dos coxinhas ou da imprensa golpista, mas pelos seus próprios erros, pelo baixo nível e alta voracidade dos seus quadros, pela ganância e incompetência que nos levaram ao lodaçal onde chafurdamos.

É triste, amigos petistas, o sonho virou pesadelo, mas não foi a direita que venceu, foi o partido que se perdeu. O medo está dando de 7 a 1 na esperança.

"Presos na Maria Antônia" - CLÓVIS ROSSI

Folha SP - 07/08

Sempre achei que a esquerda, nacional e internacional, ficou soterrada sob os escombros do Muro de Berlim. Até aí, dava para entender embora não para justificar. Afinal, a queda do Muro e o consequente fim simbólico do comunismo foram acontecimentos tão transcendentais que teriam mesmo que desnortear até quem estava do lado de cá do Muro, quanto mais os que simpatizavam com o lado derrotado.

O que surpreende, agora, com o manifesto de escritores e artistas em defesa de José Dirceu, é que esse pessoal não conseguiu sair nem sequer da rua Maria Antônia, cuja simbologia antecede de muito a queda do Muro. É inacreditável que gente que parece inteligente não perceba que José Dirceu deixou há séculos de ser o jovem idealista que lutava contra a ditadura nas barricadas estudantis de 1968.

Nem era preciso o mensalão ou, agora, o petrolão para fazer uma constatação tão óbvia.

Bastava saber, por exemplo, que Dirceu admitiu à revista "Piauí", em 2008, que prestava consultoria ao bilionário mexicano Carlos Slim, um dos três homens mais ricos do mundo, segundo a revista "Forbes".

A esquerda, inclusive muitos ou todos que assinam o manifesto, sempre denunciou a maneira como se enriquece no México (ou no Brasil).

Um idealista de verdade jamais prestaria serviços a esse tipo de empresário.

O estranhamento não é apenas meu, mas de um fundador do PT, o cientista político Rudá Ricci, que se afastou do partido desencantado.

Escreveu Rudá após a entrevista de Dirceu à "Piauí":

"O grande problema não foi se expor como um megaconsultor, homem de R$ 15 mil por consultoria, ou R$ 150 mil mensais. Esta vaidade de se expor é estranha para um ex-clandestino de esquerda. Revelar que trabalha para o homem mais rico do mundo também é estranho para um ex-presidente do maior partido de esquerda do país. Mas são idiossincrasias que acometem as melhores famílias".

À essa lucrativa "idiossincrasia" somaram-se consultorias –não devidamente comprovadas, segundo a Polícia Federal– às maiores empreiteiras do país.

No tempo em que a esquerda pensava, não deixava de denunciar a promiscuidade entre obras públicas, tocadas em geral por essas mesmas empreiteiras, e poder público.

Hoje, ao defender Dirceu, defende-se automaticamente a promiscuidade, como se houvesse maracutaia do bem (as "nossas") e do mal ("as dos outros").

Os pedidos, em voz quase inaudível, para que o PT faça um reexame de suas práticas já surgiram em 2008, na esteira do mensalão.

Rudá Ricci, por exemplo, escrevia então: "Seria fantástico se o julgamento [do mensalão] provocasse um debate franco entre petistas e toda esquerda tupiniquim. Mas já não tenho mais 20 anos. Não tenho motivos para acreditar que o brilho da utopia seja mais forte que as cores reluzentes do poder absoluto e domesticador".

Bingo, Rudá. O poder domesticou não só dirigentes do PT mas também uma fatia da intelectualidade, o que é um contrassenso: intelectual, por definição, é contestador.

'O quadro fiscal é tão catastrófico como em 80' - FABIO GIAMBIAGI

ENTREVISTA
'O quadro fiscal é tão catastrófico como em 80' - FABIO GIAMBIAGI

KARLA SPOTORNO 

O ESTADÃO - 07/08


O Brasil de hoje lembra os piores momentos dos anos 80. O País não enfrenta a hiperinflação, mas "o quadro fiscal é tão catastrófico quanto aquele". A conclusão é do economista Fabio Giambiagi, especialista em finanças públicas.

Em entrevista ao Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, Giambiagi considerou que a sessão do Congresso que aprovou, na madrugada de quinta-feira, a PEC 443 (que eleva salários de advogados da União e procuradores dos Estados) "se assemelha a uma espécie de Baile da Ilha Fiscal. Isso não vai dar certo, é uma rota para o desastre".



Essa "rota", carregada de aumento de gastos públicos, pode levar o País a perder o grau de investimento, alerta o economista, que está prestes a lançar um novo livro sobre a economia brasileira (Capitalismo Modo de Usar, Editora Elsevier). A seguir, trechos da entrevista.

O que significa para as finanças públicas e para o ajuste fiscal a derrota do governo na Câmara?

O que está acontecendo é muito grave. Eu fiquei assistindo à TV Câmara, com aquele desfile de líderes de partidos da base aliada votando a favor da PEC à qual a Fazenda corretamente se opunha. A impressão que dava é que não há governo. A situação me lembrou os piores momentos dos anos 80. Não temos a hiperinflação daqueles tempos, mas o quadro fiscal é tão catastrófico quanto aquele.

Por que o sr. considera a situação muito preocupante?

A base aliada quer todos os bônus de ser governo, mas sem ter nenhum ônus. Então, o governo se converte em algo disfuncional, onde inventam-se gastos do nada e não há a menor preocupação com a consistência disso.

Faltou alguém questionar a "consistência" do projeto?

Estamos com um déficit público (nominal), nos últimos 12 meses, de mais de 8% do PIB. Tenho dito que estamos no regime do que eu chamo de "9 Bis": a perspectiva para o ano está se aproximando de 9% de inflação e 9% do PIB de déficit. Talvez a inflação seja um pouco maior e o déficit, um pouco menor, mas são números assustadores. Nessa situação, a sessão de ontem do Congresso se assemelha a uma espécie de Baile da Ilha Fiscal. Isso não vai dar certo, é uma rota para o desastre.

Há o risco de os municípios e os Estados serem afetados por essa aprovação, no sentido de terem de aprovar uma equalização salarial?

Vai depender do que for aprovado. Mas é evidente que, direta ou indiretamente, as carreiras análogas a nível estadual serão as próximas da fila a pedir aumento. Temos um PIB que vai encolher pelo menos 2% e o Congresso aprovando aumentos exorbitantes. Qualquer cidadão na rua percebe que uma coisa não combina com a outra.

Para alguns, um verdadeiro ajuste fiscal depende de mudanças na Constituição Federal. Qual é a sua avaliação? Por quê?

A ironia é que essa PEC é justamente uma mudança na Constituição, mas que constitui a rigor uma contrarreforma. Mudanças na Constituição são importantes, mas no momento o mais importante de tudo é que Executivo e Legislativo deixem de ser o que são hoje: duas paralelas que não se encontram nem no infinito. "Checks and balances" são parte da democracia, mas um País não pode funcionar quando Executivo e Legislativo estão inteiramente divorciados, e toda semana o Congresso aprova uma medida que dinamita as bases da estabilidade.

A sinalização de que o Congresso Nacional está disposto a aprovar as chamadas "bombas fiscais" pode antecipar a perda do grau de investimento?

Isso me lembra um velho tango argentino, onde há uma estrofe que diz 'Y vos interpretás / las cosas al revés...' A agenda do ajustamento é uma, e o que temos assistido no Parlamento é exatamente o contrário: em vez de um ajuste tributário, a protelação desse ajuste; em vez de ajuste de gastos, mais gastos. É claro que, do jeito que as coisas estão se passando, estamos fazendo todo o possível para acelerar o processo que levaria ao "downgrade" (perda do grau de investimento).

A Lava Jato impõe uma ruptura em uma dinâmica de corrupção que envolve empresas e políticos e que, aparentemente, sustentou o modelo de coalizão política no Brasil. O atual combate ao governo mostra que essa dinâmica foi realmente rompida e que nenhuma outra a substituiu?

Não concordo totalmente. Uma coisa é dizer que há vícios que são antigos, e de fato são, mas não concordo que a corrupção tenha sido o amálgama que permitiu ao presidente da República governar desde a redemocratização. De qualquer forma, espero, como cidadão, obviamente, que a Lava Jato seja um divisor de águas, sim.

Não seria necessário lembrar ao PSDB, à oposição dentro do PMDB e a todos os outros partidos da oposição que aprovações como a de ontem inviabilizam a gestão de qualquer presidente, não apenas a do PT?

A equação fiscal é a mesma, qualquer que seja o governante: se o gasto for maior que a receita, será preciso aumentar a dívida pública. Se há partidos que aprovam a "pauta bomba" e no futuro o governo muda de mãos, são eles que terão de honrar o cheque. Quem sofrerá é o bolso do cidadão. Será preciso aumentar o Imposto de Renda, por exemplo, para aumentar o salário do funcionalismo. Eu me pergunto: será que é isso que o cidadão quer?