quarta-feira, junho 11, 2014

Goela abaixo - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 11/06

Como previsto pela direção, o PMDB aprovou a aliança com o PT pela reeleição da presidente Dilma Rousseff. O imprevisto foi a divisão expressa no resultado de 59% a 41%.

Na abertura da convenção o senador Valdir Raupp, presidente do partido, havia anunciado uma vitória de pelo menos 80% dos votos. Na verdade, previa uma dissidência de 10%. Ele errou nas contas também depois, ao anunciar os números finais: disse que a aliança havia sido aprovada por 69,7% dos convencionais presentes.

Errou no total de votos apurados e desconsiderou os brancos, os nulos e as abstenções. Fez, como o governo, uma contabilidade criativa. Inútil, porque nada naquela reunião lembrava a unidade de 2010, quando o PMDB inteiro aderiu com entusiasmo à candidata do então presidente Luiz Inácio da Silva. A começar pela estética do auditório Petrônio Portela, no Senado. Não havia no recinto um único cartaz, faixa ou banner onde estivesse escrito o nome de Dilma ou da dupla cuja aliança seria ali consagrada.

A sombra da dissidência pairava no ambiente. No discurso pela manhã, enquanto os convencionais votavam, Michel Temer disse que não acreditava nas notícias de traições que chegavam a ele. E as traições corriam soltas nas cabines.

Em seguida, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, quase que pediu pelo amor de Deus para que os delegados não levassem em conta as divergências locais com o PT na decisão sobre a aliança nacional.

A maioria, como se viu pelo resultado, atendeu. Mas, nos discursos, não pouparam críticas aos petistas nem fizeram louvações ao governo federal. Ficou patente o seguinte: deram a vaga de vice a Michel Temer, mas não firmaram compromisso inarredável de suar a camisa por Dilma Rousseff.

Note-se a delegação do Rio. O ex-governador Sergio Cabral, o prefeito Eduardo Paes, o governador e candidato Luiz Fernando Pezão, todos manifestaram apoio à presidente, criticaram duramente o PT local e não desgrudaram do presidente do PMDB fluminense, Jorge Picciani.

Citado nos discursos, levado à mesa principal dos trabalhos, Picciani é nada menos que o chefe da dissidência idealizados do movimento “Aezão”, que na semana passada reunião 1.600 lideranças políticas do Rio para celebrar apoio a Aécio Neves.

Nenhuma delas rompidas com Sérgio Cabral, Eduardo Paes ou Pezão.

Pauliceia desvairada. São Paulo, o berço do PT onde o partido joga suas fichas para quebrar a hegemonia de anos a fio de domínio do PSDB, aparece no recorte da pesquisa do Datafolha como o pior cenário para a presidente Dilma e o melhor para seus adversários.

Dos 140 milhões, 646 mil e 446 eleitores brasileiros, 31 milhões, 253 mil e 317 votam em São Paulo. Representam 22% do eleitorado do País. Um peso considerável no resultado geral.

Pois no Estado Dilma aparece praticamente empatada no primeiro turno com Aécio Neves (23% a 20%) e na simulação do segundo turno perderia para o tucano de 46% a 34% e, para Eduardo Campos, do PSB, de 43% aos mesmo 34%.

O poder de influência de Lula no plano nacional é de 36%; entre os paulistas cai para 24%.

Em compensação, é o Estado em que há mais margem para conquista de votos: enquanto no País o índice de nulos, brancos e indecisos é de 30%, em São Paulo sobe para 37%.

Segundo plano. O último mês de intensa exposição da presidente Dilma Rousseff, combinada com sua queda na pesquisa Datafolha, notadamente no índice de apoio no segundo turno – em que ficou a oito pontos porcentuais do tucano Aécio Neves –, leva a uma conclusão lógica: quanto mais aparece, pior para ela.

De onde pode ser que não seja uma grande vantagem o fato de sua candidatura ter o maior tempo de televisão no horário eleitoral. Ou então teremos uma situação em que o protagonista não será Dilma.


Vergonha a exorcizar - FERNANDO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 11/06

BRASÍLIA - Não havia cartazes visíveis com o nome de Dilma Rousseff no local onde foi realizada nesta terça (10) a convenção do PMDB. O partido acabou aprovando a reedição da aliança nacional com o PT, tendo o peemedebista Michel Temer como candidato a vice-presidente.

A expectativa no PMDB era a de que até 80% dos convencionais do partido ratificassem a chapa Dilma-Temer. O percentual final ficou bem abaixo --só 54% dos votos possíveis.

Há um clima entranho entre os grupos que apoiam a reeleição de Dilma. A falta de cartazes com o nome da petista no evento do PMDB foi apenas um de múltiplos exemplos.

Na semana passada, o PP (partido de Paulo Maluf) fez sua propaganda na TV. O bordão principal parecia o de uma legenda de oposição: "Não dá mais". Em seguida, uma explicação curiosa para quem é governo: "A sociedade quer participar e a política e os políticos têm que mudar".

O PP apoia a administração federal. Manda no Ministério das Cidades. Só que Dilma e suas realizações não apareceram na propaganda da legenda. No lugar, havia frases assim: "Têm muita coisa que está entalada em nossas gargantas. A corrupção, a saúde, a educação e o transporte. Ninguém aguenta mais".

Na noite desta terça foi a vez do PSD, de Gilberto Kassab. O ex-prefeito de São Paulo tem prometido apoiar oficialmente a reeleição de Dilma, mas optou por não mostrar nem falar da presidente na propaganda de dez minutos na TV. Já o Plano Real, do tucano Fernando Henrique Cardoso, foi mencionado logo no início, de maneira explícita e bem positiva.

PMDB, PP, PSD e até setores do PT parecem incomodados na hora de elogiar o governo Dilma. As propagandas recentes de PP e PSD mais atrapalham do que ajudam o Planalto. Juras de amor em privado são insuficientes. Na campanha, Dilma terá de encontrar uma fórmula para exorcizar essa atitude envergonhada de alguns de seus aliados.

Oposição em alta - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 11/06
O pior dos resultados para o Palácio do Planalto acabou se concretizando. A oposição está em alta, não apenas a externa como também a dos partidos aliados. O PMDB não vai tão dividido às eleições presidenciais desde 2002, quando indicou Rita Camata para vice na chapa tucana liderada por José Serra, derrotado então pelo ex-presidente Lula, que contou com o apoio de diversos grupos dissidentes regionais do PMDB.
A convenção nacional do partido decidiu apoiar a reeleição de Dilma por 59% contra 41%, dando-lhe mais 4 minutos e 36 segundos de propaganda eleitoral no rádio e na televisão, mas negando o apoio de sua máquina partidária em muitos estados.

Para se ter uma ideia da defecção registrada este ano, em 2010 o apoio a Dilma foi de 84% dos convencionais do PMDB. A dissidência tem uma razão única: a disputa de espaço político com o PT. O diretório do Rio de Janeiro votou em peso contra a coligação com o PT, apesar de o governador Pezão, o prefeito Eduardo Paes e o ex-governador Sérgio Cabral terem reafirmado seus apoios à presidente Dilma.

Mas todos ressaltaram que a razão da dissidência estadual, que eles fazem questão de não controlar, deve-se à candidatura do senador Lindbergh Farias, apoiado especialmente por Lula.

Na Bahia, com uma chapa oposicionista já montada com a dissidência do PMDB, não houve o propalado acordo entre Geddel Vieira Lima e a cúpula partidária: a votação maciça foi contra a aliança com o PT.

Outras bancadas, como as de Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul e Ceará, também demonstraram sua insatisfação, sendo que no Ceará é possível que, em breve, a dissidência potencial do senador Eunício Oliveira acabe fechando um acordo com o grupo do tucano Tasso Jereissati. Paraíba e Santa Catarina, pelo número de faltas de seus representantes, entraram no radar da direção nacional como possíveis problemas.

Toda essa situação somou-se ao resultado da mais nova pesquisa do Ibope, que mostrou a oposição em alta e confirmou a queda da presidente Dilma, prevendo a realização de um segundo turno.

O crescimento dos candidatos do PSDB, Aécio Neves (de 20% para 22%), e do PSB, Eduardo Campos (de 11% para 13%), mostra o início da migração dos votos dos indecisos para a oposição, com Campos voltando à disputa pela terceira via, embora ainda longe de Aécio. Pelo menos deixou de disputar o terceiro lugar com o Pastor Everaldo, do PSC.

Assim como a recente pesquisa do Datafolha, também o Ibope constatou que a diferença a favor de Dilma em um eventual segundo turno reduziu-se dramaticamente. Contra Aécio, a vantagem de Dilma caiu de 19 para 9 pontos porcentuais - em menos de um mês, o resultado passou de 43% a 24% para 42% a 33%. No confronto com Campos, a vantagem diminuiu de 20 para 11 pontos. Para culminar, a rejeição à presidente Dilma subiu para 38%.

Esse conjunto de notícias ruins fez a presidente subir o tom nas duas convenções de que participou, a do PDT pela manhã e a do PMDB à tarde. Num discurso que marcou a oposição até meses atrás, agora é Dilma quem acusa seus adversários de quererem surrupiar os programas do governo.

Foi uma crítica indireta ao candidato do PSDB Aécio Neves, que apresentou no Congresso diversos projetos alterando o Bolsa Família para aprimorá-lo . O governo votou contra a proposta de permanecer pagando o benefício até seis meses depois de o beneficiário ter conseguido um emprego formal, e também não quer incluí-lo na Loas (Lei Orgânica da Assistência Social), o que, no dizer de Aécio, transformaria o Bolsa Família em um programa de Estado, e não de governo.

Incomodada com a definição dos adversários de que o PT e o governo representam o atraso, Dilma garantiu: Nós somos o avanço: o atraso são eles . Um discurso defensivo e claramente de uma candidata acuada.

Acorda, jornalista! - FERNÃO LARA MESQUITA

FOLHA DE SP - 11/06

Manchetes sobre o golpe de 1964 se sucedem, mas para o de 2014 o destaque é próximo de zero. Nenhum critério jornalístico justifica isso


Um golpe contra a democracia está em curso desde o último dia 26 de maio e a circunstância que o torna mais ameaçador do que nunca antes na história deste país é a atitude de avestruz que a imprensa tem mantido, deixando de alertar a população para a gravidade dessa agressão.

O decreto nº 8.243, assinado por Dilma Rousseff, que cria um "Sistema Nacional de Participação Social", começa por decidir por todos nós que "sociedade civil" deixa de ser o conjunto dos brasileiros e seus representantes eleitos por voto secreto, segundo padrão universalmente consagrado de aferição da legitimidade desse processo, e passa a ser um grupo indefinido de "movimentos sociais" que ninguém elegeu e que cabe ao secretário-geral da Presidência, e a ninguém mais, convocar para examinar ou propor qualquer lei, política ou instituição existente ou que vier a ser criada daqui por diante em todas as instâncias e entes de governo, diretas e indiretas, o que afeta também os governos estaduais e municipais hoje na oposição.

Apesar da violência desse enunciado, a maioria dos jornais e televisões do país nem sequer registrou o fato. E mesmo os que entraram no assunto depois vêm diluindo o tema no noticiário como se não houvesse nada com que seus leitores devessem se preocupar. Prossegue a sucessão de manchetes em torno do golpe de 1964, mas para o de 2014 o destaque é próximo de zero. Nenhum critério jornalístico justifica isso.

Esse decreto é, na verdade, um excerto do Terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), que o PT já tentou impor antes ao país também por decreto --nas vésperas do Natal de 2009, no apagar das luzes do governo Lula--, mas que, graças à forte reação da imprensa e consequente mobilização da opinião pública, foi obrigado a abortar.

O PNDH-3 contém 521 propostas que, além da revogação da Lei de Anistia, que passou "no tapa" depois que a imprensa comprou a ideia do governo de que a prioridade nacional é voltar 50 anos para trás e não correr 50 anos para a frente, institui "comissões de direitos humanos" nos Legislativos para fazer uma triagem prévia das matérias que eles poderão ou não processar; impõe a censura à imprensa; obriga a um processo de "reeducação" todos os professores do país; veda ao Judiciário dar sentenças de reintegração de posse de propriedades "rurais ou urbanas" invadidas, prerrogativa que se torna exclusiva dos "movimentos sociais"; desmonta as polícias estaduais para criar uma central única de comando de todas as polícias do país, e vai por aí afora.

Ciente de que tal amontoado de brutalidades jamais será aprovado pelo Legislativo, o PT está tratando de fazer com esse Poder o mesmo que fez com o Judiciário. Os juízes não dão as sentenças que queremos? Substituam-se os juízes por juízes "amigos". Um Legislativo eleito pelo conjunto dos brasileiros jamais transformará essas 521 propostas em lei? Substituam-se os legisladores por "movimentos sociais" amestrados sob a tutela da Presidência da República...

O argumento de que esse é o jeito de forçar o Congresso a reformas não é honesto. Para forçar reformas que o povo deseje, existem instrumentos consagrados tais como o do voto distrital com recall, que arma as mãos de todos os eleitores para demitir na hora os representantes que resistirem ou agirem contra a sua vontade. Este tipo de participação, sim, opera milagres estritamente dentro dos limites da democracia. Substituir os representantes eleitos por "representantes" que ninguém elegeu tem outro nome: chama-se golpe.

Depois da rendição do Judiciário com a renúncia de Joaquim Barbosa, só sobra a imprensa. E os feriados da Copa farão com que só haja pouco mais de meia dúzia de sessões legislativas completas em junho e julho somados. Depois é véspera de eleição. É bom, portanto, que ela desperte já dessa letargia, pois não haverá segunda chance: está escrito no PNDH-3 que a imprensa é a próxima instituição nacional a ser desmontada.

As Copas do Brasil e as Copas no Brasil - ROBERTO DAMATTA

O GLOBO - 11/06

Ganhamos cinco copas do mundo de modo indiscutível e, como dizia Nelson Rodrigues, insofismável. Na maioria das vezes, de modo devastador como em 58, 62 e 70. Essas vitórias todas, entretanto, não foram em terra brasileira, mas “lá fora” como se dizia quando o mundo ainda era grande e desconhecido.

Havia quem pensasse que Paris era a capital da Europa e que a Inglaterra era um continente. O ponto de vista reverso arrolava Buenos Aires como capital do Brasil. Eis um país desconhecido no qual se falava espanhol ou um idioma desconhecido, “o brasileiro”, como disse uma senhora inglesa com um ar sério e douto, muito apropriado aos britânicos, num programa de televisão da BBC realizado dos anos 80, sobre o Brasil, no qual eu contribui com o lado interpretativo. Nele, além de obviedades como racismo, favor, malandragem, clientelismo e música, falávamos desse futebol que evoluiu do “jeitinho” (que iguala) para o “você sabe com quem está falando?” (que suprime o reconhecimento do outro) dos pentacampeonatos.

Foi o futebol que - ao lado da Bahia de Jorge Amado, do cinema de Glauber Rocha e Cacá Diegues; e da bossa-nova de Tom Jobim - nos tirou da vala comum de um povo sem mapa, para nos reordenar num lugar superior no tal “concerto das nações” que eu tanto ouvia falar e, menino, cheguei a pensar que era uma orquestra a tocar a melodia triste de duas guerras mundiais e holocaustos promovidos pelos nazismos e stalinismos. A partir de 50, porém, o futebol consolidou o Brasil como dono de uma invejável cronologia futebolística.

Curioso, para quem não pensa que, tanto no esporte quanto na democracia, derrota e vitória são os lados de uma mesma moeda, que tenhamos sofrido uma devastadora perda justamente na copa jogada no Brasil. É meu palpite que o jogo “em casa” fazia a mágica de suprimir no nosso mapa mental uma eventual derrota. A lição da Copa de 1950 foi que, no esporte, como na vida igualitária, há perderes e vencedores, o que não significa que os primeiros são inferiores aos segundos. É a partida, na sua dinâmica e feroz realidade quem diz - tal como sucede no mercado e nas eleições - quem é o vencedor.

Perdemos então em 50, a copa no Brasil.

Copa, vale mencionar, que é também um espaço próximo da cozinha onde as louças nas quais comemos são guardadas e é um vaso covo em que bebemos líquidos e se refere à parte superior das árvores e do chapéu. Ademais, a expressão “fechar-se em copas” fala de uma pessoa amuada tal como ficamos em 1950, quando os nossos hermanos uruguaios levaram a copa e nós nos fechamos chorosos na derrota. Mas em 1958 e 62 renascemos nesta mesma taça, que acabou sendo nossa em 1970. Fomos seus ganhadores materiais definitivos, mas a perdemos vergonhosamente para ladrões que, corre o mito, venderam o seu ouro devidamente dissolvido no mercado das copas abandonadas por suas burocracias.

Tudo isso para, com Ruy Castro, recordar que as taças eram mesmo copas ou copos elaborados, com os quais se bebia algo valioso ou sagrado. Não sei se por pedantismo ou palpite (provavelmente pelos dois), não deixo de associar as taças (ou copas) nas quais o time vencedor bebia a champanha ou o vinho da vitória, ao Santo Graal. Aquele cálice sacrossanto usado por Jesus Cristo na Última Ceia, no qual José de Arimateia (um rico senador e cristão secreto) colheu - diz a lenda - o sangue do Salvador, quando ele recebeu o golpe final de um decurião romano.

Sabe-se que o cálice faz parte de uma teia de lendas célticas que falavam no Rei Artur e numa idealizada e protodemocrática Camelot, cujo centro era a busca de objetos que simbolizavam a superioridade, legitimando-a. Nessa busca, surgem a espada, a coroa (transformada em halo nos santos) e a copa - todos ligados à pureza de coração e à espiritualidade enobrecedora. Artur, dizem os mitos, tira sua espada de uma pedra ou a recebe da Dama do Lago. Eis o que todos procuram, mas que a Dama do Lago somente entrega a um craque escolhido. Do mesmo modo, o Santo Graal que significaria “sangue real”, traria paz e prosperidade para o reino.

Para nós, pentacampeões, a taça da vitória, que hoje é um pesado troféu um tanto cafona na sua ostentação aurífica, seria a prova de que o nosso sangue mestiço é nobre e não o testemunho de fatal inferioridade. Ganhar a Copa no Brasil, em pleno território nacional, portanto, resgataria a tal prosperidade e a santa paz prometida pelo velho populismo esquerdista que, cada vez mais corrupto e dissimulado, tem desonrado muita coisa, menos - assim espero - o futebol.


Figueiredo estava certo - PAULO FIGUEIREDO FILHO

O GLOBO - 11/06

Menos da metade das obras de infraestrutura foi entregue


É verdadeira a história que circula na internet de que o presidente João Figueiredo recusou-se a promover a candidatura do Brasil à Copa do Mundo, sob o argumento de que o país teria outras prioridades. Dissera, ao então presidente da Fifa e seu amigo, João Havelange: “Você já viu uma favela no Rio de Janeiro ou uma seca no Nordeste? Acha que eu vou gastar dinheiro com estádio de futebol?” A estimativa de Havelange era de que toda a Copa custaria estrondoso US$ 1 bilhão da época, algo como R$ 6 bilhões em valores de 2014.

Foi por uma dessas peças do destino que eu, neto do presidente que recusara a Copa mais de duas décadas antes, recebi como uma das primeiras tarefas na minha passagem pelo setor público, em 2007, a coordenação da candidatura do Estado do Rio — e, consequentemente, do Brasil — para sediar a Copa do Mundo de 2014. Acabávamos de sediar, com sucesso, os Jogos Pan-Americanos, e a Copa do Mundo no país do futebol parecia um tremendo sonho. Foi um raro momento de convergência de interesses e união de todas as esferas de governo e da CBF, que mergulharam de cabeça na candidatura, com engajamento pessoal do presidente Lula.

Lembro-me da sensação de euforia quando conquistamos o direito de sediar o evento maior do futebol. Aquela seria uma Copa diferente, prometiam. A organização alardeava que os estádios seriam integralmente custeados pela iniciativa privada, incluindo a reforma do Maracanã, orçada à época em R$ 300 milhões. O Brasil assumiu, por escrito, um compromisso de resolver gargalos antigos de infraestrutura e mobilidade e teríamos até um trem-bala ligando as duas maiores cidades do país. Haveria tempo de sobra para a preparação. Era a grande chance do Brasil. Pesquisas mostravam que mais de 90% da população apoiavam a Copa do Mundo aqui. Talvez, então, Figueiredo estivesse enganado.

Hoje, sete anos depois, às vésperas da competição, eu e boa parte do país somos forçados a reconhecer a sabedoria do meu avô. Pesquisas recentes mostram que o apoio à Copa no Brasil caiu para 52% da população. Pudera: o custo total da competição deve chegar a R$ 30 bilhões. Menos da metade das obras de infraestrutura foi entregue e os estádios viram seus custos de construção quadruplicarem em alguns dos casos mais escandalosos de superfaturamento da história da República. Por pura ganância de alguns, gastamos cerca de R$ 11 bilhões do dinheiro dos contribuintes apenas na construção das arenas da Copa.

O sonho virou pesadelo e, como Figueiredo antecipara, tantos bilhões teriam sido suficientes para custear integralmente casas populares a quase 2,5 milhões de pessoas ou sete vezes e meia o orçamento original da transposição do Rio São Francisco. Mas, em vez disso, acabaremos com estádios de futebol vazios e um gosto amargo na boca do que a Copa poderia ter sido e da chance que desperdiçamos. É, parece que Figueiredo conhecia o Brasil melhor do que ninguém.

Guarda pretoriana - RÔMULO BINI PEREIRA

O ESTADÃO - 11/06

“Desde a sua epigênese a esquerda gramscista foi programada para ter um obsessivo fascínio pela governabilidade de uma nação. Quando consegue isso, brota-lhe o desejo de se apoderar do Estado e nele se perpetuar. Então, de modo insidioso e sub-reptício, desfigura a componente militar tornando-a um braço armado em proveito de seus desígnios, uma Guarda Pretoriana” Ir. S. Avelar

A Constituição federal de 1988 estabelece claramente, nos artigos 142 e 144, o papel das Forças Armadas e de seus órgãos policiais responsáveis pela segurança pública. Elaborada e aprovada após o término do regime militar, ainda sob a visão receosa de uma possível intervenção do segmento militar no campo político, reza a nossa Carta Magna que a missão essencial das Forças Armadas é a defesa do território e da soberania nacionais e que a segurança pública deve ser exercida pelas Polícias Federal, Rodoviária e Ferroviária Federais, Polícias Civil e Militar.

O emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem (GLO) vem se tornando praxe significativa e preocupante. É um tema muito sensível e sujeito a inúmeras análises e interpretações, até mesmo de sua inconstitucionalidade. Para tanto a Força Terrestre, a mais empregada, edita um caderno de GLO no qual constam 30 publicações (leis, leis complementares, decretos, portarias, ordens, regulamentos e outras) para orientar seus comandados. Uma vasta burocracia que, indubitavelmente, limita e inibe a operacionalidade dessa Força.

A maioria dos Estados já solicitou o emprego das Forças Armadas em distúrbios internos. No Estado do Rio de Janeiro nem mais se observa o que estabelece a legislação quanto ao caráter episódico e de menor duração possível no emprego das Forças de GLO. Efetivos da Marinha e do Exército atuaram por dois anos no conjunto de favelas do Alemão e hoje estão na favela da Maré. Já se fala em prolongar essa ação até a Olimpíada de 2016. São ações que envolvem riscos imprevisíveis.

A simples presença de tropas nas favelas tem sido de eficácia momentânea, porém questionável. Em áreas anteriormente pacificadas o crime organizado voltou a agir, e com maior intensidade. O Ministério da Defesa – um possível limitador desse empenho geral – demonstra ser ineficaz em selecionar e dar prioridade ao emprego das Forças. Atende às inúmeras solicitações do governo central, repassando aos Comandos Militares a responsabilidade de cumprir missões. Estes, com disciplina, executam suas missões, mesmo sabendo que em todos os escalões de comando é flagrante a opinião contrária às ações de GLO.

Deve-se considerar ainda que essas ações vêm atuando negativamente no lado operacional de sua principal missão constitucional, que é a defesa da Pátria e de sua soberania. A vulnerabilidade externa do nosso país é marcante. Longas fronteiras terrestres e marítimas, cobiças internacionais permanentes, efetivos e orçamentos reduzidos e um cenário mundial incerto exigem um preparo mínimo de adestramento e de meios de combate eficazes e modernos que permitam um adequado grau de dissuasão. Material de uso em distúrbios civis característicos das missões de GLO não é, em sua maioria, apto para o combate operacional. Não vamos combater com sprays de pimenta, cassetetes, jatos d’água ou balas de borracha, pois não são petrechos de guerra; são materiais específicos para os órgãos de segurança pública.

Adicione-se a essas considerações uma preocupação sempre latente. Com o agravamento das manifestações populares em todo o País, volta-se a falar na criação de “Guardas Nacionais” ou de “Polícias Militares Federais”, com base em efetivos da Força Terrestre. Já se estuda a transformação de batalhões operacionais com sede em capitais em batalhões de Polícia do Exército. Qual a finalidade dessas transformações? Atuar em GLO? Disciplinar o Exército? Atuar contra um inimigo interno? Ou até uma perturbadora iniciativa de transformá-los num real “braço armado” subordinado ao governo central?

A Força Nacional de Defesa, integrada por policiais militares oriundos de todos os Estados e criada no governo Lula, bem representa um embrião de uma Força subordinada diretamente aos que nos governam.

Em qualquer parte do mundo, ter um “braço armado” é um desejo histórico das esquerdas totalitárias. Como exemplo, em Cuba são suas Forças Armadas, tanto que seus líderes estão sempre fardados. Na Venezuela são as “Milícias do Povo”, armadas por Hugo Chávez. No Brasil o “Grupo dos Onze”, de Francisco Julião, serve de exemplo aos seguidores dos grupos do Movimento dos Sem-Terra (MST). Seu líder declarou recentemente que, se a oposição vencer as eleições de outubro, “haverá guerra”. Não se sabe se possuem armas.

Além das ações de GLO, as Forças Armadas continuam a exercer papéis fundamentais em nossa sociedade, principalmente as atividades em que se exigem competência, credibilidade e onde o poder público se mostra ineficiente. Por sua presença em todo o território nacional, têm conhecimento e compreensão da realidade brasileira, colaborando de forma expressiva e contínua em atividades de cunho social e de defesa civil. A própria presidenta dá às Forças Armadas incumbências que redundam em ações que não se coadunam com suas missões específicas. Tal atitude vai ao encontro do que disse um político renomado: “É uma mão de obra disciplinada, confiável, de pronto emprego e não entra em greve”. Realmente, neste país de democracia frágil e permissiva, felizmente, as Forças Armadas são a única instituição que não entra em greve.

Essa presença ímpar na sociedade brasileira não admite, entretanto, que sua principal missão constitucional seja desvirtuada ou relegada a plano secundário. Nossas Forças Armadas são uma instituição do Estado, e não de governo. Não podem ser “braço armado” de governos ou de quaisquer facções políticas, pois, se assim for, se tornariam uma “guarda pretoriana”.

É só uma brincadeira - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 11/06

SÃO PAULO - É legítimo torcer contra o Brasil na Copa? Ainda que eu não tenha abraçado essa posição, minha resposta é um sonoro "sim".

Para que, afinal, serve o jogo? Evidências zoológicas sugerem que a brincadeira desempenha um papel fundamental no desenvolvimento dos mamíferos. É jogando, isto é, simulando lutas, caçadas e fugas, que os filhotes aprendem e, divertindo-se, se preparam para a vida adulta.

Isso vale ainda mais para o homem do que para outros animais. O historiador holandês Johan Huizinga (1872-1945), autor do clássico "Homo Ludens", sustenta que a ideia de jogo é central para a civilização. Para ele, praticamente todas as atividades humanas, incluindo filosofia, guerra, arte, leis e política, podem ser vistas como o resultado de um jogo.

O que é um julgamento senão uma espécie de combate fingido no qual as partes substituem o enfrentamento total por um ditado por regras arbitrárias como as de um jogo, mas aceitas de comum acordo por ambos os lados? O ar de espetáculo, outra característica de jogos, aparece como fóssil nas togas e perucas usadas até hoje por alguns juízes, que, segundo Huizinga, têm função semelhante à das máscaras de xamãs, "transformando-os" em seres distintos.

Observamos algo parecido na política. Em vez de diferentes facções guerrearem até a morte para definir quem manda, elas se batem em eleições que seguem uma coreografia predefinida. O prêmio, isto é, o poder, é conquistado por um período fixo, ao cabo do qual o jogo se reinicia.

Se essa chave interpretativa é correta, nada mais apropriado do que nos dividirmos em grupos que torcem contra e a favor do Brasil. Se o jogo tem mesmo o caráter civilizatório que Huizinga lhe atribui, este é um momento privilegiado para nos exercitarmos em lidar com diferenças. Paradoxalmente, é porque é só uma brincadeira, ou seja, algo sem tanta importância, que o jogo se tornou tão central para nossa espécie.

Oportunismo de grevistas e sem-teto - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 11/06

MTST faz a Copa refém, e aproveita a fragilidade da candidatura Dilma e problemas do PT em São Paulo para conseguir alterar o Minha Casa Minha Vida


É de extrema obviedade a coincidência entre movimentos grevistas e reivindicatórios, como o do MTST em São Paulo, e a proximidade da Copa. Afinal, será muito ruim para torcedores, população em geral e imagem do país, se a cidade-sede do jogo de abertura do torneio, amanhã, enfrentar dificuldades devido a passeatas e conflitos nas ruas.

Sindicatos, entre eles o dos metroviários paulistas, e o MTST demonstraram oportunismo ao transformar a Copa em refém na tentativa de conseguir o que desejam.

Os metroviários esbarraram em dois obstáculos: a Justiça do Trabalho concedeu à categoria 8,7% de reajuste, acima da inflação, portanto, assim como cumpriu a lei ao declarar a greve “abusiva”; e o governo de Geraldo Alckmin demitiu dezenas de grevistas depois disso.

A maior vítima de greves no transporte público, como sempre, é a grande massa da população, de renda mais baixa. Com toda razão, por isso, a desembargadora Rilma Hemérito, do Tribunal Regional do Trabalho paulista, fez duras reprimendas em reuniões distintas de conciliação com metroviários e representantes de motoristas e cobradores.

Além da Copa, outros ingredientes no momento atribulado da cidade de São Paulo são a relativa vulnerabilidade da candidatura da presidente Dilma à reeleição e a situação incômoda do pré-candidato petista ao Palácio dos Bandeirantes, Alexandre Padilha, escolhido por apenas 3% dos eleitores ouvidos em recente pesquisa.

Fica mais fácil, neste quadro, pressionar o PT do Planalto e o do governo do prefeito Fernando Haddad. Se os metroviários ainda ameaçam devido às demissões, as quais desejam reverter em troca de uma quinta-feira sem dificuldades na cidade, os sem-teto do MTST, braço urbano do MST, suspenderam qualquer manifestação para amanhã. E os próximos dias, pois conseguiram importantes vitórias.

A primeira, fazer que com a área invadida ao lado do Itaquerão, onde haverá o jogo Brasil e Croácia, seja incluída no programa Minha Casa Minha Vida. E depois forçaram a própria mudança do programa de habitação, para seu alcance não se limitar a moradores de áreas de risco, além de ampliar o número de unidades a serem construídas e aumentar o limite de renda familiar dos beneficiários de R$ 1.600 para R$ 2.172, a fim de incluir os “sem-teto” paulistanos, a clientela do MTST.

Antigo aliado do Planalto, o MST, agora na versão urbana, é mais uma vez beneficiado. Já no início do primeiro governo Lula, o decreto que impedia desapropriação de terra invadida foi considerado letra morta. Agora, a prefeitura e o Planalto tratam de ajudar o MST urbano em São Paulo, cujo prefeito está mal avaliado pela população. Ficou uma mensagem implícita: se quiser casa, filie-se ao MTST. E, dessa forma, o direito constitucional de propriedade passa a ser ainda mais fragilizado na maior cidade do país.

A chantagem funcionou - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 11/06

Estava o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), Guilherme Boulos, anunciando em entrevista que a sua organização continuaria promovendo manifestações nas ruas de São Paulo na quinta-feira do jogo de abertura da Copa do Mundo quando foi chamado ao telefone. Sete minutos depois de conversar com um assessor do ministro da Casa Civil, Gilberto Carvalho, como informaria em seguida, um jubiloso Boulos retomou a entrevista – para anunciar que o MTST daria uma trégua aos paulistanos. Não iria marcar novos atos em favor dos metroviários ainda em greve naquela segunda-feira. Afinal, acabara de saber que o governo federal havia acatado as suas exigências. “Encerramos nossa jornada com a vitória da mobilização e com nossa pauta completamente atendida”, exultou o dirigente.

Era a rendição do governo da presidente Dilma Rousseff à ofensiva criminosa desencadeada no dia 3 de maio, quando uma área pertencente a uma construtora, propriedade particular, portanto, tornou-se alvo de uma invasão instigada pelas falanges de Boulos e batizada Copa do Povo. Em menos de 40 horas, 2,5 mil barracos foram erguidos no terreno de 150 mil metros quadrados localizado no Parque do Carmo, na zona leste da cidade – e, significativamente, a menos de 4 quilômetros do Itaquerão, o novo estádio do Corinthians. Quatro dias depois, a pedido da empresa proprietária, a Justiça determinou a reintegração de posse da área. A resposta do MTST foi bloquear, sucessivamente, vias estratégicas da capital, das Marginais à Avenida Paulista e ao centro velho. A tática de derrubar a lei no grito provou pela primeira vez dar resultados quando os governos municipal, estadual e federal, PT e PSDB, formaram uma profana aliança para adiar o cumprimento da ordem judicial.

Neste ano de Copa e de eleições em que o poder público mede os passos para não melindrar organizações, grupos e grupelhos autodenominados “movimentos sociais”, que tratam o espaço urbano como se fosse seu pavilhão privado de caça, não espanta que os fundamentos do Estado de Direito e da democracia sucumbam à chantagem dos sem-lei. Para apaziguar o MTST – e inevitavelmente abrindo caminho para que outras violências sejam também premiadas –, Dilma prometeu subsidiar com R$ 152 milhões a construção de 2 mil moradias na Copa do Povo. Estado e Prefeitura arcarão com o restante da fatura. “Não haverá assim gastos com desapropriação”, garante Boulos, aludindo a um suposto acordo com a construtora. O arranjo depende de a Câmara aprovar em segunda votação o Plano Diretor emendado pelo prefeito Fernando Haddad nos termos ditados pelo MTST – para classificar a área invadida como Zona Especial de Interesse Social (Zeis).

“vitória da mobilização”, como festeja o dirigente, foi além – em escabroso prejuízo da massa de candidatos a uma habitação popular que se inscreveram no Minha Casa, Minha Vida e esperam na fila sem partir para a delinquência. Isso porque o MTST, passando a ser incluído no programa federal, fará a sua própria lista. Na sua próxima fase, os movimentos de moradia que o integram poderão assumir, cada qual, a construção de 4 mil unidades habitacionais em vez das mil atuais. Os empreendimentos geridos por essas entidades poderão se situar em qualquer lugar da cidade. Outra mudança será a elevação do teto da renda dos beneficiários da chamada faixa 1 do programa: passará de R$ 1.600 para R$ 2.172, ou três salários mínimos. O acordo com o MTST – ou melhor, os termos da rendição incondicional do governo, porque é disso que se trata – ficou de ser assinado na próxima segunda-feira.

Nas sociedades complexas, caracterizadas pela competição entre inumeráveis interesses, muitas vezes conflitantes, as chances de êxito dos diversos setores dependem de sua capacidade de se organizar, persuadir o público de que as suas pretensões atendem ao bem comum e de pressionar os apropriados centros de decisão do Estado. Mas, até para prevenir a sua proliferação, não deve haver margem para a chantagem e a transgressão da ordem jurídica, como faz o MTST. Muito menos para serem recompensadas por um governo acoelhado ou conivente.


O calote é coisa séria - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 11/06
É preocupante o que andam informando a maioria dos indicadores da economia brasileira. Entre eles, há um de pouco brilho, mas de muita importância como sinalizador da saúde financeira daquele que deveria ser o principal foco das atenções: o consumidor. Trata-se do índice de inadimplência, palavrão que traduz o popular cano, calote ou, simplesmente, a incapacidade do comprador a prazo, do tomador de empréstimos ou de usuários de serviços permanentes de pagar as contas.
Instituições especializadas na tarefa de medir diariamente o número dessas pessoas e o valor de suas dívidas - como o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), mantido pela Confederação Nacional dos Dirigentes Logistas (CNDL) e a multinacional Serasa Experian - vêm alertando para o crescimento acelerado do número de famílias endividadas no Brasil. Não é algo que chegue às manchetes, mas o problema acaba de ganhar uma proporção que deixa os especialistas em alerta.

No relatório sobre a inadimplência em maio, o SPC Brasil constatou um crescimento de 9,56% do número de pessoas com suas contas em atraso, em relação a maio do ano passado. É o percentual de aumento mais alto desde o início da série histórica, em 2010. Segundo o relatório, entre abril e maio deste ano, 1,2 milhão de pessoas tiveram seus nomes e CPFs incluídos nos serviços regionais de proteção ao crédito, elevando para 55 milhões o total dos brasileiros inscritos.

Isso quer dizer que um em cada quatro consumidores não está ou não esteve em dia com as prestações do crediário ou com as faturas da luz, da internet ou da tevê a cabo, entre outras contas. E essa é uma situação que provoca reações negativas em todos os agentes que concedem crédito, com reflexos na economia.

A primeira delas é tornar menos fácil a liberação do crediário para compras novas ou dos empréstimos em bancos e financeiras, situação já perceptível na praça. O ministro Guido Mantega, da Fazenda, e até o ex-presidente Lula têm acusado esse golpe e, inadvertidamente, insistem que os bancos deveriam ser mais liberais.

A outra é a imediata elevação dos juros. A respeitada Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) informa que, apesar de a taxa Selic ter sido mantida em 11% pelo Banco Central, entre abril e maio, os juros cobrados de empresas e consumidores completaram o sétimo mês consecutivo de altas. Em maio, os taxas anuais variavam de 66% a 112% ao ano, conforme o produto comprado a prazo.

Mesmo que nada justifique essas taxas escandalosas, a explicação é clássica: se não houve aumento de impostos nem de custos bancários, a vilã é mesmo a inadimplência média registrada no mercado. É ela que sinaliza aos bancos o tamanho do risco que eles estão correndo e os leva a punir os justos pelos pecadores, ou seja, os juros sobem para todo mundo.

Está aí mais uma pedra no caminho da retomada da economia. É mais um preço a pagar pelo excesso de estímulo ao consumo sem contrapartida de investimentos na produção e pelo baixo esforço fiscal para conter a inflação nos últimos anos. Resta esperar que essa enrascada não chegue aos empregos, para que a população não tenha de pagar por erros que não cometeu.

PMDB à deriva - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 11/06

Não é difícil saber para que lado o PMDB se inclinará: basta seguir o poder. No plano federal, quando diminui a vantagem do favorito em uma eleição, o partido hesita, e alguns de seus membros até preferem abandonar o barco. Interesses regionais influenciam as escolhas, bem como acertos que podem se mostrar mais vantajosos no futuro.

As dissidências, porém, não são peremptórias. Definido o resultado do pleito, todos se sentem atraídos pela nau vitoriosa. Não importa o rumo, a coloração ideológica, o projeto: é com ela que o conglomerado de caciques, alas e grupos seguirá seu curso, mas sem deixar de promover os habituais motins em busca de maiores vantagens.

Principal aliado de Dilma Rousseff (PT), o PMDB definiu nesta terça-feira (10) que continuará a navegar com a presidente.

Embora a decisão fosse previsível --uma vez que o partido ocupa a Vice-Presidência da República e está aportado em cinco ministérios--, verificou-se na convenção do PMDB marcante divergência. Contaram-se 59% dos votos a favor da aliança e 41% contrários a ela.

O resultado contrasta com a ampla adesão à candidatura de Dilma em 2010, quando 84% dos delegados peemedebistas apoiaram a chapa encabeçada pela petista.

Além de descontentamentos com o modo como o governo trata seus aliados no Congresso, da queda da popularidade presidencial e das incertezas que cercam a reeleição, pesaram entre os desgostosos as ambiguidades do Planalto em disputas nos Estados. Em alguns deles, o PT e o PMDB serão adversários.

A atuação do vice-presidente Michel Temer foi decisiva para a preservação da aliança, mas os números evidenciam que o cacique-mor da sigla já não desfruta do mesmo prestígio de outros tempos.

Para a campanha petista, a decisão representa um acréscimo de 2 minutos e 20 segundos em cada bloco de 25 minutos da propaganda eleitoral. Tem sido esse, aliás, o principal fator a nortear os arranjos políticos entre partidos no Brasil.

Por um pouco mais de exposição na TV, alianças em tese impensáveis, como a de Paulo Maluf com o PT, se concretizam como se fossem naturais. Projetos e afinidades ideológicas são substituídos pelo comércio de cargos e favores, os partidos perdem significado, a política cai no descrédito --e assim "la nave va".

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Não sou homem-bomba”
Paulo Roberto Costa acalmando políticos e empreiteiros que temem sua delação


RACHADO, PMDB PODE DEPOR TEMER DA PRESIDÊNCIA

A demonstração de força dos rebeldes do PMDB, que fizeram ontem mais de 40% dos votos contrários ao projeto do vice Michel Temer de manter aliança pela reeleição da presidente Dilma Rousseff, foi vista pela cúpula como um recado do que pode vir nas eleições ao comando do partido. Segundo dissidentes, a recondução por aclamação de Temer em 2013 para presidente do PMDB corre sério risco de não se repetir em 2015.

RECADO DADO

O crescente coro dos descontentes no PMDB exige “um tratamento digno no governo Dilma”. Leia-se cargos e protagonismo nas políticas.

LISTA NEGRA

Não compareceram dez convencionais da Paraíba, o senador Vital do Rêgo, e oito de Santa Catarina, além do senador Luiz Henrique.

GOSTO DE DERROTA

Contrários a Dilma, Darcísio Perondi (RS), Leonardo Picciani (RJ) e Danilo Forte (CE) destacaram o “sabor de derrota” da vitória de Michel Temer.

YES, NÓS TEMOS

O espantosamente feio avião da seleção brasileira, grafitado pela dupla Os gêmeos, ganhou apelido à altura no Twitter: “Bananão”.

PECHINCHA SUSPEITA

A oposição tentará esclarecer, na CPMI da Petrobras, uma pechincha pra lá de suspeita. O líder do PSDB, deputado Antônio Imbassahy (BA), vai interpelar a presidente da Petrobras, Graça Foster, sobre os ativos da estatal na África, avaliados em US$ 7 bilhões, oferecidos ao banqueiro André Esteves (BTG) por apenas US$ 1,5 bilhão. Quer saber também se Lula, amigo de Esteves, tem alguma coisa a ver com isso.

PAÍS DO FUTEBOL

Faz sentido dizer que “o Brasil parou com a Copa”: depois dos metroviários, os estivadores entram em greve em todos os portos.

CONFISCO OFICIAL

Além da tributação astronômica, os Correios agora cobram adicional de R$ 12 na entrega de encomenda pela internet acima de US$ 500.

MAIS DO MESMO

Domingos Sávio (PSDB-MG) compara a CPMI do Cachoeira com a da Petrobras: ambas têm esquema de firmas fantasmas, como na Delta.

JOGO DE VÁRZEA

Com a oposição barrada, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa chutou à vontade, driblou o débil meio-campo da CPI no Senado e, deputado “homem-bomba”, sequer soltou um traque no depoimento.

NA PISTA DO PSDB

O deputado José Aníbal oficializou ao PSDB a intenção de disputar o Senado na chapa de Geraldo Alckmin. Mas o governador paulista negocia o cargo com Gilberto Kassab (PSD) e Márcio França (PSB).

DESTAQUES

Fragilizado na luta contra o câncer, o ex-ministro Mendes Ribeiro e o senador José Sarney, que acompanharam sentados a convenção do PMDB, foram destaques no discurso de Dilma.

LICITAÇÃO POLÊMICA

A comissão de licitação para escolha de agência de publicidade do BRB tem ignorado os recursos e erros no edital e na apresentação das propostas. Vai acabar sobrando na Justiça para o governador do DF, Agnelo Queiroz (PT), a quem a comissão atribui as próprias decisões.

RECORDAR É DECIDIR

Em agosto, há 33 anos, o então presidente Ronald Reagan baixou a crista da pelegada dos controladores de voo, que ameaçavam parar os Estados Unidos. Chamou militares treinados para o serviço, e demitiu a cambada: 11.350.

BRIGA INTERNA

Cresceu o ressentimento do PT de Rui Falcão com o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil). Falcão chega a acusar o correligionário, em conversas reservadas, de trabalhar para fragilizar o PT nas eleições.

RETÍFICA CH

O general Fernando Sérgio Galvão é quem será empossado na vice-presidência do Superior Tribunal Militar, dia 16. Ao contrário do que informou esta coluna, o ministro Olympio Pereira da Silva Jr é civil.

TUDO CERTO

Presidente do PMDB, Valdir Raupp obteve garantia do ministro César Borges (Transportes) e do general Fraxe (Dnit) de que não há veto da presidente Dilma à obra da ponte do Rio Madeira, que unirá o Acre a Rondônia.

#VÃOPRARUA

Outubro é a data-limite para demitir por “justa causa” os políticos em greve de ética e honestidade há anos no Congresso.


PODER SEM PUDOR

UM IMENSO BORDEL

O jovem vereador Leonel Brizola (PTB) era um dos favoritos à Prefeitura de Porto Alegre, em 1951. Confiantes, ele e seus apoiadores resolveram festejar a vitória antecipadamente. A festa, um sucesso, foi organizada por Colé, ferrenho petebista, com direito a cortejo e caminhão com lindas mulheres. No dia seguinte, o principal adversário de Brizola, Ildo Meneghetti, fez o mesmo percurso acompanhado do bispo. Com megafone à mão, anunciava:

- Venho aqui adverti-los: Brizola, se eleito for, transformará nossa cidade num imenso bordel. Podem até esperar, que esse sem-vergonha nomeará Colé como chefe do cerimonial da prefeitura. Meneghetti ganhou as eleições por pouco mais de mil votos.