O GLOBO - 13/05
Nunca antes na história deste país se viu um partido no poder que cuspiu tanto, e de forma tão escancarada, nas regras do jogo
O Brasil ficou horrorizado com as cenas de barbárie ocorridas em Guarujá semana passada, quando uma dona de casa foi linchada até a morte após boatos disseminados pelas redes sociais. Mas há outro linchamento que vem ocorrendo há anos e também merece nossa atenção, pois tem profundo impacto em nossas vidas: o das nossas instituições.
É claro que não há causalidade direta entre um e o outro, mas é inegável que a completa perda de credibilidade do povo em nossas instituições tem produzido um clima de anomia propício aos “justiceiros” que se julgam acima das leis. Como a Justiça não só tarda como falha muito, a impunidade gera a desculpa perfeita àqueles que desejam “fazer justiça com as próprias mãos”.
O agravante é justamente que o mau exemplo vem de cima. Espera-se que as autoridades sejam os maiores ícones do respeito às leis. Mas e quando o próprio governo é o primeiro a ignorar a Constituição, o império das leis? Que tipo de mensagem chega ao povo?
Não vou dizer que o PT inventou tudo isso, claro; mas nunca antes na história deste país se viu um partido no poder que cuspiu tanto, e de forma tão escancarada, nas regras do jogo. Que outro partido abusa tanto da confusão entre governo e estado? Que outro partido encara cada instrumento estatal como um braço partidário?
Exemplos não faltam. O recente discurso da presidente Dilma na véspera do Dia do Trabalho vem à mente. Diante de uma prerrogativa de Estado para um comunicado oficial, a presidente usou as redes de televisão e rádio para fazer uma absurda campanha eleitoral, ainda por cima enganosa. É ridicularizar demais nossas instituições.
O PT aparelhou toda a máquina pública, infiltrou seus militantes em estatais, agências reguladoras, chegando até ao STF, corroendo feito cupins os pilares de nossa frágil democracia. Como cobrar obediência às leis depois? Como exigir que cada cidadão se coloque sob as mesmas regras se o próprio governo se julga acima delas?
Mas não é “só” isso. Toda a retórica revolucionária dos petistas sempre enalteceu criminosos sob o manto da ideologia. Ou, por acaso, os invasores de terra do MST não praticam crimes em nome da “justiça social”? E o que acontece em seguida? São recebidos com honra no Palácio do Planalto pela própria presidente e ganham verbas do BNDES!
Boa parte da esquerda trata bandidos como “vítimas da sociedade”, como se não houvesse volição, responsabilidade em seus atos, como se uma condição financeira menos favorável fosse justificativa para roubar e matar inocentes (visão ofensiva à maioria dos pobres brasileiros, gente trabalhadora e honesta). Como exigir respeito ao Estado de direito com esse discurso sensacionalista?
O Brasil sob o PT perdeu suas esperanças num futuro melhor, eis a triste verdade. Foram anos de muito cinismo, de imoralidade à luz do dia, de bolivarianismo explícito, de canalhice recompensada. Quando o ex-presidente Lula beija a mão de “coronel” nordestino dizendo que é uma aula de política, abraça o Maluf ou afirma que Sarney não pode ser julgado como um homem comum, qual mensagem transmite ao povo?
Quando petistas do mais alto escalão são julgados e condenados pelo STF, cuja maioria dos ministros foi escolhida pelo próprio PT, e o partido sai em defesa dos criminosos presos e ataca o Supremo, qual o recado que passa para o cidadão? Como demandar aderência às leis em seguida?
O PT, adotando a estratégia marxista, segregou o país em duas classes. Ou você endossa seu modelo, ou você é um “inimigo da nação”. Divergências e críticas construtivas? Nem pensar! Imprensa livre apurando e divulgando escândalos infindáveis? Mídia golpista, tratada como “partido de oposição”. Que país resiste a esse tipo de divisão, quando o que mais se precisa é justamente um sentido de união em prol de avanços comuns?
Poucas vezes se viu uma sensação tão derrotista como a atual, com várias pessoas falando em ir embora do país. Em plena época de Copa, e no Brasil, nunca se viu tanta indiferença. Há muita revolta, isso sim. Protestos, greves, centenas de ônibus depredados ou incendiados por vândalos, uma população cansada da tática do “pão & circo”. Um ambiente fértil para oportunistas de plantão, baderneiros, agitadores e “salvadores da pátria”.
Nada disso precisa ser assim. Não podemos nos entregar ao fatalismo. Escrevo essas linhas de Miami, a “América Latina que deu certo”. Aqui, os mesmos latino-americanos obedecem as leis, respeitam as regras. Por que vamos mirar no péssimo exemplo venezuelano? Por que não podemos ter algo muito melhor? O que nos impede?
terça-feira, maio 13, 2014
O silêncio dos nada inocentes - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 13/05
Calmaria na finança nada diz sobre o Brasil 'dois por meia dúzia' (cresce 2% com inflação de 6%)
O LEITOR, QUE é perspicaz, terá notado a falta de más notícias do mundo exterior. Isto é, de notícias de invasões bárbaras dos povos do mercado lá de fora. O fim do mundo parecia próximo em fevereiro, pelo menos a julgar pelas arruaças que os donos do dinheiro grosso promoviam em países "emergentes", como nós. Na falta de especulações negativas e demenciais, o clima parece ter despiorado até por aqui, pelo menos na finança.
A calmaria é suspeita, claro. Está bom demais para ser verdade. As Bolsas mundiais estão no nível mais alto desde 2007 (se medidas pelo índice MSCI All Country World, do Morgan Stanley). O Dow Jones da Bolsa de Nova York está em nível recorde, o S&P 500 pertinho disso. O preço das commodities (matériasprimas e agropecuários cotados em Bolsas de Valores) voltou a subir animadamente.
Não há "fundamento", motivo econômico "real", "crescimento sustentável", para tanta animação (como se fosse necessário, claro. Mas essa era a ideia original da coisa).
Por ora, os povos dos mercados descartam alta de juros nos Estados Unidos, hipótese altista que deu início à série de tumultos vistos entre maio de 2013 e fevereiro de 2014.
Há ainda mais dinheiro sobrando no mundo. Os negócios com abertura de capital (venda inicial de ações de uma empresa, "IPOs") não estavam tão aquecidos desde 2010.
Isso tudo nos contamina. Uma parte da dinheirama pinga aqui, atraída de resto pela nossa maquiagem vistosa, taxas de juros indecentes de altas e um câmbio administrado pelo Banco Central, para nem mencionar os preços de liquidação a que chegaram ações e títulos de dívida brasileiros no tumulto do início do ano.
Então, provisoriamente e de público, os povos dos mercados param de matraquear sobre o fato de o Brasil ser "frágil", embora, para o bem ou para o mal, estejamos na mesma desde o ano passado.
Essa conjunção de maluquices e oportunidades de ganho gordo leva o dólar a R$ 2,21, barato demais para o nosso estado de coisas.
Uma especulação doida adicional, a da hipótese de derrota de Dilma Rousseff, por ora muito incerta, dá uma forcinha ao real e uma vitaminada impressionante no preço das ações, de estatais e da Petrobras em particular.
As empresas brasileiras grandes e boas aproveitam os dias de tempo bom e pegam mais dinheiro emprestado lá fora, a bom preço, dobrando a quantidade de "captações" em relação ao ano passado.
"Na real", continuamos a definhar de modo lento, gradual e seguro. As vendas nos supermercados perdem força, há recessão nas montadoras, a indústria encolheu no trimestre, menos gente trabalha nas grandes metrópoles, a confiança de consumidores e empresários cai ao nível do feio 2009. Dólar mais barato, tabelamentos informais de preços e juros outra vez indecentes seguram a inflação abaixo de 7%.
O Brasil não vai "explodir", como diz a presidente Dilma. Vai dar chabu.
Nada trágico, fundamentalmente nada de novo desde 2012, quando o Brasil entrava num esquema "dois por meia dúzia" (crescimento de 2% com inflação de 6%).
A calmaria não deveria nos iludir. É parte do ciclo de transtorno multipolar dos "mercados".
Calmaria na finança nada diz sobre o Brasil 'dois por meia dúzia' (cresce 2% com inflação de 6%)
O LEITOR, QUE é perspicaz, terá notado a falta de más notícias do mundo exterior. Isto é, de notícias de invasões bárbaras dos povos do mercado lá de fora. O fim do mundo parecia próximo em fevereiro, pelo menos a julgar pelas arruaças que os donos do dinheiro grosso promoviam em países "emergentes", como nós. Na falta de especulações negativas e demenciais, o clima parece ter despiorado até por aqui, pelo menos na finança.
A calmaria é suspeita, claro. Está bom demais para ser verdade. As Bolsas mundiais estão no nível mais alto desde 2007 (se medidas pelo índice MSCI All Country World, do Morgan Stanley). O Dow Jones da Bolsa de Nova York está em nível recorde, o S&P 500 pertinho disso. O preço das commodities (matériasprimas e agropecuários cotados em Bolsas de Valores) voltou a subir animadamente.
Não há "fundamento", motivo econômico "real", "crescimento sustentável", para tanta animação (como se fosse necessário, claro. Mas essa era a ideia original da coisa).
Por ora, os povos dos mercados descartam alta de juros nos Estados Unidos, hipótese altista que deu início à série de tumultos vistos entre maio de 2013 e fevereiro de 2014.
Há ainda mais dinheiro sobrando no mundo. Os negócios com abertura de capital (venda inicial de ações de uma empresa, "IPOs") não estavam tão aquecidos desde 2010.
Isso tudo nos contamina. Uma parte da dinheirama pinga aqui, atraída de resto pela nossa maquiagem vistosa, taxas de juros indecentes de altas e um câmbio administrado pelo Banco Central, para nem mencionar os preços de liquidação a que chegaram ações e títulos de dívida brasileiros no tumulto do início do ano.
Então, provisoriamente e de público, os povos dos mercados param de matraquear sobre o fato de o Brasil ser "frágil", embora, para o bem ou para o mal, estejamos na mesma desde o ano passado.
Essa conjunção de maluquices e oportunidades de ganho gordo leva o dólar a R$ 2,21, barato demais para o nosso estado de coisas.
Uma especulação doida adicional, a da hipótese de derrota de Dilma Rousseff, por ora muito incerta, dá uma forcinha ao real e uma vitaminada impressionante no preço das ações, de estatais e da Petrobras em particular.
As empresas brasileiras grandes e boas aproveitam os dias de tempo bom e pegam mais dinheiro emprestado lá fora, a bom preço, dobrando a quantidade de "captações" em relação ao ano passado.
"Na real", continuamos a definhar de modo lento, gradual e seguro. As vendas nos supermercados perdem força, há recessão nas montadoras, a indústria encolheu no trimestre, menos gente trabalha nas grandes metrópoles, a confiança de consumidores e empresários cai ao nível do feio 2009. Dólar mais barato, tabelamentos informais de preços e juros outra vez indecentes seguram a inflação abaixo de 7%.
O Brasil não vai "explodir", como diz a presidente Dilma. Vai dar chabu.
Nada trágico, fundamentalmente nada de novo desde 2012, quando o Brasil entrava num esquema "dois por meia dúzia" (crescimento de 2% com inflação de 6%).
A calmaria não deveria nos iludir. É parte do ciclo de transtorno multipolar dos "mercados".
Professores, acordem! - GUSTAVO IOSCHPE
REVISTA VEJA
Normalmente escrevo esta coluna pensando nos leitores que nada têm a ver com o setor educacional. Faço isso, em primeiro lugar, porque creio que a educação brasileira só vai avançar (e com ela o Brasil) quando houver demanda pública por melhorias. E, segundo, porque nos últimos anos tenho chegado à conclusão de que falar com o professor médio brasileiro, na esperança de trazer algum conhecimento que o leve a melhorar seu desempenho, é mais inútil do que o proverbial pente para careca. Não deve haver, nos 510 milhões de quilômetros quadrados deste nosso planeta solitário, um grupo mais obstinado em ignorar a realidade que o dos professores brasileiros. O discurso é sempre o mesmo: o professor é um herói, um sacerdote abnegado da construção de um mundo melhor, mal pago, desvalorizado, abandonado pela sociedade e pelos governantes, que faz o melhor possível com o pouco que recebe. Hoje faço minha última tentativa de falar aos nossos mestres. E, dado o grau de autoengano em que vivem, eu o farei sem firulas.
Caros professores: vocês se meteram em uma enrascada. Há décadas, as lideranças de vocês vêm construindo um discurso de vitimização. A imagem que vocês vendem não é a de profissionais competentes e comprometidos, mas a de coitadinhos, estropiados e maltratados. E vocês venceram: a população brasileira está do seu lado, comprou essa imagem (nada seduz mais a alma brasileira do que um coitado, afinal). Quando vocês fazem greve – mesmo a mais disparatada e interminável –, os pais de alunos não ficam bravos por pagar impostos a profissionais que deixam seus filhos na mão; pelo contrário, apoiam a causa de vocês. É uma vitória quase inacreditável. Mas prestem atenção: essa é uma vitória de Pirro. Porque nos últimos anos essa imagem de desalento fez com que aumentassem muito os recursos que vão para vocês, sem a exigência de alguma contrapartida da sua parte. Recentemente destinamos os royalties do pré-sal a vocês, e, em breve, quando o Plano Nacional de Educação que transita no Congresso for aprovado, seremos o único país do mundo, exceto Cuba, em que se gastam 10% do PIB em educação (aos filocubanos, saibam que o salário de um professor lá é de aproximadamente 28 dólares por mês. Isso mesmo, 28 dólares. Os 10% cubanos se devem à falta de PIB, não a um volume de investimento significativo).
Quando um custo é pequeno, ninguém se importa muito com o resultado. Quando as coisas vão bem, ninguém fica muito preocupado em cortar despesas. E, quando a área é de pouca importância, a pressão pelo desempenho é pequena. No passado recente, tudo isso era verdade sobre a educação brasileira. Éramos um país agrícola em um mundo industrial; a qualificação de nossa gente não era um elemento indispensável e o país crescia bem. Mas isso mudou. O tempo das vacas gordas já era, e a educação passou a ser prioridade inadiável na era do conhecimento. Nesse cenário, a chance de que se continue atirando dinheiro no sistema educacional sem haver nenhuma melhora, a longo prazo, é zero.
Vocês foram gananciosos demais. Os 10% do PIB e os royalties do pré-sal serão a danação de vocês. Porque, quando essa enxurrada de dinheiro começar a entrar e nossa educação continuar um desastre, até os pais de alunos de escola pública vão entender o que hoje só os estudiosos da área sabem: que não há relação entre valor investido em educação – entre eles o salário de professor – e o aprendizado dos alunos. Aí esses pais, e a mídia, vão finalmente querer entrar nas escolas para entender como é possível investirmos tanto e colhermos tão pouco. Vão descobrir que a escola brasileira é uma farsa, um depósito de crianças. Verão a quantidade abismal de professores que faltam ao trabalho, que não prescrevem nem corrigem dever de casa, que passam o tempo de aula lendo jornal ou em rede social ou, no melhor dos casos, enchendo o quadro-negro de conteúdo para aluno copiar, como se isso fosse aula. E então vocês serão cobrados. Muito cobrados. Mas, como terão passado décadas apenas pedindo mais, em vez de buscar qualificação, não conseguirão entregar.
Quando isso acontecer, não esperem a ajuda dos atuais defensores de vocês, como políticos de esquerda, dirigentes de ONGs da área e alguns "intelectuais". Sei que em declarações públicas esse pessoal faz juras de amor a vocês. Mas, quando as luzes se apagam e as câmeras param de filmar, eles dizem cobras e lagartos.
Existem muitas coisas que vocês precisarão fazer, na prática, para melhorar a qualidade do ensino, e sobre elas já discorri em alguns livros e artigos aqui. Antes delas, seria bom começarem a remover as barreiras mentais que geram um discurso ilógico e atravancam o progresso. Primeira: se vocês são vítimas que não têm culpa de nada, também não poderão ser os protagonistas que terão responsabilidade pelo sucesso. Se são objetos do processo quando ele dá errado, não poderão ser sujeitos quando ele começar a dar certo. Se vocês querem ser importantes na vitória, precisam assimilar o seu papel na derrota.
Segunda: vocês não podem menosprezar a ciência e os achados da literatura empírica sempre que, como na questão dos salários, eles forem contrários aos interesses de vocês. Ou vocês acreditam em ciência, ou não acreditam. E, se não acreditam – se o que vale é experiência pessoal ou achismo –, então vocês são absolutamente dispensáveis, e podemos escolher na rua qualquer pessoa dotada de bom-senso para cuidar da nossa educação. Vocês são os guardiães e retransmissores do conhecimento acumulado ao longo da história da humanidade. Menosprezar ou relativizar esse conhecimento é cavar a própria cova.
Terceira: parem de vedar a participação de terceiros no debate educacional. É inconsistente com o que vocês mesmos dizem: que o problema da educação brasileira é de falta de envolvimento da sociedade. Quando a sociedade quer participar, vocês precisam encorajá-la, não dizer que só quem vive a rotina de "cuspe e giz" é que pode opinar. Até porque, se cada área só puder ser discutida por quem a pratica, vocês terão de deixar a determinação de salários e investimentos nas mãos de economistas. Acho que não gostarão do resultado...
Quarta: abandonem essa obsessão por salários. Ela está impedindo que vocês vejam todos os outros problemas – seus e dos outros. O discurso sobre salários é inconsistente. Se o aumento de salário melhorar o desempenho, significa que ou vocês estavam desmotivados (o que não casa com o discurso de abnegados tirando leite de pedra) ou que é preciso atrair pessoas de outro perfil para a profissão (o que equivale a dizer que vocês são inúteis irrecuperáveis).
O respeito da sociedade não virá quando vocês tiverem um contracheque mais gordo. Virá se vocês começarem a notar suas próprias carências e lutarem para saná-las, dando ao país o que esperamos de vocês: educação de qualidade para nossos filhos.
Normalmente escrevo esta coluna pensando nos leitores que nada têm a ver com o setor educacional. Faço isso, em primeiro lugar, porque creio que a educação brasileira só vai avançar (e com ela o Brasil) quando houver demanda pública por melhorias. E, segundo, porque nos últimos anos tenho chegado à conclusão de que falar com o professor médio brasileiro, na esperança de trazer algum conhecimento que o leve a melhorar seu desempenho, é mais inútil do que o proverbial pente para careca. Não deve haver, nos 510 milhões de quilômetros quadrados deste nosso planeta solitário, um grupo mais obstinado em ignorar a realidade que o dos professores brasileiros. O discurso é sempre o mesmo: o professor é um herói, um sacerdote abnegado da construção de um mundo melhor, mal pago, desvalorizado, abandonado pela sociedade e pelos governantes, que faz o melhor possível com o pouco que recebe. Hoje faço minha última tentativa de falar aos nossos mestres. E, dado o grau de autoengano em que vivem, eu o farei sem firulas.
Caros professores: vocês se meteram em uma enrascada. Há décadas, as lideranças de vocês vêm construindo um discurso de vitimização. A imagem que vocês vendem não é a de profissionais competentes e comprometidos, mas a de coitadinhos, estropiados e maltratados. E vocês venceram: a população brasileira está do seu lado, comprou essa imagem (nada seduz mais a alma brasileira do que um coitado, afinal). Quando vocês fazem greve – mesmo a mais disparatada e interminável –, os pais de alunos não ficam bravos por pagar impostos a profissionais que deixam seus filhos na mão; pelo contrário, apoiam a causa de vocês. É uma vitória quase inacreditável. Mas prestem atenção: essa é uma vitória de Pirro. Porque nos últimos anos essa imagem de desalento fez com que aumentassem muito os recursos que vão para vocês, sem a exigência de alguma contrapartida da sua parte. Recentemente destinamos os royalties do pré-sal a vocês, e, em breve, quando o Plano Nacional de Educação que transita no Congresso for aprovado, seremos o único país do mundo, exceto Cuba, em que se gastam 10% do PIB em educação (aos filocubanos, saibam que o salário de um professor lá é de aproximadamente 28 dólares por mês. Isso mesmo, 28 dólares. Os 10% cubanos se devem à falta de PIB, não a um volume de investimento significativo).
Quando um custo é pequeno, ninguém se importa muito com o resultado. Quando as coisas vão bem, ninguém fica muito preocupado em cortar despesas. E, quando a área é de pouca importância, a pressão pelo desempenho é pequena. No passado recente, tudo isso era verdade sobre a educação brasileira. Éramos um país agrícola em um mundo industrial; a qualificação de nossa gente não era um elemento indispensável e o país crescia bem. Mas isso mudou. O tempo das vacas gordas já era, e a educação passou a ser prioridade inadiável na era do conhecimento. Nesse cenário, a chance de que se continue atirando dinheiro no sistema educacional sem haver nenhuma melhora, a longo prazo, é zero.
Vocês foram gananciosos demais. Os 10% do PIB e os royalties do pré-sal serão a danação de vocês. Porque, quando essa enxurrada de dinheiro começar a entrar e nossa educação continuar um desastre, até os pais de alunos de escola pública vão entender o que hoje só os estudiosos da área sabem: que não há relação entre valor investido em educação – entre eles o salário de professor – e o aprendizado dos alunos. Aí esses pais, e a mídia, vão finalmente querer entrar nas escolas para entender como é possível investirmos tanto e colhermos tão pouco. Vão descobrir que a escola brasileira é uma farsa, um depósito de crianças. Verão a quantidade abismal de professores que faltam ao trabalho, que não prescrevem nem corrigem dever de casa, que passam o tempo de aula lendo jornal ou em rede social ou, no melhor dos casos, enchendo o quadro-negro de conteúdo para aluno copiar, como se isso fosse aula. E então vocês serão cobrados. Muito cobrados. Mas, como terão passado décadas apenas pedindo mais, em vez de buscar qualificação, não conseguirão entregar.
Quando isso acontecer, não esperem a ajuda dos atuais defensores de vocês, como políticos de esquerda, dirigentes de ONGs da área e alguns "intelectuais". Sei que em declarações públicas esse pessoal faz juras de amor a vocês. Mas, quando as luzes se apagam e as câmeras param de filmar, eles dizem cobras e lagartos.
Existem muitas coisas que vocês precisarão fazer, na prática, para melhorar a qualidade do ensino, e sobre elas já discorri em alguns livros e artigos aqui. Antes delas, seria bom começarem a remover as barreiras mentais que geram um discurso ilógico e atravancam o progresso. Primeira: se vocês são vítimas que não têm culpa de nada, também não poderão ser os protagonistas que terão responsabilidade pelo sucesso. Se são objetos do processo quando ele dá errado, não poderão ser sujeitos quando ele começar a dar certo. Se vocês querem ser importantes na vitória, precisam assimilar o seu papel na derrota.
Segunda: vocês não podem menosprezar a ciência e os achados da literatura empírica sempre que, como na questão dos salários, eles forem contrários aos interesses de vocês. Ou vocês acreditam em ciência, ou não acreditam. E, se não acreditam – se o que vale é experiência pessoal ou achismo –, então vocês são absolutamente dispensáveis, e podemos escolher na rua qualquer pessoa dotada de bom-senso para cuidar da nossa educação. Vocês são os guardiães e retransmissores do conhecimento acumulado ao longo da história da humanidade. Menosprezar ou relativizar esse conhecimento é cavar a própria cova.
Terceira: parem de vedar a participação de terceiros no debate educacional. É inconsistente com o que vocês mesmos dizem: que o problema da educação brasileira é de falta de envolvimento da sociedade. Quando a sociedade quer participar, vocês precisam encorajá-la, não dizer que só quem vive a rotina de "cuspe e giz" é que pode opinar. Até porque, se cada área só puder ser discutida por quem a pratica, vocês terão de deixar a determinação de salários e investimentos nas mãos de economistas. Acho que não gostarão do resultado...
Quarta: abandonem essa obsessão por salários. Ela está impedindo que vocês vejam todos os outros problemas – seus e dos outros. O discurso sobre salários é inconsistente. Se o aumento de salário melhorar o desempenho, significa que ou vocês estavam desmotivados (o que não casa com o discurso de abnegados tirando leite de pedra) ou que é preciso atrair pessoas de outro perfil para a profissão (o que equivale a dizer que vocês são inúteis irrecuperáveis).
O respeito da sociedade não virá quando vocês tiverem um contracheque mais gordo. Virá se vocês começarem a notar suas próprias carências e lutarem para saná-las, dando ao país o que esperamos de vocês: educação de qualidade para nossos filhos.
Pão de queijo - XICO GRAZIANO
O Estado de S.Paulo - 13/05
Nascido em Minas Gerais, o pão de queijo virou unanimidade nacional. Por onde se anda, do Oiapoque ao Chuí, lá está o quitute mineiro esperando uma mordida. Ultrapassou as fronteiras: nos Estados Unidos, em Portugal, na Itália e até no Japão já se aprecia a delícia nas cafeterias. Culinária caipira vestida de chique.
É muito curiosa a história do pão de queijo. Naquela época, durante a mineração iniciada a partir de 1700, faltava comida para alimentar tanta gente atraída pelas jazidas descobertas próximo de Ouro Preto. Segundo Caio Prado Júnior (História Econômica do Brasil), do Nordeste para as Minas Gerais ocorreu um rush populacional de grandes proporções, relativamente mais acentuado e violento que o verificado na conquista do oeste norte-americano. Cerca de 1/5 dos brasileiros - a grande maioria escravos - ocupou, em poucos decênios, um imenso território, deslocando o eixo econômico da Colônia rumo ao Sudeste.
Por causa do afluxo dessa gente, o ciclo da mineração provocou um estímulo à produção de alimentos básicos. Do Nordeste e das regiões mais próximas se obtinham o feijão, o arroz, o milho e seu fubá, o porco e a banha, o leite e o queijo, a mandioca. Áreas mais longínquas, como o pampa gaúcho, passaram a oferecer carne de charque. Nesse ambiente surgiu o pão de queijo, inicialmente, dizem, oferecido pelas escravas aos senhores das fazendas. De onde veio essa ideia?
Ocorre que dificilmente se encontrava, naquelas paradas, a farinha de trigo, matéria-prima da panificação clássica. Típico das regiões temperadas, o milenar cereal nunca combinou com o calor do Nordeste brasileiro, e era então importado da Europa para aqui servir aos fidalgos do rei. Criativamente, as cozinheiras mineiras substituíram o inexistente trigo pelo polvilho, derivado da mandioca, tubérculo com origens tupiniquins. Acrescentaram na massa lascas de queijo curado, endurecido e ralado, e, levada ao forno, acabou por semelhança sendo chamada de "pão". História da alimentação.
Não se entende a nutrição humana fora do contexto histórico. O consumo de trigo no Brasil explodiu somente após a 2.ª Guerra Mundial. Grandes estoques se formaram e os Estados Unidos passaram a implementar, na órbita da recém-criada ONU, políticas internacionais consideradas de "ajuda humanitária", utilizando o cereal como ponta de lança contra a fome. Foi assim que as massas derivadas de trigo começaram a dominar a mesa das famílias mais carentes na América do Sul e na África, especialmente. A forte urbanização que ocorria naquele momento conspirou a favor desse processo de substituição de pratos tradicionais por gêneros alimentares de origem externa. Pesquisas mostravam, já nos anos 1980, a dominação do macarrão na alimentação popular em Manaus. Em plena Amazônia.
O enorme incentivo ao consumo de trigo fez explodir a importação do grão, onerando a balança comercial. Tal desequilíbrio se tornou o maior desafio, jamais vencido, da política agrícola no Brasil: a autossuficiência da produção nacional de trigo. Os preços de mercado nunca remuneraram o custo dos triticultores sulinos nem os pesados subsídios públicos - desgraçadamente desviados, como sempre - foram capazes de elevar a contento a oferta interna. Resultado: até hoje, mais da metade do trigo consumido no País vem do exterior, boa parte da Argentina.
Essa alteração, de certo modo artificial, no consumo alimentar do brasileiro se deu em detrimento da utilização dos produtos genuinamente tropicais, como a mandioca, cultivada desde os indígenas. Pero Vaz de Caminha foi quem primeiro escreveu sobre a fartura do alimento nativo, na famosa carta dirigida ao Rei D. Manuel: "Eles não comem senão deste inhame, de que aqui há muito, e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si deitam. E com isso andam tais rijos e tão nédios que não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos". Supimpa.
Colonização dá nisso. De fora lhe trazem costumes, ideologia, comida. Podem levar também, como ocorreu com a batata, cultivada originalmente pelos incas e introduzida na Europa, onde dominou a alimentação. Curiosa, também, é a história do milho, cereal nativo da América, mas igualmente desvalorizado com a introdução do trigo na panificação. Uma broa de milho, por exemplo. Quem já experimentou a guloseima recém-saída do forno, derretendo seu sabor com aquela sementinha de erva doce sobre a casca, certamente torce para que ela brilhe na mesma mesa contemporânea que afortunou o pão de queijo. Não será fácil.
Neste mundo onde os hábitos de consumo se modificam pela propaganda, geralmente enganosa, os produtos genuínos ficam espremidos dentro de suas modestas origens. O pão de queijo permaneceu muito tempo confinado ao cardápio da tradicional comida mineira, até ser descoberto pela comilança da globalização. Sua receita foi turbinada com os métodos e aditivos típicos da moderna fabricação tecnológica, o que lhe retirou aquele gostinho de fogão caipira, mas ele entrou na moda, sem restrição de idade nem renda. Tornou-se cosmopolita.
O sucesso recente do pão de queijo comprova a grande modificação da história da alimentação humana: o low food substituído pelo fast food. Nichos de culinária antiga sobrevivem, sim, fazendo contraponto à modernidade. A receita da vovó atrai as pessoas como se elas jamais se livrassem das reminiscências familiares. Mas o forno à lenha vale apenas no fim de semana. Na volta ao asfalto, na correria da labuta diária mandam as gororobas prontas, salgadas ou adocicadas, que tristemente empurram a humanidade para uma inusitada tragédia da saúde: a obesidade.
Mas essa é outra história.
Nascido em Minas Gerais, o pão de queijo virou unanimidade nacional. Por onde se anda, do Oiapoque ao Chuí, lá está o quitute mineiro esperando uma mordida. Ultrapassou as fronteiras: nos Estados Unidos, em Portugal, na Itália e até no Japão já se aprecia a delícia nas cafeterias. Culinária caipira vestida de chique.
É muito curiosa a história do pão de queijo. Naquela época, durante a mineração iniciada a partir de 1700, faltava comida para alimentar tanta gente atraída pelas jazidas descobertas próximo de Ouro Preto. Segundo Caio Prado Júnior (História Econômica do Brasil), do Nordeste para as Minas Gerais ocorreu um rush populacional de grandes proporções, relativamente mais acentuado e violento que o verificado na conquista do oeste norte-americano. Cerca de 1/5 dos brasileiros - a grande maioria escravos - ocupou, em poucos decênios, um imenso território, deslocando o eixo econômico da Colônia rumo ao Sudeste.
Por causa do afluxo dessa gente, o ciclo da mineração provocou um estímulo à produção de alimentos básicos. Do Nordeste e das regiões mais próximas se obtinham o feijão, o arroz, o milho e seu fubá, o porco e a banha, o leite e o queijo, a mandioca. Áreas mais longínquas, como o pampa gaúcho, passaram a oferecer carne de charque. Nesse ambiente surgiu o pão de queijo, inicialmente, dizem, oferecido pelas escravas aos senhores das fazendas. De onde veio essa ideia?
Ocorre que dificilmente se encontrava, naquelas paradas, a farinha de trigo, matéria-prima da panificação clássica. Típico das regiões temperadas, o milenar cereal nunca combinou com o calor do Nordeste brasileiro, e era então importado da Europa para aqui servir aos fidalgos do rei. Criativamente, as cozinheiras mineiras substituíram o inexistente trigo pelo polvilho, derivado da mandioca, tubérculo com origens tupiniquins. Acrescentaram na massa lascas de queijo curado, endurecido e ralado, e, levada ao forno, acabou por semelhança sendo chamada de "pão". História da alimentação.
Não se entende a nutrição humana fora do contexto histórico. O consumo de trigo no Brasil explodiu somente após a 2.ª Guerra Mundial. Grandes estoques se formaram e os Estados Unidos passaram a implementar, na órbita da recém-criada ONU, políticas internacionais consideradas de "ajuda humanitária", utilizando o cereal como ponta de lança contra a fome. Foi assim que as massas derivadas de trigo começaram a dominar a mesa das famílias mais carentes na América do Sul e na África, especialmente. A forte urbanização que ocorria naquele momento conspirou a favor desse processo de substituição de pratos tradicionais por gêneros alimentares de origem externa. Pesquisas mostravam, já nos anos 1980, a dominação do macarrão na alimentação popular em Manaus. Em plena Amazônia.
O enorme incentivo ao consumo de trigo fez explodir a importação do grão, onerando a balança comercial. Tal desequilíbrio se tornou o maior desafio, jamais vencido, da política agrícola no Brasil: a autossuficiência da produção nacional de trigo. Os preços de mercado nunca remuneraram o custo dos triticultores sulinos nem os pesados subsídios públicos - desgraçadamente desviados, como sempre - foram capazes de elevar a contento a oferta interna. Resultado: até hoje, mais da metade do trigo consumido no País vem do exterior, boa parte da Argentina.
Essa alteração, de certo modo artificial, no consumo alimentar do brasileiro se deu em detrimento da utilização dos produtos genuinamente tropicais, como a mandioca, cultivada desde os indígenas. Pero Vaz de Caminha foi quem primeiro escreveu sobre a fartura do alimento nativo, na famosa carta dirigida ao Rei D. Manuel: "Eles não comem senão deste inhame, de que aqui há muito, e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si deitam. E com isso andam tais rijos e tão nédios que não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos". Supimpa.
Colonização dá nisso. De fora lhe trazem costumes, ideologia, comida. Podem levar também, como ocorreu com a batata, cultivada originalmente pelos incas e introduzida na Europa, onde dominou a alimentação. Curiosa, também, é a história do milho, cereal nativo da América, mas igualmente desvalorizado com a introdução do trigo na panificação. Uma broa de milho, por exemplo. Quem já experimentou a guloseima recém-saída do forno, derretendo seu sabor com aquela sementinha de erva doce sobre a casca, certamente torce para que ela brilhe na mesma mesa contemporânea que afortunou o pão de queijo. Não será fácil.
Neste mundo onde os hábitos de consumo se modificam pela propaganda, geralmente enganosa, os produtos genuínos ficam espremidos dentro de suas modestas origens. O pão de queijo permaneceu muito tempo confinado ao cardápio da tradicional comida mineira, até ser descoberto pela comilança da globalização. Sua receita foi turbinada com os métodos e aditivos típicos da moderna fabricação tecnológica, o que lhe retirou aquele gostinho de fogão caipira, mas ele entrou na moda, sem restrição de idade nem renda. Tornou-se cosmopolita.
O sucesso recente do pão de queijo comprova a grande modificação da história da alimentação humana: o low food substituído pelo fast food. Nichos de culinária antiga sobrevivem, sim, fazendo contraponto à modernidade. A receita da vovó atrai as pessoas como se elas jamais se livrassem das reminiscências familiares. Mas o forno à lenha vale apenas no fim de semana. Na volta ao asfalto, na correria da labuta diária mandam as gororobas prontas, salgadas ou adocicadas, que tristemente empurram a humanidade para uma inusitada tragédia da saúde: a obesidade.
Mas essa é outra história.
Quem paga a conta - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 13/05
Está terminando da pior forma o caso envolvendo o BNDES e o frigorífico Independência. Aqui, neste espaço, essa operação desastrosa foi criticada desde o início, sem que o banco público a explicasse. Agora se sabe, pela reportagem de Mauro Zanatta, no “Estado de S.Paulo”, que o desfecho será o esperado: enorme prejuízo aos cofres públicos.
O banco perdeu a disputa que fez com o seu sócio, a família Russo, dono do Independência, e terá que ficar com o prejuízo de R$ 250 milhões. Além disso, terá que pagar as custas do processo movido na Câmara de Arbitragem do Mercado da BMF & Bovespa. O processo corre em sigilo. Deve um banco público, que usa dinheiro do contribuinte, usar tanto o subterfúgio do sigilo para não prestar contas à população?
Em dezembro de 2008, o BNDES comprou por R$ 250 milhões uma participação na empresa e se comprometeu a dar mais R$ 200 milhões. Três meses depois, o frigorífico quebrou. O governo agora explica que comprou porque o frigorífico era uma das estrelas do mercado. Ora, quem pode dar esse tipo de explicação é o pequeno investidor, mas não o banco que tem a maior carteira de ações do país. Ele deveria se informar bem antes de entrar na empresa. Quem quebra em fevereiro já estava falido em dezembro, evidentemente.
Em 2009, escrevi que o banco estava virando sócio e dando empréstimos a empresas com conhecidas dificuldades financeiras. Não fui a única. Vários analistas criticaram, em artigos e entrevistas, o projeto ao qual o BNDES se lançou, de campeões nacionais. Na época, ele elegeu três empresas que deveriam liderar o setor de carne. O Independência seria um desses líderes. O outro seria o JBS, no qual o banco despejou bilhões. O terceiro era o Marfrig, que ficou tempos na corda bamba. Frigoríficos menores não conseguiram empréstimos. Para os grandes, o dinheiro jorrava fácil. O Brasil já era, antes daquela política, o maior exportador de carne do mundo.
Quando o Independência quebrou, perguntei ao BNDES que explicação ele tinha para ter realizado o negócio. Ele respondeu que havia encaminhado o assunto para o Departamento Jurídico. A explicação era e continua sendo insuficiente.
Na outra ponta, a pequena empresa enfrenta realidade diferente. Um exemplo vem do empresário José Alfredo Machado, que pediu R$ 1,5 milhão ao BNDES para montar uma fábrica de biocombustível em Aracruz, no Espírito Santo, em 2003. O investimento total da empresa foi de R$ 4,5 milhões; quase 70% bancados pelos sócios.
As exigências foram rigorosas: obrigatoriedade de contratação de seguro, no próprio BNDES, de 7,2% do valor do empréstimo, o que elevou o financiamento em R$ 108 mil. Alienação fiduciária de todas as máquinas e do terreno onde a fábrica foi construída. O banco ficou com os bens em seu nome até que o empréstimo fosse pago. Os três sócios e suas esposas ainda foram obrigados a se tornar fiadores do acordo.
O BNDES exigiu a contratação de outro banco como agente repassador, que acabou sendo o Banco do Brasil. O BB pediu garantias de R$ 1,5 milhão, em aplicações financeiras, que ficariam bloqueadas até que a fábrica entrasse em operação.
— Para tomar R$ 1,5 milhão do BNDES, tivemos que dar R$1,5 milhão de garantia ao Banco do Brasil. O pior é que eles não cumpriram o combinado, de liberar nosso dinheiro assim que a fábrica começasse a funcionar, no início de 2004. À medida em que íamos quitando o empréstimo com o BNDES, o BB ia devolvendo e isso durou até o final de 2008. Na prática, não houve financiamento. Depositamos o dinheiro em uma conta e recebemos em outra. Ficamos sem capital de giro, e o BB, em vez de liberar a garantia integralmente, nos ofereceu outro empréstimo. Nunca mais pretendo pegar nada com eles, e ao mesmo tempo vejo grandes empresas tomando bilhões. Será que eles tiveram que passar pelas mesmas exigências? — questiona o empresário.
Na reportagem do “Estadão” sobre o frigorífico quebrado, fontes do governo só aceitaram falar se seus nomes não aparecessem. A explicação que eles dão para o negócio é que a decisão foi tomada com base em “informações precárias”. Como não pretendem divulgar o processo, fica-se sem saber quem foi o Nelson Cerveró do BNDES no caso do Independência.
Está terminando da pior forma o caso envolvendo o BNDES e o frigorífico Independência. Aqui, neste espaço, essa operação desastrosa foi criticada desde o início, sem que o banco público a explicasse. Agora se sabe, pela reportagem de Mauro Zanatta, no “Estado de S.Paulo”, que o desfecho será o esperado: enorme prejuízo aos cofres públicos.
O banco perdeu a disputa que fez com o seu sócio, a família Russo, dono do Independência, e terá que ficar com o prejuízo de R$ 250 milhões. Além disso, terá que pagar as custas do processo movido na Câmara de Arbitragem do Mercado da BMF & Bovespa. O processo corre em sigilo. Deve um banco público, que usa dinheiro do contribuinte, usar tanto o subterfúgio do sigilo para não prestar contas à população?
Em dezembro de 2008, o BNDES comprou por R$ 250 milhões uma participação na empresa e se comprometeu a dar mais R$ 200 milhões. Três meses depois, o frigorífico quebrou. O governo agora explica que comprou porque o frigorífico era uma das estrelas do mercado. Ora, quem pode dar esse tipo de explicação é o pequeno investidor, mas não o banco que tem a maior carteira de ações do país. Ele deveria se informar bem antes de entrar na empresa. Quem quebra em fevereiro já estava falido em dezembro, evidentemente.
Em 2009, escrevi que o banco estava virando sócio e dando empréstimos a empresas com conhecidas dificuldades financeiras. Não fui a única. Vários analistas criticaram, em artigos e entrevistas, o projeto ao qual o BNDES se lançou, de campeões nacionais. Na época, ele elegeu três empresas que deveriam liderar o setor de carne. O Independência seria um desses líderes. O outro seria o JBS, no qual o banco despejou bilhões. O terceiro era o Marfrig, que ficou tempos na corda bamba. Frigoríficos menores não conseguiram empréstimos. Para os grandes, o dinheiro jorrava fácil. O Brasil já era, antes daquela política, o maior exportador de carne do mundo.
Quando o Independência quebrou, perguntei ao BNDES que explicação ele tinha para ter realizado o negócio. Ele respondeu que havia encaminhado o assunto para o Departamento Jurídico. A explicação era e continua sendo insuficiente.
Na outra ponta, a pequena empresa enfrenta realidade diferente. Um exemplo vem do empresário José Alfredo Machado, que pediu R$ 1,5 milhão ao BNDES para montar uma fábrica de biocombustível em Aracruz, no Espírito Santo, em 2003. O investimento total da empresa foi de R$ 4,5 milhões; quase 70% bancados pelos sócios.
As exigências foram rigorosas: obrigatoriedade de contratação de seguro, no próprio BNDES, de 7,2% do valor do empréstimo, o que elevou o financiamento em R$ 108 mil. Alienação fiduciária de todas as máquinas e do terreno onde a fábrica foi construída. O banco ficou com os bens em seu nome até que o empréstimo fosse pago. Os três sócios e suas esposas ainda foram obrigados a se tornar fiadores do acordo.
O BNDES exigiu a contratação de outro banco como agente repassador, que acabou sendo o Banco do Brasil. O BB pediu garantias de R$ 1,5 milhão, em aplicações financeiras, que ficariam bloqueadas até que a fábrica entrasse em operação.
— Para tomar R$ 1,5 milhão do BNDES, tivemos que dar R$1,5 milhão de garantia ao Banco do Brasil. O pior é que eles não cumpriram o combinado, de liberar nosso dinheiro assim que a fábrica começasse a funcionar, no início de 2004. À medida em que íamos quitando o empréstimo com o BNDES, o BB ia devolvendo e isso durou até o final de 2008. Na prática, não houve financiamento. Depositamos o dinheiro em uma conta e recebemos em outra. Ficamos sem capital de giro, e o BB, em vez de liberar a garantia integralmente, nos ofereceu outro empréstimo. Nunca mais pretendo pegar nada com eles, e ao mesmo tempo vejo grandes empresas tomando bilhões. Será que eles tiveram que passar pelas mesmas exigências? — questiona o empresário.
Na reportagem do “Estadão” sobre o frigorífico quebrado, fontes do governo só aceitaram falar se seus nomes não aparecessem. A explicação que eles dão para o negócio é que a decisão foi tomada com base em “informações precárias”. Como não pretendem divulgar o processo, fica-se sem saber quem foi o Nelson Cerveró do BNDES no caso do Independência.
Solução única - MARCELO COUTINHO
FOLHA DE SP - 13/05
Se o Brasil já se desindustrializou, qual seria a razão para não estabelecermos um acordo com os Estados Unidos?
Nos anos 1990, a década americana do século americano, as exportações industriais brasileiras correspondiam a 55% do total do nosso comércio exterior. Hoje, com a ascensão chinesa, esse percentual caiu para 30% e continua a declinar, impedindo o Brasil de crescer.
Parte da responsabilidade disso ter ocorrido de maneira tão acelerada e profunda após a crise de 2008 é da estratégia comercial brasileira e da sua subordinação às decisões ideológicas do governo.
Mesmo com a hegemonia dos Estados Unidos e promovendo reformas estruturais na economia, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) quando presidente (1995-2002) manteve as negociações em torno da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) em banho-maria, preocupado com seus efeitos sobre a indústria nacional. Conseguiu preservar o Mercosul, que viveu naquele período o seu apogeu, servindo para atenuar as crises cíclicas do capitalismo.
Por sua vez, nos primeiros anos de seu governo, Lula (PT) chegou a propor a "Alca light", menos ambiciosa, mas que nunca saiu do papel. Com o nascente neobolivarianismo, foi enterrada em 2005 uma negociação que poderia ser muito útil agora para o Brasil enfrentar a desindustrialização causada não pelas empresas americanas, mas pela China e outros emergentes.
Se o Brasil já se desindustrializou, qual seria a razão para não estabelecermos com os Estados Unidos um acordo para fortalecer ambos os países de outra forma? A China liquidou o único obstáculo não ideológico a um acordo de livre-comércio entre as duas maiores economias das Américas. Resta superarmos as barreiras políticas para um ganho de mútuo interesse.
Dificilmente, poderíamos voltar ao padrão de comércio exterior equilibrado que prevaleceu entre 1978 a 2008. Na corrida da globalização comercial, jogávamos tanto no campo industrial quanto nos setores mais básicos da economia. Desde o final do governo Lula, houve um desequilíbrio estrutural contra a indústria quase impossível de ser revertido.
Na era FHC, a América Latina comprava cerca de 60% dos produtos industriais brasileiros e a América do Norte 30%. Ao priorizarmos os Brics, perdemos o comércio que mais valor agrega à economia. Não só o Brasil parou de crescer, como estabelecemos um teto mais baixo para o trabalhador: apenas dois salários mínimos é o que paga uma economia de serviços e commodities.
Quando se diz que o consumo está pressionando a inflação, não é por culpa do salário mínimo, mas porque produzimos cada vez menos e, contraditoriamente, continuamos uma economia fechada, protecionista. O resultado só pode ser o aumento dos preços. A saída dessa arapuca passa por uma abertura comercial inteligente, negociada com parceiros que também possam abrir seus mercados consumidores, instituindo de preferência uma integração das cadeias produtivas.
Reside justamente nas características do Estado brasileiro a explicação para os efeitos mais limitados da globalização sobre o nosso mercado. O peso do comércio internacional sobre o PIB brasileiro aumentou, porém bem menos do que a média mundial. Se isso por um lado nos deixa menos suscetíveis às crises globais, por outro não nos torna imune a elas e ainda prejudica o nosso aproveitamento de oportunidades em períodos de estabilidade.
Qualquer gesto chinês no sentido de atenuar a desindustrialização brasileira deve ser visto com ceticismo pelo simples motivo de que a potência asiática precisa da sua indústria para se desenvolver e dos alimentos brasileiros para dar o que comer a mais de 1 bilhão de pessoas.
Quis a ironia que um acordo comercial com os Estados Unidos seja talvez a única solução para preservar a pouca indústria exportadora que restou ao Brasil. Desta vez, o relógio corre contra nós. Quanto mais o tempo passar, menos indústria teremos com que negociar.
Se o Brasil já se desindustrializou, qual seria a razão para não estabelecermos um acordo com os Estados Unidos?
Nos anos 1990, a década americana do século americano, as exportações industriais brasileiras correspondiam a 55% do total do nosso comércio exterior. Hoje, com a ascensão chinesa, esse percentual caiu para 30% e continua a declinar, impedindo o Brasil de crescer.
Parte da responsabilidade disso ter ocorrido de maneira tão acelerada e profunda após a crise de 2008 é da estratégia comercial brasileira e da sua subordinação às decisões ideológicas do governo.
Mesmo com a hegemonia dos Estados Unidos e promovendo reformas estruturais na economia, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) quando presidente (1995-2002) manteve as negociações em torno da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) em banho-maria, preocupado com seus efeitos sobre a indústria nacional. Conseguiu preservar o Mercosul, que viveu naquele período o seu apogeu, servindo para atenuar as crises cíclicas do capitalismo.
Por sua vez, nos primeiros anos de seu governo, Lula (PT) chegou a propor a "Alca light", menos ambiciosa, mas que nunca saiu do papel. Com o nascente neobolivarianismo, foi enterrada em 2005 uma negociação que poderia ser muito útil agora para o Brasil enfrentar a desindustrialização causada não pelas empresas americanas, mas pela China e outros emergentes.
Se o Brasil já se desindustrializou, qual seria a razão para não estabelecermos com os Estados Unidos um acordo para fortalecer ambos os países de outra forma? A China liquidou o único obstáculo não ideológico a um acordo de livre-comércio entre as duas maiores economias das Américas. Resta superarmos as barreiras políticas para um ganho de mútuo interesse.
Dificilmente, poderíamos voltar ao padrão de comércio exterior equilibrado que prevaleceu entre 1978 a 2008. Na corrida da globalização comercial, jogávamos tanto no campo industrial quanto nos setores mais básicos da economia. Desde o final do governo Lula, houve um desequilíbrio estrutural contra a indústria quase impossível de ser revertido.
Na era FHC, a América Latina comprava cerca de 60% dos produtos industriais brasileiros e a América do Norte 30%. Ao priorizarmos os Brics, perdemos o comércio que mais valor agrega à economia. Não só o Brasil parou de crescer, como estabelecemos um teto mais baixo para o trabalhador: apenas dois salários mínimos é o que paga uma economia de serviços e commodities.
Quando se diz que o consumo está pressionando a inflação, não é por culpa do salário mínimo, mas porque produzimos cada vez menos e, contraditoriamente, continuamos uma economia fechada, protecionista. O resultado só pode ser o aumento dos preços. A saída dessa arapuca passa por uma abertura comercial inteligente, negociada com parceiros que também possam abrir seus mercados consumidores, instituindo de preferência uma integração das cadeias produtivas.
Reside justamente nas características do Estado brasileiro a explicação para os efeitos mais limitados da globalização sobre o nosso mercado. O peso do comércio internacional sobre o PIB brasileiro aumentou, porém bem menos do que a média mundial. Se isso por um lado nos deixa menos suscetíveis às crises globais, por outro não nos torna imune a elas e ainda prejudica o nosso aproveitamento de oportunidades em períodos de estabilidade.
Qualquer gesto chinês no sentido de atenuar a desindustrialização brasileira deve ser visto com ceticismo pelo simples motivo de que a potência asiática precisa da sua indústria para se desenvolver e dos alimentos brasileiros para dar o que comer a mais de 1 bilhão de pessoas.
Quis a ironia que um acordo comercial com os Estados Unidos seja talvez a única solução para preservar a pouca indústria exportadora que restou ao Brasil. Desta vez, o relógio corre contra nós. Quanto mais o tempo passar, menos indústria teremos com que negociar.
As empresas não votam, mas elegem - GIL CASTELLO BRANCO
O GLOBO - 13/05
Segundo o Instituto Kellogg, para cada real aplicado nas campanhas, as doadoras obtêm R$ 8,50 em contratos públicos
A democracia não tem preço, mas as eleições brasileiras estão cada vez mais caras. O ciclo eleitoral completo para presidente, governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores movimentou, nos últimos quatro anos, cerca de R$ 9,5 bilhões. A soma inclui as doações, o Fundo Partidário e a isenção fiscal às emissoras para a transmissão do horário eleitoral gratuito. As verbas oficiais não incluem a dinheirama que circula em malas, meias e cuecas. A título de comparação, somente o caixa 1 supera os R$ 8,1 bilhões previstos para as 45 obras de mobilidade urbana da Copa 2014.
Nos bilhões das últimas eleições municipais existem várias curiosidades. Entre elas, quais seriam os motivos que levaram um empresário a doar, como pessoa física, quase R$ 3 milhões a partidos políticos adversários, sendo R$ 1,9 milhão para o Diretório Nacional do PT e R$ 1 milhão para o Diretório Estadual do PSDB? Como explicar que 4.443 candidatos tenham feito autodoações superiores a 50% dos bens que declararam à Receita Federal?
Quanto às doações de pessoas jurídicas, a maioria dos ministros do STF já decidiu proibi-las, mas o julgamento ainda não foi concluído. Assim, em 2014, os empresários continuarão a dar as cartas. Até mesmo nos anos sem eleições, as empresas bancam generosamente alguns partidos, notadamente os governistas e aqueles com perspectivas de poder, chegando ao ponto de quase 100% das doações serem empresariais. Em 2013, por exemplo, o PT recebeu o total de R$ 79,8 milhões e o PSDB, R$ 20,4 milhões. Curiosamente, o PSB, do candidato Eduardo Campos, amealhou R$ 8,3 milhões, quantia surpreendente para uma agremiação com arrecadação zero em 2009 e 2011. Em resumo, de 2011 a 2013, o PT arrecadou quatro vezes mais do que o PSDB e quase 12 vezes mais do que o PSB. É uma união promíscua entre o capital e o trabalho.
As doações atendem ao princípio franciscano do “é dando que se recebe”. Conforme estudo do Instituto Kellogg, para cada real aplicado nas campanhas eleitorais, as empresas obtêm R$ 8,50 em contratos públicos. Além do excepcional retorno financeiro, os empresários colocam azeitonas nas próprias empadas, haja vista que dos 594 parlamentares, 273 são empresários (46%) e 160 compõem a bancada ruralista (27%), conforme dados do Departamento Intersindical de Assistência Parlamentar (Diap).
A cada eleição os custos sobem exponencialmente. Para eleger-se em 2010, cada deputado federal gastou, em média, R$ 1,1 milhão; os senadores, R$ 4,5 milhões; os governadores, R$ 23,1 milhões. Assim, mal tomam posse e os políticos já estão preocupados com verbas para a renovação do mandato. Parodiando Fernando Pessoa às avessas, tudo vale a pena se a doação não for pequena. Como consequência, de cada dez inquéritos sobre corrupção na Polícia Federal, seis envolvem questões eleitorais.
Diante desses fatos, o veto às doações das pessoas jurídicas resolverá apenas parte do problema. Sem o caixa empresarial, será imprescindível a fixação de limites que reduzam os custos das campanhas eleitorais, tal como previsto em lei desde 1965. A definição de um teto nacional e de tetos regionais — compatíveis com os PIBs estaduais e municipais — irá atenuar os efeitos do poder econômico. Tetos iguais para cargos e regiões, associados à transparência plena quanto às receitas e despesas, irão desidratar o caixa 2, pois os próprios candidatos estarão de olho nos adversários.
A retração dos recursos empresariais também poderá ser compensada com o melhor uso do Fundo Partidário e das isenções fiscais. Exemplo de desperdício são as propagandas políticas, repetidas seguidas vezes em horário nobre. Que dirá o pagamento de advogados com o Fundo para defesa de condenados dos partidos.
Enfim, a próxima eleição ainda não será a que desejamos. De positivo, a resolução do TSE que elimina as “doações ocultas” ao exigir nas prestações de contas os CPFs e os CNPJs dos doadores originais. No próximo governo, porém, quaisquer que sejam os eleitos, temas como os sistemas eleitorais, formas de financiamento, voto facultativo, reeleição, candidaturas avulsas, entre outros, precisam ser enfrentados, ainda que não exista consenso.
No momento em que 76,3% dos brasileiros não confiam no Congresso (segundo o Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo), só uma ampla reforma político-eleitoral renovará a relação dos cidadãos com seus representantes. Essa reconciliação, se houver, irá ampliar o financiamento privado individual e a participação dos brasileiros na vida política nacional. Dinheiro à parte, os eleitores somos nós.
Segundo o Instituto Kellogg, para cada real aplicado nas campanhas, as doadoras obtêm R$ 8,50 em contratos públicos
A democracia não tem preço, mas as eleições brasileiras estão cada vez mais caras. O ciclo eleitoral completo para presidente, governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores movimentou, nos últimos quatro anos, cerca de R$ 9,5 bilhões. A soma inclui as doações, o Fundo Partidário e a isenção fiscal às emissoras para a transmissão do horário eleitoral gratuito. As verbas oficiais não incluem a dinheirama que circula em malas, meias e cuecas. A título de comparação, somente o caixa 1 supera os R$ 8,1 bilhões previstos para as 45 obras de mobilidade urbana da Copa 2014.
Nos bilhões das últimas eleições municipais existem várias curiosidades. Entre elas, quais seriam os motivos que levaram um empresário a doar, como pessoa física, quase R$ 3 milhões a partidos políticos adversários, sendo R$ 1,9 milhão para o Diretório Nacional do PT e R$ 1 milhão para o Diretório Estadual do PSDB? Como explicar que 4.443 candidatos tenham feito autodoações superiores a 50% dos bens que declararam à Receita Federal?
Quanto às doações de pessoas jurídicas, a maioria dos ministros do STF já decidiu proibi-las, mas o julgamento ainda não foi concluído. Assim, em 2014, os empresários continuarão a dar as cartas. Até mesmo nos anos sem eleições, as empresas bancam generosamente alguns partidos, notadamente os governistas e aqueles com perspectivas de poder, chegando ao ponto de quase 100% das doações serem empresariais. Em 2013, por exemplo, o PT recebeu o total de R$ 79,8 milhões e o PSDB, R$ 20,4 milhões. Curiosamente, o PSB, do candidato Eduardo Campos, amealhou R$ 8,3 milhões, quantia surpreendente para uma agremiação com arrecadação zero em 2009 e 2011. Em resumo, de 2011 a 2013, o PT arrecadou quatro vezes mais do que o PSDB e quase 12 vezes mais do que o PSB. É uma união promíscua entre o capital e o trabalho.
As doações atendem ao princípio franciscano do “é dando que se recebe”. Conforme estudo do Instituto Kellogg, para cada real aplicado nas campanhas eleitorais, as empresas obtêm R$ 8,50 em contratos públicos. Além do excepcional retorno financeiro, os empresários colocam azeitonas nas próprias empadas, haja vista que dos 594 parlamentares, 273 são empresários (46%) e 160 compõem a bancada ruralista (27%), conforme dados do Departamento Intersindical de Assistência Parlamentar (Diap).
A cada eleição os custos sobem exponencialmente. Para eleger-se em 2010, cada deputado federal gastou, em média, R$ 1,1 milhão; os senadores, R$ 4,5 milhões; os governadores, R$ 23,1 milhões. Assim, mal tomam posse e os políticos já estão preocupados com verbas para a renovação do mandato. Parodiando Fernando Pessoa às avessas, tudo vale a pena se a doação não for pequena. Como consequência, de cada dez inquéritos sobre corrupção na Polícia Federal, seis envolvem questões eleitorais.
Diante desses fatos, o veto às doações das pessoas jurídicas resolverá apenas parte do problema. Sem o caixa empresarial, será imprescindível a fixação de limites que reduzam os custos das campanhas eleitorais, tal como previsto em lei desde 1965. A definição de um teto nacional e de tetos regionais — compatíveis com os PIBs estaduais e municipais — irá atenuar os efeitos do poder econômico. Tetos iguais para cargos e regiões, associados à transparência plena quanto às receitas e despesas, irão desidratar o caixa 2, pois os próprios candidatos estarão de olho nos adversários.
A retração dos recursos empresariais também poderá ser compensada com o melhor uso do Fundo Partidário e das isenções fiscais. Exemplo de desperdício são as propagandas políticas, repetidas seguidas vezes em horário nobre. Que dirá o pagamento de advogados com o Fundo para defesa de condenados dos partidos.
Enfim, a próxima eleição ainda não será a que desejamos. De positivo, a resolução do TSE que elimina as “doações ocultas” ao exigir nas prestações de contas os CPFs e os CNPJs dos doadores originais. No próximo governo, porém, quaisquer que sejam os eleitos, temas como os sistemas eleitorais, formas de financiamento, voto facultativo, reeleição, candidaturas avulsas, entre outros, precisam ser enfrentados, ainda que não exista consenso.
No momento em que 76,3% dos brasileiros não confiam no Congresso (segundo o Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo), só uma ampla reforma político-eleitoral renovará a relação dos cidadãos com seus representantes. Essa reconciliação, se houver, irá ampliar o financiamento privado individual e a participação dos brasileiros na vida política nacional. Dinheiro à parte, os eleitores somos nós.
Reserva de mercado - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 13/05
Sempre tão atentos e reverentes a pesquisas de opinião, os partidos e os políticos têm uma impressionante capacidade de se manter alheios aos crescentes índices de rejeição à obrigatoriedade do voto, exigência com a qual o Brasil se alinha a uma minoria de países, inclusive na América do Sul.
Por que voltar ao assunto agora? Para juntar dois fatos: uma pesquisa do instituto Datafolha publicada neste domingo e a recorrente proposta de reforma política feita diante de toda e qualquer crise. Mesmo daquelas atinentes à ausência de compostura das pessoas, mal que as regras por si só não dão conta de corrigir.
A consulta mostra que 61% dos pesquisados são contrários ao voto obrigatório, enquanto 38% são a favor. Há dois anos, havia um empate: 48% eram contra e 48% favoráveis.
Em 2008, 53% apoiavam a obrigatoriedade e 43% preferiam que o voto fosse facultativo. A tendência se inverteu de maneira acentuada e, ainda assim, o tema é solenemente ignorado nos debates sobre reforma política.
Há propostas no Congresso para instituir o facultativo, mas tirando seus autores e uns poucos defensores, são solenemente ignoradas pela ampla maioria de partidos de todas as correntes. O argumento mais comum é o de que o voto obrigatório é uma garantia democrática.
Não resiste à confrontação com a realidade vigente na maioria das nações democráticas. Pela trajetória descendente da satisfação do brasileiro em ter seu direito de votar transformado em imposição do Estado, trata-se de uma assertiva na contramão dos anseios do eleitorado.
Para contraditar há uma teoria corrente não só entre políticos, mas também entre acadêmicos, juristas e curiosos em geral, segundo a qual nesse assunto o público não sabe o que diz.
Engraçado, tomam-se como verdadeiros todos os demais itens da lista escolhida por especialistas para integrar a reforma política, mas quando se trata de considerar a opinião do eleitor a respeito de seu ato individual e sagrado, não vale.
As justificativas são várias, mas a mais cínica reza que o povo brasileiro ainda não teria atingido o estágio de educação e consciência suficiente para conquistar o direito ao exercício do discernimento. Isso é dito assim como se fosse uma argumentação robusta e bastante lógica. Lamentavelmente, seus autores não informam de que maneira seria medido esse momento glorioso nem indicam a que tribunal seria submetido o eleitorado para o julgamento sobre o alcance e o preparo para a conquista da independência.
A solução por ora encontrada é fingir que a questão não existe, não tem relevância ou que guarda relação com uma insatisfação (temporária?) generalizada com a política e as instituições - talvez a ser resolvida com a reforma política.
A descrença de fato pode ser um dos motivos. Mas a desatenção, o menosprezo a algo que aparece na pesquisa como causa de desconforto é parte da descrença, pois não?
Quem sabe o eleitorado esteja, ao contrário do que pensam os sabidos, cada vez mais consciente. Convicto de que o voto é um direito e que tem sido imposto como obrigação sem que os eleitos se vejam obrigados a corresponder minimamente às expectativas dos representados.
A prova de que não ouvem é que simplesmente ignoram um tema tão diretamente relacionado à vontade do eleitor como a forma do voto.
A chance de que os candidatos à Presidência tratem do assunto é nula, porque o problema não é de consciência nem de educação, muito menos de defesa da democracia: é medo de perder a garantia da reserva de mercado. Nisso não falam, mas há consenso tácito.
Crescerá substancialmente a abstenção? Sem dúvida, uma vez facultado o direito de não votar, os candidatos, os representantes, os governantes terão de mudar radicalmente o comportamento para motivar o cidadão brasileiro ir às urnas com vontade de acertar.
Essa é a obra necessária e à qual ninguém se dispõe a dar as mãos.
Sempre tão atentos e reverentes a pesquisas de opinião, os partidos e os políticos têm uma impressionante capacidade de se manter alheios aos crescentes índices de rejeição à obrigatoriedade do voto, exigência com a qual o Brasil se alinha a uma minoria de países, inclusive na América do Sul.
Por que voltar ao assunto agora? Para juntar dois fatos: uma pesquisa do instituto Datafolha publicada neste domingo e a recorrente proposta de reforma política feita diante de toda e qualquer crise. Mesmo daquelas atinentes à ausência de compostura das pessoas, mal que as regras por si só não dão conta de corrigir.
A consulta mostra que 61% dos pesquisados são contrários ao voto obrigatório, enquanto 38% são a favor. Há dois anos, havia um empate: 48% eram contra e 48% favoráveis.
Em 2008, 53% apoiavam a obrigatoriedade e 43% preferiam que o voto fosse facultativo. A tendência se inverteu de maneira acentuada e, ainda assim, o tema é solenemente ignorado nos debates sobre reforma política.
Há propostas no Congresso para instituir o facultativo, mas tirando seus autores e uns poucos defensores, são solenemente ignoradas pela ampla maioria de partidos de todas as correntes. O argumento mais comum é o de que o voto obrigatório é uma garantia democrática.
Não resiste à confrontação com a realidade vigente na maioria das nações democráticas. Pela trajetória descendente da satisfação do brasileiro em ter seu direito de votar transformado em imposição do Estado, trata-se de uma assertiva na contramão dos anseios do eleitorado.
Para contraditar há uma teoria corrente não só entre políticos, mas também entre acadêmicos, juristas e curiosos em geral, segundo a qual nesse assunto o público não sabe o que diz.
Engraçado, tomam-se como verdadeiros todos os demais itens da lista escolhida por especialistas para integrar a reforma política, mas quando se trata de considerar a opinião do eleitor a respeito de seu ato individual e sagrado, não vale.
As justificativas são várias, mas a mais cínica reza que o povo brasileiro ainda não teria atingido o estágio de educação e consciência suficiente para conquistar o direito ao exercício do discernimento. Isso é dito assim como se fosse uma argumentação robusta e bastante lógica. Lamentavelmente, seus autores não informam de que maneira seria medido esse momento glorioso nem indicam a que tribunal seria submetido o eleitorado para o julgamento sobre o alcance e o preparo para a conquista da independência.
A solução por ora encontrada é fingir que a questão não existe, não tem relevância ou que guarda relação com uma insatisfação (temporária?) generalizada com a política e as instituições - talvez a ser resolvida com a reforma política.
A descrença de fato pode ser um dos motivos. Mas a desatenção, o menosprezo a algo que aparece na pesquisa como causa de desconforto é parte da descrença, pois não?
Quem sabe o eleitorado esteja, ao contrário do que pensam os sabidos, cada vez mais consciente. Convicto de que o voto é um direito e que tem sido imposto como obrigação sem que os eleitos se vejam obrigados a corresponder minimamente às expectativas dos representados.
A prova de que não ouvem é que simplesmente ignoram um tema tão diretamente relacionado à vontade do eleitor como a forma do voto.
A chance de que os candidatos à Presidência tratem do assunto é nula, porque o problema não é de consciência nem de educação, muito menos de defesa da democracia: é medo de perder a garantia da reserva de mercado. Nisso não falam, mas há consenso tácito.
Crescerá substancialmente a abstenção? Sem dúvida, uma vez facultado o direito de não votar, os candidatos, os representantes, os governantes terão de mudar radicalmente o comportamento para motivar o cidadão brasileiro ir às urnas com vontade de acertar.
Essa é a obra necessária e à qual ninguém se dispõe a dar as mãos.
Um estuário de mágoas - JOSÉ CASADO
O GLOBO - 13/05
Em documento, cúpula do PT desqualifica adversários e anuncia guerra total a quem ameaçar ‘a conquista de hegemonia em torno do nosso projeto de sociedade’
São 2.200 palavras espalhadas por dez páginas com as “diretrizes” do programa de governo, da tática de campanha e da política de alianças do Partido dos Trabalhadores para a disputa em outubro. Foram proclamadas na semana passada por 800 dirigentes do partido, sob a batuta de Lula, na sagração da candidatura de Dilma Rousseff à reeleição.
O conteúdo surpreende: revela que o maior partido político brasileiro, a cinco meses da eleição e com sua candidata liderando todas as pesquisas, planeja uma campanha eleitoral raivosa sobre os adversários, na defensiva diante da “complexidade da conjuntura” e dos “reflexos da crise mundial”.
O documento, disponível na rede do PT, é cinco vezes mais extenso que o da campanha de 2010. Indica uma drástica mudança no humor petista depois de 12 anos no poder.
Dissiparam-se o tom de leveza e o autojúbilo com a certeza de que se mudavam “substancialmente o Brasil e a vida dos brasileiros”.
Agora, a “resolução” do PT é pela guerra total a quem ameaçar a “conquista de hegemonia em torno do nosso projeto de sociedade”.
Os dirigentes creem ter uma missão salvacionista: “Superar a herança maldita, cujas fontes são a ditadura militar, o desenvolvimentismo conservador e a devastação neoliberal.”
Assim, veem como “tarefa” o “aprofundamento da soberania nacional, a aceleração e radicalização da integração latino-americana e caribenha, e uma política externa que confronte os interesses dos Estados Unidos e seus aliados”.
Em síndrome persecutória, enxergam “um pesado ataque ao nosso projeto, ao nosso governo e ao PT, por parte de setores da elite conservadora e da mídia oligopolista, que funciona como verdadeiro partido de oposição”. O “principal exemplo”, afirmam, foi o “julgamento de exceção” do mensalão no STF.
Supõem ser essencial desqualificar os adversários: “Representam um projeto oposto ao nosso, muito embora um deles se esforce em transmutar-se em uma suposta terceira via. Guardadas as diferenças secundárias e temporais, arregimentam os interesses privatistas, rentistas, entreguistas, sob o guarda-chuva ideológico do neoliberalismo e de valores retrógrados do machismo, racismo e homofobia, daqueles que pretendem voltar ao passado neoliberal, excludente e conservador.”
Interpretam a ansiedade por mudanças (expressa por 74% dos eleitores, no Datafolha) como atestado da própria onisciência, pois “todas estão contidas em nosso programa, como é o caso exemplar da reforma política, a democratização da comunicação, a reforma agrária, a reforma urbana e a reforma tributária”.
Acham que o epicentro está na “luta pela reforma política”. Porque “nosso grande objetivo é democratizar o Estado, inverter prioridades e estabelecer uma contra-hegemonia ao capitalismo, construir um socialismo radicalmente democrático para o Brasil”.
Essas “diretrizes” esvanecem a possibilidade de sedução do eleitor pela oferta objetiva de um futuro de progresso pessoal e coletivo. Elas pressupõem que a militância petista vá às ruas intimar o eleitorado a votar em Dilma por solidariedade à cúpula, que parece se afogar num estuário de mágoas. Seria um exercício eleitoral inovador sobre a arte de viver da fé. Só não se sabe fé em quê.
De bruxas e monstros - ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SP - 13/05
BRASÍLIA - O que têm em comum quem põe na internet o desenho falado de uma "bruxa" e quem usa as redes sociais para chamar o presidente do STF de "monstro"?
Um brinca com coisa séria. O outro é um militante que --seria só por "amor à causa"?-- aderiu ao vale-tudo. E ambos são igualmente covardes que se escondem no anonimato para caluniar, mentir, incitar. E, por isso, são de alta periculosidade.
A "brincadeira da bruxa" excitou a ignorância e a loucura de uma comunidade que passará décadas tentando entender como cidadãos até então normais puxaram pelos cabelos uma moça inocente e indefesa, jogaram-na no chão, amarraram-lhe as mãos e a mataram a pauladas. Ela morreu sem entender sequer por quê.
E o risco da incitação contra o "monstro"? Com o país fervendo com linchamentos, assaltos, balas perdidas e protestos por toda parte, tudo pode acontecer. A diferença é que o ministro Joaquim Barbosa sabe exatamente que tipo de gente está por trás e por que está sendo perseguido.
Segundo a revista "Veja", a PF anda atrás de quem posta coisas assim: "Joaquim Barbosa deve ser morto. Ponto final". E até já localizou o autor de um texto meigo que chama o ministro de "desgraçado", que "vai morrer de câncer ou um tiro na cabeça". É um ativo integrante da Comissão de Ética (?!) do PT no Rio Grande do Norte. Haja ética!
É estarrecedor, mas não surpresa. Basta buscar na mesma "Veja" uma informação de fevereiro de 2013: um assessor do ministro Gilberto Carvalho --frise-se: do Planalto-- viajou a Cuba, com tudo pago pelo governo brasileiro, para fazer um curso sobre técnicas de... "ciberguerra"! Decifrando, "novas formas de comunicação de rede e batalhas políticas".
Não que seja uma exclusividade petista, ao contrário, mas esse tipo de gente usa os fantásticos recursos da internet para agredir, deturpar, transformar mentiras em verdades e criar bruxas e monstros. Um legado e tanto para as novas gerações.
BRASÍLIA - O que têm em comum quem põe na internet o desenho falado de uma "bruxa" e quem usa as redes sociais para chamar o presidente do STF de "monstro"?
Um brinca com coisa séria. O outro é um militante que --seria só por "amor à causa"?-- aderiu ao vale-tudo. E ambos são igualmente covardes que se escondem no anonimato para caluniar, mentir, incitar. E, por isso, são de alta periculosidade.
A "brincadeira da bruxa" excitou a ignorância e a loucura de uma comunidade que passará décadas tentando entender como cidadãos até então normais puxaram pelos cabelos uma moça inocente e indefesa, jogaram-na no chão, amarraram-lhe as mãos e a mataram a pauladas. Ela morreu sem entender sequer por quê.
E o risco da incitação contra o "monstro"? Com o país fervendo com linchamentos, assaltos, balas perdidas e protestos por toda parte, tudo pode acontecer. A diferença é que o ministro Joaquim Barbosa sabe exatamente que tipo de gente está por trás e por que está sendo perseguido.
Segundo a revista "Veja", a PF anda atrás de quem posta coisas assim: "Joaquim Barbosa deve ser morto. Ponto final". E até já localizou o autor de um texto meigo que chama o ministro de "desgraçado", que "vai morrer de câncer ou um tiro na cabeça". É um ativo integrante da Comissão de Ética (?!) do PT no Rio Grande do Norte. Haja ética!
É estarrecedor, mas não surpresa. Basta buscar na mesma "Veja" uma informação de fevereiro de 2013: um assessor do ministro Gilberto Carvalho --frise-se: do Planalto-- viajou a Cuba, com tudo pago pelo governo brasileiro, para fazer um curso sobre técnicas de... "ciberguerra"! Decifrando, "novas formas de comunicação de rede e batalhas políticas".
Não que seja uma exclusividade petista, ao contrário, mas esse tipo de gente usa os fantásticos recursos da internet para agredir, deturpar, transformar mentiras em verdades e criar bruxas e monstros. Um legado e tanto para as novas gerações.
Brasil-Ucrânia, comédia de erros - RUBENS BARBOSA
O Estado de S.Paulo - 13/05
Em razão dos possíveis desdobramentos nos campos militar, político e econômico, a crise na Ucrânia tem gerado forte preocupação. Ao confrontar a Rússia, EUA e Europa ressuscitam considerações geopolíticas que gostariam de deixar para trás. Consumada a incorporação da Crimeia ao território russo, o mundo espera o desfecho das disputas pelos territórios do leste da Ucrânia, na fronteira com a Rússia, onde se concentra a maioria da população de origem e de língua russas.
Quais os interesses do Brasil na relação com a Ucrânia? Poucos talvez possam identificar assuntos em comum com país tão distante.
O Brasil no governo Lula se associou à Ucrânia para a cessão de espaço para lançamento de satélites comerciais do Centro de Lançamento de Satélites em Alcântara. Para isso, foi criada a empresa mista Alcântara Cyclone Space (ACS), formada em partes iguais, que já consumiu US$ 918 milhões do lado brasileiro, tendo sido metade aportada em meados de 2013, sob a forma de aumento de capital, sem nenhum resultado concreto até aqui. A ideia era aproveitar o programa ucraniano para, se tudo desse certo, desenvolver uma indústria voltada para lançamentos no Brasil. Toda essa negociação com a Ucrânia está cercada de circunstâncias que mostram a maneira descoordenada como muitos projetos de grande relevância estratégica foram tratados nos últimos anos.
O programa espacial brasileiro de desenvolvimento de Veículos Lançadores de Satélites (VLS) e de aproveitamento comercial da Base de Alcântara colocaria o Brasil no mercado global, dominado em mais de 85% por lançamentos de satélites de comunicação de empresas norte-americanas. Para viabilizar a entrada do Brasil nesse mercado, o governo FHC negociou acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA. Por questões ideológicas, o PT na oposição e, depois, no governo ficou contra o acordo que, paralisado no Congresso, foi abandonado. O governo Lula, no entanto, para viabilizar a cooperação com a Ucrânia, teve de assinar um acordo de salvaguardas tecnológicas com o governo de Kiev. O acordo com a Ucrânia, traduzido quase literalmente do firmado com os EUA, foi rapidamente aprovado pelo Congresso com o apoio entusiasmado do PT. Chegou-se mesmo a discutir um segundo acordo, que atenuasse cláusulas draconianas que restringiam o acesso das autoridades brasileiras aos equipamentos ucranianos e ampliasse a cooperação para o desenvolvimento conjunto de um novo VLS (Cyclone V).
Soube, no ano passado, que a Ucrânia havia feito gestões junto do governo de Washington para que o acordo de salvaguarda tecnológica com o Brasil fosse retomado, porque o foguete ucraniano incorpora peças e componentes americanos. Assim, o VLS Cyclone só poderia ser lançado de Alcântara se o acordo Brasil-EUA estivesse em vigor.
Essa comédia de erros está atrasando por mais de 15 anos o programa brasileiro de utilização comercial da Base de Alcântara. Será que as autoridades brasileiras não sabiam que o acordo com os EUA era indispensável para levar adiante o projeto com a Ucrânia?
O quiproquó não termina aí. A empresa que teoricamente produziria o foguete lançador dos satélites comerciais de Alcântara está localizada na área industrial da Ucrânia, exatamente no território agora conflagrado pela presença de população russa, transferida para a região para operar o complexo industrial militar que Moscou havia criado naquele país, então parte da URSS. O que acontecerá se esse território for incorporado à Rússia?
Além disso, a Ucrânia, sem condições de fazer os aportes financeiros necessários, pela precária situação de sua economia, contribuiu para reduzir o projeto a um sonho de uma noite de verão. A negociação com a Ucrânia teve clara motivação ideológica para evitar a dependência dos EUA. A maneira desastrada como todo o processo foi operado é mais um exemplo de um equívoco cometido por considerações político-partidárias. Os investimentos feitos pelo governo brasileiro não serão recuperados e o caos doméstico ucraniano inviabiliza qualquer esforço para a retomada do projeto.
O acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA, depois da visita do presidente Barack Obama ao Brasil em 2011, estava sofrendo modificações para ser apresentado às autoridades norte-americanas. A negociação do acordo, contudo, está paralisada, como tudo o que é realmente importante na relação com os EUA. A decisão da presidente Dilma Rousseff de só normalizar as relações bilaterais depois de um eventual pedido de desculpas de Obama pelo monitoramento indevido da Agência Nacional de Segurança (NSA) dificulta o desenlace da crise entre os dois países. Como o pedido dificilmente será atendido, este e outros temas de interesse brasileiro dormem nos escaninhos da burocracia itamaratiana.
Críticos cobram um posicionamento da política externa, outrora tão ativa e altiva, em relação aos graves acontecimentos que culminaram com a anexação da Crimeia à Rússia e com os distúrbios em diversas cidades ucranianas.
A paralisia da diplomacia brasileira pode ser explicada por um conjunto de fatores: o Brasil ser membro do Brics, hoje um bloco institucionalizado, com reuniões presidenciais (a próxima ocorrerá em Fortaleza, em julho) e ministeriais todos os anos; pela dificuldade de lidar com o imbróglio em que nos metemos com o acordo de cooperação no Centro de Lançamento de Alcântara; e pela deliberada política do governo Dilma de encolhimento da política externa e da não participação do Brasil na cena internacional.
Fica cada vez mais evidente a necessidade de uma nova política externa que restaure a influência do Itamaraty, para evitar situações como a da Ucrânia, e restabeleça a voz e a presença do Brasil no exterior.
Em razão dos possíveis desdobramentos nos campos militar, político e econômico, a crise na Ucrânia tem gerado forte preocupação. Ao confrontar a Rússia, EUA e Europa ressuscitam considerações geopolíticas que gostariam de deixar para trás. Consumada a incorporação da Crimeia ao território russo, o mundo espera o desfecho das disputas pelos territórios do leste da Ucrânia, na fronteira com a Rússia, onde se concentra a maioria da população de origem e de língua russas.
Quais os interesses do Brasil na relação com a Ucrânia? Poucos talvez possam identificar assuntos em comum com país tão distante.
O Brasil no governo Lula se associou à Ucrânia para a cessão de espaço para lançamento de satélites comerciais do Centro de Lançamento de Satélites em Alcântara. Para isso, foi criada a empresa mista Alcântara Cyclone Space (ACS), formada em partes iguais, que já consumiu US$ 918 milhões do lado brasileiro, tendo sido metade aportada em meados de 2013, sob a forma de aumento de capital, sem nenhum resultado concreto até aqui. A ideia era aproveitar o programa ucraniano para, se tudo desse certo, desenvolver uma indústria voltada para lançamentos no Brasil. Toda essa negociação com a Ucrânia está cercada de circunstâncias que mostram a maneira descoordenada como muitos projetos de grande relevância estratégica foram tratados nos últimos anos.
O programa espacial brasileiro de desenvolvimento de Veículos Lançadores de Satélites (VLS) e de aproveitamento comercial da Base de Alcântara colocaria o Brasil no mercado global, dominado em mais de 85% por lançamentos de satélites de comunicação de empresas norte-americanas. Para viabilizar a entrada do Brasil nesse mercado, o governo FHC negociou acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA. Por questões ideológicas, o PT na oposição e, depois, no governo ficou contra o acordo que, paralisado no Congresso, foi abandonado. O governo Lula, no entanto, para viabilizar a cooperação com a Ucrânia, teve de assinar um acordo de salvaguardas tecnológicas com o governo de Kiev. O acordo com a Ucrânia, traduzido quase literalmente do firmado com os EUA, foi rapidamente aprovado pelo Congresso com o apoio entusiasmado do PT. Chegou-se mesmo a discutir um segundo acordo, que atenuasse cláusulas draconianas que restringiam o acesso das autoridades brasileiras aos equipamentos ucranianos e ampliasse a cooperação para o desenvolvimento conjunto de um novo VLS (Cyclone V).
Soube, no ano passado, que a Ucrânia havia feito gestões junto do governo de Washington para que o acordo de salvaguarda tecnológica com o Brasil fosse retomado, porque o foguete ucraniano incorpora peças e componentes americanos. Assim, o VLS Cyclone só poderia ser lançado de Alcântara se o acordo Brasil-EUA estivesse em vigor.
Essa comédia de erros está atrasando por mais de 15 anos o programa brasileiro de utilização comercial da Base de Alcântara. Será que as autoridades brasileiras não sabiam que o acordo com os EUA era indispensável para levar adiante o projeto com a Ucrânia?
O quiproquó não termina aí. A empresa que teoricamente produziria o foguete lançador dos satélites comerciais de Alcântara está localizada na área industrial da Ucrânia, exatamente no território agora conflagrado pela presença de população russa, transferida para a região para operar o complexo industrial militar que Moscou havia criado naquele país, então parte da URSS. O que acontecerá se esse território for incorporado à Rússia?
Além disso, a Ucrânia, sem condições de fazer os aportes financeiros necessários, pela precária situação de sua economia, contribuiu para reduzir o projeto a um sonho de uma noite de verão. A negociação com a Ucrânia teve clara motivação ideológica para evitar a dependência dos EUA. A maneira desastrada como todo o processo foi operado é mais um exemplo de um equívoco cometido por considerações político-partidárias. Os investimentos feitos pelo governo brasileiro não serão recuperados e o caos doméstico ucraniano inviabiliza qualquer esforço para a retomada do projeto.
O acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA, depois da visita do presidente Barack Obama ao Brasil em 2011, estava sofrendo modificações para ser apresentado às autoridades norte-americanas. A negociação do acordo, contudo, está paralisada, como tudo o que é realmente importante na relação com os EUA. A decisão da presidente Dilma Rousseff de só normalizar as relações bilaterais depois de um eventual pedido de desculpas de Obama pelo monitoramento indevido da Agência Nacional de Segurança (NSA) dificulta o desenlace da crise entre os dois países. Como o pedido dificilmente será atendido, este e outros temas de interesse brasileiro dormem nos escaninhos da burocracia itamaratiana.
Críticos cobram um posicionamento da política externa, outrora tão ativa e altiva, em relação aos graves acontecimentos que culminaram com a anexação da Crimeia à Rússia e com os distúrbios em diversas cidades ucranianas.
A paralisia da diplomacia brasileira pode ser explicada por um conjunto de fatores: o Brasil ser membro do Brics, hoje um bloco institucionalizado, com reuniões presidenciais (a próxima ocorrerá em Fortaleza, em julho) e ministeriais todos os anos; pela dificuldade de lidar com o imbróglio em que nos metemos com o acordo de cooperação no Centro de Lançamento de Alcântara; e pela deliberada política do governo Dilma de encolhimento da política externa e da não participação do Brasil na cena internacional.
Fica cada vez mais evidente a necessidade de uma nova política externa que restaure a influência do Itamaraty, para evitar situações como a da Ucrânia, e restabeleça a voz e a presença do Brasil no exterior.
Refinaria é um monumento ao uso político da Petrobras - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 13/05
O projeto para o Maranhão foi imposto por Lula para atender a interesses políticos, e é um entre vários decididos sem qualquer cuidado com o contribuinte
A Petrobras se converte em copioso manancial de exemplos escabrosos de como não se pode administrar uma empresa pública. Ou qualquer outra, por suposto. A escandalosa aquisição da refinaria de Pasadena, Texas, a um grupo belga, por um preço final estratosférico (US$ 1,2 bilhão), já teve importante função pedagógica por alertar sobre o que pode acontecer quando cargos-chave em uma empresa da importância da Petrobras fazem parte do jogo fisiológico do aparelhamento, por motivos político-ideológicos, pessoais ou ambos.
E não foi apenas Pasadena o único mau negócio fechado pela estatal no longo período em que a empresa esteve sob controle de uma falange sindical do lulopetismo. Também é considerada estranha a compra de uma refinaria no Japão (Nansei, em Okinawa), além dos superfaturamentos visíveis, detectados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em pelo menos dois canteiros de obras — da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e da Comperj, novo polo petroquímico do Rio de Janeiro.
Na edição de domingo, O GLOBO trouxe mais uma história nada edificante, a do projeto da Refinaria Premium I, prevista para Bacabeira, próximo a São Luís, Maranhão. A pedra fundamental da refinaria foi lançada em 2010, com grande alarido, na presença do então presidente Lula, sua candidata à sucessão Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, e ilustres representantes do clã Sarney: o próprio senador José Sarney (PMDB-AP), a filha e governadora Roseana e o discípulo Edison Lobão, ministro das Minas e Energia.
Anos depois, não há uma estaca fincada no local, “apenas” uma despesa de R$ 1 bilhão (!) jogada no caixa da estatal, a título de projetos, transporte, estudos ambientais, terraplenagem e treinamentos. Mais este escândalo tem, também, seu lado pedagógico: alertar sobre o risco de se subordinar investimentos públicos a objetivos políticos. Cabe lembrar a lapidar entrevista que o ainda presidente Lula concedeu ao jornal “Valor Econômico”, em 2009, em que se vangloriou de ter forçado a Petrobras a incluir nos planos a refinaria maranhense e mais outra, a Premium II, no Ceará.
Foram parte do projeto político-eleitoral do lulopetismo, para consolidar a longa e estreita aliança com os Sarney e manter na zona de influência do PT os Gomes (o governador Cid e o ex-ministro Ciro). Na hora de ajustar as contas, a Petrobras jogou para um futuro impreciso as refinarias, numa decisão correta. Mas ficou com pelo menos a conta de R$ 1 bilhão da Premium I.
Lula também tentou empurrar para a Vale siderúrgicas no Norte. Não conseguiu, pois, mesmo com toda a influência do Estado na empresa, ela tem controle privado. A saga desses projetos, contabilizada em bilhões de reais de perdas, serve como indiscutível prova da sobrecarga que representa para o contribuinte quando governos agem de forma voluntariosa, sem maiores cuidados técnicos. A atual crise no setor elétrico é outro exemplo.
O projeto para o Maranhão foi imposto por Lula para atender a interesses políticos, e é um entre vários decididos sem qualquer cuidado com o contribuinte
A Petrobras se converte em copioso manancial de exemplos escabrosos de como não se pode administrar uma empresa pública. Ou qualquer outra, por suposto. A escandalosa aquisição da refinaria de Pasadena, Texas, a um grupo belga, por um preço final estratosférico (US$ 1,2 bilhão), já teve importante função pedagógica por alertar sobre o que pode acontecer quando cargos-chave em uma empresa da importância da Petrobras fazem parte do jogo fisiológico do aparelhamento, por motivos político-ideológicos, pessoais ou ambos.
E não foi apenas Pasadena o único mau negócio fechado pela estatal no longo período em que a empresa esteve sob controle de uma falange sindical do lulopetismo. Também é considerada estranha a compra de uma refinaria no Japão (Nansei, em Okinawa), além dos superfaturamentos visíveis, detectados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em pelo menos dois canteiros de obras — da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e da Comperj, novo polo petroquímico do Rio de Janeiro.
Na edição de domingo, O GLOBO trouxe mais uma história nada edificante, a do projeto da Refinaria Premium I, prevista para Bacabeira, próximo a São Luís, Maranhão. A pedra fundamental da refinaria foi lançada em 2010, com grande alarido, na presença do então presidente Lula, sua candidata à sucessão Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, e ilustres representantes do clã Sarney: o próprio senador José Sarney (PMDB-AP), a filha e governadora Roseana e o discípulo Edison Lobão, ministro das Minas e Energia.
Anos depois, não há uma estaca fincada no local, “apenas” uma despesa de R$ 1 bilhão (!) jogada no caixa da estatal, a título de projetos, transporte, estudos ambientais, terraplenagem e treinamentos. Mais este escândalo tem, também, seu lado pedagógico: alertar sobre o risco de se subordinar investimentos públicos a objetivos políticos. Cabe lembrar a lapidar entrevista que o ainda presidente Lula concedeu ao jornal “Valor Econômico”, em 2009, em que se vangloriou de ter forçado a Petrobras a incluir nos planos a refinaria maranhense e mais outra, a Premium II, no Ceará.
Foram parte do projeto político-eleitoral do lulopetismo, para consolidar a longa e estreita aliança com os Sarney e manter na zona de influência do PT os Gomes (o governador Cid e o ex-ministro Ciro). Na hora de ajustar as contas, a Petrobras jogou para um futuro impreciso as refinarias, numa decisão correta. Mas ficou com pelo menos a conta de R$ 1 bilhão da Premium I.
Lula também tentou empurrar para a Vale siderúrgicas no Norte. Não conseguiu, pois, mesmo com toda a influência do Estado na empresa, ela tem controle privado. A saga desses projetos, contabilizada em bilhões de reais de perdas, serve como indiscutível prova da sobrecarga que representa para o contribuinte quando governos agem de forma voluntariosa, sem maiores cuidados técnicos. A atual crise no setor elétrico é outro exemplo.
O agronegócio salvador - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 13/05
Com superávit de US$ 24,14 bilhões de janeiro a abril, o agronegócio continua sendo o principal suporte do comércio exterior brasileiro, abalado por exportações totais em queda e um desempenho muito ruim da maior parte da indústria. Aquele saldo positivo foi obtido apesar do cenário externo ainda adverso e da redução de preços de vários produtos importantes, como soja e grãos, carnes, açúcar e álcool. As exportações do setor renderam US$ 29,85 bilhões nos primeiros quatro meses, 1,2% menos que um ano antes. Mesmo assim, essas vendas compensaram boa parte do desastre observado em outros componentes da balança comercial. As vendas de manufaturados, no valor de US$ 24,659 bilhões, foram 7,6% menores que as de janeiro a abril do ano passado. As de semimanufaturados, de US$ 8,769 bilhões, ficaram 9,5% abaixo das contabilizadas no mesmo quadrimestre de 2013. O saldo geral do comércio de bens foi um buraco de US$ 5,57 bilhões. Teria sido muito pior sem a receita de produtos agropecuários com ou sem processamento.
A Ásia, excluído o Oriente Médio, continuou sendo o principal destino das exportações do agronegócio brasileiro. A região proporcionou 43,3% da receita obtida pelo setor. A China permaneceu como a compradora número um. Absorveu produtos no valor de US$ 8,1 bilhões, 27,1% do total faturado pelo Brasil. O gasto chinês foi 33,1% maior que o de igual período de um ano antes. Embora com menor crescimento, explicável em boa parte por ajustes internos, a economia chinesa permanece como o destino mais importante das exportações agrícolas brasileiras e como a principal parceira comercial do Brasil. No primeiro quadrimestre, a China comprou produtos brasileiros no valor de US$ 14,07 bilhões, 20,3% do total.
A permanência da China como enorme consumidora de matérias-primas, apesar de seu menor crescimento econômico, é uma excelente notícia para o Brasil. Nos últimos anos, a perspectiva de ajuste na economia chinesa motivou alguma preocupação quanto a seus efeitos para a economia brasileira. Pelo menos até agora, as más previsões foram desmentidas. O apetite chinês por produtos agrícolas e outras matérias-primas é hoje especialmente importante para o Brasil, por causa do mau desempenho comercial dos produtores de manufaturados e de boa parte dos fabricantes de semimanufaturados.
Mas há dois aspectos negativos nesse quadro. O primeiro é a continuação da enorme dependência do Brasil em relação à economia da China e de alguns outros mercados da Ásia. Essa dependência é especialmente ruim porque o comércio com esses parceiros é semicolonial, com o Brasil exportando quase exclusivamente produtos primários e importando manufaturados. Em 2013, só 3,39% dos US$ 46,03 bilhões vendidos à China corresponderam a manufaturados. Incluídos os semimanufaturados, as vendas totais da indústria chegaram a US$ 7,02 bilhões, 15,25% do total. No mesmo ano, a indústria brasileira vendeu US$ 17,77 bilhões aos Estados Unidos, incluídos US$ 13,06 bilhões de manufaturados.
O segundo aspecto negativo é a excessiva dependência do agronegócio. É muito bom dispor de uma agropecuária eficiente e complementada por uma agroindústria de alta qualidade, formando um conjunto com alta produtividade e grande poder de competição. Mas é igualmente indispensável, para uma economia como a brasileira, dispor de uma indústria de transformação capaz de concorrer com produtores estrangeiros tanto fora do País quanto no mercado interno.
Há muitos argumentos a favor deste ponto de vista. Preços industriais são geralmente menos instáveis e o setor manufatureiro ainda é a principal fonte de empregos de alta qualidade, além de ter sido por muito tempo - e poderia voltar a ser - um grande núcleo de inovação e de absorção de tecnologia.
Não se trata de negligenciar o apoio ao desenvolvimento do agronegócio, o setor mais competitivo do Brasil, mas de reequilibrar os padrões de eficiência dos dois grandes segmentos produtores de bens. Os formuladores e condutores da política econômica têm fracassado na execução dessa tarefa.
Com superávit de US$ 24,14 bilhões de janeiro a abril, o agronegócio continua sendo o principal suporte do comércio exterior brasileiro, abalado por exportações totais em queda e um desempenho muito ruim da maior parte da indústria. Aquele saldo positivo foi obtido apesar do cenário externo ainda adverso e da redução de preços de vários produtos importantes, como soja e grãos, carnes, açúcar e álcool. As exportações do setor renderam US$ 29,85 bilhões nos primeiros quatro meses, 1,2% menos que um ano antes. Mesmo assim, essas vendas compensaram boa parte do desastre observado em outros componentes da balança comercial. As vendas de manufaturados, no valor de US$ 24,659 bilhões, foram 7,6% menores que as de janeiro a abril do ano passado. As de semimanufaturados, de US$ 8,769 bilhões, ficaram 9,5% abaixo das contabilizadas no mesmo quadrimestre de 2013. O saldo geral do comércio de bens foi um buraco de US$ 5,57 bilhões. Teria sido muito pior sem a receita de produtos agropecuários com ou sem processamento.
A Ásia, excluído o Oriente Médio, continuou sendo o principal destino das exportações do agronegócio brasileiro. A região proporcionou 43,3% da receita obtida pelo setor. A China permaneceu como a compradora número um. Absorveu produtos no valor de US$ 8,1 bilhões, 27,1% do total faturado pelo Brasil. O gasto chinês foi 33,1% maior que o de igual período de um ano antes. Embora com menor crescimento, explicável em boa parte por ajustes internos, a economia chinesa permanece como o destino mais importante das exportações agrícolas brasileiras e como a principal parceira comercial do Brasil. No primeiro quadrimestre, a China comprou produtos brasileiros no valor de US$ 14,07 bilhões, 20,3% do total.
A permanência da China como enorme consumidora de matérias-primas, apesar de seu menor crescimento econômico, é uma excelente notícia para o Brasil. Nos últimos anos, a perspectiva de ajuste na economia chinesa motivou alguma preocupação quanto a seus efeitos para a economia brasileira. Pelo menos até agora, as más previsões foram desmentidas. O apetite chinês por produtos agrícolas e outras matérias-primas é hoje especialmente importante para o Brasil, por causa do mau desempenho comercial dos produtores de manufaturados e de boa parte dos fabricantes de semimanufaturados.
Mas há dois aspectos negativos nesse quadro. O primeiro é a continuação da enorme dependência do Brasil em relação à economia da China e de alguns outros mercados da Ásia. Essa dependência é especialmente ruim porque o comércio com esses parceiros é semicolonial, com o Brasil exportando quase exclusivamente produtos primários e importando manufaturados. Em 2013, só 3,39% dos US$ 46,03 bilhões vendidos à China corresponderam a manufaturados. Incluídos os semimanufaturados, as vendas totais da indústria chegaram a US$ 7,02 bilhões, 15,25% do total. No mesmo ano, a indústria brasileira vendeu US$ 17,77 bilhões aos Estados Unidos, incluídos US$ 13,06 bilhões de manufaturados.
O segundo aspecto negativo é a excessiva dependência do agronegócio. É muito bom dispor de uma agropecuária eficiente e complementada por uma agroindústria de alta qualidade, formando um conjunto com alta produtividade e grande poder de competição. Mas é igualmente indispensável, para uma economia como a brasileira, dispor de uma indústria de transformação capaz de concorrer com produtores estrangeiros tanto fora do País quanto no mercado interno.
Há muitos argumentos a favor deste ponto de vista. Preços industriais são geralmente menos instáveis e o setor manufatureiro ainda é a principal fonte de empregos de alta qualidade, além de ter sido por muito tempo - e poderia voltar a ser - um grande núcleo de inovação e de absorção de tecnologia.
Não se trata de negligenciar o apoio ao desenvolvimento do agronegócio, o setor mais competitivo do Brasil, mas de reequilibrar os padrões de eficiência dos dois grandes segmentos produtores de bens. Os formuladores e condutores da política econômica têm fracassado na execução dessa tarefa.
Governo de contradições - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
GAZETA DO POVO - PR - 13/05
Em matéria de declarações públicas, o governo apresenta mais barulho do que afinação. E isso não é bom
Na condição de presidente, Dilma Rousseff tem o direito de defender e implantar as políticas que julgar mais conveniente para o país, cabendo-lhe arcar com as consequências em termos de apoio ou rejeição popular. O poder do presidente da República no regime presidencialista é imenso, moderado em parte pelo Poder Legislativo, ao qual deve submeter seus projetos que, legalmente, dependam de aprovação parlamentar. Assim, o pensamento, o comportamento e os atos de um presidente têm forte influência no planejamento e nas decisões do setor privado.
Como o chefe da nação é auxiliado por ministros, as declarações e decisões ministeriais têm alta relevância na formulação de cenários sob os quais os empresários tomam suas decisões de produção, investimento e financiamento. Quando os ministros dizem uma coisa e a presidente diz outra, uma enorme confusão se estabelece, com efeitos negativos sobre as decisões empresariais. As recentes declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que o governo estaria estudando aumentos de impostos a fim de alcançar as metas de superávit primário, incluem-se no vasto rol de contradições criadas pelo governo.
Logo após as afirmações do ministro, o mercado passou a planejar os negócios considerando a hipótese de elevação tributária se não agora pelo menos para 2015. Mal acabavam de traçar as primeiras linhas de seus planejamentos estratégicos, a presidente Dilma, em jantar com jornalistas mulheres no Palácio Alvorada, declara textualmente que “ele (o ministro Mantega) falou em tese, não tem nada disso em perspectiva, não sei em que condições ele falou, a gente escorrega em casca de banana bem bonita...”.
Além dos efeitos negativos específicos, a contradição entre o comportamento da presidente e o de seu ministro produz efeitos colaterais e se expande para outras áreas da vida nacional. Mais um exemplo é a declaração de outro ministro afirmando que não haverá racionamento de energia. Sua palavra tem credibilidade parcial, pois os agentes econômicos ficam se perguntando se, diante da escassez de chuvas, a presidente pensa a mesma coisa. Em mais uma declaração confusa, ela se referiu à defasagem dos preços da energia, dos combustíveis e das tarifas de transporte desautorizondo qualquer previsão ou declaração de que poderão vir reajustes mais altos em 2015. “Não tenho que dar tarifaço, por que dar?”, foram as palavras de Dilma.
Ocorre que o mercado inteiro sabe que a presidente da Petrobras, Graça Foster, vem pressionando Dilma para ser mais flexível em relação ao reajuste dos derivados do petróleo. Graça Foster tem dois trunfos para fazer valer sua posição: o baixo lucro da companhia neste início de ano e a impressão geral de que a maior empresa do país está dilapidada nas duas frentes, a econômica e a ética. Eventual desempenho expressivo (leia-se: elevados lucros) da Petrobras no segundo semestre de 2014 e nos meses iniciais de 2015, além de fortalecer a saúde financeira da empresa, seria uma espécie de arma contra os críticos e a corrosão da imagem da empresa.
Outra contradição no interior do governo diz respeito à inflação. A presidente vem insistindo que a elevação de preços está sob controle e desfilou uma série de números para dizer que, entre os três últimos governos, o seu é o mais eficiente no controle da inflação. Ela disse também que não há o menor risco de a inflação sair do domínio das autoridades econômicas em 2015. Porém, os últimos aumentos da taxa de juros, a Selic, e as atas do Conselho de Política Monetária (Copom) indicam que o BC não está na mesma linha otimista de Dilma.
Ao afirmar que a inflação não é uma ameaça, Dilma transmite a impressão de que o governo não está disposto a adotar medidas preventivas austeras e que somente o faria quando e se os preços saírem do controle. Entre os clientes dos supermercados, há os que colocam em dúvida a inflação anunciada pelo governo, pois os preços no varejo, especialmente os alimentos, têm subido bem mais que o IPCA. Para as famílias, a elevação dos preços dos alimentos tem efeito bastante sensível sobre a percepção em relação à inflação. Nesse ponto, o BC tem sido mais cauteloso e vem transmitindo sinais de que a elevação dos preços dos alimentos constituem um problema sério sim e podem pôr fogo na inflação. O discurso da presidente vai numa direção e os sinais do BC vão em outra, isto é, o BC demonstra, em relação à inflação, ter mais medo que Dilma.
Essas contradições mostram que, em matéria de declarações públicas, o governo apresenta mais barulho do que afinação. E isso não é bom.
Em matéria de declarações públicas, o governo apresenta mais barulho do que afinação. E isso não é bom
Na condição de presidente, Dilma Rousseff tem o direito de defender e implantar as políticas que julgar mais conveniente para o país, cabendo-lhe arcar com as consequências em termos de apoio ou rejeição popular. O poder do presidente da República no regime presidencialista é imenso, moderado em parte pelo Poder Legislativo, ao qual deve submeter seus projetos que, legalmente, dependam de aprovação parlamentar. Assim, o pensamento, o comportamento e os atos de um presidente têm forte influência no planejamento e nas decisões do setor privado.
Como o chefe da nação é auxiliado por ministros, as declarações e decisões ministeriais têm alta relevância na formulação de cenários sob os quais os empresários tomam suas decisões de produção, investimento e financiamento. Quando os ministros dizem uma coisa e a presidente diz outra, uma enorme confusão se estabelece, com efeitos negativos sobre as decisões empresariais. As recentes declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que o governo estaria estudando aumentos de impostos a fim de alcançar as metas de superávit primário, incluem-se no vasto rol de contradições criadas pelo governo.
Logo após as afirmações do ministro, o mercado passou a planejar os negócios considerando a hipótese de elevação tributária se não agora pelo menos para 2015. Mal acabavam de traçar as primeiras linhas de seus planejamentos estratégicos, a presidente Dilma, em jantar com jornalistas mulheres no Palácio Alvorada, declara textualmente que “ele (o ministro Mantega) falou em tese, não tem nada disso em perspectiva, não sei em que condições ele falou, a gente escorrega em casca de banana bem bonita...”.
Além dos efeitos negativos específicos, a contradição entre o comportamento da presidente e o de seu ministro produz efeitos colaterais e se expande para outras áreas da vida nacional. Mais um exemplo é a declaração de outro ministro afirmando que não haverá racionamento de energia. Sua palavra tem credibilidade parcial, pois os agentes econômicos ficam se perguntando se, diante da escassez de chuvas, a presidente pensa a mesma coisa. Em mais uma declaração confusa, ela se referiu à defasagem dos preços da energia, dos combustíveis e das tarifas de transporte desautorizondo qualquer previsão ou declaração de que poderão vir reajustes mais altos em 2015. “Não tenho que dar tarifaço, por que dar?”, foram as palavras de Dilma.
Ocorre que o mercado inteiro sabe que a presidente da Petrobras, Graça Foster, vem pressionando Dilma para ser mais flexível em relação ao reajuste dos derivados do petróleo. Graça Foster tem dois trunfos para fazer valer sua posição: o baixo lucro da companhia neste início de ano e a impressão geral de que a maior empresa do país está dilapidada nas duas frentes, a econômica e a ética. Eventual desempenho expressivo (leia-se: elevados lucros) da Petrobras no segundo semestre de 2014 e nos meses iniciais de 2015, além de fortalecer a saúde financeira da empresa, seria uma espécie de arma contra os críticos e a corrosão da imagem da empresa.
Outra contradição no interior do governo diz respeito à inflação. A presidente vem insistindo que a elevação de preços está sob controle e desfilou uma série de números para dizer que, entre os três últimos governos, o seu é o mais eficiente no controle da inflação. Ela disse também que não há o menor risco de a inflação sair do domínio das autoridades econômicas em 2015. Porém, os últimos aumentos da taxa de juros, a Selic, e as atas do Conselho de Política Monetária (Copom) indicam que o BC não está na mesma linha otimista de Dilma.
Ao afirmar que a inflação não é uma ameaça, Dilma transmite a impressão de que o governo não está disposto a adotar medidas preventivas austeras e que somente o faria quando e se os preços saírem do controle. Entre os clientes dos supermercados, há os que colocam em dúvida a inflação anunciada pelo governo, pois os preços no varejo, especialmente os alimentos, têm subido bem mais que o IPCA. Para as famílias, a elevação dos preços dos alimentos tem efeito bastante sensível sobre a percepção em relação à inflação. Nesse ponto, o BC tem sido mais cauteloso e vem transmitindo sinais de que a elevação dos preços dos alimentos constituem um problema sério sim e podem pôr fogo na inflação. O discurso da presidente vai numa direção e os sinais do BC vão em outra, isto é, o BC demonstra, em relação à inflação, ter mais medo que Dilma.
Essas contradições mostram que, em matéria de declarações públicas, o governo apresenta mais barulho do que afinação. E isso não é bom.
Meninas da Nigéria: dilema para o Ocidente - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 13/05
O sequestro de 276 adolescentes nigerianas, além de comover o mundo, cria dilema para o Ocidente. Boko Haram age no nordeste do país - região cujos 72% da população vivem na linha da pobreza. O grupo terrorista islâmico se nutre da miséria e de interpretação distorcida do Corão para espalhar o pânico entre os cidadãos do país. Com retórica religiosa marcada pelo obscurantismo, o líder Abubakar Shekau rapta, rouba, mata, explode ônibus, incendeia residências, plantações e estabelecimentos comerciais.
Em 14 de abril, a violência contra as meninas mobilizou a opinião pública internacional por somar indignações. De um lado, chama a atenção o número de vítimas, próximo de três centenas. De outro, a causa alegada para o ato: castigo por elas frequentarem a escola. (Lugar de mulher, segundo eles, é em casa para cuidar do marido e dos filhos.) Também o destino que as aguarda: serem vendidas por R$ 12 a líderes tribais para servir de esposas ou escravas.
Manifestações se espalharam pelos cinco continentes. As redes sociais mobilizaram diferentes segmentos de comunidades locais e estrangeiras. Até a primeira-dama americana, Michele Obama, exibiu a hastag #devolvamnossasmeninas. Governos se manifestaram e, aliados à ONU, condenaram o episódio. Retórica à parte, ações efetivas são tímidas. Estados Unidos e Reino Unido enviaram especialistas em sequestros para ajudar a localizar as jovens. Boko Haram propôs trocar as meninas pelos terroristas presos.
O quadro é difícil e a situação, grave. Trata-se de jogo em que só há perdedores. O islamismo perde porque reforça a identidade da religião com o terrorismo. Cresce, com isso, a islamofobia mundo afora. O Ocidente perde porque, seja qual for a decisão tomada, terá de escolher entre o ruim e o pior. Repete-se, mantidas as devidas proporções, o dilema observado em Damasco e no Cairo.
Apoiar os rebeldes sírios ou egípcios significa dar mais poder a grupos muçulmanos radicais que comandam a oposição. Por seu lado, apoiar os governos é manter ditaduras cruéis e corruptas que se perpetuam no poder - medida que contraria os valores ocidentais. Na Nigéria, combater o Boko Haram se traduz em colaboração com o presidente Goodluck Jonathan, cujo exército é tão cruel quanto os terroristas.
Não só. Em uma década, o país cresceu 7% ao ano e ameaça ultrapassar a África do Sul como a maior economia do continente. Mas o governo, corrupto e regado a petróleo explorado por empresas ocidentais, não investe em benefício da população miserável, vítima preferencial dos radicais. O terror, vale lembrar, mudou de alvo: ameaça menos as grandes potências e volta-se contra muçulmanos pobres da Ásia, da África e do Oriente Médio.
No caso das meninas sequestradas, entre o ruim e o pior, a pior saída é deixar as jovens entregues à própria sorte. Segundo depoimento de uma que conseguiu escapar, garotas sofrem 15 estupros por dia. É preciso ajudar o governo nigeriano a resgatar as vítimas, embora se saiba que se ajuda a quem não merece.
Em 14 de abril, a violência contra as meninas mobilizou a opinião pública internacional por somar indignações. De um lado, chama a atenção o número de vítimas, próximo de três centenas. De outro, a causa alegada para o ato: castigo por elas frequentarem a escola. (Lugar de mulher, segundo eles, é em casa para cuidar do marido e dos filhos.) Também o destino que as aguarda: serem vendidas por R$ 12 a líderes tribais para servir de esposas ou escravas.
Manifestações se espalharam pelos cinco continentes. As redes sociais mobilizaram diferentes segmentos de comunidades locais e estrangeiras. Até a primeira-dama americana, Michele Obama, exibiu a hastag #devolvamnossasmeninas. Governos se manifestaram e, aliados à ONU, condenaram o episódio. Retórica à parte, ações efetivas são tímidas. Estados Unidos e Reino Unido enviaram especialistas em sequestros para ajudar a localizar as jovens. Boko Haram propôs trocar as meninas pelos terroristas presos.
O quadro é difícil e a situação, grave. Trata-se de jogo em que só há perdedores. O islamismo perde porque reforça a identidade da religião com o terrorismo. Cresce, com isso, a islamofobia mundo afora. O Ocidente perde porque, seja qual for a decisão tomada, terá de escolher entre o ruim e o pior. Repete-se, mantidas as devidas proporções, o dilema observado em Damasco e no Cairo.
Apoiar os rebeldes sírios ou egípcios significa dar mais poder a grupos muçulmanos radicais que comandam a oposição. Por seu lado, apoiar os governos é manter ditaduras cruéis e corruptas que se perpetuam no poder - medida que contraria os valores ocidentais. Na Nigéria, combater o Boko Haram se traduz em colaboração com o presidente Goodluck Jonathan, cujo exército é tão cruel quanto os terroristas.
Não só. Em uma década, o país cresceu 7% ao ano e ameaça ultrapassar a África do Sul como a maior economia do continente. Mas o governo, corrupto e regado a petróleo explorado por empresas ocidentais, não investe em benefício da população miserável, vítima preferencial dos radicais. O terror, vale lembrar, mudou de alvo: ameaça menos as grandes potências e volta-se contra muçulmanos pobres da Ásia, da África e do Oriente Médio.
No caso das meninas sequestradas, entre o ruim e o pior, a pior saída é deixar as jovens entregues à própria sorte. Segundo depoimento de uma que conseguiu escapar, garotas sofrem 15 estupros por dia. É preciso ajudar o governo nigeriano a resgatar as vítimas, embora se saiba que se ajuda a quem não merece.
Livre para (não) votar - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 13/05
Pesquisa Datafolha publicada no domingo mostrou um crescimento relevante do apoio ao voto facultativo. Em maio de 2010, registrava-se divisão simétrica: 48% a favor e 48% contrários. Agora, 61% dos entrevistados afirmam que o cidadão tem o direito de decidir se quer ou não votar, e 34% defendem a obrigatoriedade.
O sufrágio compulsório, adotado no país desde 1932, é considerado por seus defensores uma forma de ampliar a representatividade democrática e ajudar na educação cívica do eleitor.
As desigualdades regionais e socioeconômicas, combinadas com a escassa experiência democrática do Brasil, poderiam levar a altos índices de abstenção justamente nos segmentos mais necessitados. O constrangimento seria mantido como um "dever" da cidadania.
Tais argumentos, por bem intencionados que sejam, não escondem certo viés autoritário --característico, aliás, da cultura política latino-americana, onde a obrigatoriedade é a regra. Nas democracias mais desenvolvidas, dos EUA à Europa, prevalece o regime facultativo, com base no princípio de que o voto é um direito, não um dever.
O entendimento de que o caráter compulsório garante maior legitimidade aos resultados soa falacioso não só pela já considerável incidência de votos nulos e brancos verificada no Brasil mas também pelo fato de que parte do eleitorado vai às urnas porque é obrigado por lei, não por ato de consciência.
Os candidatos, por sua vez, não raro se sentem dispensados de assumir compromissos com o eleitor.
Políticos de projeção, filiados a diversas correntes ideológicas --como Lula e José Serra, para citar apenas o PT e o PSDB--, já se manifestaram contra o voto compulsório. Em sentido oposto, personalidades de peso apoiam a permanência da regra atual.
Esta Folha defende a adoção do regime facultativo. Não se trata, por certo, de panaceia para o sistema político. O processo de aperfeiçoamento democrático exige outras reformas, além de tempo, educação e mais acesso a informações.
O país, não obstante, parece maduro para enfrentar a questão. A mudança da norma constitucional seguida de um referendo é o caminho a seguir. As resistências do meio político a reformas desse gênero, no entanto, são atávicas. Sempre presente na retórica de candidatos e governantes, a discussão sobre esses temas segue, infelizmente, travada no Legislativo.
Pesquisa Datafolha publicada no domingo mostrou um crescimento relevante do apoio ao voto facultativo. Em maio de 2010, registrava-se divisão simétrica: 48% a favor e 48% contrários. Agora, 61% dos entrevistados afirmam que o cidadão tem o direito de decidir se quer ou não votar, e 34% defendem a obrigatoriedade.
O sufrágio compulsório, adotado no país desde 1932, é considerado por seus defensores uma forma de ampliar a representatividade democrática e ajudar na educação cívica do eleitor.
As desigualdades regionais e socioeconômicas, combinadas com a escassa experiência democrática do Brasil, poderiam levar a altos índices de abstenção justamente nos segmentos mais necessitados. O constrangimento seria mantido como um "dever" da cidadania.
Tais argumentos, por bem intencionados que sejam, não escondem certo viés autoritário --característico, aliás, da cultura política latino-americana, onde a obrigatoriedade é a regra. Nas democracias mais desenvolvidas, dos EUA à Europa, prevalece o regime facultativo, com base no princípio de que o voto é um direito, não um dever.
O entendimento de que o caráter compulsório garante maior legitimidade aos resultados soa falacioso não só pela já considerável incidência de votos nulos e brancos verificada no Brasil mas também pelo fato de que parte do eleitorado vai às urnas porque é obrigado por lei, não por ato de consciência.
Os candidatos, por sua vez, não raro se sentem dispensados de assumir compromissos com o eleitor.
Políticos de projeção, filiados a diversas correntes ideológicas --como Lula e José Serra, para citar apenas o PT e o PSDB--, já se manifestaram contra o voto compulsório. Em sentido oposto, personalidades de peso apoiam a permanência da regra atual.
Esta Folha defende a adoção do regime facultativo. Não se trata, por certo, de panaceia para o sistema político. O processo de aperfeiçoamento democrático exige outras reformas, além de tempo, educação e mais acesso a informações.
O país, não obstante, parece maduro para enfrentar a questão. A mudança da norma constitucional seguida de um referendo é o caminho a seguir. As resistências do meio político a reformas desse gênero, no entanto, são atávicas. Sempre presente na retórica de candidatos e governantes, a discussão sobre esses temas segue, infelizmente, travada no Legislativo.
Fundos no vermelho - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 13/05
Uma perversa combinação de fatores conjunturais adversos e aplicações financeiras temerárias levaram os fundos de pensão a um déficit sem precedentes da ordem de R$ 22 bilhões. Já o governo, fiel aos seus hábitos e pronto a reincidir em erros gritantes, deu de manipular regras que governam o setor, também contaminado, de resto, por manobras de contabilidade criativa - a mágica que transforma prejuízos reais em lucros cenográficos.
Os 256 fundos de previdência fechada em operação no País abrangem 6,5 milhões de pessoas, entre participantes que contribuem mensalmente para formar um pecúlio, assistidos e dependentes. Têm essa denominação porque a sua clientela se compõe exclusivamente de funcionários de empresas e membros de associações que oferecem essa modalidade de aposentadoria complementar à do INSS. Administram em conjunto um patrimônio na casa de R$ 624 bilhões, ou 14,7% do PIB nacional.
Desses ativos, 65% estão em mãos de entidades patrocinadas por empresas públicas, a começar do Previ (dos empregados do Banco do Brasil), Petros (Petrobrás) e Funcef (Caixa Econômica Federal). Os fundos das estatais, até por seu porte, respondem pelo grosso do citado déficit, que fez do ano passado o pior da história do setor, incluindo 2009, sob o impacto da crise internacional provocada pelo colapso de Wall Street, em fins do ano anterior. Para recorrer a um termo um tanto em desuso, é o caso de dizer que a situação dos fundos é periclitante. Ainda em 2012, o teto da sua meta de rentabilidade já tinha sido rebaixado de 6% para 4,5%.
Fontes da Superintendência Nacional de Previdência Complementar culpam pela explosão do déficit, em primeiro lugar, a desvalorização das aplicações em títulos prefixados. As expectativas para este ano são pessimistas - além da permanência dos fatores que derrubaram os fundos em 2013, a inflação, o desempenho da Bolsa, as incertezas diante da Copa, das eleições e do fim de um período presidencial devem dificultar a recuperação dos fundos.
Mas é preciso considerar, também, os investimentos desastrosos, feitos em obediência a instruções do governo, entre eles a capitalização das empresas "campeãs", que deram com os burros n'água.
Embora fundos sejam negócios de longuíssimo prazo, há quem tema, por exemplo, que o Postalis, dos funcionários dos Correios, leve mais de uma década para zerar o prejuízo de cerca de R$ 985 milhões em 2013. Segundo o site Contas Abertas, trata-se do maior déficit (13%), em relação ao patrimônio, entre as grandes fundações. O Postalis tem o maior número de investidores do País. A instituição atribui parte do déficit (R$ 287 milhões) a discutíveis "ajustes técnicos", derivados do aumento da expectativa de vida de seus membros e da diminuição do ingresso de novos participantes.
Mas as perdas restantes de R$ 698 milhões resultaram de aplicações malfeitas. O valor nem inclui o sumiço de mais da metade dos R$ 130 milhões investidos em ações do Grupo EBX, de Eike Batista. O então diretor financeiro do Postalis, Ricardo Oliveira Azevedo, foi demitido. É de perguntar como devem ser tratados os responsáveis, no Petros, por transformar uma perda de R$ 51 milhões em um ganho de R$ 824 milhões. Assim como o Funcef, da Caixa, o Petros detém 10% do capital da Usina de Belo Monte. Só que o Funcef resolveu calcular a sua parte pelo valor de mercado, enquanto o Petros o fez pelo que poderá valer quando a usina estiver funcionando.
Trata-se de uma resposta marota ao ato do conselho fiscal que reprovou as contas segundo as quais a fundação fechou 2013 com déficit de R$ 2,8 bilhões. A criatividade amenizou o mau desempenho. Outro problema é que, pelas regras do sistema, um fundo com déficit de 10% sobre o patrimônio em dado exercício terá de apresentar, já no seguinte, um plano para sair da enrascada. O governo decidiu que, para esse fim, o déficit poderá superar 15% em 2013. Recusou-se a englobar 2015 para não deixar a impressão de que duvida da recuperação da economia até lá a ponto de o setor sair do vermelho.
Uma perversa combinação de fatores conjunturais adversos e aplicações financeiras temerárias levaram os fundos de pensão a um déficit sem precedentes da ordem de R$ 22 bilhões. Já o governo, fiel aos seus hábitos e pronto a reincidir em erros gritantes, deu de manipular regras que governam o setor, também contaminado, de resto, por manobras de contabilidade criativa - a mágica que transforma prejuízos reais em lucros cenográficos.
Os 256 fundos de previdência fechada em operação no País abrangem 6,5 milhões de pessoas, entre participantes que contribuem mensalmente para formar um pecúlio, assistidos e dependentes. Têm essa denominação porque a sua clientela se compõe exclusivamente de funcionários de empresas e membros de associações que oferecem essa modalidade de aposentadoria complementar à do INSS. Administram em conjunto um patrimônio na casa de R$ 624 bilhões, ou 14,7% do PIB nacional.
Desses ativos, 65% estão em mãos de entidades patrocinadas por empresas públicas, a começar do Previ (dos empregados do Banco do Brasil), Petros (Petrobrás) e Funcef (Caixa Econômica Federal). Os fundos das estatais, até por seu porte, respondem pelo grosso do citado déficit, que fez do ano passado o pior da história do setor, incluindo 2009, sob o impacto da crise internacional provocada pelo colapso de Wall Street, em fins do ano anterior. Para recorrer a um termo um tanto em desuso, é o caso de dizer que a situação dos fundos é periclitante. Ainda em 2012, o teto da sua meta de rentabilidade já tinha sido rebaixado de 6% para 4,5%.
Fontes da Superintendência Nacional de Previdência Complementar culpam pela explosão do déficit, em primeiro lugar, a desvalorização das aplicações em títulos prefixados. As expectativas para este ano são pessimistas - além da permanência dos fatores que derrubaram os fundos em 2013, a inflação, o desempenho da Bolsa, as incertezas diante da Copa, das eleições e do fim de um período presidencial devem dificultar a recuperação dos fundos.
Mas é preciso considerar, também, os investimentos desastrosos, feitos em obediência a instruções do governo, entre eles a capitalização das empresas "campeãs", que deram com os burros n'água.
Embora fundos sejam negócios de longuíssimo prazo, há quem tema, por exemplo, que o Postalis, dos funcionários dos Correios, leve mais de uma década para zerar o prejuízo de cerca de R$ 985 milhões em 2013. Segundo o site Contas Abertas, trata-se do maior déficit (13%), em relação ao patrimônio, entre as grandes fundações. O Postalis tem o maior número de investidores do País. A instituição atribui parte do déficit (R$ 287 milhões) a discutíveis "ajustes técnicos", derivados do aumento da expectativa de vida de seus membros e da diminuição do ingresso de novos participantes.
Mas as perdas restantes de R$ 698 milhões resultaram de aplicações malfeitas. O valor nem inclui o sumiço de mais da metade dos R$ 130 milhões investidos em ações do Grupo EBX, de Eike Batista. O então diretor financeiro do Postalis, Ricardo Oliveira Azevedo, foi demitido. É de perguntar como devem ser tratados os responsáveis, no Petros, por transformar uma perda de R$ 51 milhões em um ganho de R$ 824 milhões. Assim como o Funcef, da Caixa, o Petros detém 10% do capital da Usina de Belo Monte. Só que o Funcef resolveu calcular a sua parte pelo valor de mercado, enquanto o Petros o fez pelo que poderá valer quando a usina estiver funcionando.
Trata-se de uma resposta marota ao ato do conselho fiscal que reprovou as contas segundo as quais a fundação fechou 2013 com déficit de R$ 2,8 bilhões. A criatividade amenizou o mau desempenho. Outro problema é que, pelas regras do sistema, um fundo com déficit de 10% sobre o patrimônio em dado exercício terá de apresentar, já no seguinte, um plano para sair da enrascada. O governo decidiu que, para esse fim, o déficit poderá superar 15% em 2013. Recusou-se a englobar 2015 para não deixar a impressão de que duvida da recuperação da economia até lá a ponto de o setor sair do vermelho.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
“Lula precisa dar satisfação sobre a governança da Petrobras”
Aécio Naves (PSDB) lembrando que refinaria superfaturada ocorreu no governo Lula
ITAMARATY IGNORA SEGURANÇA E ESCANCARA O BRASIL
Não bastasse a entrada desenfreada de haitianos, o Itamaraty resolveu fazer a festa de movimentos como Al-Qaeda e assemelhados, abrindo as porteiras para que se mudem de mala e cuia para cá: às vésperas da Copa e das Olimpíadas, instruiu embaixadas e consulados a darem vistos – sem consulta prévia ao Brasil – para nacionais do Afeganistão, Irã, Iraque, Jordânia, Líbano, Líbia, Palestina, Paquistão e Síria.
A CIRCULAR DO RISCO
A ordem do Itamaraty, liberando vistos em regiões tomadas por grupos terroristas, está na circular telegráfica nº 94.443/375, de 7 de maio.
IRRESPONSABILIDADE
O “liberou geral” do Itamaraty, em áreas críticas de segurança, é ainda mais leviano pela falta de estrutura para analisar pedidos de vistos.
ONDE MORA O PERIGO
Sem estrutura nem pessoal qualificado, embaixadas e consulados se valem de contratados locais para analisar a concessão de visto.
SABE DE NADA, INOCENTE
A Secretaria de Segurança para Grandes Eventos do Ministério da Justiça diz que nada sabe sobre a porteira escancarada pelo Itamaraty.
‘CONTRABANDO’ EM MP DÁ à HYUNDAI R$ 1 BI POR ANO
Nesta terça (13), último dia para sancionar (ou vetar) a Medida Provisória 627 e todos os seus “contrabandos”, a presidente Dilma está na iminência de beneficiar mais uma vez o Grupo Caoa Hyundai, e sua fábrica em Anápolis (GO). Segundo a MP 627, o governo abriria mão de mais de R$ 1 bilhão anuais em impostos, por mais cinco anos. Desde 2010, a Hyundai é beneficiada pela isenção, que deveria acabar em 31 de dezembro de 2015. A MP estende a moleza até 2020.
PRAZO FATAL
Se o Diário Oficial não publicar nesta quarta a MP 627, sancionada ou vetada, ela vira lei. E torna alguns políticos ainda mais ricos.
O MESMO DE NOVO
É a segunda vez que a Lei 9.826/99 é alterada. O texto original previa prazo até 2010, mas foi estendido para 2015, a oito meses do prazo.
MP S/A
A MP 627 tem “contrabandos” como isenção de impostos para remessa de dinheiro ao exterior e até anistia de multas dos planos de saúde.
VATAPÁ VERGONHOSO
Alvo do Conselho Nacional de Justiça por ter se tornado efetiva sem concurso, a mulher do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), Fátima Mendonça, se aposentou no Tribunal de Justiça. Trabalhar, dizem na Bahia, nunca foi seu forte. Ganhava quase R$ 15 mil.
LANCE ALTO
Assediado para apoiar Luiz Pezão (PMDB) ao governo do Rio, Miro Teixeira (PROS) pode ganhar a Secretaria de Educação. Mas já sinalizou que não está muito disposto a negociar com o PMDB cabralino.
A MÃE NA RODA
O eterno presidenciável Levy Fidelix é alvo de ação no TJ-DF por ter nomeado a mãe Lecy de Araújo Fidelix como tesoureira do PRTB, sem sequer ser filiada ao partido. Estranha-se a demora no julgamento.
SUPRAPARTIDÁRIO
Desembargador federal em Brasília, mais votado em lista tríplice para o Superior Tribunal de Justiça, Reynaldo Fonseca tem a torcida de dois conterrâneos maranhenses que se digladiam na política: senador José Sarney (PMDB-AP) e Flávio Dino (PCdoB), candidato a governador.
BB DE BAGUNÇA BRASIL
O Brasil é mesmo uma bagunça: candidatos ao concurso da Cobra Tecnologia, que faz parte de uma subsidiária do Banco do Brasil, a BB Tecnologia, têm que pagar o boleto da inscrição... no banco Santander.
BONITINHA, MAS...
A nova marca dos Correios até que ficou bonitinha, mas os serviços da estatal continuam ordinários: exemplo de eficiência anos atrás, hoje entrega cartas simples com até um mês de atraso. Às vezes, dois.
ESTRATÉGIAS
A executiva nacional do PSB se reúne nesta terça (13) em Brasília para discutir datas de convenções e para unificar discurso sobre candidatura de Eduardo Campos a presidente, após as últimas pesquisas.
CUIDADO QUE EU APITO!
Virou piada nas redes sociais a campanha Vizinhança Solidária, da Secretaria de Segurança Pública do Acre, que distribuiu apitos para as pessoas pedirem ajuda dos vizinhos quando estiverem em apuros.
PENSANDO BEM...
...o “trabalho externo” do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares acabou virando piada de salão.
PODER SEM PUDOR
LEI REVOGÁVEL
Getúlio Vargas estava fora do poder, mas conservava apoio majoritário no Rio Grande do Sul. Em 1948, no interior, a Câmara Municipal recebeu um engenheiro para explicar a construção de uma ponte:
- A obra será em concreto, com três pilares.
- E se fizermos com dois pilares? - perguntou um vereador.
- E se fizermos com apenas um pilar? - quis saber outro.
- Não é possível por causa da Lei da Gravidade - descartou o técnico.
- Mas, tchê, nós semo maioria e derrubamo essa tal Lei da Gravidade.
Um terceiro vereador ponderou, liquidando o assunto:
- Essa lei é do Getúlio Vargas e nós não vamos mexer naquilo que o homem fez...
A ponte foi construída sobre três pilares.
Aécio Naves (PSDB) lembrando que refinaria superfaturada ocorreu no governo Lula
ITAMARATY IGNORA SEGURANÇA E ESCANCARA O BRASIL
Não bastasse a entrada desenfreada de haitianos, o Itamaraty resolveu fazer a festa de movimentos como Al-Qaeda e assemelhados, abrindo as porteiras para que se mudem de mala e cuia para cá: às vésperas da Copa e das Olimpíadas, instruiu embaixadas e consulados a darem vistos – sem consulta prévia ao Brasil – para nacionais do Afeganistão, Irã, Iraque, Jordânia, Líbano, Líbia, Palestina, Paquistão e Síria.
A CIRCULAR DO RISCO
A ordem do Itamaraty, liberando vistos em regiões tomadas por grupos terroristas, está na circular telegráfica nº 94.443/375, de 7 de maio.
IRRESPONSABILIDADE
O “liberou geral” do Itamaraty, em áreas críticas de segurança, é ainda mais leviano pela falta de estrutura para analisar pedidos de vistos.
ONDE MORA O PERIGO
Sem estrutura nem pessoal qualificado, embaixadas e consulados se valem de contratados locais para analisar a concessão de visto.
SABE DE NADA, INOCENTE
A Secretaria de Segurança para Grandes Eventos do Ministério da Justiça diz que nada sabe sobre a porteira escancarada pelo Itamaraty.
‘CONTRABANDO’ EM MP DÁ à HYUNDAI R$ 1 BI POR ANO
Nesta terça (13), último dia para sancionar (ou vetar) a Medida Provisória 627 e todos os seus “contrabandos”, a presidente Dilma está na iminência de beneficiar mais uma vez o Grupo Caoa Hyundai, e sua fábrica em Anápolis (GO). Segundo a MP 627, o governo abriria mão de mais de R$ 1 bilhão anuais em impostos, por mais cinco anos. Desde 2010, a Hyundai é beneficiada pela isenção, que deveria acabar em 31 de dezembro de 2015. A MP estende a moleza até 2020.
PRAZO FATAL
Se o Diário Oficial não publicar nesta quarta a MP 627, sancionada ou vetada, ela vira lei. E torna alguns políticos ainda mais ricos.
O MESMO DE NOVO
É a segunda vez que a Lei 9.826/99 é alterada. O texto original previa prazo até 2010, mas foi estendido para 2015, a oito meses do prazo.
MP S/A
A MP 627 tem “contrabandos” como isenção de impostos para remessa de dinheiro ao exterior e até anistia de multas dos planos de saúde.
VATAPÁ VERGONHOSO
Alvo do Conselho Nacional de Justiça por ter se tornado efetiva sem concurso, a mulher do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), Fátima Mendonça, se aposentou no Tribunal de Justiça. Trabalhar, dizem na Bahia, nunca foi seu forte. Ganhava quase R$ 15 mil.
LANCE ALTO
Assediado para apoiar Luiz Pezão (PMDB) ao governo do Rio, Miro Teixeira (PROS) pode ganhar a Secretaria de Educação. Mas já sinalizou que não está muito disposto a negociar com o PMDB cabralino.
A MÃE NA RODA
O eterno presidenciável Levy Fidelix é alvo de ação no TJ-DF por ter nomeado a mãe Lecy de Araújo Fidelix como tesoureira do PRTB, sem sequer ser filiada ao partido. Estranha-se a demora no julgamento.
SUPRAPARTIDÁRIO
Desembargador federal em Brasília, mais votado em lista tríplice para o Superior Tribunal de Justiça, Reynaldo Fonseca tem a torcida de dois conterrâneos maranhenses que se digladiam na política: senador José Sarney (PMDB-AP) e Flávio Dino (PCdoB), candidato a governador.
BB DE BAGUNÇA BRASIL
O Brasil é mesmo uma bagunça: candidatos ao concurso da Cobra Tecnologia, que faz parte de uma subsidiária do Banco do Brasil, a BB Tecnologia, têm que pagar o boleto da inscrição... no banco Santander.
BONITINHA, MAS...
A nova marca dos Correios até que ficou bonitinha, mas os serviços da estatal continuam ordinários: exemplo de eficiência anos atrás, hoje entrega cartas simples com até um mês de atraso. Às vezes, dois.
ESTRATÉGIAS
A executiva nacional do PSB se reúne nesta terça (13) em Brasília para discutir datas de convenções e para unificar discurso sobre candidatura de Eduardo Campos a presidente, após as últimas pesquisas.
CUIDADO QUE EU APITO!
Virou piada nas redes sociais a campanha Vizinhança Solidária, da Secretaria de Segurança Pública do Acre, que distribuiu apitos para as pessoas pedirem ajuda dos vizinhos quando estiverem em apuros.
PENSANDO BEM...
...o “trabalho externo” do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares acabou virando piada de salão.
PODER SEM PUDOR
LEI REVOGÁVEL
Getúlio Vargas estava fora do poder, mas conservava apoio majoritário no Rio Grande do Sul. Em 1948, no interior, a Câmara Municipal recebeu um engenheiro para explicar a construção de uma ponte:
- A obra será em concreto, com três pilares.
- E se fizermos com dois pilares? - perguntou um vereador.
- E se fizermos com apenas um pilar? - quis saber outro.
- Não é possível por causa da Lei da Gravidade - descartou o técnico.
- Mas, tchê, nós semo maioria e derrubamo essa tal Lei da Gravidade.
Um terceiro vereador ponderou, liquidando o assunto:
- Essa lei é do Getúlio Vargas e nós não vamos mexer naquilo que o homem fez...
A ponte foi construída sobre três pilares.