FOLHA DE SP - 06/10
Karl Marx falhou: como cientista e até como profeta. Esse fracasso já foi referido em coluna (Será que Deus existe?). Mas faltou acrescentar um pormenor: Marx nem sequer previu que a sua "luta de classes" seria substituída por uma perpétua "imitação de classe".
O proletariado não desejava destruir o sistema capitalista. Pelo contrário: desejava antes participar nele, imitando a burguesia –nos seus hábitos e gostos– e desfrutando dos mesmos confortos materiais que só o capitalismo permite.
Se dúvidas houvesse, bastaria olhar para os confrontos em Hong Kong, com os manifestantes a exigir respeito pelas eleições de 2017 na ilha. Pequim ficou em estado de alerta.
Entendo: em 1989, o PC chinês contemplou a desagregação do comunismo na Europa com horror. Consta até que o líder de então, Deng Xiaoping, terá ficado assustado com os fuzilamentos sumários do encantador casal Ceausescu, na Roménia.
O colapso da União Soviética, pouco depois, deixou o aviso: não bastava reprimir uma população miserável, como aconteceu na Praça de Tiananmen. Era preciso responder aos anseios da população, o que significava abrir as portas a um "capitalismo de Estado" controlado.
Fatalmente, o PC chinês ignorou a maior fraqueza da teoria marxista: o capitalismo, e mesmo o "capitalismo de Estado", não se limita a matar a fome e a permitir carros ou roupas de grife.
Cedo ou tarde, a emergência de uma classe média significa também que as massas desejam mais: coisas intangíveis como liberdade, participação política e até o direito de governar.
Em Hong Kong, essas reivindicações podem ser explicadas (e reforçadas) pela tradição de liberdade que já existia antes da devolução britânica em 1997.
Mas, como informa a revista "The Economist", essas reivindicações são já sentidas em todo o país –de tal forma que uma das prioridades do regime nesses dias foi ocultar da população continental a "Revolução dos Guarda-Chuvas" de Hong Kong.
Durante décadas, vários especialistas sobre a China formularam a questão clássica: será possível ter uma sociedade capitalista sem o tipo de liberdades de uma sociedade democrática?
As imagens de Hong Kong são a primeira e promissora resposta. E são também uma confirmação histórica: para o comunismo funcionar, é importante que uma sociedade seja mantida rigorosamente na miséria.
segunda-feira, outubro 06, 2014
Política, corrupção e pizza - LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SP - 06/10
Ninguém dá bola para corrupção em política. Nenhum estrato social. Nem rico nem pobre
Dito de forma direta, o que quero dizer hoje é: ninguém está nem aí para corrupção em política. Nenhum estrato social. Nem rico, nem pobre, nem culto, nem artista, nem inteligentinho. Pega bem dizer que se está, mas é pura afetação de salão. Coisa de burguês. A prova é que com ou sem Petrobras, no final, será servida uma grande pizza.
Escândalos se acumulam (e não me refiro apenas aos bolivarianos atualmente no poder), mas ninguém está nem aí. Justificativas sustentam toda e qualquer defesa de políticos ou partidos corruptos ou suspeitos de corrupção. A democracia tem uma dimensão circense e as eleições são seu clímax.
Sim, são afirmações céticas. O senso comum pensa que ser cético é duvidar da existência de Deus. Isso é ceticismo de criança. Qualquer um duvida da existência de Deus. Quem se leva muito a sério por isso é que é meio bobo.
E a razão pra ninguém estar nem aí para corrupção é que nossa relação com a política não é racional, como dizem que é. Somos mais facilmente racionais quando compramos pão francês do que quando pensamos em política. "Consciência política" é tão fetiche quanto "carma".
Não existe essa tal de consciência política, mas sim simpatias, empatias, interesses, taras, fanatismo que travestimos de "consciência política".
A única racionalidade possível na política é a de Maquiavel, que continua sendo o filósofo da política mais sério até hoje: a razão da política é a conquista e manutenção do poder a qualquer custo.
Desde o século 18 e a falsa afirmação de que a política redimirá o mundo (pecado do suíço Rousseau), abriu-se um novo "mercado" das mentiras políticas: aquele que diz que a política pode ser "ética".
A democracia tem uma vocação para a retórica, já dizia Platão. Mas, reconheçamos, não há regime melhor. Nela, o circo das "escolhas éticas" se acumulam ao sabor do marketing e das justificativas do que preferimos.
Não votamos racionalmente. Votamos porque (na melhor das hipóteses) algum candidato ou partido concorda, mais ou menos, com a "pequena" teoria de mundo que temos.
Alguns de nós tem mais tempo e condição de trabalhar suas "pequenas" teorias. Outros vão a seco e votam em quem eles acham que vai aumentar o poder de compra deles (dane-se a corrupção) ou quem mais se encaixa na visão de "um mundo melhor" (maior fetiche da política dos últimos 250 anos) deles (dane-se a corrupção).
Se acreditamos que a economia seja uma ciência do comportamento humano que deve levar em conta coisas como "quem tem o que todo mundo quer ganha mais" tendemos a crer que devemos levar em conta as "leis de mercado". Quem crê que devemos "buscar formas mais humanas de produção e igualdade" não crê nas "leis de mercado", mas sim que elas foram inventadas pelos que gostam de explorar os mais fracos.
Mas, como a democracia é um regime baseado numa economia do ressentimento, quem crê em "leis de mercado" é malvado e quem afirma que elas podem ser negadas se quisermos fazer o mundo melhor é visto como gente legal.
Se acho um candidato "fodão", arrumo razões pra votar nele. Se acho que o Brasil precisa de um modo de vida "x", arrumo alguém que pareça concordar comigo. Se acho o candidato alguém comprometido com a "justiça social", ele pode até roubar. Se busco santos, direi: o Brasil precisa de um choque de sinceridade na política.
A crença de que exista racionalidade na política é tão necessária para a maioria das pessoas hoje quanto Deus é necessário para uma porrada de gente. Os não-religiosos creem que olham o mundo de modo mais racional porque não acreditam num ser invisível entre tantos outros. Mas, acreditar que exista uma coisa chamada "consciência política" é também um ato de fé.
Suecos votam para garantir seu tempo livre. Americanos para defender seu quintal. Argentinos por masoquismo. Franceses para garantir a aposentadoria. Ingleses já não sabem se são pós-cristãos ou neomuçulmanos.
E brasileiros votam porque querem mais Estado nas suas vidas. Mais Bolsa Família e mais bolsa empresário. Em mil anos rirão de nossa fé na democracia.
Ninguém dá bola para corrupção em política. Nenhum estrato social. Nem rico nem pobre
Dito de forma direta, o que quero dizer hoje é: ninguém está nem aí para corrupção em política. Nenhum estrato social. Nem rico, nem pobre, nem culto, nem artista, nem inteligentinho. Pega bem dizer que se está, mas é pura afetação de salão. Coisa de burguês. A prova é que com ou sem Petrobras, no final, será servida uma grande pizza.
Escândalos se acumulam (e não me refiro apenas aos bolivarianos atualmente no poder), mas ninguém está nem aí. Justificativas sustentam toda e qualquer defesa de políticos ou partidos corruptos ou suspeitos de corrupção. A democracia tem uma dimensão circense e as eleições são seu clímax.
Sim, são afirmações céticas. O senso comum pensa que ser cético é duvidar da existência de Deus. Isso é ceticismo de criança. Qualquer um duvida da existência de Deus. Quem se leva muito a sério por isso é que é meio bobo.
E a razão pra ninguém estar nem aí para corrupção é que nossa relação com a política não é racional, como dizem que é. Somos mais facilmente racionais quando compramos pão francês do que quando pensamos em política. "Consciência política" é tão fetiche quanto "carma".
Não existe essa tal de consciência política, mas sim simpatias, empatias, interesses, taras, fanatismo que travestimos de "consciência política".
A única racionalidade possível na política é a de Maquiavel, que continua sendo o filósofo da política mais sério até hoje: a razão da política é a conquista e manutenção do poder a qualquer custo.
Desde o século 18 e a falsa afirmação de que a política redimirá o mundo (pecado do suíço Rousseau), abriu-se um novo "mercado" das mentiras políticas: aquele que diz que a política pode ser "ética".
A democracia tem uma vocação para a retórica, já dizia Platão. Mas, reconheçamos, não há regime melhor. Nela, o circo das "escolhas éticas" se acumulam ao sabor do marketing e das justificativas do que preferimos.
Não votamos racionalmente. Votamos porque (na melhor das hipóteses) algum candidato ou partido concorda, mais ou menos, com a "pequena" teoria de mundo que temos.
Alguns de nós tem mais tempo e condição de trabalhar suas "pequenas" teorias. Outros vão a seco e votam em quem eles acham que vai aumentar o poder de compra deles (dane-se a corrupção) ou quem mais se encaixa na visão de "um mundo melhor" (maior fetiche da política dos últimos 250 anos) deles (dane-se a corrupção).
Se acreditamos que a economia seja uma ciência do comportamento humano que deve levar em conta coisas como "quem tem o que todo mundo quer ganha mais" tendemos a crer que devemos levar em conta as "leis de mercado". Quem crê que devemos "buscar formas mais humanas de produção e igualdade" não crê nas "leis de mercado", mas sim que elas foram inventadas pelos que gostam de explorar os mais fracos.
Mas, como a democracia é um regime baseado numa economia do ressentimento, quem crê em "leis de mercado" é malvado e quem afirma que elas podem ser negadas se quisermos fazer o mundo melhor é visto como gente legal.
Se acho um candidato "fodão", arrumo razões pra votar nele. Se acho que o Brasil precisa de um modo de vida "x", arrumo alguém que pareça concordar comigo. Se acho o candidato alguém comprometido com a "justiça social", ele pode até roubar. Se busco santos, direi: o Brasil precisa de um choque de sinceridade na política.
A crença de que exista racionalidade na política é tão necessária para a maioria das pessoas hoje quanto Deus é necessário para uma porrada de gente. Os não-religiosos creem que olham o mundo de modo mais racional porque não acreditam num ser invisível entre tantos outros. Mas, acreditar que exista uma coisa chamada "consciência política" é também um ato de fé.
Suecos votam para garantir seu tempo livre. Americanos para defender seu quintal. Argentinos por masoquismo. Franceses para garantir a aposentadoria. Ingleses já não sabem se são pós-cristãos ou neomuçulmanos.
E brasileiros votam porque querem mais Estado nas suas vidas. Mais Bolsa Família e mais bolsa empresário. Em mil anos rirão de nossa fé na democracia.
Da teimosia como método - LUÍS EDUARDO ASSIS
O ESTADÃO - 06/10
A presidente Dilma Rousseff não gosta do mercado financeiro - no que é correspondida com juras de eterno desamor. Faz sentido. São duas maneiras distintas de enxergar o mundo, o que envolve preconceitos, exageros e simplificações.
Nossa presidente é economista e, possivelmente, a primeira pessoa a morar no Palácio da Alvorada que sabe o que é a taxa Selic. Ela tem convicções profundas sobre como funciona e como deveria funcionar a economia brasileira. Tem todas as respostas. Se necessário, tem as perguntas também. Ao contrário do seu antecessor, que delegou a gestão da política econômica assim como um paciente confia em seu neurocirurgião, Dilma Rousseff faz ela mesma sua operação se valendo de espelhos colocados no teto do centro cirúrgico. O mercado também tem suas crenças e mitos, a começar pelo fato de que subestima as dificuldades de se governar nos meandros das regras democráticas.
Talvez a discussão sobre o déficit público seja onde estas diferentes visões sejam mais claramente antagônicas. A economista Dilma e seus discípulos teimam em cortejar a ideia vagamente keynesiana de que os gastos públicos são intrinsecamente úteis e devem seguir um padrão anticíclico: têm de aumentar nas fases de recessão, para mitigar a queda no nível de atividade, e devem desacelerar nas fases de crescimento, quando parte maior da arrecadação pode ser alocada para o serviço da dívida.
Por esse raciocínio, a expansão dos gastos em períodos em que as vacas emagrecem teria o condão de sustentar o nível de atividade, promovendo o aumento da arrecadação. No limite, é o equivalente à invenção do moto-contínuo, um mecanismo que fornece ao exterior mais energia do que consome, em flagrante contradição com a primeira lei da termodinâmica.
O governo semeia gastos hoje e colhe impostos amanhã, evitando as agruras do desemprego. Só existe um problema neste devaneio: não é assim que funciona. Estamos em recessão? Vamos aumentar os gastos para estimular o nível de atividade. Estamos crescendo? Vamos aumentar os gastos para resgatar a dívida social.
Com essa má vontade conceitual, a performance da política fiscal na gestão Dilma é lamentável. No acumulado entre janeiro e agosto de 2014, o saldo do superávit primário foi de míseros R$ 10,2 bilhões, pouco mais do que 10% da meta para o ano. Mais uma promessa a ser descumprida - e nem assim a economia anda.
São três os principais argumentos contra a tese governista. Em primeiro lugar, ao considerar os gastos públicos como um todo, põe-se em segundo plano a necessidade profilática de cortar gastos injustificados. Trata-se de medida higiênica. Da mesma forma que se devem cortar as unhas regularmente, também é preciso cortar gastos públicos de tempos em tempos. Sob a proteção da incúria, viceja o desperdício.
Em segundo lugar, é imperioso rediscutir a estrutura de gastos, ainda que isso signifique tocar em temas delicados. Para citar um exemplo usual: o contribuinte brasileiro paga mais de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de quatro vezes a despesa do Bolsa Família, para financiar um sistema de pensão por morte benevolente e vulnerável a fraudes. A média desse tipo de gasto nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) não chega a 1% do PIB. Por que o Brasil, classe média baixa do mundo, deveria ter um sistema mais generoso que os países ricos?
Por fim, e talvez principalmente, o descaso com a política fiscal onera demasiadamente a política monetária, deixando ao Banco Central a inglória missão de combater a inflação por meio de juros altos, o que é profundamente prejudicial à distribuição de renda. No ano passado, R$ 249 bilhões foram gastos com o pagamento de juros. Como esses bilhões são distribuídos? Por sorteio? Jogados de um helicóptero? Pior: esses recursos são distribuídos na exata proporção da riqueza financeira previamente existente. Quem tem muito ganha muito, quem nada tem não ganha nada - e quem deve, a começar pelo próprio governo, paga tudo. Nada mais regressivo.
Os mais ricos. Estudo pioneiro realizado recentemente pelos economistas Marcelo Medeiros, Pedro Souza e Fabio Castro (O Topo da Distribuição de Renda no Brasil - 2006-2012) mostra, a partir de análise das declarações do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), que há extrema concentração de renda entre os mais ricos. A diferença entre essa fonte de dados e as pesquisas do IBGE que embasam as declarações ufanistas do governo, que proclama ter desconcentrado a renda, é o fato de que a subdeclaração é muito menor nos dados da Receita Federal, seja porque o pesquisado não se sente seguro em declarar sua renda ao IBGE, seja porque nem os ricos sabem exatamente quanto ganham todos os meses com o recebimento de juros, informação disponível nas declarações.
Em 2012, enquanto a parcela de 1% de mais ricos obteve uma renda média anual de R$ 553 mil, o 0,1% de mais ricos (os bacanas entre os bacanas) se aboletou com nada menos que uma renda média de R$ 2,37 milhões, quase R$ 200 mil por mês. Esse pequeno grupo de brasileiros garfou neste ano quase 11% da renda total do País, porcentual que cresceu nos últimos anos. Nos levantamentos domiciliares do IBGE, a fração do 0,1% de mais ricos fica com menos de 4% da renda.
Controlar o gasto público não é modismo neoliberal do mercado financeiro. Uma política fiscal complacente só agrava os desequilíbrios da economia. Persistir na tese de que há funcionalidade no aumento contínuo e desnecessário dos gastos públicos é apenas teimosia que não vai nos tirar do atoleiro. O próximo governo não poderá persistir com uma política fiscal contraditória e perdulária, sob pena de encaminhar o Brasil para uma crise institucional, da qual ele mesmo será sua maior vítima.
A presidente Dilma Rousseff não gosta do mercado financeiro - no que é correspondida com juras de eterno desamor. Faz sentido. São duas maneiras distintas de enxergar o mundo, o que envolve preconceitos, exageros e simplificações.
Nossa presidente é economista e, possivelmente, a primeira pessoa a morar no Palácio da Alvorada que sabe o que é a taxa Selic. Ela tem convicções profundas sobre como funciona e como deveria funcionar a economia brasileira. Tem todas as respostas. Se necessário, tem as perguntas também. Ao contrário do seu antecessor, que delegou a gestão da política econômica assim como um paciente confia em seu neurocirurgião, Dilma Rousseff faz ela mesma sua operação se valendo de espelhos colocados no teto do centro cirúrgico. O mercado também tem suas crenças e mitos, a começar pelo fato de que subestima as dificuldades de se governar nos meandros das regras democráticas.
Talvez a discussão sobre o déficit público seja onde estas diferentes visões sejam mais claramente antagônicas. A economista Dilma e seus discípulos teimam em cortejar a ideia vagamente keynesiana de que os gastos públicos são intrinsecamente úteis e devem seguir um padrão anticíclico: têm de aumentar nas fases de recessão, para mitigar a queda no nível de atividade, e devem desacelerar nas fases de crescimento, quando parte maior da arrecadação pode ser alocada para o serviço da dívida.
Por esse raciocínio, a expansão dos gastos em períodos em que as vacas emagrecem teria o condão de sustentar o nível de atividade, promovendo o aumento da arrecadação. No limite, é o equivalente à invenção do moto-contínuo, um mecanismo que fornece ao exterior mais energia do que consome, em flagrante contradição com a primeira lei da termodinâmica.
O governo semeia gastos hoje e colhe impostos amanhã, evitando as agruras do desemprego. Só existe um problema neste devaneio: não é assim que funciona. Estamos em recessão? Vamos aumentar os gastos para estimular o nível de atividade. Estamos crescendo? Vamos aumentar os gastos para resgatar a dívida social.
Com essa má vontade conceitual, a performance da política fiscal na gestão Dilma é lamentável. No acumulado entre janeiro e agosto de 2014, o saldo do superávit primário foi de míseros R$ 10,2 bilhões, pouco mais do que 10% da meta para o ano. Mais uma promessa a ser descumprida - e nem assim a economia anda.
São três os principais argumentos contra a tese governista. Em primeiro lugar, ao considerar os gastos públicos como um todo, põe-se em segundo plano a necessidade profilática de cortar gastos injustificados. Trata-se de medida higiênica. Da mesma forma que se devem cortar as unhas regularmente, também é preciso cortar gastos públicos de tempos em tempos. Sob a proteção da incúria, viceja o desperdício.
Em segundo lugar, é imperioso rediscutir a estrutura de gastos, ainda que isso signifique tocar em temas delicados. Para citar um exemplo usual: o contribuinte brasileiro paga mais de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de quatro vezes a despesa do Bolsa Família, para financiar um sistema de pensão por morte benevolente e vulnerável a fraudes. A média desse tipo de gasto nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) não chega a 1% do PIB. Por que o Brasil, classe média baixa do mundo, deveria ter um sistema mais generoso que os países ricos?
Por fim, e talvez principalmente, o descaso com a política fiscal onera demasiadamente a política monetária, deixando ao Banco Central a inglória missão de combater a inflação por meio de juros altos, o que é profundamente prejudicial à distribuição de renda. No ano passado, R$ 249 bilhões foram gastos com o pagamento de juros. Como esses bilhões são distribuídos? Por sorteio? Jogados de um helicóptero? Pior: esses recursos são distribuídos na exata proporção da riqueza financeira previamente existente. Quem tem muito ganha muito, quem nada tem não ganha nada - e quem deve, a começar pelo próprio governo, paga tudo. Nada mais regressivo.
Os mais ricos. Estudo pioneiro realizado recentemente pelos economistas Marcelo Medeiros, Pedro Souza e Fabio Castro (O Topo da Distribuição de Renda no Brasil - 2006-2012) mostra, a partir de análise das declarações do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), que há extrema concentração de renda entre os mais ricos. A diferença entre essa fonte de dados e as pesquisas do IBGE que embasam as declarações ufanistas do governo, que proclama ter desconcentrado a renda, é o fato de que a subdeclaração é muito menor nos dados da Receita Federal, seja porque o pesquisado não se sente seguro em declarar sua renda ao IBGE, seja porque nem os ricos sabem exatamente quanto ganham todos os meses com o recebimento de juros, informação disponível nas declarações.
Em 2012, enquanto a parcela de 1% de mais ricos obteve uma renda média anual de R$ 553 mil, o 0,1% de mais ricos (os bacanas entre os bacanas) se aboletou com nada menos que uma renda média de R$ 2,37 milhões, quase R$ 200 mil por mês. Esse pequeno grupo de brasileiros garfou neste ano quase 11% da renda total do País, porcentual que cresceu nos últimos anos. Nos levantamentos domiciliares do IBGE, a fração do 0,1% de mais ricos fica com menos de 4% da renda.
Controlar o gasto público não é modismo neoliberal do mercado financeiro. Uma política fiscal complacente só agrava os desequilíbrios da economia. Persistir na tese de que há funcionalidade no aumento contínuo e desnecessário dos gastos públicos é apenas teimosia que não vai nos tirar do atoleiro. O próximo governo não poderá persistir com uma política fiscal contraditória e perdulária, sob pena de encaminhar o Brasil para uma crise institucional, da qual ele mesmo será sua maior vítima.
A nova onda - PAULO GUEDES
O GLOBO - 06/10
A 'onda da razão' em favor de Aécio sucedeu à 'onda de indignação' em que surfara Marina. Mas uma oposição respeitável precisa de ambas
Aécio Neves usou a imagem de uma "onda da razão" para explicar a disparada das intenções de voto em sua candidatura. A subida dessa "onda da razão" na reta final do primeiro turno das eleições sucedeu à descida da "onda de indignação" em que antes surfara Marina Silva. O problema para Aécio é que uma oposição respeitável precisaria tanto da razão quanto da indignação para não morrer antes de chegar à praia.
Aécio é o candidato mais preparado, mas ainda não se mostrou desconfortável o bastante com as degeneradas práticas da "velha política", esta mãe de todos os escândalos. Marina tornara-se por isso um veículo da indignação dos eleitores e também o arauto de uma "nova política". Mas sempre transmitiu uma ideia de fragilidade para efetivar as anunciadas mudanças. Não teria sustentação parlamentar para enfrentar a feroz resistência às mudanças de um establishment ainda menos virtuoso que o dos papas renascentistas.
O anúncio do apoio de Marina a Aécio poderia configurar um novo eixo de governabilidade como alternativa ao "presidencialismo de cooptação". É essencial para o surgimento de uma "nova política" que essa aliança ocorra em torno das reformas de modernização. Tanto na dimensão política quanto na econômica. O excesso de gastos públicos aumentou os impostos e os juros, derrubando o crescimento econômico. E a concentração de recursos na esfera federal frustrou o espírito democrático de descentralização da Constituição de 1988, enfraquecendo a Federação e alimentando o fisiologismo. A estagnação econômica e a corrupção sistêmica são filhos desses colossais equívocos.
A economia brasileira continua no piloto automático, em voo cego rumo ao retrocesso. A perda de qualidade da política macroeconômica foi um processo lento, gradual e previsível. Além dos escândalos de corrupção e das denúncias de aparelhamento, a alta da inflação e o baixo crescimento são pedras no sapato da candidata Dilma Rousseff para a disputa no segundo turno. Repito que estamos em uma transição incompleta. É no apoio à inoperância, na blindagem contra escândalos e na manutenção de vícios do Antigo Regime que se destacam alianças políticas oportunistas e retrógradas. Mas já é hora de sairmos desse pântano em que se transformou a política brasileira.
Aécio Neves usou a imagem de uma "onda da razão" para explicar a disparada das intenções de voto em sua candidatura. A subida dessa "onda da razão" na reta final do primeiro turno das eleições sucedeu à descida da "onda de indignação" em que antes surfara Marina Silva. O problema para Aécio é que uma oposição respeitável precisaria tanto da razão quanto da indignação para não morrer antes de chegar à praia.
Aécio é o candidato mais preparado, mas ainda não se mostrou desconfortável o bastante com as degeneradas práticas da "velha política", esta mãe de todos os escândalos. Marina tornara-se por isso um veículo da indignação dos eleitores e também o arauto de uma "nova política". Mas sempre transmitiu uma ideia de fragilidade para efetivar as anunciadas mudanças. Não teria sustentação parlamentar para enfrentar a feroz resistência às mudanças de um establishment ainda menos virtuoso que o dos papas renascentistas.
O anúncio do apoio de Marina a Aécio poderia configurar um novo eixo de governabilidade como alternativa ao "presidencialismo de cooptação". É essencial para o surgimento de uma "nova política" que essa aliança ocorra em torno das reformas de modernização. Tanto na dimensão política quanto na econômica. O excesso de gastos públicos aumentou os impostos e os juros, derrubando o crescimento econômico. E a concentração de recursos na esfera federal frustrou o espírito democrático de descentralização da Constituição de 1988, enfraquecendo a Federação e alimentando o fisiologismo. A estagnação econômica e a corrupção sistêmica são filhos desses colossais equívocos.
A economia brasileira continua no piloto automático, em voo cego rumo ao retrocesso. A perda de qualidade da política macroeconômica foi um processo lento, gradual e previsível. Além dos escândalos de corrupção e das denúncias de aparelhamento, a alta da inflação e o baixo crescimento são pedras no sapato da candidata Dilma Rousseff para a disputa no segundo turno. Repito que estamos em uma transição incompleta. É no apoio à inoperância, na blindagem contra escândalos e na manutenção de vícios do Antigo Regime que se destacam alianças políticas oportunistas e retrógradas. Mas já é hora de sairmos desse pântano em que se transformou a política brasileira.
TCU, esse pessimista - ELENA LANDAU
FOLHA DE SP - 06/10
Finalizei esta coluna na expectativa de que haverá segundo turno. Nele o jogo eleitoral será mais equilibrado. Iguala-se o tempo de TV, e o confronto de ideias será direto.
É a chance para melhorar o nível da campanha. Temas mais importantes do que acusações devem ser discutidos, como o intervencionismo do governo na economia, agravado pela captura de instituições que deveriam servir a sociedade e não a um partido.
O setor elétrico é vítima desses erros e vive grave crise, deixando uma herança maldita: alto endividamento de empresas, perda de valor de estatais, altos reajustes de tarifas, obras atrasadas, reservatórios baixos e risco de racionamento.
A atual administração insiste em negar o óbvio. Para ela não há crise. Mas o Tribunal de Contas da União acaba de se pronunciar sobre os efeitos da MP 579 no setor elétrico.
Auditoria confirmou o que já se suspeitava. A medida teve o custo de R$ 61 bilhões só às distribuidoras. O valor inclui financiamento do Tesouro e empréstimos bancários, utilizados para adiar os reajustes garantidos nos contratos.
O consumidor pagará muito mais caro. Além do custo de energia, sua conta de luz virá acrescida de juros --R$ 9 bilhões. Um dos mais graves erros do populismo tarifário.
Até o pronunciamento do TCU, não havia indicação de que os autores da desastrosa medida seriam responsabilizados. Por unanimidade, o acórdão aprova a convocação do ministro Lobão e outros para justificar erros. Entre eles, o inexplicável cancelamento do leilão de energia previsto para novembro de 2012.
O ministério esboçou resposta dizendo havia possibilidade de sobra de energia à época. Não faz sentido. Continua sem justificar porque deixou que as distribuidoras iniciassem 2013 sem energia suficiente para cumprir suas obrigações. Foram obrigadas a se abastecer no mercado de curto prazo, a preços muito superiores aos previstos em contratos. Essa é a origem do imbróglio, não a seca.
O relatório é leitura obrigatória. Talvez o primeiro passo para corrigir rumos, forçando o governo a enfrentar as consequências do voluntarismo, exigindo explicações e averiguando responsabilidades.
Com a cooptação das instituições do setor, não havia uma análise isenta da gravidade da situação. Com essa MP, em setembro de 2012, são evidentes os estragos causados pelo intervencionismo e mudança de regras. As críticas unânimes caíram no vazio.
O governo finalmente promete publicar uma nota técnica de esclarecimento. Ótimo. Os parcos argumentos que usa em sua defesa serão submetidos ao crivo de associações, consultores, empresas e, quem sabe, pelos eleitores se o debate eleitoral permitir.
Vai ver que nem toda unanimidade é burra.
Finalizei esta coluna na expectativa de que haverá segundo turno. Nele o jogo eleitoral será mais equilibrado. Iguala-se o tempo de TV, e o confronto de ideias será direto.
É a chance para melhorar o nível da campanha. Temas mais importantes do que acusações devem ser discutidos, como o intervencionismo do governo na economia, agravado pela captura de instituições que deveriam servir a sociedade e não a um partido.
O setor elétrico é vítima desses erros e vive grave crise, deixando uma herança maldita: alto endividamento de empresas, perda de valor de estatais, altos reajustes de tarifas, obras atrasadas, reservatórios baixos e risco de racionamento.
A atual administração insiste em negar o óbvio. Para ela não há crise. Mas o Tribunal de Contas da União acaba de se pronunciar sobre os efeitos da MP 579 no setor elétrico.
Auditoria confirmou o que já se suspeitava. A medida teve o custo de R$ 61 bilhões só às distribuidoras. O valor inclui financiamento do Tesouro e empréstimos bancários, utilizados para adiar os reajustes garantidos nos contratos.
O consumidor pagará muito mais caro. Além do custo de energia, sua conta de luz virá acrescida de juros --R$ 9 bilhões. Um dos mais graves erros do populismo tarifário.
Até o pronunciamento do TCU, não havia indicação de que os autores da desastrosa medida seriam responsabilizados. Por unanimidade, o acórdão aprova a convocação do ministro Lobão e outros para justificar erros. Entre eles, o inexplicável cancelamento do leilão de energia previsto para novembro de 2012.
O ministério esboçou resposta dizendo havia possibilidade de sobra de energia à época. Não faz sentido. Continua sem justificar porque deixou que as distribuidoras iniciassem 2013 sem energia suficiente para cumprir suas obrigações. Foram obrigadas a se abastecer no mercado de curto prazo, a preços muito superiores aos previstos em contratos. Essa é a origem do imbróglio, não a seca.
O relatório é leitura obrigatória. Talvez o primeiro passo para corrigir rumos, forçando o governo a enfrentar as consequências do voluntarismo, exigindo explicações e averiguando responsabilidades.
Com a cooptação das instituições do setor, não havia uma análise isenta da gravidade da situação. Com essa MP, em setembro de 2012, são evidentes os estragos causados pelo intervencionismo e mudança de regras. As críticas unânimes caíram no vazio.
O governo finalmente promete publicar uma nota técnica de esclarecimento. Ótimo. Os parcos argumentos que usa em sua defesa serão submetidos ao crivo de associações, consultores, empresas e, quem sabe, pelos eleitores se o debate eleitoral permitir.
Vai ver que nem toda unanimidade é burra.
Democracia em marcha - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 06/10
A pessoa, vale lembrar, não mora em programa eleitoral. Mora em casa.
Pela sétima vez depois da redemocratização, os brasileiros foram às urnas para eleger o presidente da República e postulantes a mandatos estaduais e federais. É fato memorável. Há 30 anos, mais de 1 milhão de pessoas tomaram as ruas das principais cidades para exigir o direito de escolher o mandatário diretamente, sem intermediários.
Em junho do ano passado, multidão de jovens de norte a sul do país manifestou-se publicamente não mais para reivindicar o legítimo exercício da cidadania, mas avanços sociais garantidos pela democracia. Ontem, o quarto colégio eleitoral do mundo deu demonstração de maturidade.
Depois de campanha marcada pela imprevisibilidade, solavancos e apelo a jogos baixos, milhões de cidadãos, cumpriram o dever cívico de votar. Graças à organização do Tribunal Eleitoral e a civilidade do eleitor, o evento transcorreu sem maiores transtornos. Ocorrências que contrariaram a legislação, como boca de urna e distribuição de propaganda, tiveram a resposta adequada sem comprometer o resultado.
Vale, pois, lembrar frase de Livingstone Bituraldo. "Quem ganha", escreveu ele, "não é quem vence as eleições, mas quem vota com inteligência". O formato da campanha, porém, não permitiu o conhecimento das propostas de quem pleiteia mandato. Entregues a marqueteiros, as peças publicitárias não apresentaram nem discutiram programas.
O cidadão acaba assinando cheque em branco. Daí por que muitos não se sentem representados pelos vitoriosos nas urnas. Em consequência, não fiscalizam o eleito. É sabido, porém, que ninguém se senta em cadeira no Legislativo e no Executivo levado apenas pela vontade de lá chegar. Presidente, governador, senador, deputado, prefeito e vereador são conduzidos pela mão do voto.
Problemas cruciais têm de ser debatidos. Que proposta concreta tem o candidato para chegar à educação que dê acesso ao conhecimento; oferecer saúde que salva em vez de matar; dar segurança que assegure o direito de ir e vir sem risco de ser molestado, ferido ou morto; manter o poder de compra do salário; garantir mobilidade com transporte público rápido, pontual e abrangente; combater efetivamente a corrupção; simplificar a burocracia e aplicar melhor os recursos públicos?
O segundo turno abre a possibilidade de correção de rumos. Campanhas indiretamente pagas pelos impostos arrecadados da sociedade precisam informar. Têm de ser propositivas. Espera-se que peças de ficção sejam substituídas pela realidade - que pode e deve ser mudada. A pessoa, vale lembrar, não mora em programa eleitoral. Mora em casa.
Em junho do ano passado, multidão de jovens de norte a sul do país manifestou-se publicamente não mais para reivindicar o legítimo exercício da cidadania, mas avanços sociais garantidos pela democracia. Ontem, o quarto colégio eleitoral do mundo deu demonstração de maturidade.
Depois de campanha marcada pela imprevisibilidade, solavancos e apelo a jogos baixos, milhões de cidadãos, cumpriram o dever cívico de votar. Graças à organização do Tribunal Eleitoral e a civilidade do eleitor, o evento transcorreu sem maiores transtornos. Ocorrências que contrariaram a legislação, como boca de urna e distribuição de propaganda, tiveram a resposta adequada sem comprometer o resultado.
Vale, pois, lembrar frase de Livingstone Bituraldo. "Quem ganha", escreveu ele, "não é quem vence as eleições, mas quem vota com inteligência". O formato da campanha, porém, não permitiu o conhecimento das propostas de quem pleiteia mandato. Entregues a marqueteiros, as peças publicitárias não apresentaram nem discutiram programas.
O cidadão acaba assinando cheque em branco. Daí por que muitos não se sentem representados pelos vitoriosos nas urnas. Em consequência, não fiscalizam o eleito. É sabido, porém, que ninguém se senta em cadeira no Legislativo e no Executivo levado apenas pela vontade de lá chegar. Presidente, governador, senador, deputado, prefeito e vereador são conduzidos pela mão do voto.
Problemas cruciais têm de ser debatidos. Que proposta concreta tem o candidato para chegar à educação que dê acesso ao conhecimento; oferecer saúde que salva em vez de matar; dar segurança que assegure o direito de ir e vir sem risco de ser molestado, ferido ou morto; manter o poder de compra do salário; garantir mobilidade com transporte público rápido, pontual e abrangente; combater efetivamente a corrupção; simplificar a burocracia e aplicar melhor os recursos públicos?
O segundo turno abre a possibilidade de correção de rumos. Campanhas indiretamente pagas pelos impostos arrecadados da sociedade precisam informar. Têm de ser propositivas. Espera-se que peças de ficção sejam substituídas pela realidade - que pode e deve ser mudada. A pessoa, vale lembrar, não mora em programa eleitoral. Mora em casa.
O mau uso das estatais - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADO DE S.PAULO - 06/10
O Brasil tem suportado um custo muito alto pelo uso político das estatais - quando são loteadas para acomodar companheiros e aliados e quando são desviadas de seus fins para servir, às vezes de forma desastrosa, às conveniências da política econômica. É muito raro, no entanto, grandes empresários, especialmente quando próximos do governo, apontarem o dedo para condenar esse abuso. Por isso tem particular importância o pronunciamento público do industrial Jorge Gerdau Johannpeter a respeito do assunto. Ele centrou sua crítica no conflito de interesses entre o governo, representante do controlador, o Estado, e os acionistas minoritários. Proposta do empresário: obrigar a estatal a deixar claro, quando busca recursos de investidores, se vai seguir regras de mercado ou subordinar-se aos interesses governamentais.
O problema apontado pelo empresário Gerdau, membro da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, órgão de assessoria do Planalto, é importante, de fato, mas é só um aspecto de uma distorção muito maior. A interferência do governo afetou perigosamente, em todos os casos, um universo bem mais amplo que o mercado de capitais.
O desarranjo imposto ao mercado é o mais evidente. Interesses de minoritários foram atropelados, por exemplo, quando a presidente Dilma Rousseff resolveu antecipar a renovação de concessões do setor elétrico.
Houve protestos contra a redução de tarifas e também contra a mudança no esquema de amortização dos investimentos anteriores. A compensação foi considerada insuficiente e o assunto foi discutido publicamente pelos minoritários da Eletrobrás. Mas prevaleceu o peso do governo.
Acionistas foram também prejudicados pelo controle, imposto à Petrobrás, dos preços dos combustíveis. As duas grandes estatais perderam boa parte do valor de mercado, em pouco tempo, mas as decisões das autoridades foram mantidas. A correção das tarifas de eletricidade começou neste ano. Há poucos dias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, prometeu iniciar em breve o ajuste dos combustíveis. Mas nenhuma dessas providências anulará os estragos já causados.
Os danos mais amplos afetam toda a economia nacional. A política de preços imposta à Petrobrás distorceu, por exemplo, a relação entre os valores da gasolina e do etanol. Isso prejudicou os planos de produção e de expansão do setor sucroalcooleiro. O Brasil poderia ser um grande exportador de etanol, mas até a oferta interna de álcool foi prejudicada pela política oficial imediatista, imprudente e mistificadora.
A interferência na formação das tarifas de eletricidade e dos preços de combustíveis fracassou como política anti-inflacionária. A inflação permanece há anos muito acima de 4,5%, meta oficial, e assim permanecerá enquanto persistirem suas causas, incluída a gastança federal.
Mas o uso político das estatais envolve muito mais que a inepta mistificação dos preços. Envolve prejuízos para o fluxo de caixa das empresas e, portanto, para sua capacidade de investir. Isso limita a produtividade geral da economia e seu potencial de crescimento. As perdas vão muito além do mercado de capitais e afetam a vida e as perspectivas de todos os brasileiros.
O uso político das empresas controladas pelo Estado tem assumido formas variadas, todas perigosas. Para começar, o loteamento de cargos compromete a qualidade administrativa e multiplica as possibilidades de corrupção. A pilhagem da Petrobrás, dia a dia mais exposta à visão do público, ilustra com assustadora clareza esse ponto. Mas a interferência pode produzir danos de outras maneiras.
Forçar empresas do Estado a comprar equipamentos e componentes nacionais, mesmo quando mais caros, é impor a essas companhias custos adicionais e um desvio de finalidade. A distorção se torna especialmente grave quando esse desvio inclui a sujeição da empresa a objetivos ideológicos - por exemplo, o apoio a um governo bolivariano. A descrição dos desastres poderia avançar e incluir o uso de bancos estatais para fins políticos ou de mero companheirismo. Se quisesse, o empresário Gerdau poderia ter ido muito mais longe.
O Brasil tem suportado um custo muito alto pelo uso político das estatais - quando são loteadas para acomodar companheiros e aliados e quando são desviadas de seus fins para servir, às vezes de forma desastrosa, às conveniências da política econômica. É muito raro, no entanto, grandes empresários, especialmente quando próximos do governo, apontarem o dedo para condenar esse abuso. Por isso tem particular importância o pronunciamento público do industrial Jorge Gerdau Johannpeter a respeito do assunto. Ele centrou sua crítica no conflito de interesses entre o governo, representante do controlador, o Estado, e os acionistas minoritários. Proposta do empresário: obrigar a estatal a deixar claro, quando busca recursos de investidores, se vai seguir regras de mercado ou subordinar-se aos interesses governamentais.
O problema apontado pelo empresário Gerdau, membro da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, órgão de assessoria do Planalto, é importante, de fato, mas é só um aspecto de uma distorção muito maior. A interferência do governo afetou perigosamente, em todos os casos, um universo bem mais amplo que o mercado de capitais.
O desarranjo imposto ao mercado é o mais evidente. Interesses de minoritários foram atropelados, por exemplo, quando a presidente Dilma Rousseff resolveu antecipar a renovação de concessões do setor elétrico.
Houve protestos contra a redução de tarifas e também contra a mudança no esquema de amortização dos investimentos anteriores. A compensação foi considerada insuficiente e o assunto foi discutido publicamente pelos minoritários da Eletrobrás. Mas prevaleceu o peso do governo.
Acionistas foram também prejudicados pelo controle, imposto à Petrobrás, dos preços dos combustíveis. As duas grandes estatais perderam boa parte do valor de mercado, em pouco tempo, mas as decisões das autoridades foram mantidas. A correção das tarifas de eletricidade começou neste ano. Há poucos dias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, prometeu iniciar em breve o ajuste dos combustíveis. Mas nenhuma dessas providências anulará os estragos já causados.
Os danos mais amplos afetam toda a economia nacional. A política de preços imposta à Petrobrás distorceu, por exemplo, a relação entre os valores da gasolina e do etanol. Isso prejudicou os planos de produção e de expansão do setor sucroalcooleiro. O Brasil poderia ser um grande exportador de etanol, mas até a oferta interna de álcool foi prejudicada pela política oficial imediatista, imprudente e mistificadora.
A interferência na formação das tarifas de eletricidade e dos preços de combustíveis fracassou como política anti-inflacionária. A inflação permanece há anos muito acima de 4,5%, meta oficial, e assim permanecerá enquanto persistirem suas causas, incluída a gastança federal.
Mas o uso político das estatais envolve muito mais que a inepta mistificação dos preços. Envolve prejuízos para o fluxo de caixa das empresas e, portanto, para sua capacidade de investir. Isso limita a produtividade geral da economia e seu potencial de crescimento. As perdas vão muito além do mercado de capitais e afetam a vida e as perspectivas de todos os brasileiros.
O uso político das empresas controladas pelo Estado tem assumido formas variadas, todas perigosas. Para começar, o loteamento de cargos compromete a qualidade administrativa e multiplica as possibilidades de corrupção. A pilhagem da Petrobrás, dia a dia mais exposta à visão do público, ilustra com assustadora clareza esse ponto. Mas a interferência pode produzir danos de outras maneiras.
Forçar empresas do Estado a comprar equipamentos e componentes nacionais, mesmo quando mais caros, é impor a essas companhias custos adicionais e um desvio de finalidade. A distorção se torna especialmente grave quando esse desvio inclui a sujeição da empresa a objetivos ideológicos - por exemplo, o apoio a um governo bolivariano. A descrição dos desastres poderia avançar e incluir o uso de bancos estatais para fins políticos ou de mero companheirismo. Se quisesse, o empresário Gerdau poderia ter ido muito mais longe.
Uma relação muito cara - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADO DE S.PAULO - 06/10
Sustentados pelo Tesouro Nacional, os financiamentos subsidiados concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a pretexto de estimular os investimentos e a produção, não produziram os resultados esperados, como mostra a pífia evolução do PIB neste ano, mas estão custando cada vez mais para o País.
Incentivados após o início da crise mundial, em 2008, os programas do BNDES vinham custando de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões por ano ao Tesouro, na forma de subsídio implícito. Esse valor deveria crescer substancialmente neste ano para R$ 15,7 bilhões, conforme projeções feitas em dezembro pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda como informação complementar ao Orçamento da União para 2014. No entanto, o que já era custoso ficará ainda mais caro: os subsídios do Tesouro ao BNDES neste ano devem alcançar R$ 23,3 bilhões. Em 2015, serão mais R$ 24,3 bilhões, totalizando R$ 70,6 bilhões em quatro anos, como mostrou reportagem do Estado (17/9). Somados os subsídios do Programa de Sustentação de Investimentos, o valor alcança R$ 79,7 bilhões no período considerado.
O governo do PT criou uma relação de interesses recíprocos entre o Tesouro e o BNDES, cujos resultados não são nítidos para o contribuinte, a quem cabe pagar a conta. Em geral, para assegurar ao banco mais recursos para emprestar, o Tesouro lhe entrega títulos da dívida pública, operação que não implica aumento de gastos fiscais e, assim, não prejudica os planos do governo de apresentar um superávit primário mais reluzente - embora cada vez menos consistente. Com maior disponibilidade de recursos, o banco empresta mais e, assim, tem a possibilidade de auferir mais lucros, que repassa para seu controlador, o próprio Tesouro. A receita de dividendos, muitas vezes até antecipada, ajuda a melhorar o superávit primário.
Apesar da pouca transparência do ponto de vista fiscal, não há nada de ilegal na operação - tão útil para as duas partes que, desde 2009, o Tesouro já emprestou para o banco mais de R$ 400 bilhões - nem haveria perdas reais para o governo se seu resultado fosse, como se prometeu, o crescimento mais rápido da economia. A expansão da produção asseguraria um crescimento da receita tributária suficiente para compensar o custo dos subsídios implícitos na operação.
Nos últimos anos, a política do BNDES baseou-se na escolha, pelo banco, de empresas consideradas estratégicas ou que viessem a se transformar em grandes participantes do mercado mundial - as "empresas campeãs nacionais". Os maus resultados das escolhas feitas pelo BNDES levaram-no a abandonar essa política.
Os custos para o contribuinte decorrem do caráter naturalmente desvantajoso dessas operações para o Tesouro. Para conceder empréstimos ao BNDES, o Tesouro emite títulos de dívida. São títulos corrigidos por índices de inflação, pela taxa de câmbio ou outro indexador, mais a taxa básica de juros. Para tentar conter as pressões inflacionárias, o Banco Central teve de elevar a taxa básica Selic, que estava em 7,24% ao ano no início de 2013 e desde abril vem sendo mantida em 11% ao ano.
Já nos empréstimos que concede, o BNDES cobra a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), mantida há tempos em 6% ao ano, mais um adicional baixo, inferior a 0,5% ao ano. É também por essa taxa que o BNDES corrige sua dívida com o Tesouro - de que resulta o subsídio da operação.
Como o reforço do caixa do BNDES não tem impacto direto sobre o superávit primário, essa operação, por esse lado, não afeta a política fiscal do governo. Mas, ao permitir a expansão das operações do BNDES e, assim, propiciar o crescimento do lucro da instituição, que o transfere para o governo, ela tem impacto positivo nas receitas do Tesouro.
Essa mágica contábil não era divulgada rotineiramente pelo governo. Foi por exigência do Tribunal de Contas da União, depois de longa discussão com o Ministério da Fazenda, que o governo passou a fazê-lo, desde o ano passado.
Sustentados pelo Tesouro Nacional, os financiamentos subsidiados concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a pretexto de estimular os investimentos e a produção, não produziram os resultados esperados, como mostra a pífia evolução do PIB neste ano, mas estão custando cada vez mais para o País.
Incentivados após o início da crise mundial, em 2008, os programas do BNDES vinham custando de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões por ano ao Tesouro, na forma de subsídio implícito. Esse valor deveria crescer substancialmente neste ano para R$ 15,7 bilhões, conforme projeções feitas em dezembro pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda como informação complementar ao Orçamento da União para 2014. No entanto, o que já era custoso ficará ainda mais caro: os subsídios do Tesouro ao BNDES neste ano devem alcançar R$ 23,3 bilhões. Em 2015, serão mais R$ 24,3 bilhões, totalizando R$ 70,6 bilhões em quatro anos, como mostrou reportagem do Estado (17/9). Somados os subsídios do Programa de Sustentação de Investimentos, o valor alcança R$ 79,7 bilhões no período considerado.
O governo do PT criou uma relação de interesses recíprocos entre o Tesouro e o BNDES, cujos resultados não são nítidos para o contribuinte, a quem cabe pagar a conta. Em geral, para assegurar ao banco mais recursos para emprestar, o Tesouro lhe entrega títulos da dívida pública, operação que não implica aumento de gastos fiscais e, assim, não prejudica os planos do governo de apresentar um superávit primário mais reluzente - embora cada vez menos consistente. Com maior disponibilidade de recursos, o banco empresta mais e, assim, tem a possibilidade de auferir mais lucros, que repassa para seu controlador, o próprio Tesouro. A receita de dividendos, muitas vezes até antecipada, ajuda a melhorar o superávit primário.
Apesar da pouca transparência do ponto de vista fiscal, não há nada de ilegal na operação - tão útil para as duas partes que, desde 2009, o Tesouro já emprestou para o banco mais de R$ 400 bilhões - nem haveria perdas reais para o governo se seu resultado fosse, como se prometeu, o crescimento mais rápido da economia. A expansão da produção asseguraria um crescimento da receita tributária suficiente para compensar o custo dos subsídios implícitos na operação.
Nos últimos anos, a política do BNDES baseou-se na escolha, pelo banco, de empresas consideradas estratégicas ou que viessem a se transformar em grandes participantes do mercado mundial - as "empresas campeãs nacionais". Os maus resultados das escolhas feitas pelo BNDES levaram-no a abandonar essa política.
Os custos para o contribuinte decorrem do caráter naturalmente desvantajoso dessas operações para o Tesouro. Para conceder empréstimos ao BNDES, o Tesouro emite títulos de dívida. São títulos corrigidos por índices de inflação, pela taxa de câmbio ou outro indexador, mais a taxa básica de juros. Para tentar conter as pressões inflacionárias, o Banco Central teve de elevar a taxa básica Selic, que estava em 7,24% ao ano no início de 2013 e desde abril vem sendo mantida em 11% ao ano.
Já nos empréstimos que concede, o BNDES cobra a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), mantida há tempos em 6% ao ano, mais um adicional baixo, inferior a 0,5% ao ano. É também por essa taxa que o BNDES corrige sua dívida com o Tesouro - de que resulta o subsídio da operação.
Como o reforço do caixa do BNDES não tem impacto direto sobre o superávit primário, essa operação, por esse lado, não afeta a política fiscal do governo. Mas, ao permitir a expansão das operações do BNDES e, assim, propiciar o crescimento do lucro da instituição, que o transfere para o governo, ela tem impacto positivo nas receitas do Tesouro.
Essa mágica contábil não era divulgada rotineiramente pelo governo. Foi por exigência do Tribunal de Contas da União, depois de longa discussão com o Ministério da Fazenda, que o governo passou a fazê-lo, desde o ano passado.
A escolha de Marina - RICARDO NOBLAT
O GLOBO - 06/10
"Desvio de dinheiro é natural e intrínseco ao serviço público"
Cid Gomes, governador do Ceará
Marina Silva, candidata do PSB a presidente da República, jogara a toalha há dez dias. Foi quando comentou com um dos seus conselheiros: "Levadas em conta as circunstâncias que marcaram minha entrada na campanha, já fui longe demais." Voltou ao assunto depois do debate entre os presidenciáveis promovido pela TV Globo na última quinta-feira. Admitiu desanimada: "Eu estar onde estou já é um milagre."
É CLARO QUE não estava satisfeita com seu desempenho. Conformada? É quase certo que sim. Queria ganhar naturalmente. Mas repetia que a ganhar perdendo preferia perder ganhando. Um jogo de palavras. Não só um jogo. Cadê dinheiro para pagar as despesas sempre crescentes da campanha? Dinheiro até poderia existir. Estrutura montada para administrar a campanha com eficiência, jamais existiu.
CADÊ MATERIAL de propaganda? Até daria tempo para produzi-lo. Para fazê-lo chegar às mãos de eleitores em todo o país... Impossível. Foram queimados mais de 50 milhões de "santinhos" com Marina de candidata a vice-presidente. Ela evitava dizer que se sentia mal acolhida pela facção do PSB liderada por Roberto Amaral, o presidente em exercício do partido desde a morte de Eduardo Campos.
LEVARÁ MAIS algum tempo para que Marina reconheça os muitos erros que cometeu - se é que o fará. O primeiro e mais barulhento dos erros foi autorizar a divulgação do seu programa de governo sem ter lido com rigor a versão final. Acabou sendo obrigada a retificá-lo. E pagou por isso um preço elevado. Desgastou-se. Acusaram-na - e com razão - de dizer uma coisa hoje e de se desmentir amanhã.
O SEGUNDO ERRO grave foi não abdicar da posição de se manter distante de políticos que julgava indignos de sua companhia. Um deles: Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, que acabaria reeleito no primeiro turno. Marina liderou as pesquisas de intenção de voto em São Paulo. Depois foi desbancada por Dilma. Por fim, autorizou a impressão de suas fotos junto com as de Alckmin. Era tarde. E, no entanto...
NO ENTANTO, teria sido tão fácil para ela, uma vez Eduardo morto, recuar de certos dogmas que apregoara sem ônus como candidata a vice... A maioria dos eleitores compreenderia se ela dissesse: "Em respeito à memória de Eduardo, assumo como meus todos os compromissos assumidos por ele." E ainda poderia se permitir, de fato, a respeitar alguns e a esquecer de outros porventura difíceis de engolir.
TUDO INDICA que Marina não repetirá o comportamento que adotou na eleição presidencial de 2010, quando foi a terceira candidata mais votada e negou seu apoio a qualquer um dos finalistas do segundo turno - Dilma e José Serra. Para ser coerente com o que disse sobre Dilma, apoiará Aécio se ele adotar parte do seu programa de governo. Aécio pagará qualquer preço pelo apoio de Marina. E com razão.
NA ÚLTIMA SEMANA de campanha, Aécio disparou na frente de Marina e quase atropelou Dilma na reta de chegada. Pôde fazer isso, sobretudo, graças aos votos de mineiros e de paulistas. Nenhum instituto de pesquisa foi capaz de antecipar o tamanho da ojeriza nacional ao PT. O partido, praticamente, acabou varrido do Sul do país onde perdeu as eleições para governador e senador.
A VALER O que ensina a história das eleições majoritárias de 1994 para cá, o candidato a se eleger no segundo turno será o mais votado no primeiro. Portanto, alô, alô, Dilma! Mande passar a faixa presidencial. Mas, pensando melhor, não mande.
Cid Gomes, governador do Ceará
Marina Silva, candidata do PSB a presidente da República, jogara a toalha há dez dias. Foi quando comentou com um dos seus conselheiros: "Levadas em conta as circunstâncias que marcaram minha entrada na campanha, já fui longe demais." Voltou ao assunto depois do debate entre os presidenciáveis promovido pela TV Globo na última quinta-feira. Admitiu desanimada: "Eu estar onde estou já é um milagre."
É CLARO QUE não estava satisfeita com seu desempenho. Conformada? É quase certo que sim. Queria ganhar naturalmente. Mas repetia que a ganhar perdendo preferia perder ganhando. Um jogo de palavras. Não só um jogo. Cadê dinheiro para pagar as despesas sempre crescentes da campanha? Dinheiro até poderia existir. Estrutura montada para administrar a campanha com eficiência, jamais existiu.
CADÊ MATERIAL de propaganda? Até daria tempo para produzi-lo. Para fazê-lo chegar às mãos de eleitores em todo o país... Impossível. Foram queimados mais de 50 milhões de "santinhos" com Marina de candidata a vice-presidente. Ela evitava dizer que se sentia mal acolhida pela facção do PSB liderada por Roberto Amaral, o presidente em exercício do partido desde a morte de Eduardo Campos.
LEVARÁ MAIS algum tempo para que Marina reconheça os muitos erros que cometeu - se é que o fará. O primeiro e mais barulhento dos erros foi autorizar a divulgação do seu programa de governo sem ter lido com rigor a versão final. Acabou sendo obrigada a retificá-lo. E pagou por isso um preço elevado. Desgastou-se. Acusaram-na - e com razão - de dizer uma coisa hoje e de se desmentir amanhã.
O SEGUNDO ERRO grave foi não abdicar da posição de se manter distante de políticos que julgava indignos de sua companhia. Um deles: Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, que acabaria reeleito no primeiro turno. Marina liderou as pesquisas de intenção de voto em São Paulo. Depois foi desbancada por Dilma. Por fim, autorizou a impressão de suas fotos junto com as de Alckmin. Era tarde. E, no entanto...
NO ENTANTO, teria sido tão fácil para ela, uma vez Eduardo morto, recuar de certos dogmas que apregoara sem ônus como candidata a vice... A maioria dos eleitores compreenderia se ela dissesse: "Em respeito à memória de Eduardo, assumo como meus todos os compromissos assumidos por ele." E ainda poderia se permitir, de fato, a respeitar alguns e a esquecer de outros porventura difíceis de engolir.
TUDO INDICA que Marina não repetirá o comportamento que adotou na eleição presidencial de 2010, quando foi a terceira candidata mais votada e negou seu apoio a qualquer um dos finalistas do segundo turno - Dilma e José Serra. Para ser coerente com o que disse sobre Dilma, apoiará Aécio se ele adotar parte do seu programa de governo. Aécio pagará qualquer preço pelo apoio de Marina. E com razão.
NA ÚLTIMA SEMANA de campanha, Aécio disparou na frente de Marina e quase atropelou Dilma na reta de chegada. Pôde fazer isso, sobretudo, graças aos votos de mineiros e de paulistas. Nenhum instituto de pesquisa foi capaz de antecipar o tamanho da ojeriza nacional ao PT. O partido, praticamente, acabou varrido do Sul do país onde perdeu as eleições para governador e senador.
A VALER O que ensina a história das eleições majoritárias de 1994 para cá, o candidato a se eleger no segundo turno será o mais votado no primeiro. Portanto, alô, alô, Dilma! Mande passar a faixa presidencial. Mas, pensando melhor, não mande.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
CPI ENROLA E NÃO CONVOCA HOMEM-BOMBA YOUSSEF
A Operação Lava Jato, há seis meses, revelou Alberto Youssef como o megadoleiro que subornou o vice-presidente da Câmara, André Vargas (ex-PT), e grande parte do poder político, e ainda fez a Polícia Federal meter na cadeia Paulo Roberto Costa, ex-diretor corrupto da Petrobras. Apesar disso, um acordo tácito na CPI e CPMI da Petrobras não força a convocação de Youssef para depor. É que todos temem a sua língua.
ASSOMBRAÇÃO
Alberto Youssef é o verdadeiro “homem-bomba”, temido por 9 em cada 10 políticos. Alguns deles frequentadores da CPI e da CPMI.
ATACADO E VAREJO
Enquanto Paulo Roberto Costa, que Lula chama de “Paulinho”, atuava nos altos escalões, Alberto Youssef cuidava do “varejo” da corrupção.
EXPERTISE
Youssef é suspeito subornar políticos que “abriam portas” para seus negócios nada republicanos, na Esplanada dos Ministérios.
GURU DA ‘ZELITE’
Paulo Roberto Costa era um “resolvedor-geral” de problemas ou demandas financeiras dos políticos realmente poderosos, em Brasília.
COM AÉCIO, 2º TURNO SERÁ DE TIRAR O FÔLEGO
Política é para profissionais, e essa regra pode explicar o desempenho final arrebatador de Aécio Neves (PSDB), a quase cinco pontos percentuais da presidenta Dilma (PT). Explica também a perplexidade do PT. Aécio fez Marina (PSB) derreter como alternativa de oposição, e chega ao segundo turno oferecendo a empolgação como pedra de toque da sua campanha. Será um 2º turno de tirar o fôlego.
AÉCIO NO RECIFE
Num primeiro gesto político relevante, Aécio pretende visitar Renata Campos, viúva do falecido Eduardo Campos (PSB).
PESQUISAS DERROTADAS
Os institutos de pesquisas deveriam explicar por que erraram tanto em vários estados e nas previsões da votação de Aécio Neves.
DE LONGE
Na última pesquisa de intenção de votos, Aécio Neves aparecia com, no máximo, 27%; quase dez pontos a menos do que obteve.
ALIANÇA PSDB-PSB
O candidato tucano Aécio Neves planeja visitar a família e a viúva do falecido governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB). Ele sabe que o apoio do PSB e de Marina Silva será fundamental no 2º turno.
SEGUNDO TURNO
O líder do PSDB, Antônio Imbassahy (BA), pretende reunir a bancada federal na terça (17), em Brasília, para discutir o quadro do partido após o resultado das eleições e as estratégias no 2º turno presidencial.
PARA BOM ENTENDEDOR…
O vice-presidente Michel Temer acompanhou o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD) em sua votação no Colégio Santa Cruz, mas não colocou os pés na votação de Paulo Skaf, candidato ao governo de SP.
ESPELHO MEU
A revista Época confirma em sua edição desta semana uma informação publicada nesta coluna em 16 de junho: além de contas na Suíça, Paulo Roberto Costa tem contas no paraíso fiscal de Hong Kong.
MAIS DO MESMO
Em lugar de Alberto Youssef, a CPMI da Petrobras convocou para esta quarta (8) depoimento da ex-contadora do doleiro, Meire Poza, que confirmou à Justiça que empreiteiras pagaram o advogado do doleiro.
O BENEFICIADO
O desempenho eleitoral de Aécio Neves (PSDB) com 34% foi a surpresa da eleição presidencial: antes da morte de Eduardo Campos (PSB), o senador nunca havia passado de 23% em pesquisas.
DISTINTOS ELEITORES
Autoridades devidamente identificadas por distintivos foram vistas furando as longas filas em seções eleitorais de Brasília, sob escolta policial. É a “carteirada de urna”.
PROVOCAÇÃO
Foi vista como uma provocação, para cutucar Aécio Neves, a afirmação de Walter Feldman de que o PSDB morreria, caso Marina fosse eleita. O tucanato acredita que Marina necessitaria do PSDB para governar.
NINGUÉM MERECE
Quando se viu na iminência da derrota, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) ameaçou o eleitorado: confirmada a derrota, ele seguiria a carreira de cantor.
A Operação Lava Jato, há seis meses, revelou Alberto Youssef como o megadoleiro que subornou o vice-presidente da Câmara, André Vargas (ex-PT), e grande parte do poder político, e ainda fez a Polícia Federal meter na cadeia Paulo Roberto Costa, ex-diretor corrupto da Petrobras. Apesar disso, um acordo tácito na CPI e CPMI da Petrobras não força a convocação de Youssef para depor. É que todos temem a sua língua.
ASSOMBRAÇÃO
Alberto Youssef é o verdadeiro “homem-bomba”, temido por 9 em cada 10 políticos. Alguns deles frequentadores da CPI e da CPMI.
ATACADO E VAREJO
Enquanto Paulo Roberto Costa, que Lula chama de “Paulinho”, atuava nos altos escalões, Alberto Youssef cuidava do “varejo” da corrupção.
EXPERTISE
Youssef é suspeito subornar políticos que “abriam portas” para seus negócios nada republicanos, na Esplanada dos Ministérios.
GURU DA ‘ZELITE’
Paulo Roberto Costa era um “resolvedor-geral” de problemas ou demandas financeiras dos políticos realmente poderosos, em Brasília.
COM AÉCIO, 2º TURNO SERÁ DE TIRAR O FÔLEGO
Política é para profissionais, e essa regra pode explicar o desempenho final arrebatador de Aécio Neves (PSDB), a quase cinco pontos percentuais da presidenta Dilma (PT). Explica também a perplexidade do PT. Aécio fez Marina (PSB) derreter como alternativa de oposição, e chega ao segundo turno oferecendo a empolgação como pedra de toque da sua campanha. Será um 2º turno de tirar o fôlego.
AÉCIO NO RECIFE
Num primeiro gesto político relevante, Aécio pretende visitar Renata Campos, viúva do falecido Eduardo Campos (PSB).
PESQUISAS DERROTADAS
Os institutos de pesquisas deveriam explicar por que erraram tanto em vários estados e nas previsões da votação de Aécio Neves.
DE LONGE
Na última pesquisa de intenção de votos, Aécio Neves aparecia com, no máximo, 27%; quase dez pontos a menos do que obteve.
ALIANÇA PSDB-PSB
O candidato tucano Aécio Neves planeja visitar a família e a viúva do falecido governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB). Ele sabe que o apoio do PSB e de Marina Silva será fundamental no 2º turno.
SEGUNDO TURNO
O líder do PSDB, Antônio Imbassahy (BA), pretende reunir a bancada federal na terça (17), em Brasília, para discutir o quadro do partido após o resultado das eleições e as estratégias no 2º turno presidencial.
PARA BOM ENTENDEDOR…
O vice-presidente Michel Temer acompanhou o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD) em sua votação no Colégio Santa Cruz, mas não colocou os pés na votação de Paulo Skaf, candidato ao governo de SP.
ESPELHO MEU
A revista Época confirma em sua edição desta semana uma informação publicada nesta coluna em 16 de junho: além de contas na Suíça, Paulo Roberto Costa tem contas no paraíso fiscal de Hong Kong.
MAIS DO MESMO
Em lugar de Alberto Youssef, a CPMI da Petrobras convocou para esta quarta (8) depoimento da ex-contadora do doleiro, Meire Poza, que confirmou à Justiça que empreiteiras pagaram o advogado do doleiro.
O BENEFICIADO
O desempenho eleitoral de Aécio Neves (PSDB) com 34% foi a surpresa da eleição presidencial: antes da morte de Eduardo Campos (PSB), o senador nunca havia passado de 23% em pesquisas.
DISTINTOS ELEITORES
Autoridades devidamente identificadas por distintivos foram vistas furando as longas filas em seções eleitorais de Brasília, sob escolta policial. É a “carteirada de urna”.
PROVOCAÇÃO
Foi vista como uma provocação, para cutucar Aécio Neves, a afirmação de Walter Feldman de que o PSDB morreria, caso Marina fosse eleita. O tucanato acredita que Marina necessitaria do PSDB para governar.
NINGUÉM MERECE
Quando se viu na iminência da derrota, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) ameaçou o eleitorado: confirmada a derrota, ele seguiria a carreira de cantor.