FOLHA DE SP - 24/03
Estamos quase lá: os europeus se preparam para discutir se as crianças têm sexo
A comunidade europeia, essa reunião de países cheios de gente mimada, anda querendo discutir se é certo tratar uma criança quando é pequena de menino ou menina. O debate, é evidente, é coisa de gente riquinha que acaba levando a sério delírios da chamada teoria de gênero, essa invenção de professores desocupados com problemas de identidade sexual.
De fato, desse jeito, parece que a Europa ocidental acabou mesmo. As escolas europeias, se essa ideia idiota passar, vão virar um antro de "autoritarismo de gênero".
Nesse sentido, Putin talvez esteja fazendo um favor aos europeus, lembrando a eles que existe um mundo de preocupações reais, e não os debates idiotas sobre se meninos são meninos e meninas são meninas ou se tudo isso é uma invenção humana como o "croissant".
Nesse cenário, cabe bem o Obama, que, sendo um presidente pop das redes sociais, deve ter mandando um WhatsApp para o Putin protestando contra a anexação da Crimeia pelos russos, coisa que o russos têm todo o direito de fazer e que a maioria esmagadora da população da Crimeia deseja.
Imagino que Obama, cuja única competência é ser o primeiro presidente negro dos EUA (uma grande coisa, sem dúvida), deve ter posto na sua página do "Face" grandes bravatas dizendo que ia fazer isso e aquilo e colocar o Putin no seu lugar. Na verdade, quem colocou quem aqui no "seu lugar"? O Putin é que colocou a série toda de líderes ocidentais nos seus lugares, porque estes, viciados em discutir como a vida é uma "agência de direitos chiques", enquanto comem queijos e vinhos, se esqueceram de que a vida é o que acontece quando você está ocupado delirando com seus sonhos de Branca de Neve.
Putin é um choque de realidade na sociedade fútil em que se transformou a Europa ocidental, banhada em "direitos" que custam muito caro.
Voltando à discussão sobre o sexo das crianças. Chocante é como muitos psicólogos, contaminados pela ideia de que construímos sujeitos socialmente, se deixam levar por essa bobagem do tamanho de um bonde cheio de bobos. O fato de que existam gays e lésbicas, e que estes tenham, sim, direito de viver como todo mundo, não implica o direito de teóricos autoritários começarem a legislar sobre a sexualidade de um monte de crianças "avant la lettre".
Imagino que, se essa lei pegar, o número de crianças com problemas de identidade no futuro da Europa será enorme; mas tudo bem, porque o Estado de bem-estar social (esse personagem de um conto de fadas) vai garantir terapia para todo mundo. Levar um debate desses a sério beira as raias da pura e simples irresponsabilidade moral.
Voltando à Rússia. Desde, no mínimo, o século 19 (vemos isso, por exemplo, nos debates na imprensa russa, debates esses do qual fez parte gente de peso como Dostoiévski, Turguêniev e Tolstói), a Rússia se vê como uma nação que deve cuidar de si mesma para não se transformar no fantasma de si mesma que virou a Europa, bêbada com o que alguns filósofos e similares inventaram para combater o tédio.
Um amigo meu, discutindo esse projeto de lei estúpido, fez uma bela analogia. Sabemos que Francis Bacon, entre outros (o louquinho do Giordano Bruno também fez essa crítica, mas a usou para seus delírios metafísicos inócuos), criticou duramente o que se convencionou chamar em história da filosofia de "baixa escolástica".
A escolástica foi um tipo de prática filosófica muito comum na Idade Média, que buscava racionalizar todo o conhecimento a partir de enunciados lógicos sistemáticos que supostamente esgotariam a totalidade da realidade, inclusive a metafísica. Grandes figuras desse período, como Tomás de Aquino, foram escolásticos.
A "baixa escolástica" é a marca da decadência da escolástica, que por sua vez representou a decadência da Europa medieval e metafísica pré-científica e burguesa.
Os escolásticos decadentes, para Bacon, discutiam coisas como "quando um homem puxa um burro, é ele quem puxa ou a corda?". Ou: "Teriam os anjos sexo?".
Estamos quase lá: os europeus se preparam para discutir se as crianças têm sexo. A Europa precisa muito de Putin.
segunda-feira, março 24, 2014
Tolerância - DENIS LERRER ROSENFIELD
O GLOBO - 24/03
Os costumes se alteram e, com eles, certas noções corriqueiras do bem e do mal, do vício e da virtude. Comportamentos que eram considerados como “maus” tornam-se socialmente aceitos, enquanto outros que eram admitidos já não são mais compartilhados.
Processos desse tipo são inerentes ao desenvolvimento das sociedades. Daí não se segue, porém, que o “novo” seja melhor do que o “velho” ou que haja necessariamente “progresso” nessas mutações. Devemos ter o maior cuidado em não identificar o último na ordem do tempo como o melhor para a sociedade no seu conjunto.
O Brasil vive um momento particularmente interessante de sua história, em uma espécie de frenesi pelo novo que ganha os contornos de uma realização do “bem”. A predominância do politicamente correto funciona como um tipo de parâmetro que deveria ser universalmente válido, como se as pessoas não fossem mais capazes de fazer por sua própria conta aquilo que consideram o melhor para si ou para a sociedade no seu conjunto. Impera o comportamento da emulação, a repetição do que vem a ser tido como socialmente aceitável.
Dentre essas transformações dos costumes, tem ganho especial relevância em certos formadores de opinião diferentes pressões para a legalização da maconha, como se tal medida fosse capaz de reduzir o mercado ilegal desse produto. Mais do que isto, começam a surgir argumentos de outro tipo, como os dos seus supostos benefícios para a saúde, segundo hipotéticos estudos científicos.
Aliás, torna-se uma prática corrente nos meios jornalísticos considerar uma mera hipótese de trabalho como se fosse uma verdade definitiva. Ato seguinte, os defensores políticos dessas ideias passam a propagar tal “verdade” como se fosse “científica”. Trata-se, na verdade, de uma empulhação.
Exemplos começam a se multiplicar. O Uruguai passou a ser considerado um país “progressista” por ter legalizado o consumo da maconha, abrindo as portas para que o seu comércio torne-se algo legal. Neste sentido, esse país representaria o “progresso”, enquanto os seus adversários seriam a concretização do “atraso”. O respaldo é ainda reforçado por modificações legislativas ocorridas em alguns estados americanos, como se estivéssemos diante de algo inexorável.
Inexorável talvez seja a tendência hoje vigente de considerar qualquer mudança nos costumes como sendo a encarnação do bem. A questão que se coloca é a de se uma maior tolerância ao consumo de drogas como a maconha deva se traduzir por sua liberação. Uma coisa consiste em a sociedade aceitar certos comportamentos como nocivos, sem se preocupar demasiado em coibi-los, uma vez que toda sociedade deveria ser capaz de conviver com a diferença e, mesmo, com comportamentos desviantes em relação aos padrões usualmente aceitos.
Uma repressão muito forte pode dar ensejo a formas violentas de reação. Uma tolerância indiscriminada pode levar à contaminação de toda a sociedade. Os extremos devem ser evitados. Já dizia Aristóteles que a virtude reside no termo médio.
Ocorre que esse tipo de acolhimento do “novo” e da “diferença” é fortemente contrastado com a condenação de outros comportamentos como os do fumo e do consumo de bebidas alcoólicas. É, deveras, curioso. Os que defendem o consumo da maconha agora começam a apregoar que ela é menos nociva do que o consumo do tabaco e do álcool. Logo, ela deveria ser mais bem favorecida!
Observem o paradoxo. A maconha deveria ter o seu consumo legalizado, aí, portanto, incluindo a sua produção e comércio. Deveriam os produtores e comerciantes pagar impostos, o que, na visão dos seus defensores, reduziria, senão eliminaria, o tráfico de drogas, pelo menos deste tipo de droga. A tolerância seria implementada, ainda segundo os mesmos defensores, com o reconhecimento da “diferença”.
Contudo, a mesma ideia de tolerância não é aplicada ao tabaco e ao álcool, cada vez mais tidos por um problema comportamental e de saúde pública que deveria ser equacionado. E equacionado sob o modo de campanhas que só têm se intensificado, aumentando, inclusive, a sua tributação.
O caso particularmente paradigmático é o do tabaco. O seu consumo e a sua produção, que envolve 160 milhões de agricultores familiares, estão sendo desestimulados mediante políticas frequentemente coercitivas. É como se o comportamento saudável devesse ser imposto pelo Estado, restando aos indivíduos apenas a obediência e a tutela, como se fossem incapazes de decidirem por si mesmo. Qual é o problema de uma pessoa que gosta de fumar e beber? Não é a livre escolha uma opção sua? Será que as pessoas necessitam de controladores de consciência?
O contraste é ainda mais acentuado entre a maconha e o tabaco. Enquanto se procura legalizar a primeira, tornando o seu consumo um negócio como qualquer outro, passando o tráfico a mudar de natureza, sendo um produto comercializável, faz-se o processo inverso no que diz respeito ao segundo desses produtos.
O tabaco passa a ser fortemente tributado, criando um mercado negro, o do contrabando, que hoje já representa 30% do mercado total. Empregos estão sendo perdidos. O que antes era tido como tráfico passa a ser considerado como “legal”, enquanto o que era e é legal passa a ser objeto de “contrabando”, comércio ilegal, que só favorece, na verdade, o Paraguai. O consumo de álcool, a continuar essa tendência, seguirá pelo mesmo caminho.
Tudo isto se deve a uma espécie de cruzada do politicamente correto. Este toma o que considera “bom” ou “progressista” como algo que deve ser simplesmente imposto aos que não querem seguir a nova forma de “virtude”.
Bernard de Mandeville, célebre libertário do século XVII, naquele então denominado de libertino, já advertia contra os reformadores sociais, os reformadores dos costumes, que, em nome da virtude, terminavam produzindo formas de desestruturação econômica e social. A imposição do bem pode produzir daninhas consequências. É a marcha da intolerância.
Os costumes se alteram e, com eles, certas noções corriqueiras do bem e do mal, do vício e da virtude. Comportamentos que eram considerados como “maus” tornam-se socialmente aceitos, enquanto outros que eram admitidos já não são mais compartilhados.
Processos desse tipo são inerentes ao desenvolvimento das sociedades. Daí não se segue, porém, que o “novo” seja melhor do que o “velho” ou que haja necessariamente “progresso” nessas mutações. Devemos ter o maior cuidado em não identificar o último na ordem do tempo como o melhor para a sociedade no seu conjunto.
O Brasil vive um momento particularmente interessante de sua história, em uma espécie de frenesi pelo novo que ganha os contornos de uma realização do “bem”. A predominância do politicamente correto funciona como um tipo de parâmetro que deveria ser universalmente válido, como se as pessoas não fossem mais capazes de fazer por sua própria conta aquilo que consideram o melhor para si ou para a sociedade no seu conjunto. Impera o comportamento da emulação, a repetição do que vem a ser tido como socialmente aceitável.
Dentre essas transformações dos costumes, tem ganho especial relevância em certos formadores de opinião diferentes pressões para a legalização da maconha, como se tal medida fosse capaz de reduzir o mercado ilegal desse produto. Mais do que isto, começam a surgir argumentos de outro tipo, como os dos seus supostos benefícios para a saúde, segundo hipotéticos estudos científicos.
Aliás, torna-se uma prática corrente nos meios jornalísticos considerar uma mera hipótese de trabalho como se fosse uma verdade definitiva. Ato seguinte, os defensores políticos dessas ideias passam a propagar tal “verdade” como se fosse “científica”. Trata-se, na verdade, de uma empulhação.
Exemplos começam a se multiplicar. O Uruguai passou a ser considerado um país “progressista” por ter legalizado o consumo da maconha, abrindo as portas para que o seu comércio torne-se algo legal. Neste sentido, esse país representaria o “progresso”, enquanto os seus adversários seriam a concretização do “atraso”. O respaldo é ainda reforçado por modificações legislativas ocorridas em alguns estados americanos, como se estivéssemos diante de algo inexorável.
Inexorável talvez seja a tendência hoje vigente de considerar qualquer mudança nos costumes como sendo a encarnação do bem. A questão que se coloca é a de se uma maior tolerância ao consumo de drogas como a maconha deva se traduzir por sua liberação. Uma coisa consiste em a sociedade aceitar certos comportamentos como nocivos, sem se preocupar demasiado em coibi-los, uma vez que toda sociedade deveria ser capaz de conviver com a diferença e, mesmo, com comportamentos desviantes em relação aos padrões usualmente aceitos.
Uma repressão muito forte pode dar ensejo a formas violentas de reação. Uma tolerância indiscriminada pode levar à contaminação de toda a sociedade. Os extremos devem ser evitados. Já dizia Aristóteles que a virtude reside no termo médio.
Ocorre que esse tipo de acolhimento do “novo” e da “diferença” é fortemente contrastado com a condenação de outros comportamentos como os do fumo e do consumo de bebidas alcoólicas. É, deveras, curioso. Os que defendem o consumo da maconha agora começam a apregoar que ela é menos nociva do que o consumo do tabaco e do álcool. Logo, ela deveria ser mais bem favorecida!
Observem o paradoxo. A maconha deveria ter o seu consumo legalizado, aí, portanto, incluindo a sua produção e comércio. Deveriam os produtores e comerciantes pagar impostos, o que, na visão dos seus defensores, reduziria, senão eliminaria, o tráfico de drogas, pelo menos deste tipo de droga. A tolerância seria implementada, ainda segundo os mesmos defensores, com o reconhecimento da “diferença”.
Contudo, a mesma ideia de tolerância não é aplicada ao tabaco e ao álcool, cada vez mais tidos por um problema comportamental e de saúde pública que deveria ser equacionado. E equacionado sob o modo de campanhas que só têm se intensificado, aumentando, inclusive, a sua tributação.
O caso particularmente paradigmático é o do tabaco. O seu consumo e a sua produção, que envolve 160 milhões de agricultores familiares, estão sendo desestimulados mediante políticas frequentemente coercitivas. É como se o comportamento saudável devesse ser imposto pelo Estado, restando aos indivíduos apenas a obediência e a tutela, como se fossem incapazes de decidirem por si mesmo. Qual é o problema de uma pessoa que gosta de fumar e beber? Não é a livre escolha uma opção sua? Será que as pessoas necessitam de controladores de consciência?
O contraste é ainda mais acentuado entre a maconha e o tabaco. Enquanto se procura legalizar a primeira, tornando o seu consumo um negócio como qualquer outro, passando o tráfico a mudar de natureza, sendo um produto comercializável, faz-se o processo inverso no que diz respeito ao segundo desses produtos.
O tabaco passa a ser fortemente tributado, criando um mercado negro, o do contrabando, que hoje já representa 30% do mercado total. Empregos estão sendo perdidos. O que antes era tido como tráfico passa a ser considerado como “legal”, enquanto o que era e é legal passa a ser objeto de “contrabando”, comércio ilegal, que só favorece, na verdade, o Paraguai. O consumo de álcool, a continuar essa tendência, seguirá pelo mesmo caminho.
Tudo isto se deve a uma espécie de cruzada do politicamente correto. Este toma o que considera “bom” ou “progressista” como algo que deve ser simplesmente imposto aos que não querem seguir a nova forma de “virtude”.
Bernard de Mandeville, célebre libertário do século XVII, naquele então denominado de libertino, já advertia contra os reformadores sociais, os reformadores dos costumes, que, em nome da virtude, terminavam produzindo formas de desestruturação econômica e social. A imposição do bem pode produzir daninhas consequências. É a marcha da intolerância.
Finalmente um diagnóstico correto - LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
VALOR ECONÔMICO - 24/03
Os jornalistas Cristiano Romero e Angela Bittencourt do Valor ouviram membros importantes da equipe econômica do governo Dilma e reproduziram uma detalhada análise do estágio atual da economia brasileira. Pela primeira vez estou totalmente de acordo com a avaliação da equipe econômica. Aliás, em várias colunas que escrevi para o Valor ao longo do ano passado, chamei a atenção para as razões pelas quais o modelo de gestão da economia nos governos petistas anteriores não poderia ser repetido. A maioria de meus argumentos e conclusões está alinhada com a matéria citada acima.
Aprendi com um antigo professor da Poli que a solução de qualquer problema começa - e depende - de uma análise correta e detalhada de suas características e causas. Seu conselho era sempre o de que a primeira fase, ao se enfrentar um problema, exigia uma resposta correta à questão "Qual é o problema que temos que resolver?". Se fizermos esta pergunta sobre a situação conjuntural da economia brasileira hoje as respostas dadas pela equipe econômica são corretas.
Pouco antes da citada coluna do Valor, o professor Edmar Bacha, em entrevista ao "Estadão", tinha construído uma linha de raciocínio muito semelhante à que sabemos hoje ser a posição de setores importantes do governo. Essa convergência de diagnóstico - mas não de soluções - fica ainda mais importante na medida em que as pesquisas de opinião pública mostram que mais de 65% da população quer mudanças no próximo mandato presidencial. Está aberta, portanto, a temporada das propostas de cada lado.
Gostaria de participar deste debate trazendo um pouco de minha experiência durante o primeiro mandato de FHC. Aprendi - principalmente no convívio com meu grande amigo Sérgio Mota - a respeitar os contornos políticos e de opinião pública na hora de definir alguma ação estrutural do governo, principalmente no campo da economia. Ele sempre dizia que para uma ação ser viável é preciso levar em consideração certas restrições que refletem o momento que vive a sociedade, ou, como ele dizia no seu jeito muito pessoal, é preciso levar o povo em consideração.
Neste sentido, de ouvir o povo, uma limitação que precisamos considerar hoje é que não existe, na sociedade, o mesmo sentimento de ansiedade que havia quando o Plano Real foi implantado. E precisamos lembrar que, muito do sucesso do Plano Real se deve ao fato de que a grande maioria dos brasileiros queria - desesperadamente - que ele desse certo. Isto não existe hoje e as medidas a serem definidas não podem representar uma redução importante e imediata do padrão de vida do brasileiro, principalmente na classe média emergente que foi criada ao longo dos últimos anos. Esta é uma limitação que precisa ser considerada por aqueles que vão desenhar os planos econômicos dos candidatos que vão enfrentar a opinião pública.
"Poucas e boas" me parece ser uma boa imagem para descrever a necessidade atual. Neste sentido sugiro que as medidas mais urgentes, principalmente na redução da carga tributária, sejam concentradas na indústria, para recolocá-la em condições de crescer novamente. Agricultura e o setor de serviços estão mais protegidos e podem ficar para uma segunda geração de medidas, no lado da oferta, que se fazem necessárias hoje. Neste sentido, as duas ações imediatas mais importantes seriam: redução em 30% da carga tributária que incide sobre a indústria e retirada da legislação de todos os penduricalhos colocados para capturar recursos "parafiscais" via atividade industrial.
Em relação à redução da carga tributária o melhor caminho seria a eliminação do PIS/Cofins, que é de longe o imposto mais agressivo à competitividade da indústria. Pelos meus dados, as duas podem ser eliminadas. No caso dos penduricalhos, que tem na multa que as empresas são obrigadas a pagar nos casos de demissão com justa causa - e que vão financiar parte do programa Minha Casa Minha Vida - seu melhor exemplo, será necessária uma lição de casa bem feita para elencá-los todos.
A questão que certamente o leitor vai colocar neste momento é como financiar a redução de 30% da carga tributária da indústria, principalmente via eliminação do PIS/Cofins e que deve representar cerca de 3% do PIB. Sem ter chegado ao nível do detalhe, alinho três possíveis fontes de financiamento: a primeira e a mais lógica seria uma redução importante das contribuições das empresas industriais aos órgãos patronais como Sesi e Senai. Reganhar competitividade é mais importante que financiar cursos e mordomias.
Uma segunda fonte de contribuição viria de um programa de redução de gastos do governo previamente identificados no orçamento federal. Com esta redução, o Tesouro poderia aumentar sua contribuição para o financiamento da previdência pública. Finalmente, poderíamos ter uma taxa de contribuição social a ser cobrada sobre os dividendos pagos pelas empresas industriais a seus acionistas. Afinal serão eles os grandes beneficiários do alívio importante da carga tributária de suas empresas.
Os jornalistas Cristiano Romero e Angela Bittencourt do Valor ouviram membros importantes da equipe econômica do governo Dilma e reproduziram uma detalhada análise do estágio atual da economia brasileira. Pela primeira vez estou totalmente de acordo com a avaliação da equipe econômica. Aliás, em várias colunas que escrevi para o Valor ao longo do ano passado, chamei a atenção para as razões pelas quais o modelo de gestão da economia nos governos petistas anteriores não poderia ser repetido. A maioria de meus argumentos e conclusões está alinhada com a matéria citada acima.
Aprendi com um antigo professor da Poli que a solução de qualquer problema começa - e depende - de uma análise correta e detalhada de suas características e causas. Seu conselho era sempre o de que a primeira fase, ao se enfrentar um problema, exigia uma resposta correta à questão "Qual é o problema que temos que resolver?". Se fizermos esta pergunta sobre a situação conjuntural da economia brasileira hoje as respostas dadas pela equipe econômica são corretas.
Pouco antes da citada coluna do Valor, o professor Edmar Bacha, em entrevista ao "Estadão", tinha construído uma linha de raciocínio muito semelhante à que sabemos hoje ser a posição de setores importantes do governo. Essa convergência de diagnóstico - mas não de soluções - fica ainda mais importante na medida em que as pesquisas de opinião pública mostram que mais de 65% da população quer mudanças no próximo mandato presidencial. Está aberta, portanto, a temporada das propostas de cada lado.
Gostaria de participar deste debate trazendo um pouco de minha experiência durante o primeiro mandato de FHC. Aprendi - principalmente no convívio com meu grande amigo Sérgio Mota - a respeitar os contornos políticos e de opinião pública na hora de definir alguma ação estrutural do governo, principalmente no campo da economia. Ele sempre dizia que para uma ação ser viável é preciso levar em consideração certas restrições que refletem o momento que vive a sociedade, ou, como ele dizia no seu jeito muito pessoal, é preciso levar o povo em consideração.
Neste sentido, de ouvir o povo, uma limitação que precisamos considerar hoje é que não existe, na sociedade, o mesmo sentimento de ansiedade que havia quando o Plano Real foi implantado. E precisamos lembrar que, muito do sucesso do Plano Real se deve ao fato de que a grande maioria dos brasileiros queria - desesperadamente - que ele desse certo. Isto não existe hoje e as medidas a serem definidas não podem representar uma redução importante e imediata do padrão de vida do brasileiro, principalmente na classe média emergente que foi criada ao longo dos últimos anos. Esta é uma limitação que precisa ser considerada por aqueles que vão desenhar os planos econômicos dos candidatos que vão enfrentar a opinião pública.
"Poucas e boas" me parece ser uma boa imagem para descrever a necessidade atual. Neste sentido sugiro que as medidas mais urgentes, principalmente na redução da carga tributária, sejam concentradas na indústria, para recolocá-la em condições de crescer novamente. Agricultura e o setor de serviços estão mais protegidos e podem ficar para uma segunda geração de medidas, no lado da oferta, que se fazem necessárias hoje. Neste sentido, as duas ações imediatas mais importantes seriam: redução em 30% da carga tributária que incide sobre a indústria e retirada da legislação de todos os penduricalhos colocados para capturar recursos "parafiscais" via atividade industrial.
Em relação à redução da carga tributária o melhor caminho seria a eliminação do PIS/Cofins, que é de longe o imposto mais agressivo à competitividade da indústria. Pelos meus dados, as duas podem ser eliminadas. No caso dos penduricalhos, que tem na multa que as empresas são obrigadas a pagar nos casos de demissão com justa causa - e que vão financiar parte do programa Minha Casa Minha Vida - seu melhor exemplo, será necessária uma lição de casa bem feita para elencá-los todos.
A questão que certamente o leitor vai colocar neste momento é como financiar a redução de 30% da carga tributária da indústria, principalmente via eliminação do PIS/Cofins e que deve representar cerca de 3% do PIB. Sem ter chegado ao nível do detalhe, alinho três possíveis fontes de financiamento: a primeira e a mais lógica seria uma redução importante das contribuições das empresas industriais aos órgãos patronais como Sesi e Senai. Reganhar competitividade é mais importante que financiar cursos e mordomias.
Uma segunda fonte de contribuição viria de um programa de redução de gastos do governo previamente identificados no orçamento federal. Com esta redução, o Tesouro poderia aumentar sua contribuição para o financiamento da previdência pública. Finalmente, poderíamos ter uma taxa de contribuição social a ser cobrada sobre os dividendos pagos pelas empresas industriais a seus acionistas. Afinal serão eles os grandes beneficiários do alívio importante da carga tributária de suas empresas.
O mito do corte de gastos - CLAUDIO ADILSON GONÇALEZ
O Estado de S.Paulo - 24/03
Todo mês de fevereiro, não falha. Com mais regularidade do que o carnaval - dado que este às vezes teima em cair em março, para atrapalhar o ano letivo e confundir os modelos de dessazonalização -, o governo edita seu decreto de reprogramação orçamentária, impropriamente conhecido como contingenciamento. Com a mesma regularidade a imprensa, mesmo a especializada, e até alguns analistas chamam isso de corte de gastos.
Na verdade, como o próprio nome diz, o decreto de reprogramação é mera reestimativa das receitas e das despesas do Orçamento federal. Tradicionalmente, o Congresso Nacional infla as receitas com o objetivo de gerar espaço para incluir emendas parlamentares, sem afetar, teoricamente, a meta de superávit primário estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O Executivo, por sua vez, retira os excessos introduzidos pelo Congresso nos dois lados do Orçamento e emite o decreto de reprogramação.
Observe-se que não há qualquer tipo de corte. Cortar despesas seria gastar menos do que vinha sendo gasto, por exemplo, em relação ao exercício anterior. E isso não acontece no Brasil há muitos anos, e tampouco ocorrerá em 2014. O decepcionante resultado primário (antes da dedução das despesas com juros) relativo ao mês de janeiro último e o quase certo elevado déficit no mês de fevereiro já demonstram como é implausível a meta de superávit primário consolidado para todo o setor público, de 1,9% do PIB, prometida pelo ministro da Fazenda.
É interessante destacar que a reprogramação não é uma estimativa convencional, que embute certo grau de incerteza, para baixo ou para cima. Na reprogramação orçamentária o superávit estimado é um teto. Se a receita efetiva ficar acima da prevista, o governo (com raríssimas exceções) anulará, parcial ou totalmente, os contingenciamentos, ou seja, aumentará os gastos, em vez de entregar um superávit maior. Por outro lado, na hipótese de a receita ficar aquém da estimada, o mais provável é que o resultado primário efetivo fique abaixo do prometido, a menos dos conhecidos "truques", que só servem para aumentar a falta de credibilidade do governo na gestão das contas públicas.
Na reprogramação orçamentária divulgada no mês passado há premissas inverossímeis. Por exemplo, a estimativa das transferências pelo Tesouro à Previdência Social para compensar as desonerações da folha de pagamento foi reduzida de R$ 17 bilhões para R$ 11 bilhões, ou seja, a mesma dotação do ano passado. Mas as despesas da Previdência estão subestimadas, como publicamente admitiu o próprio ministro Garibaldi Alves. Basta lembrar que o programa de desoneração da folha foi ampliado pela Lei n.º 12.844 de julho de 2013, com a inclusão das empresas de construção civil, transporte rodoviário e ferroviário de cargas, de manutenção e reparo de embarcações e de operações de carga e descarga em portos.
De forma geral, a previsão de crescimento da despesa primária em apenas 9,5% em 2014 não é crível. Elevação menor que 10% só ocorreu no primeiro ano da administração Lula e não em ano eleitoral. Naquela época ainda não existiam vários programas de subsídios e o governo não se defrontava com um enorme buraco nas empresas de distribuição de energia. A maior parte desse último problema foi empurrada com a barriga para 2015, mediante uma operação nada convencional com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), mas sobram ainda cerca de R$ 4 bilhões adicionais a serem bancados pelo Tesouro.
Para entender a dificuldade de cortar gasto público no Brasil é preciso analisar a dinâmica de longo prazo da despesa primária da União. Por que ela cresce continuamente como proporção do PIB, tendo se elevado de 14,5%, em 1999, para 19%, no ano passado? Será que o governo vem se tornando crescentemente perdulário no custeio da máquina administrativa e nos gastos com o funcionalismo?
A resposta à segunda pergunta é não. Se assim fosse, medidas frequentemente reclamadas pela população e pela imprensa, tais como choque de gestão, redução do número de ministérios, fim das mordomias, controle dos gastos com viagens, etc., seriam a solução. Evidentemente, sou a favor de tais medidas, mas a má notícia é que a economia delas resultante seria irrelevante para resolver o problema fiscal brasileiro.
Segundo dados levantados pelo economista Mansueto de Almeida, os gastos com pessoal e com todo o custeio da máquina administrativa (exceto educação e saúde) caíram em relação ao PIB, no período analisado. Em 1999, primeiro ano do segundo mandato de FHC, tais dispêndios correspondiam a 5,9% do PIB, e no ano passado fecharam em 5,2% do PIB. Os investimentos são baixíssimos, tendo se mantido em cerca de 1% do PIB desde 2002.
O crescimento da despesa pública da União também não é explicado pelo aumento da produção de bens públicos, tais como educação, saúde, segurança, justiça e infraestrutura básica, mas, sim, pela forte expansão dos gastos de natureza social, que cresceram em 4,6% do PIB no período 1999 a 2013, a saber: Previdência Social, 2,2%; programas sociais (Bolsa Família, seguro-desemprego, benefício de prestação continuada e abono salarial), 1,7%; e os subsídios (Minha Casa, Minha Vida, Minha Casa Melhor, etc.), 0,7%.
Esses números deixam claro que qualquer proposta séria de ajuste fiscal no Brasil terá de focar a contenção dos gastos de natureza social. Refiro-me a medidas amargas, tais como regras austeras de reajuste do salário mínimo e sua completa desvinculação de qualquer benefício, reforma da Previdência que alcance inclusive os atuais participantes, profunda revisão da legislação das pensões por morte e do seguro-desemprego, corte de subsídios, entre outras. Mas não creio que a sociedade, por meio de seus representantes políticos, esteja disposta a dar suporte a ações nessa direção. O mais provável, infelizmente, é que haverá novo aumento da carga tributária, com repercussão negativa sobre o crescimento econômico, principalmente se o sonho petista de ressuscitar a CPMF se concretizar.
Todo mês de fevereiro, não falha. Com mais regularidade do que o carnaval - dado que este às vezes teima em cair em março, para atrapalhar o ano letivo e confundir os modelos de dessazonalização -, o governo edita seu decreto de reprogramação orçamentária, impropriamente conhecido como contingenciamento. Com a mesma regularidade a imprensa, mesmo a especializada, e até alguns analistas chamam isso de corte de gastos.
Na verdade, como o próprio nome diz, o decreto de reprogramação é mera reestimativa das receitas e das despesas do Orçamento federal. Tradicionalmente, o Congresso Nacional infla as receitas com o objetivo de gerar espaço para incluir emendas parlamentares, sem afetar, teoricamente, a meta de superávit primário estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O Executivo, por sua vez, retira os excessos introduzidos pelo Congresso nos dois lados do Orçamento e emite o decreto de reprogramação.
Observe-se que não há qualquer tipo de corte. Cortar despesas seria gastar menos do que vinha sendo gasto, por exemplo, em relação ao exercício anterior. E isso não acontece no Brasil há muitos anos, e tampouco ocorrerá em 2014. O decepcionante resultado primário (antes da dedução das despesas com juros) relativo ao mês de janeiro último e o quase certo elevado déficit no mês de fevereiro já demonstram como é implausível a meta de superávit primário consolidado para todo o setor público, de 1,9% do PIB, prometida pelo ministro da Fazenda.
É interessante destacar que a reprogramação não é uma estimativa convencional, que embute certo grau de incerteza, para baixo ou para cima. Na reprogramação orçamentária o superávit estimado é um teto. Se a receita efetiva ficar acima da prevista, o governo (com raríssimas exceções) anulará, parcial ou totalmente, os contingenciamentos, ou seja, aumentará os gastos, em vez de entregar um superávit maior. Por outro lado, na hipótese de a receita ficar aquém da estimada, o mais provável é que o resultado primário efetivo fique abaixo do prometido, a menos dos conhecidos "truques", que só servem para aumentar a falta de credibilidade do governo na gestão das contas públicas.
Na reprogramação orçamentária divulgada no mês passado há premissas inverossímeis. Por exemplo, a estimativa das transferências pelo Tesouro à Previdência Social para compensar as desonerações da folha de pagamento foi reduzida de R$ 17 bilhões para R$ 11 bilhões, ou seja, a mesma dotação do ano passado. Mas as despesas da Previdência estão subestimadas, como publicamente admitiu o próprio ministro Garibaldi Alves. Basta lembrar que o programa de desoneração da folha foi ampliado pela Lei n.º 12.844 de julho de 2013, com a inclusão das empresas de construção civil, transporte rodoviário e ferroviário de cargas, de manutenção e reparo de embarcações e de operações de carga e descarga em portos.
De forma geral, a previsão de crescimento da despesa primária em apenas 9,5% em 2014 não é crível. Elevação menor que 10% só ocorreu no primeiro ano da administração Lula e não em ano eleitoral. Naquela época ainda não existiam vários programas de subsídios e o governo não se defrontava com um enorme buraco nas empresas de distribuição de energia. A maior parte desse último problema foi empurrada com a barriga para 2015, mediante uma operação nada convencional com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), mas sobram ainda cerca de R$ 4 bilhões adicionais a serem bancados pelo Tesouro.
Para entender a dificuldade de cortar gasto público no Brasil é preciso analisar a dinâmica de longo prazo da despesa primária da União. Por que ela cresce continuamente como proporção do PIB, tendo se elevado de 14,5%, em 1999, para 19%, no ano passado? Será que o governo vem se tornando crescentemente perdulário no custeio da máquina administrativa e nos gastos com o funcionalismo?
A resposta à segunda pergunta é não. Se assim fosse, medidas frequentemente reclamadas pela população e pela imprensa, tais como choque de gestão, redução do número de ministérios, fim das mordomias, controle dos gastos com viagens, etc., seriam a solução. Evidentemente, sou a favor de tais medidas, mas a má notícia é que a economia delas resultante seria irrelevante para resolver o problema fiscal brasileiro.
Segundo dados levantados pelo economista Mansueto de Almeida, os gastos com pessoal e com todo o custeio da máquina administrativa (exceto educação e saúde) caíram em relação ao PIB, no período analisado. Em 1999, primeiro ano do segundo mandato de FHC, tais dispêndios correspondiam a 5,9% do PIB, e no ano passado fecharam em 5,2% do PIB. Os investimentos são baixíssimos, tendo se mantido em cerca de 1% do PIB desde 2002.
O crescimento da despesa pública da União também não é explicado pelo aumento da produção de bens públicos, tais como educação, saúde, segurança, justiça e infraestrutura básica, mas, sim, pela forte expansão dos gastos de natureza social, que cresceram em 4,6% do PIB no período 1999 a 2013, a saber: Previdência Social, 2,2%; programas sociais (Bolsa Família, seguro-desemprego, benefício de prestação continuada e abono salarial), 1,7%; e os subsídios (Minha Casa, Minha Vida, Minha Casa Melhor, etc.), 0,7%.
Esses números deixam claro que qualquer proposta séria de ajuste fiscal no Brasil terá de focar a contenção dos gastos de natureza social. Refiro-me a medidas amargas, tais como regras austeras de reajuste do salário mínimo e sua completa desvinculação de qualquer benefício, reforma da Previdência que alcance inclusive os atuais participantes, profunda revisão da legislação das pensões por morte e do seguro-desemprego, corte de subsídios, entre outras. Mas não creio que a sociedade, por meio de seus representantes políticos, esteja disposta a dar suporte a ações nessa direção. O mais provável, infelizmente, é que haverá novo aumento da carga tributária, com repercussão negativa sobre o crescimento econômico, principalmente se o sonho petista de ressuscitar a CPMF se concretizar.
Saindo de mansinho - PAULO GUEDES
O GLOBO - 24/03
O Brasil assiste hoje a um fenômeno relativamente novo: uma importante expatriação de capitais financeiros locais em busca de segurança no exterior. Um afastamento do "dinheiro bom".
Uma fuga do "dinheiro quente". Um abandono pelo "dinheiro empreendedor". Prática regular entre as grandes fortunas financeiras de outros países latino-americanos que há muito navegam a rota da desesperança, não se trata mais apenas da fuga do "dinheiro frio" de sonegadores e traficantes, do "dinheiro esperto" de especuladores e financistas nem dos capitais apátridas de empresas multinacionais.
Ao contrário, trata-se agora de uma alocação sistemática e crescente de grande parte dos portfólios locais sob forma de aplicações financeiras no exterior. Essa expatriação sistêmica de fluxos da poupança nacional reflete a maior sofisticação dos aplicadores em suas necessidades de diversificação dos veículos de investimento. Mas não há dúvida de que reflete, em sua maior parte, uma inequívoca e ininterrupta deterioração dos fundamentos da economia brasileira. Pois não se trata de uma busca por maiores taxas de retorno lá fora, e sim de uma necessidade de escapar aos maiores riscos percebidos aqui dentro.
Com as economias dos países desenvolvidos travadas por anos a fio pela grande crise contemporânea, abriu-se uma enorme janela de oportunidade para que o Brasil se transformasse na nova fronteira de crescimento da economia mundial. Mas tropeçamos miseravelmente em nossas próprias pernas. Afastamo-nos progressivamente dos bons fundamentos fiscais, monetários e até contábeis, descambando para o controle de preços e a regulamentação inadequada em áreas críticas como energia e petróleo. Nada que não se possa reparar, mas tudo se deve corrigir antes que se aprofunde a decepção rumo à tragédia.
As taxas de juros nos mercados financeiros globais permanecem extraordinariamente baixas. Apesar do anúncio de sua eventual elevação pelos bancos centrais, os ajustes sob consideração seriam demasiado pequenos para que pudessem explicar essa onda crescente de poupança brasileira que se move em direção ao exterior. A verdade é que tem ocorrido, ao longo dos últimos anos, uma clara reversão de expectativas anteriormente favoráveis quanto ao crescimento do país. Tem conserto, pois a culpa é inteiramente nossa.
O Brasil assiste hoje a um fenômeno relativamente novo: uma importante expatriação de capitais financeiros locais em busca de segurança no exterior. Um afastamento do "dinheiro bom".
Uma fuga do "dinheiro quente". Um abandono pelo "dinheiro empreendedor". Prática regular entre as grandes fortunas financeiras de outros países latino-americanos que há muito navegam a rota da desesperança, não se trata mais apenas da fuga do "dinheiro frio" de sonegadores e traficantes, do "dinheiro esperto" de especuladores e financistas nem dos capitais apátridas de empresas multinacionais.
Ao contrário, trata-se agora de uma alocação sistemática e crescente de grande parte dos portfólios locais sob forma de aplicações financeiras no exterior. Essa expatriação sistêmica de fluxos da poupança nacional reflete a maior sofisticação dos aplicadores em suas necessidades de diversificação dos veículos de investimento. Mas não há dúvida de que reflete, em sua maior parte, uma inequívoca e ininterrupta deterioração dos fundamentos da economia brasileira. Pois não se trata de uma busca por maiores taxas de retorno lá fora, e sim de uma necessidade de escapar aos maiores riscos percebidos aqui dentro.
Com as economias dos países desenvolvidos travadas por anos a fio pela grande crise contemporânea, abriu-se uma enorme janela de oportunidade para que o Brasil se transformasse na nova fronteira de crescimento da economia mundial. Mas tropeçamos miseravelmente em nossas próprias pernas. Afastamo-nos progressivamente dos bons fundamentos fiscais, monetários e até contábeis, descambando para o controle de preços e a regulamentação inadequada em áreas críticas como energia e petróleo. Nada que não se possa reparar, mas tudo se deve corrigir antes que se aprofunde a decepção rumo à tragédia.
As taxas de juros nos mercados financeiros globais permanecem extraordinariamente baixas. Apesar do anúncio de sua eventual elevação pelos bancos centrais, os ajustes sob consideração seriam demasiado pequenos para que pudessem explicar essa onda crescente de poupança brasileira que se move em direção ao exterior. A verdade é que tem ocorrido, ao longo dos últimos anos, uma clara reversão de expectativas anteriormente favoráveis quanto ao crescimento do país. Tem conserto, pois a culpa é inteiramente nossa.
Petrovotos - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S.Paulo - 24/03
Na eleição presidencial de 2002, sempre que aparecia o registro de uma pesquisa na Justiça Eleitoral, instituições do mercado financeiro corriam a encomendar a sua. Como a lei manda que uma pesquisa que se pretenda divulgar precisa ser registrada com cinco dias úteis de antecedência, bancos e assemelhados tinham tempo para descobrir antes o que seria publicado - pois pesquisas feitas simultaneamente costumam ter resultados similares. Ganharam muito dinheiro com isso.
O fenômeno acontecia porque Luiz Inácio Lula da Silva era visto como uma ameaça econômica, e o mercado apostava contra ele. Se o petista subia, o real caía frente ao dólar - e vice-versa. Saber que isso iria acontecer um dia antes era uma grande vantagem.
Após dois pleitos - 2006 e 2010 - em que a perspectiva de um presidente petista não implicou oscilação automática do dólar ou da Bovespa, o efeito PT volta a se repetir em 2014. Na semana passada, não foi preciso nem encomendar uma pesquisa própria. Especuladores difundiram boatos falsos de que Dilma cairia no Ibope. Alavancaram assim as ações da Petrobrás e criaram uma oportunidade de lucro, comprando na baixa e vendendo na alta.
A estratégia pode funcionar algumas vezes - porque o mercado acredita que, se Dilma Rousseff perder, o preço da gasolina voltará a subir, e as ações da Petrobrás, a se valorizar. Mas há risco. Se ficar evidente que especuladores apostam contra a reeleição da presidente e ainda ganham dinheiro com isso, a petista pode posar de vítima e explorar isso na campanha.
Dilma paz e amor. Se prestar atenção às pesquisas e aos sinais crescentes de insatisfação, Dilma sinalizará com a possibilidade de promover mudanças em um eventual segundo mandato. Afora quem quer mudar tudo - e, por isso, não vota nela -, a maior parte do eleitorado (37%) gostaria que o próximo presidente mudasse muita coisa no governo. Desses, 38% dizem que querem mudanças mas com Dilma na Presidência.
Isso significa que 1 em cada 3 eleitores da presidente é um mudancista moderado. Não atender, mesmo que parcialmente, sua expectativa, é incentivá-lo a pular para o barco da oposição. A maneira mais rápida de fazer isso é assumir um discurso triunfalista, insistir que nada precisa ser mudado e que ninguém é capaz de fazer melhor do que ela.
Sem esse eleitor pró-mudança, Dilma ficaria restrita aos cerca de 30% de simpatizantes petistas e/ou governistas inabaláveis. Esse terço é o patamar mínimo de qualquer candidato do PT a presidente. É necessário, mas insuficiente. Leva ao segundo turno, mas não à vitória. Para se reeleger, Dilma precisa manter do eleitorado independente que já tem e ampliá-lo. Para isso, precisaria moderar o discurso. Tipo: "Paz e amor, meu querido".
Incompatibilidade eleitoral. Marina Silva perdeu mais do que ganhou quando resolveu se unir a Eduardo Campos para se vingar de Dilma. Seu capital político-eleitoral, de origem evangélica e ambientalista, está em queda permanente desde a absorção da Rede Sustentabilidade pelo PSB. Se a dupla fonte de eleitores da ex-presidenciável já era difícil de reconciliar, a junção abrupta aos campistas diluiu o que já era pouco consistente. Não deu liga.
Nos cenários do Ibope em outubro, novembro e março, a intenção de voto em Marina caiu de 21%, para 16%, para 12%. Seria esperado, se houvesse uma transferência de eleitores para o novo parceiro. Mas isso não ocorreu. No mesmo período, as taxas de Eduardo Campos foram de 10%, 7% e 7%. Marina se enfraqueceu sem reforçar o novo aliado.
O cenário pode complicar ainda mais. Pré-candidato a presidente pelo PSC, o pastor Everaldo já tem 8% de intenções de voto entre evangélicos - com chance de crescer. E o Partido Verde lançou a pré-candidatura de Eduardo Jorge, que pode cooptar eleitores ambientalistas que eram de Marina. Bom para Aécio Neves.
Na eleição presidencial de 2002, sempre que aparecia o registro de uma pesquisa na Justiça Eleitoral, instituições do mercado financeiro corriam a encomendar a sua. Como a lei manda que uma pesquisa que se pretenda divulgar precisa ser registrada com cinco dias úteis de antecedência, bancos e assemelhados tinham tempo para descobrir antes o que seria publicado - pois pesquisas feitas simultaneamente costumam ter resultados similares. Ganharam muito dinheiro com isso.
O fenômeno acontecia porque Luiz Inácio Lula da Silva era visto como uma ameaça econômica, e o mercado apostava contra ele. Se o petista subia, o real caía frente ao dólar - e vice-versa. Saber que isso iria acontecer um dia antes era uma grande vantagem.
Após dois pleitos - 2006 e 2010 - em que a perspectiva de um presidente petista não implicou oscilação automática do dólar ou da Bovespa, o efeito PT volta a se repetir em 2014. Na semana passada, não foi preciso nem encomendar uma pesquisa própria. Especuladores difundiram boatos falsos de que Dilma cairia no Ibope. Alavancaram assim as ações da Petrobrás e criaram uma oportunidade de lucro, comprando na baixa e vendendo na alta.
A estratégia pode funcionar algumas vezes - porque o mercado acredita que, se Dilma Rousseff perder, o preço da gasolina voltará a subir, e as ações da Petrobrás, a se valorizar. Mas há risco. Se ficar evidente que especuladores apostam contra a reeleição da presidente e ainda ganham dinheiro com isso, a petista pode posar de vítima e explorar isso na campanha.
Dilma paz e amor. Se prestar atenção às pesquisas e aos sinais crescentes de insatisfação, Dilma sinalizará com a possibilidade de promover mudanças em um eventual segundo mandato. Afora quem quer mudar tudo - e, por isso, não vota nela -, a maior parte do eleitorado (37%) gostaria que o próximo presidente mudasse muita coisa no governo. Desses, 38% dizem que querem mudanças mas com Dilma na Presidência.
Isso significa que 1 em cada 3 eleitores da presidente é um mudancista moderado. Não atender, mesmo que parcialmente, sua expectativa, é incentivá-lo a pular para o barco da oposição. A maneira mais rápida de fazer isso é assumir um discurso triunfalista, insistir que nada precisa ser mudado e que ninguém é capaz de fazer melhor do que ela.
Sem esse eleitor pró-mudança, Dilma ficaria restrita aos cerca de 30% de simpatizantes petistas e/ou governistas inabaláveis. Esse terço é o patamar mínimo de qualquer candidato do PT a presidente. É necessário, mas insuficiente. Leva ao segundo turno, mas não à vitória. Para se reeleger, Dilma precisa manter do eleitorado independente que já tem e ampliá-lo. Para isso, precisaria moderar o discurso. Tipo: "Paz e amor, meu querido".
Incompatibilidade eleitoral. Marina Silva perdeu mais do que ganhou quando resolveu se unir a Eduardo Campos para se vingar de Dilma. Seu capital político-eleitoral, de origem evangélica e ambientalista, está em queda permanente desde a absorção da Rede Sustentabilidade pelo PSB. Se a dupla fonte de eleitores da ex-presidenciável já era difícil de reconciliar, a junção abrupta aos campistas diluiu o que já era pouco consistente. Não deu liga.
Nos cenários do Ibope em outubro, novembro e março, a intenção de voto em Marina caiu de 21%, para 16%, para 12%. Seria esperado, se houvesse uma transferência de eleitores para o novo parceiro. Mas isso não ocorreu. No mesmo período, as taxas de Eduardo Campos foram de 10%, 7% e 7%. Marina se enfraqueceu sem reforçar o novo aliado.
O cenário pode complicar ainda mais. Pré-candidato a presidente pelo PSC, o pastor Everaldo já tem 8% de intenções de voto entre evangélicos - com chance de crescer. E o Partido Verde lançou a pré-candidatura de Eduardo Jorge, que pode cooptar eleitores ambientalistas que eram de Marina. Bom para Aécio Neves.
Para não descarrilar o vagão Argentina - SÉRGIO LEO
VALOR ECONÔMICO -24/03
Há muitas mensagens ocultas nos pronunciamentos do governo brasileiro sobre a Argentina, nos últimos dias. Enquanto especialistas discutem se o Brasil deve ou não se livrar dos sócios no Mercosul para tentar voo solo nas negociações comerciais internacionais, o governo brasileiro trava discussões delicadas para acertar o passo com o vizinho de que dispõe.
Há algum tempo, a Argentina é um dos maiores mercados para as vendas externas de manufaturados brasileiros com maior valor agregado - ainda que os automóveis sejam uma parcela excessiva nessas exportações.
De um lado, Brasília busca uma saída para o sufoco cambial argentino; de outro, batalha para que a Argentina não pese nas negociações de livre comércio com a União Europeia.
Na sexta-feira, autoridades do governo brasileiro informaram que o Mercosul apresentará uma "proposta conjunta" de redução de tarifas aos europeus. Não há alternativa: nas últimas reuniões do bloco, os emissários de Cristina Kirchner disseram que não aceitam a sugestão defendida por Brasil, Uruguai e Paraguai, de que os argentinos apresentassem uma proposta à parte, que adiaria a liberalização do mercado da Argentina aos europeus, mas permitiria aos sócios liberalizar logo os seus.
E há também a questão cambial. Com reservas estrangeiras em queda, sem muitas opções de financiamento e temerosos da intervenção estatal e da desvalorização do peso, os argentinos têm evitado empréstimos de prazo mais longo, o que só agrava o aperto no mercado de câmbio.
A escassez de financiamentos agrava a queda no comércio bilateral, que afeta mais severamente a Argentina: as vendas brasileiras ao vizinho caíram 16% no primeiro bimestre, enquanto as compras brasileiras de produtos argentinos despencaram 27%, pela média diária, em relação ao mesmo período de 2013.
Na conversa entre autoridades brasileiras e argentinas, há pouco mais de uma semana, avaliou-se que, com as últimas medidas do governo vizinho em relação ao câmbio, que aproximaram as cotações oficial e do mercado negro, surgiram condições para recuperar a confiança dos agentes econômicos e estimulá-los a tomar empréstimos de prazo mais longo.
Busca-se, agora, uma fórmula para garantir aos importadores e exportadores locais que podem tomar empréstimos de mais longo prazo sem temer uma retenção de seus pagamentos.
É uma tarefa desafiadora, as empresas temem assumir compromissos e encontrar barreiras para remessa de dólares aos credores e já vêm evitando, por isso, compromissos que vencem no segundo semestre de 2014, ou até um pouco antes.
Na prática, o governo de Cristina Kirchner, que recentemente passou a reter a saída de dólares que ingressam no país, reconhece que tem de dar aos empresários garantias de que não imporá obstáculos aos pagamentos por créditos de prazo maior.
O BC argentino pretende dar, aos créditos mais longos para importação argentina, maior facilidade de remessa de divisas - algo complicado de se fazer sem se admitir que há retenções heterodoxas de pagamentos e de importações.
É essa garantia dos governos, de que haverá dólares para pagar empréstimos no futuro próximo, o principal tema do memorando de entendimentos em discussão entre Brasil e Argentina, a ser firmado pelos dois países paralelamente à reunião do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na Costa do Sauípe (Bahia), na quinta-feira.
Na sexta-feira, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Mauro Borges, informou aos jornalistas que os governos estudam uma "linha de crédito" para facilitar o comércio, a ser oferecida pelos bancos comerciais.
O governo brasileiro não colocará um real do Tesouro para apoiar o comércio com a Argentina; mas seguem em operação as linhas tradicionais do BANCO DO BRASIL e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para apoio às exportações e importações de produtos brasileiros.
Não há, até agora, conversas para que esses bancos públicos brasileiros tenham maior engajamento nas transações bilaterais. Até porque o problema é na outra ponta. Os importadores argentinos pressionam a demanda por dólares, porque temem assumir compromissos e se sujeitar a multas ao ter suas remessas retidas pelo governo local. Melhor seria que o governo argentino criasse, no mercado local, um instrumento de mitigação de riscos para os emprestadores e tomadores de crédito, papel que, no Brasil, é desempenhado por um sofisticado mercado de derivativos.
É nesse cenário de restrições que os negociadores do Brasil, Paraguai e Uruguai tentam convencer os argentinos de que devem aceitar prazos mais curtos de redução de tarifas e liberalização do mercado em um acordo com a União Europeia.
Reunidos na sexta-feira, os sócios do Mercosul não conseguiram concluir uma proposta considerada aceitável para começo de conversas com os europeus -os europeus, é bem verdade, também encontram dificuldades para oferecer uma abertura do mercado compatível com suas ambições de liberalização por parte dos sul-americanos.
Há um longo hiato entre a assinatura de um acordo e seu funcionamento a todo vapor, e é esse um dos argumentos usados para animar a generosidade das autoridades em Buenos Aires. Os argentinos parecem, pelo menos, dispostos a se empenhar nas negociações com os europeus, que se tornaram uma questão de honra para Cristina Kirchner - foi ela, aliás, quem relançou em 2010 as conversas, paralisadas desde 2004. Também na reunião do BID, nesta semana, os governos do Mercosul devem voltar a tentar um avanço nesse tema.
Há muitas mensagens ocultas nos pronunciamentos do governo brasileiro sobre a Argentina, nos últimos dias. Enquanto especialistas discutem se o Brasil deve ou não se livrar dos sócios no Mercosul para tentar voo solo nas negociações comerciais internacionais, o governo brasileiro trava discussões delicadas para acertar o passo com o vizinho de que dispõe.
Há algum tempo, a Argentina é um dos maiores mercados para as vendas externas de manufaturados brasileiros com maior valor agregado - ainda que os automóveis sejam uma parcela excessiva nessas exportações.
De um lado, Brasília busca uma saída para o sufoco cambial argentino; de outro, batalha para que a Argentina não pese nas negociações de livre comércio com a União Europeia.
Na sexta-feira, autoridades do governo brasileiro informaram que o Mercosul apresentará uma "proposta conjunta" de redução de tarifas aos europeus. Não há alternativa: nas últimas reuniões do bloco, os emissários de Cristina Kirchner disseram que não aceitam a sugestão defendida por Brasil, Uruguai e Paraguai, de que os argentinos apresentassem uma proposta à parte, que adiaria a liberalização do mercado da Argentina aos europeus, mas permitiria aos sócios liberalizar logo os seus.
E há também a questão cambial. Com reservas estrangeiras em queda, sem muitas opções de financiamento e temerosos da intervenção estatal e da desvalorização do peso, os argentinos têm evitado empréstimos de prazo mais longo, o que só agrava o aperto no mercado de câmbio.
A escassez de financiamentos agrava a queda no comércio bilateral, que afeta mais severamente a Argentina: as vendas brasileiras ao vizinho caíram 16% no primeiro bimestre, enquanto as compras brasileiras de produtos argentinos despencaram 27%, pela média diária, em relação ao mesmo período de 2013.
Na conversa entre autoridades brasileiras e argentinas, há pouco mais de uma semana, avaliou-se que, com as últimas medidas do governo vizinho em relação ao câmbio, que aproximaram as cotações oficial e do mercado negro, surgiram condições para recuperar a confiança dos agentes econômicos e estimulá-los a tomar empréstimos de prazo mais longo.
Busca-se, agora, uma fórmula para garantir aos importadores e exportadores locais que podem tomar empréstimos de mais longo prazo sem temer uma retenção de seus pagamentos.
É uma tarefa desafiadora, as empresas temem assumir compromissos e encontrar barreiras para remessa de dólares aos credores e já vêm evitando, por isso, compromissos que vencem no segundo semestre de 2014, ou até um pouco antes.
Na prática, o governo de Cristina Kirchner, que recentemente passou a reter a saída de dólares que ingressam no país, reconhece que tem de dar aos empresários garantias de que não imporá obstáculos aos pagamentos por créditos de prazo maior.
O BC argentino pretende dar, aos créditos mais longos para importação argentina, maior facilidade de remessa de divisas - algo complicado de se fazer sem se admitir que há retenções heterodoxas de pagamentos e de importações.
É essa garantia dos governos, de que haverá dólares para pagar empréstimos no futuro próximo, o principal tema do memorando de entendimentos em discussão entre Brasil e Argentina, a ser firmado pelos dois países paralelamente à reunião do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na Costa do Sauípe (Bahia), na quinta-feira.
Na sexta-feira, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Mauro Borges, informou aos jornalistas que os governos estudam uma "linha de crédito" para facilitar o comércio, a ser oferecida pelos bancos comerciais.
O governo brasileiro não colocará um real do Tesouro para apoiar o comércio com a Argentina; mas seguem em operação as linhas tradicionais do BANCO DO BRASIL e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para apoio às exportações e importações de produtos brasileiros.
Não há, até agora, conversas para que esses bancos públicos brasileiros tenham maior engajamento nas transações bilaterais. Até porque o problema é na outra ponta. Os importadores argentinos pressionam a demanda por dólares, porque temem assumir compromissos e se sujeitar a multas ao ter suas remessas retidas pelo governo local. Melhor seria que o governo argentino criasse, no mercado local, um instrumento de mitigação de riscos para os emprestadores e tomadores de crédito, papel que, no Brasil, é desempenhado por um sofisticado mercado de derivativos.
É nesse cenário de restrições que os negociadores do Brasil, Paraguai e Uruguai tentam convencer os argentinos de que devem aceitar prazos mais curtos de redução de tarifas e liberalização do mercado em um acordo com a União Europeia.
Reunidos na sexta-feira, os sócios do Mercosul não conseguiram concluir uma proposta considerada aceitável para começo de conversas com os europeus -os europeus, é bem verdade, também encontram dificuldades para oferecer uma abertura do mercado compatível com suas ambições de liberalização por parte dos sul-americanos.
Há um longo hiato entre a assinatura de um acordo e seu funcionamento a todo vapor, e é esse um dos argumentos usados para animar a generosidade das autoridades em Buenos Aires. Os argentinos parecem, pelo menos, dispostos a se empenhar nas negociações com os europeus, que se tornaram uma questão de honra para Cristina Kirchner - foi ela, aliás, quem relançou em 2010 as conversas, paralisadas desde 2004. Também na reunião do BID, nesta semana, os governos do Mercosul devem voltar a tentar um avanço nesse tema.
Já deu! - AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP - 24/03
Protagonista de um governo refém dos interesses do regime de aparelhamento que se abateu sobre o Estado nacional, a presidente Dilma Rousseff já não sabe mais o que dizer ao Brasil, além de terceirizar responsabilidades.
Atônitos, os brasileiros são informados que, em poucos anos, a 12ª maior empresa do mundo foi transformada na 120ª e começam a perceber que, infelizmente, a PTrobras, longe de ser uma exceção, é o retrato do governo sob o comando do PT.
Incapacidade de gestão e planejamento. Desvios e suspeições. Excesso de compromisso com os companheiros, falta de compromisso com o país.
De um lado, a gravidade das revelações objetivas que vêm à tona e fazem a realidade superar as versões, que, antes sussurradas no meio político, já pareciam inverossímeis.
De outro, a vaidade e a onipotência daqueles que parecem acreditar que somos, os brasileiros, um conjunto de tolos.
O que se tornou conhecido por todos recentemente já era, há muito, de domínio do governo. Por que, então, por exemplo, só agora o diretor que passou a ser o bode expiatório do escândalo foi demitido?
Por que personagens das páginas policiais estiveram, até ontem, protegidos em posições de extrema confiança?
O que mudou? O que transformou um bem feito num malfeito foi apenas a percepção da sociedade? Que governo é este que só age ou ensaia providências quando é confrontado pela opinião pública?
De onde vem tanta arrogância, que faz com que os representantes do PT tripudiem sobre a percepção dos brasileiros?
Primeiro, inventaram os "recursos não contabilizados". Na semana passada, o presidente do Banco Central chamou de mera "realocação contábil" a iniciativa da Caixa de lançar os recursos confiscados dos correntistas como lucro. Agora, na ausência de um mordomo, a culpa parece ser do "relatório".
Os brasileiros vêm sendo desrespeitados todos os dias por ações concretas, sempre envoltas em coincidências demais e transparência de menos, mas também pela forma com que o governo responde a elas.
Estamos cansados de ver o interesse público e coletivo, razão de ser da própria República e da democracia, confundido com os interesses privados e os projetos individuais de poder de pessoas e de partidos.
Uma coisa são os desafios da nação. Outra, são os problemas criados pelo governo.
O governo que o eleitor escolheu para ser solução se transformou no principal problema do país. A verdade é que o governo colocou o Brasil no caminho errado --é simples assim. E o Brasil precisa voltar para o caminho certo.
Precisamos de um governo que volte a ser solução.
Entre a indignação, a revolta e o cansaço diante de repetidos absurdos, o sentimento geral dos brasileiros é um só: já deu!
Consumismo artificial - SEBASTIÃO VENTURA PEREIRA DA PAIXÃO JR.
GAZETA DO POVO - PR - 24/03
O projeto econômico petista está com os dias contados; os sintomas estão aí aos olhos de todos, indicando que uma mudança de rumo na economia é urgente e inadiável. Iniciada por Lula e tocada por Dilma, a arrancada consumista deu às classes menos favorecidas uma sensação de pertencimento social. Sem cortinas, Lula usou seu agudo tirocínio político para espraiar crédito por canais de baixa renda e, assim, proporcionar um mínimo poder de compra aos mais carentes.
Tal injeção de crédito, associada à possibilidade de compras com parcelamento de médio prazo, potencializou o sonho capitalista nas periferias, trazendo para dentro da economia de mercado muitos clientes que, antes, apenas ficavam olhando vitrines. No entanto, cuidado: o messias não fez a multiplicação dos pães. Na verdade, a medida apenas estimulou o aumento do preço da farinha ou a diminuição do pãozinho francês...
Não adianta: em economia não há milagre. Cedo ou tarde, os mágicos ficam nus. Objetivamente, o fato é que consumismo artificial é certeza de uma morte anunciada. Quando o endividamento familiar chega a seu ponto de saturação, a engrenagem tranca e, a depender da quantidade de dinheiro injetado na veia, o paciente, pelo choque inflacionário, vai à UTI por falência múltipla de órgãos. Aqui chegando, não adianta só rezar e dizer que foi um bom menino ao longo da vida, é urgente e inadiável a pronta medicação do corpo econômico moribundo, e haja analgésicos para conter a dor inflacionária. No fim, a doce sensação consumista é transformada em salgadas dívidas reais.
Se a memória não me trai, é de Mário Henrique Simonsen a frase de que “a inflação aleija, mas o câmbio mata”. A ideia é de precisão cirúrgica. Enquanto a inflação vai silenciosamente deixando os pobres mais pobres, o câmbio desnorteado é a pá de cal dos desatinos populistas. A perda de credibilidade do governo, após muitas palavras ao vento e lances irresponsáveis de “contabilidade criativa” (nome bonitinho para o que antigamente era simplesmente chamado de mentira, farsa ou fraude), faz os investidores internos e estrangeiros baterem em retirada por absoluta falta de confiança e segurança jurídica. Não tendo para onde correr, o governo vai se endividar ainda mais, garantindo um futuro de recessão e alta do desemprego. Basta olhar o passado para enxergar o futuro.
Ainda temos tempo de colocar o Brasil nos eixos. Para tanto, em vez de retórica e sorrisos fúteis, precisaremos de trabalho e seriedade política. Em vez de apenas querer ganhar votos, o governo deve ter a decência de olhar para a nação e assumir que seu modelo econômico está superado. Precisamos de investimento educacional e de infraestrutura. Precisamos de menos burocracia e de maior simplicidade fiscal. Precisamos estimular a indústria nacional e deixar de tratar o empresário como um inimigo do Estado. Politicamente, precisamos de partidos, e não de quadrilhas do poder. Ao fim, precisamos ser autenticamente cidadãos e não apenas eleitores de ocasião.
E então, onde você está e o que quer para o nosso país?
O projeto econômico petista está com os dias contados; os sintomas estão aí aos olhos de todos, indicando que uma mudança de rumo na economia é urgente e inadiável. Iniciada por Lula e tocada por Dilma, a arrancada consumista deu às classes menos favorecidas uma sensação de pertencimento social. Sem cortinas, Lula usou seu agudo tirocínio político para espraiar crédito por canais de baixa renda e, assim, proporcionar um mínimo poder de compra aos mais carentes.
Tal injeção de crédito, associada à possibilidade de compras com parcelamento de médio prazo, potencializou o sonho capitalista nas periferias, trazendo para dentro da economia de mercado muitos clientes que, antes, apenas ficavam olhando vitrines. No entanto, cuidado: o messias não fez a multiplicação dos pães. Na verdade, a medida apenas estimulou o aumento do preço da farinha ou a diminuição do pãozinho francês...
Não adianta: em economia não há milagre. Cedo ou tarde, os mágicos ficam nus. Objetivamente, o fato é que consumismo artificial é certeza de uma morte anunciada. Quando o endividamento familiar chega a seu ponto de saturação, a engrenagem tranca e, a depender da quantidade de dinheiro injetado na veia, o paciente, pelo choque inflacionário, vai à UTI por falência múltipla de órgãos. Aqui chegando, não adianta só rezar e dizer que foi um bom menino ao longo da vida, é urgente e inadiável a pronta medicação do corpo econômico moribundo, e haja analgésicos para conter a dor inflacionária. No fim, a doce sensação consumista é transformada em salgadas dívidas reais.
Se a memória não me trai, é de Mário Henrique Simonsen a frase de que “a inflação aleija, mas o câmbio mata”. A ideia é de precisão cirúrgica. Enquanto a inflação vai silenciosamente deixando os pobres mais pobres, o câmbio desnorteado é a pá de cal dos desatinos populistas. A perda de credibilidade do governo, após muitas palavras ao vento e lances irresponsáveis de “contabilidade criativa” (nome bonitinho para o que antigamente era simplesmente chamado de mentira, farsa ou fraude), faz os investidores internos e estrangeiros baterem em retirada por absoluta falta de confiança e segurança jurídica. Não tendo para onde correr, o governo vai se endividar ainda mais, garantindo um futuro de recessão e alta do desemprego. Basta olhar o passado para enxergar o futuro.
Ainda temos tempo de colocar o Brasil nos eixos. Para tanto, em vez de retórica e sorrisos fúteis, precisaremos de trabalho e seriedade política. Em vez de apenas querer ganhar votos, o governo deve ter a decência de olhar para a nação e assumir que seu modelo econômico está superado. Precisamos de investimento educacional e de infraestrutura. Precisamos de menos burocracia e de maior simplicidade fiscal. Precisamos estimular a indústria nacional e deixar de tratar o empresário como um inimigo do Estado. Politicamente, precisamos de partidos, e não de quadrilhas do poder. Ao fim, precisamos ser autenticamente cidadãos e não apenas eleitores de ocasião.
E então, onde você está e o que quer para o nosso país?
Boa fé não faz mal a ninguém - PAULO BROSSARD
ZERO HORA -24/03
Há uma semana, pouco mais, o STF pôs a pá de cal em velha controvérsia entre a União e a Varig, condenando a estatal a pagar pesada indenização à empresa. Fala-se em coisa de R$ 3 bilhões. O processo se arrastou mais de 20 anos e todas as delongas possíveis fazem parte do passado.
Tudo teria decorrido do congelamento imposto à Varig no tocante à atualização de suas fontes vitais, legais e contratuais. Desse modo durante dois ou três anos, salvo engano, e inflação desenfreada, a empresa ficou impedida de reajustar o valor de seus serviços. O resultado foi o que não podia deixar de vir a ser. Decorrido esse longo período os danos teriam chegado à cifra bilionária. Este o fato em sua expressão esquemática.
O caso em si mesmo é relevante, mas ele não se resume a duas entidades, uma estatal e a outra privada, pois enseja a apreciação de um aspecto por vezes ignorado. Entre nós, a administração em vez de evitar abusos, por vezes, parece que deles se utiliza na esperança de ser salvo por obra do Espírito Santo e se esforça por empregar os possíveis recursos protelatórios, até que o litígio perdure por anos e a controvérsia termine com a decisão final transitada em julgado e com ela uma enorme dívida por saldar.
O congelamento de preços é medida rápida e fácil, mas não pode ser senão transitória, o mais breve possível; no entanto, dada a sua comodidade tende a durar o que não deve e não pode. No caso, o resultado foi aprofundar um poço que aumentava dia a dia; a União esperando uma vitória forense que não chegou, enquanto isto, o poço cresceu implacavelmente e com ele o valor da indenização decorrente do abuso administrativo.
Sempre me pareceu que se o homem comum está sujeito às regras ditadas pela seriedade e boa fé em suas relações civis, o Estado está a elas sujeito mais do que ninguém, exatamente por ser o Estado, no entanto, isto nem sempre ocorre. Outrossim, a Fazenda tem de ter um serviço jurídico modelar, pois se é verdade que ela tem um único cliente, este o maior do Brasil, que é a própria União; em condições de aconselhá-la pelo menos no plano judicial, seja no sentido de sustentar o seu alegado direito ou a recomendar que não insista em uma pretensão infundada e que pode resultar em onerosa. Aliás, recentemente governos estaduais têm orientado seus defensores judiciais a não recorrer ou não insistir nos feitos em que a jurisprudência dos Tribunais Superiores tenha consagrado orientação divergente da dos Estados. Caso contrário, o Estado corre o risco de, ao cabo de certos litígios, ver-se em face de sanções irrecorríveis, como sucedeu com o caso da Varig.
Enfim, a boa fé não faz mal a ninguém e a natural superioridade da União em relação aos litigantes em geral autoriza que o poder público se sirva da equidade para obter o que, às vezes, o império da lei não atinge.
* * *
Caso de excepcional gravidade, aliás, já denunciado e surpreendentemente sem repercussão proporcional, retornou ao noticiário. A compra pela Petrobras da mal cheirosa refinaria de Pasadena, no Texas, em 2006, ao que tudo indica ainda dará muito que falar e motivos não faltam.
Há uma semana, pouco mais, o STF pôs a pá de cal em velha controvérsia entre a União e a Varig, condenando a estatal a pagar pesada indenização à empresa. Fala-se em coisa de R$ 3 bilhões. O processo se arrastou mais de 20 anos e todas as delongas possíveis fazem parte do passado.
Tudo teria decorrido do congelamento imposto à Varig no tocante à atualização de suas fontes vitais, legais e contratuais. Desse modo durante dois ou três anos, salvo engano, e inflação desenfreada, a empresa ficou impedida de reajustar o valor de seus serviços. O resultado foi o que não podia deixar de vir a ser. Decorrido esse longo período os danos teriam chegado à cifra bilionária. Este o fato em sua expressão esquemática.
O caso em si mesmo é relevante, mas ele não se resume a duas entidades, uma estatal e a outra privada, pois enseja a apreciação de um aspecto por vezes ignorado. Entre nós, a administração em vez de evitar abusos, por vezes, parece que deles se utiliza na esperança de ser salvo por obra do Espírito Santo e se esforça por empregar os possíveis recursos protelatórios, até que o litígio perdure por anos e a controvérsia termine com a decisão final transitada em julgado e com ela uma enorme dívida por saldar.
O congelamento de preços é medida rápida e fácil, mas não pode ser senão transitória, o mais breve possível; no entanto, dada a sua comodidade tende a durar o que não deve e não pode. No caso, o resultado foi aprofundar um poço que aumentava dia a dia; a União esperando uma vitória forense que não chegou, enquanto isto, o poço cresceu implacavelmente e com ele o valor da indenização decorrente do abuso administrativo.
Sempre me pareceu que se o homem comum está sujeito às regras ditadas pela seriedade e boa fé em suas relações civis, o Estado está a elas sujeito mais do que ninguém, exatamente por ser o Estado, no entanto, isto nem sempre ocorre. Outrossim, a Fazenda tem de ter um serviço jurídico modelar, pois se é verdade que ela tem um único cliente, este o maior do Brasil, que é a própria União; em condições de aconselhá-la pelo menos no plano judicial, seja no sentido de sustentar o seu alegado direito ou a recomendar que não insista em uma pretensão infundada e que pode resultar em onerosa. Aliás, recentemente governos estaduais têm orientado seus defensores judiciais a não recorrer ou não insistir nos feitos em que a jurisprudência dos Tribunais Superiores tenha consagrado orientação divergente da dos Estados. Caso contrário, o Estado corre o risco de, ao cabo de certos litígios, ver-se em face de sanções irrecorríveis, como sucedeu com o caso da Varig.
Enfim, a boa fé não faz mal a ninguém e a natural superioridade da União em relação aos litigantes em geral autoriza que o poder público se sirva da equidade para obter o que, às vezes, o império da lei não atinge.
* * *
Caso de excepcional gravidade, aliás, já denunciado e surpreendentemente sem repercussão proporcional, retornou ao noticiário. A compra pela Petrobras da mal cheirosa refinaria de Pasadena, no Texas, em 2006, ao que tudo indica ainda dará muito que falar e motivos não faltam.
Limites ao conteúdo local - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 24/03
Embora seja da mais perfeita lógica empresarial, a declaração da presidente da Petrobrás, Graça Foster, de que a prioridade de sua gestão é o aumento da produção de petróleo e não a contratação de equipamentos produzidos pela indústria nacional contraria a lógica eleitoral do PT - se é que há lógica nisso. Prometida pelo então candidato petista Lula durante a campanha presidencial de 2002, a política de conteúdo local mínimo em todos os equipamentos adquiridos pelas empresas petrolíferas em operação no País foi oficializada e mantém-se até hoje, com efeitos positivos para parte da indústria, mas com a imposição de dificuldades para a Petrobrás e outras companhias do setor.
Obrigada a comprar no País, a estatal muitas vezes paga mais caro do que pagaria no exterior e nem sempre obtém produtos com a tecnologia que poderia obter fora. Ela tolerou essa situação durante 12 anos. A declaração de Graça Foster, feita durante a assinatura de contrato de encomenda de oito embarcações, indica que a situação está mudando.
As encomendas são parte das 146 embarcações previstas no Programa de Renovação da Frota de Apoio Marítimo, criado em 2008 com o objetivo de aumentar o nível de conteúdo nacional da frota de embarcações de apoio, utilizadas para levar mantimentos às plataformas em alto-mar e prestar serviços como o de lançamento de âncoras e dutos submarinos.
Há alguns meses, ao comemorar o resultado do leilão do Campo de Libra, a presidente Dilma Rousseff disse que não haveria alterações nas regras para o setor de petróleo, entre as quais as de conteúdo nacional. Até há pouco, a direção da Petrobrás evitava referências diretas aos problemas criados por essas regras. Mas, agora, pressionada pelos maus resultados operacionais e financeiros da empresa, sua presidente vem procurando recuperar a capacidade de produção de óleo, melhorar o desempenho das atuais refinarias - insuficientes para atender à demanda interna crescente de combustíveis -, obter receitas que possam sustentar os ambiciosos programas de investimentos dos próximos anos e, ainda assim, aumentar sua rentabilidade. Isso significa, entre outras coisas, encomendar os equipamentos de que necessita junto a fornecedores que podem oferecer o melhor produto pelo menor preço e nas melhores condições de pagamento.
"Sabemos que não é possível fazer tudo (no Brasil) e a Petrobrás não pode esperar", disse Graça Foster. Esclareceu, em seguida, que "não é prioridade para nós nenhuma contratação que coloque em risco nossa curva de produção". É uma forma de dizer que, para alcançar as metas de aumento de produção fixadas em seu plano de negócios para o período 2014-2018, a empresa comprará no exterior o que não puder ser fornecido pela indústria local. É o que deveria ter feito sempre.
Para tentar tranquilizar os dirigentes das empresas brasileiras, disse que o óleo novo - isto é, o contínuo aumento da produção - "nos dá segurança de que a indústria naval, nossa fornecedora, veio para ficar e para ter conosco prestígio e responsabilidade que é preciso ter".
As dificuldades da Petrobrás são nítidas. Em janeiro, a produção de petróleo e gás caiu 2,2% em relação a dezembro, para 2,31 milhões de barris por dia. No ano passado, a produção média ficou em 1,9 milhão de barris diários. A meta da empresa é elevar a produção para 4,2 milhões de barris por dia em 2020.
Na área de refino, a não conclusão de nenhuma nova refinaria nos últimos anos impediu a Petrobrás de atender à crescente demanda interna por combustíveis, o que resultou no aumento da importação e do déficit no comércio desses itens. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis prevê que, neste ano, o déficit no comércio de gasolina e de diesel alcançará US$ 11,5 bilhões.
Como paga mais pelo combustível que é forçada a importar do que pode cobrar do consumidor, pois o preço no mercado interno é severamente controlado pelo governo, a estatal acumula prejuízos nessa operação, o que afeta duramente sua capacidade de investimentos.
Embora seja da mais perfeita lógica empresarial, a declaração da presidente da Petrobrás, Graça Foster, de que a prioridade de sua gestão é o aumento da produção de petróleo e não a contratação de equipamentos produzidos pela indústria nacional contraria a lógica eleitoral do PT - se é que há lógica nisso. Prometida pelo então candidato petista Lula durante a campanha presidencial de 2002, a política de conteúdo local mínimo em todos os equipamentos adquiridos pelas empresas petrolíferas em operação no País foi oficializada e mantém-se até hoje, com efeitos positivos para parte da indústria, mas com a imposição de dificuldades para a Petrobrás e outras companhias do setor.
Obrigada a comprar no País, a estatal muitas vezes paga mais caro do que pagaria no exterior e nem sempre obtém produtos com a tecnologia que poderia obter fora. Ela tolerou essa situação durante 12 anos. A declaração de Graça Foster, feita durante a assinatura de contrato de encomenda de oito embarcações, indica que a situação está mudando.
As encomendas são parte das 146 embarcações previstas no Programa de Renovação da Frota de Apoio Marítimo, criado em 2008 com o objetivo de aumentar o nível de conteúdo nacional da frota de embarcações de apoio, utilizadas para levar mantimentos às plataformas em alto-mar e prestar serviços como o de lançamento de âncoras e dutos submarinos.
Há alguns meses, ao comemorar o resultado do leilão do Campo de Libra, a presidente Dilma Rousseff disse que não haveria alterações nas regras para o setor de petróleo, entre as quais as de conteúdo nacional. Até há pouco, a direção da Petrobrás evitava referências diretas aos problemas criados por essas regras. Mas, agora, pressionada pelos maus resultados operacionais e financeiros da empresa, sua presidente vem procurando recuperar a capacidade de produção de óleo, melhorar o desempenho das atuais refinarias - insuficientes para atender à demanda interna crescente de combustíveis -, obter receitas que possam sustentar os ambiciosos programas de investimentos dos próximos anos e, ainda assim, aumentar sua rentabilidade. Isso significa, entre outras coisas, encomendar os equipamentos de que necessita junto a fornecedores que podem oferecer o melhor produto pelo menor preço e nas melhores condições de pagamento.
"Sabemos que não é possível fazer tudo (no Brasil) e a Petrobrás não pode esperar", disse Graça Foster. Esclareceu, em seguida, que "não é prioridade para nós nenhuma contratação que coloque em risco nossa curva de produção". É uma forma de dizer que, para alcançar as metas de aumento de produção fixadas em seu plano de negócios para o período 2014-2018, a empresa comprará no exterior o que não puder ser fornecido pela indústria local. É o que deveria ter feito sempre.
Para tentar tranquilizar os dirigentes das empresas brasileiras, disse que o óleo novo - isto é, o contínuo aumento da produção - "nos dá segurança de que a indústria naval, nossa fornecedora, veio para ficar e para ter conosco prestígio e responsabilidade que é preciso ter".
As dificuldades da Petrobrás são nítidas. Em janeiro, a produção de petróleo e gás caiu 2,2% em relação a dezembro, para 2,31 milhões de barris por dia. No ano passado, a produção média ficou em 1,9 milhão de barris diários. A meta da empresa é elevar a produção para 4,2 milhões de barris por dia em 2020.
Na área de refino, a não conclusão de nenhuma nova refinaria nos últimos anos impediu a Petrobrás de atender à crescente demanda interna por combustíveis, o que resultou no aumento da importação e do déficit no comércio desses itens. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis prevê que, neste ano, o déficit no comércio de gasolina e de diesel alcançará US$ 11,5 bilhões.
Como paga mais pelo combustível que é forçada a importar do que pode cobrar do consumidor, pois o preço no mercado interno é severamente controlado pelo governo, a estatal acumula prejuízos nessa operação, o que afeta duramente sua capacidade de investimentos.
Fora dos gabinetes - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 24/03
A infeliz coincidência da tramitação final do projeto do Marco Civil da Internet, encaminhado ao Congresso pelo governo, com a crise entre PT e PMDB prejudica o debate legislativo de uma legislação-chave para garantir a efetiva democratização, no país, do uso da rede mundial de computadores.
Isso porque, por inevitável, o projeto passou a ser munição nesta briga, pois seu relator, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é líder de bancada e da rebelião de parte do PMDB e de partidos menores da base, desgostosos com os rumos que tomou a reforma ministerial feita pela presidente Dilma para supostamente consolidar apoios à sua reeleição.
Mesmo antes da crise, Cunha já assumira posição contrária a um item estratégico do Marco, o que firma o princípio da “neutralidade de rede”, segundo a qual a todo cliente têm de ser oferecidas as mesmas condições de tráfego na rede, em termos de velocidade e tamanho de arquivo. Sejam a clientes parrudos como Google, Netflix, Yahoo ou a um novo e pequeno site desenvolvido numa start-up.
O princípio é lógico, mas polêmico, por não agradar às telecoms, companhias de telecomunicações. Para elas, interessa cobrar tarifas mais elevadas a quem necessita entregar volumes crescentes de dados — imagem, som, texto — e na maior velocidade possível, sem interrupções. Imagine-se quanto uma Netflix, que chega a ocupar 50% da rede nos Estados Unidos, em horário nobre, com seus filmes, está disposta a pagar ao provedor para manter a carteira de assinantes e ampliá-la.
Tudo faz sentido, não fosse o fato de a não adoção do conceito de neutralidade de rede prejudicar as empresas nascentes na internet. Se as telecoms puderem cobrar tarifas mais elevadas às grandes corporações “dotcom”, empresas de internet, para elas não fará grande diferença do ponto de vista financeiro. Não ocorre o mesmo com start-ups.
Em outras palavras, cassar a neutralidade de rede significa erguer barreiras à entrada de novos concorrentes neste vasto e crescente mercado digital. Corrompe-se talvez a principal característica da internet, a de ser “aberta e democrática”. Em alguma medida, quem tiver mais dinheiro em caixa levará vantagem em relação a quem tenha a melhor ideia, porém com frágil suporte financeiro. A internet, assim, ficará mais parecida com o antigo universo analógico.
E, como as telecoms costumam ter sites próprios, também nunca se saberá ao certo se empresas coligadas não receberão tratamento favorecido. Há, então, mais um risco: o de, sem a neutralidade de rede, existirem distorções na concorrência.
Noticia-se que o projeto poderá ser votado amanhã, mediante acordo pelo qual a neutralidade seria regulamentada depois, por decreto. Também não é o melhor caminho. Este é um assunto a ser resolvido na transparência do Congresso e não em gabinetes distantes da opinião pública.
A infeliz coincidência da tramitação final do projeto do Marco Civil da Internet, encaminhado ao Congresso pelo governo, com a crise entre PT e PMDB prejudica o debate legislativo de uma legislação-chave para garantir a efetiva democratização, no país, do uso da rede mundial de computadores.
Isso porque, por inevitável, o projeto passou a ser munição nesta briga, pois seu relator, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é líder de bancada e da rebelião de parte do PMDB e de partidos menores da base, desgostosos com os rumos que tomou a reforma ministerial feita pela presidente Dilma para supostamente consolidar apoios à sua reeleição.
Mesmo antes da crise, Cunha já assumira posição contrária a um item estratégico do Marco, o que firma o princípio da “neutralidade de rede”, segundo a qual a todo cliente têm de ser oferecidas as mesmas condições de tráfego na rede, em termos de velocidade e tamanho de arquivo. Sejam a clientes parrudos como Google, Netflix, Yahoo ou a um novo e pequeno site desenvolvido numa start-up.
O princípio é lógico, mas polêmico, por não agradar às telecoms, companhias de telecomunicações. Para elas, interessa cobrar tarifas mais elevadas a quem necessita entregar volumes crescentes de dados — imagem, som, texto — e na maior velocidade possível, sem interrupções. Imagine-se quanto uma Netflix, que chega a ocupar 50% da rede nos Estados Unidos, em horário nobre, com seus filmes, está disposta a pagar ao provedor para manter a carteira de assinantes e ampliá-la.
Tudo faz sentido, não fosse o fato de a não adoção do conceito de neutralidade de rede prejudicar as empresas nascentes na internet. Se as telecoms puderem cobrar tarifas mais elevadas às grandes corporações “dotcom”, empresas de internet, para elas não fará grande diferença do ponto de vista financeiro. Não ocorre o mesmo com start-ups.
Em outras palavras, cassar a neutralidade de rede significa erguer barreiras à entrada de novos concorrentes neste vasto e crescente mercado digital. Corrompe-se talvez a principal característica da internet, a de ser “aberta e democrática”. Em alguma medida, quem tiver mais dinheiro em caixa levará vantagem em relação a quem tenha a melhor ideia, porém com frágil suporte financeiro. A internet, assim, ficará mais parecida com o antigo universo analógico.
E, como as telecoms costumam ter sites próprios, também nunca se saberá ao certo se empresas coligadas não receberão tratamento favorecido. Há, então, mais um risco: o de, sem a neutralidade de rede, existirem distorções na concorrência.
Noticia-se que o projeto poderá ser votado amanhã, mediante acordo pelo qual a neutralidade seria regulamentada depois, por decreto. Também não é o melhor caminho. Este é um assunto a ser resolvido na transparência do Congresso e não em gabinetes distantes da opinião pública.
Pacificação do Rio para além da Copa - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 24/03
A partir de 20 de novembro de 2008, quando a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) foi instalada na Favela Dona Marta, em Botafogo, o crescente sucesso da retomada de extensas e populosas áreas dominadas pelo tráfico no Rio de Janeiro pareceu realidade sem volta. Cada vez mais, a expectativa positiva firmava-se em números concretos, com vertiginosa queda dos índices de criminalidade. Até a paisagem dos morros mudou, com a população passando a usufruir de espaços públicos antes tomados por homens fortemente armados. Contudo, passados mais de cinco anos e quase quatro dezenas de UPPS depois, a política de segurança parece ter entrado em xeque.
O Estado não pode se intimidar. É cedo para avaliação definitiva dos acontecimentos, mas uma análise realista dos fatos e uma reação articulada, que una numa só força os governos municipal, estadual e federal, com o envolvimento de seus Três Poderes, se impõem, antes que o retrocesso seja consumado. O governador Sérgio Cabral correu a Brasília para pedir socorro. O reforço imediato - a ser detalhado a partir de hoje, conforme anunciado na sexta-feira - é para enfrentar os ataques sistemáticos a comunidades pacificadas. É certo que a emergência não pode ser ignorada. Mas urge ir além e, conforme previsto desde o início, consolidar a cidadania, garantindo aos moradores acesso a serviços públicos de qualidade.
É esse o fundamento para a paz. Mantê-la apenas pela presença ostensiva das forças de segurança é perpetuar o estado de tensão, animar a bandidagem a ficar à espreita, apenas aguardando o primeiro sinal de descuido para mostrar as garras. Por sua vez, o crime organizado deve ser enfrentado pelo aparato de inteligência do Estado. A apreensão de armas e drogas e a prisão de traficantes de pequeno, médio e até grande porte são necessárias, mas não bastam. É primordial esmagar o poder financeiro dessas instituições. Mas a sociedade sabe quão longe está de contar com tamanha eficiência, quando vê chefões comandarem o crime inclusive de dentro de penitenciárias.
A pouco mais de dois meses da Copa do Mundo e de dois anos das Olimpíadas, não deverão faltar investimentos para conter a violência urbana no Rio de Janeiro. Mas a Cidade Maravilhosa não se limita ao estereótipo de principal porta de entrada e cartão-postal do país. Os megaeventos são preocupação extra. A população tem apoiado as UPPs, como mostraram pesquisas de opinião realizadas antes das atuais investidas de bandoleiros, porque elas freiam a criminalidade, permitem o ir e vir, salvam vidas. Não é a imagem da metrópole, mas a sobrevivência de cada um que conta. De igual forma, a bem-sucedida estratégia de pacificação é mais que um trunfo político-eleitoral. Deve ser levada avante e aperfeiçoada tendo em vista o bem comum.
O Estado não pode se intimidar. É cedo para avaliação definitiva dos acontecimentos, mas uma análise realista dos fatos e uma reação articulada, que una numa só força os governos municipal, estadual e federal, com o envolvimento de seus Três Poderes, se impõem, antes que o retrocesso seja consumado. O governador Sérgio Cabral correu a Brasília para pedir socorro. O reforço imediato - a ser detalhado a partir de hoje, conforme anunciado na sexta-feira - é para enfrentar os ataques sistemáticos a comunidades pacificadas. É certo que a emergência não pode ser ignorada. Mas urge ir além e, conforme previsto desde o início, consolidar a cidadania, garantindo aos moradores acesso a serviços públicos de qualidade.
É esse o fundamento para a paz. Mantê-la apenas pela presença ostensiva das forças de segurança é perpetuar o estado de tensão, animar a bandidagem a ficar à espreita, apenas aguardando o primeiro sinal de descuido para mostrar as garras. Por sua vez, o crime organizado deve ser enfrentado pelo aparato de inteligência do Estado. A apreensão de armas e drogas e a prisão de traficantes de pequeno, médio e até grande porte são necessárias, mas não bastam. É primordial esmagar o poder financeiro dessas instituições. Mas a sociedade sabe quão longe está de contar com tamanha eficiência, quando vê chefões comandarem o crime inclusive de dentro de penitenciárias.
A pouco mais de dois meses da Copa do Mundo e de dois anos das Olimpíadas, não deverão faltar investimentos para conter a violência urbana no Rio de Janeiro. Mas a Cidade Maravilhosa não se limita ao estereótipo de principal porta de entrada e cartão-postal do país. Os megaeventos são preocupação extra. A população tem apoiado as UPPs, como mostraram pesquisas de opinião realizadas antes das atuais investidas de bandoleiros, porque elas freiam a criminalidade, permitem o ir e vir, salvam vidas. Não é a imagem da metrópole, mas a sobrevivência de cada um que conta. De igual forma, a bem-sucedida estratégia de pacificação é mais que um trunfo político-eleitoral. Deve ser levada avante e aperfeiçoada tendo em vista o bem comum.
Incertezas americanas - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 24/03
Primeiro encontro do Banco Central dos EUA sob nova direção não dissipou dúvidas quanto ao ritmo de mudança da política econômica do país
O primeiro encontro do banco central americano sob nova direção deixou inalterado e, portanto, ainda incerto o ritmo da mudança da política econômica dos Estados Unidos. O resultado da reunião inaugural do Fed sob a presidência de Janet Yellen não esclareceu quando serão elevadas as taxas de juros de curto prazo.
Desde o final do ano passado, o Fed passou a reduzir a quantidade de dinheiro despejada na economia a fim de amainar a crise que teve início em 2008. Até o final deste ano, tal política de estímulos terá fim. Alguns meses depois, o órgão voltará a elevar as taxas de juros de curto prazo, próximas de zero desde o final de 2008.
Em um aparente deslize, Janet Yellen teria dado a entender que os juros voltariam a subir um pouco mais cedo do que se prevê, talvez uma antecipação de um trimestre.
Avaliações posteriores da reunião de estreia de Yellen, porém, convergiram apenas para o consenso de que as taxas subirão em algum momento de 2015, sem que o Fed tenha explicitado os critérios que desencadearão tal mudança.
O programado fim dos estímulos e a subsequente alta de juros indicariam que a economia americana está no caminho da normalização, de crescimento maior e mais regular, em torno de 3% ao ano.
Por um lado, essa recuperação contribuirá para a estabilização da atividade econômica mundial. Por outro, tais mudanças causarão turbulências, que a princípio vão criar dificuldades para países com desequilíbrios econômicos, tais como os ditos emergentes --o Brasil inclusive.
A alta da taxa nos EUA vai induzir uma elevação de juros na economia mundial e, assim, encarecer os financiamentos dos quais dependem países com deficit externos relevantes. Foi por esse motivo que o início da normalização americana provocou desvalorizações da moeda e de outros ativos de países tidos como frágeis.
Depois de um início de ano tumultuado, os emergentes vivem semanas de calmaria. Crises, ou o mero temor de crises, como na Ucrânia e na China, além de uma desaceleração temporária nos Estados Unidos, levaram investidores a fugir de ativos de risco, o que costuma reduzir as taxas de juros americanas de longo prazo.
Caso sejam atenuados os riscos e se verifique que a parada americana deveu-se apenas aos efeitos de um inverno ruim, os juros de longo prazo voltarão a subir, sinal de aperto no mercado financeiro mundial. Ou seja, enquanto durar esse momento de ajuste nos EUA e as incertezas sobre seu ritmo, a volatilidade será recorrente.
A julgar pelas atitudes recentes do Fed, tal período de transtornos deve durar pelo menos até meados de 2015.
Desde o final do ano passado, o Fed passou a reduzir a quantidade de dinheiro despejada na economia a fim de amainar a crise que teve início em 2008. Até o final deste ano, tal política de estímulos terá fim. Alguns meses depois, o órgão voltará a elevar as taxas de juros de curto prazo, próximas de zero desde o final de 2008.
Em um aparente deslize, Janet Yellen teria dado a entender que os juros voltariam a subir um pouco mais cedo do que se prevê, talvez uma antecipação de um trimestre.
Avaliações posteriores da reunião de estreia de Yellen, porém, convergiram apenas para o consenso de que as taxas subirão em algum momento de 2015, sem que o Fed tenha explicitado os critérios que desencadearão tal mudança.
O programado fim dos estímulos e a subsequente alta de juros indicariam que a economia americana está no caminho da normalização, de crescimento maior e mais regular, em torno de 3% ao ano.
Por um lado, essa recuperação contribuirá para a estabilização da atividade econômica mundial. Por outro, tais mudanças causarão turbulências, que a princípio vão criar dificuldades para países com desequilíbrios econômicos, tais como os ditos emergentes --o Brasil inclusive.
A alta da taxa nos EUA vai induzir uma elevação de juros na economia mundial e, assim, encarecer os financiamentos dos quais dependem países com deficit externos relevantes. Foi por esse motivo que o início da normalização americana provocou desvalorizações da moeda e de outros ativos de países tidos como frágeis.
Depois de um início de ano tumultuado, os emergentes vivem semanas de calmaria. Crises, ou o mero temor de crises, como na Ucrânia e na China, além de uma desaceleração temporária nos Estados Unidos, levaram investidores a fugir de ativos de risco, o que costuma reduzir as taxas de juros americanas de longo prazo.
Caso sejam atenuados os riscos e se verifique que a parada americana deveu-se apenas aos efeitos de um inverno ruim, os juros de longo prazo voltarão a subir, sinal de aperto no mercado financeiro mundial. Ou seja, enquanto durar esse momento de ajuste nos EUA e as incertezas sobre seu ritmo, a volatilidade será recorrente.
A julgar pelas atitudes recentes do Fed, tal período de transtornos deve durar pelo menos até meados de 2015.
Gol contra a Copa - EDITORIAL ZERO HORA
ZERO HORA - 24/11
São irreversíveis os danos provocados pelos atrasos em obras decisivas para o êxito da Copa do Mundo no Brasil, como os que comprometem a ampliação do terminal de passageiros do Aeroporto Salgado Filho. São prejuízos que não devem ser medidos apenas pela contabilidade econômica, que afeta empresas de aviação, prestadores de serviço e passageiros. Há também um dano sério à imagem do país. O não cumprimento de cronogramas estabelecidos com boa antecedência expõe deficiências de gestão tanto do setor público quanto das empresas que assumiram o compromisso de tocar as obras. É desalentadora a informação divulgada por este jornal de que há certa displicência da empreiteira, que dispões de operários em número insuficiente e ainda enfrenta conflitos trabalhistas.
Projetos importantes para o sucesso da mobilidade urbana durante o Mundial não poderiam ter sido tratados com tanto descuido por parte dos governos e dos organismos diretamente envolvidos. No caso do aeroporto, fica evidente que a Infraero foi alertada, pelo ritmo da obra, que o planejado não seria cumprido. Chega-se agora, às vésperas do evento, à conclusão de que nenhuma medida será capaz de recuperar o tempo perdido. A ampliação do terminal não estará pronta até o início da Copa. Casos como esse são vergonhosos para o setor público, incapaz de fazer valer sua autoridade _ e suas atribuições _, e também para as empresas que não conseguiram dar conta da tarefa.
O exemplo do Salgado Filho soma-se a outros, nas mais variadas áreas, em que governos e empreiteiras tentam transferir responsabilidades. Há queixas de administrações locais contra a não liberação de verbas da União, desentendimentos causados por entraves burocráticos e alegações de conteúdo técnico. Com tantos atrasos em tantas frentes, não há como aceitar as desculpas com naturalidade. O que se denuncia, na maioria das obras fora do cronograma, é uma lamentável combinação de desleixo e ineficiência de todas as partes.
São irreversíveis os danos provocados pelos atrasos em obras decisivas para o êxito da Copa do Mundo no Brasil, como os que comprometem a ampliação do terminal de passageiros do Aeroporto Salgado Filho. São prejuízos que não devem ser medidos apenas pela contabilidade econômica, que afeta empresas de aviação, prestadores de serviço e passageiros. Há também um dano sério à imagem do país. O não cumprimento de cronogramas estabelecidos com boa antecedência expõe deficiências de gestão tanto do setor público quanto das empresas que assumiram o compromisso de tocar as obras. É desalentadora a informação divulgada por este jornal de que há certa displicência da empreiteira, que dispões de operários em número insuficiente e ainda enfrenta conflitos trabalhistas.
Projetos importantes para o sucesso da mobilidade urbana durante o Mundial não poderiam ter sido tratados com tanto descuido por parte dos governos e dos organismos diretamente envolvidos. No caso do aeroporto, fica evidente que a Infraero foi alertada, pelo ritmo da obra, que o planejado não seria cumprido. Chega-se agora, às vésperas do evento, à conclusão de que nenhuma medida será capaz de recuperar o tempo perdido. A ampliação do terminal não estará pronta até o início da Copa. Casos como esse são vergonhosos para o setor público, incapaz de fazer valer sua autoridade _ e suas atribuições _, e também para as empresas que não conseguiram dar conta da tarefa.
O exemplo do Salgado Filho soma-se a outros, nas mais variadas áreas, em que governos e empreiteiras tentam transferir responsabilidades. Há queixas de administrações locais contra a não liberação de verbas da União, desentendimentos causados por entraves burocráticos e alegações de conteúdo técnico. Com tantos atrasos em tantas frentes, não há como aceitar as desculpas com naturalidade. O que se denuncia, na maioria das obras fora do cronograma, é uma lamentável combinação de desleixo e ineficiência de todas as partes.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
PT AGE PARA TOMAR A VAGA DE SARNEY NO SENADO
O PT nacional finge contrariedade, mas nada faz para impedir o PT-AP de lançar Dora Nascimento contra José Sarney (PMDB) ao Senado, em outubro. Pior: integrando a chapa do atual governador do Amapá, Camilo Capiberibe (PSB), arqui-inimigo do ex-presidente. A estratégia do PT, definida pelo ex-presidente Lula, é “atropelar” aliados para lhes tomar as vagas, nem que entre eles estejam figuras como José Sarney.
POR POUCO
Na última eleição do senador José Sarney ganhou com menos de 2% de diferença uma disputa apertada a com deputada estadual Cristina Almeida (PSB). Agora, o PT acha que pode eleger Dora Nascimento contra Sarney.
PRIORIDADE PETISTA
Após admitir candidatura em 2018, Lula fixou a prioridade do PT: eleger bancadas majoritárias no Senado e principalmente na Câmara.
PARA ENTENDER A JOGADA
O número de deputados federais eleitos determina o tempo de TV de cada partido na campanha eleitoral seguinte.
DUPLA PEDETISTA
Dois ex-governadores do PDT, candidatos este ano, correm o risco de veto da lei da Ficha Limpa: Waldez Góes (AP) e Ronaldo Lessa (AL).
SENADORES TORRARAM R$ 2,5 MILHÕES NO RECESSO
Apesar de o ano Legislativo só haver começado de fato depois do Carnaval, os senadores mantiveram seus gastos com a Cota para Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap) a todo vapor, e torraram mais de R$ 2,5 milhões só nos dois primeiros meses do ano. Para não mexer no bolso e gastar o salário (R$ 26.723,13), muitos deles utilizam a Ceap em passagens aéreas, combustível e até mesmo alimentação.
QUEM EXPLICA?
Grande parte do dinheiro gasto em janeiro e fevereiro, período de recesso, foi para “divulgação da atividade parlamentar”.
PRIMEIRO OS MEUS
Antes de confirmar que será vice de Eduardo Campos (PSB), Marina exige negociar alianças da turma do Rede em São Paulo, Rio e Minas.
TUDO POR PALANQUE
Eduardo Campos pressiona Wilma de Faria (PSB-RN) a disputar o governo potiguar contra Henrique Alves (PMDB), em vez do Senado.
GRANDE CABO ELEITORAL
O Planalto ligou todos os alertas após constatar que o desgaste acentuado do prefeito paulistano Fernando Haddad (PT) faz dele um dos principais cabos eleitorais do PSDB, em outubro.
VOCÊ AMANHÃ
Preterido por Lula, que preferiu Lindbergh Farias a Pezão para sucedê-lo, o governador Sérgio Cabral (PMDB) sofre o “efeito Alckmin”: a bandidagem à solta no Rio, prometendo “fazer o diabo” até a Copa.
REBAIXADOS
A Previ, previdência complementar dos servidores do Banco do Brasil, trocou o “associados”, em seus comunicados, por “assistidos”. “De sócios, passamos a socorridos”, alerta um leitor, aposentado no BB.
FICOU NA AMEAÇA
Preterido para o ministério da presidenta Dilma, o senador Vital do Rêgo (PMDB) ameaçou apoiar o PSDB, na campanha para o governo da Paraíba, mas o partido deverá lançar seu irmão Veneziano.
DITADURA, 50
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) fez 57 anos sexta (21), mas vai comemorar sábado (31), nos 50 anos do golpe. Usará um avião com faixas de protesto contra Dilma: “Vá para Cuba, Fidel Castro de saia”.
APETITE INFINITO
Deputados do PMDB lamentam que a trapalhada da presidenta Dilma sobre a compra de refinaria pela Petrobras tenha ocorrido só depois da reforma ministerial, impossibilitando mais pressão da sigla por cargos.
RECADO DADO
Indicado para comissão externa que investigará denúncias contra a Petrobras, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) já avisou que adotará postura independente: “Eu quero é apurar, doa a quem doer”.
FUMAÇA ECONOMIZADA
Dois sócios comentavam a decisão do Comodoro do Iate Clube de Brasília de cortar o fornecimento de carvão ao restaurante dos funcionários. Um deles, venenoso, tascou: “É economia de fumaça…”
PENSANDO BEM…
…os sucessivos escândalos da Petrobras já ameaçam atingir a camada do pré-sal.
O PT nacional finge contrariedade, mas nada faz para impedir o PT-AP de lançar Dora Nascimento contra José Sarney (PMDB) ao Senado, em outubro. Pior: integrando a chapa do atual governador do Amapá, Camilo Capiberibe (PSB), arqui-inimigo do ex-presidente. A estratégia do PT, definida pelo ex-presidente Lula, é “atropelar” aliados para lhes tomar as vagas, nem que entre eles estejam figuras como José Sarney.
POR POUCO
Na última eleição do senador José Sarney ganhou com menos de 2% de diferença uma disputa apertada a com deputada estadual Cristina Almeida (PSB). Agora, o PT acha que pode eleger Dora Nascimento contra Sarney.
PRIORIDADE PETISTA
Após admitir candidatura em 2018, Lula fixou a prioridade do PT: eleger bancadas majoritárias no Senado e principalmente na Câmara.
PARA ENTENDER A JOGADA
O número de deputados federais eleitos determina o tempo de TV de cada partido na campanha eleitoral seguinte.
DUPLA PEDETISTA
Dois ex-governadores do PDT, candidatos este ano, correm o risco de veto da lei da Ficha Limpa: Waldez Góes (AP) e Ronaldo Lessa (AL).
SENADORES TORRARAM R$ 2,5 MILHÕES NO RECESSO
Apesar de o ano Legislativo só haver começado de fato depois do Carnaval, os senadores mantiveram seus gastos com a Cota para Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap) a todo vapor, e torraram mais de R$ 2,5 milhões só nos dois primeiros meses do ano. Para não mexer no bolso e gastar o salário (R$ 26.723,13), muitos deles utilizam a Ceap em passagens aéreas, combustível e até mesmo alimentação.
QUEM EXPLICA?
Grande parte do dinheiro gasto em janeiro e fevereiro, período de recesso, foi para “divulgação da atividade parlamentar”.
PRIMEIRO OS MEUS
Antes de confirmar que será vice de Eduardo Campos (PSB), Marina exige negociar alianças da turma do Rede em São Paulo, Rio e Minas.
TUDO POR PALANQUE
Eduardo Campos pressiona Wilma de Faria (PSB-RN) a disputar o governo potiguar contra Henrique Alves (PMDB), em vez do Senado.
GRANDE CABO ELEITORAL
O Planalto ligou todos os alertas após constatar que o desgaste acentuado do prefeito paulistano Fernando Haddad (PT) faz dele um dos principais cabos eleitorais do PSDB, em outubro.
VOCÊ AMANHÃ
Preterido por Lula, que preferiu Lindbergh Farias a Pezão para sucedê-lo, o governador Sérgio Cabral (PMDB) sofre o “efeito Alckmin”: a bandidagem à solta no Rio, prometendo “fazer o diabo” até a Copa.
REBAIXADOS
A Previ, previdência complementar dos servidores do Banco do Brasil, trocou o “associados”, em seus comunicados, por “assistidos”. “De sócios, passamos a socorridos”, alerta um leitor, aposentado no BB.
FICOU NA AMEAÇA
Preterido para o ministério da presidenta Dilma, o senador Vital do Rêgo (PMDB) ameaçou apoiar o PSDB, na campanha para o governo da Paraíba, mas o partido deverá lançar seu irmão Veneziano.
DITADURA, 50
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) fez 57 anos sexta (21), mas vai comemorar sábado (31), nos 50 anos do golpe. Usará um avião com faixas de protesto contra Dilma: “Vá para Cuba, Fidel Castro de saia”.
APETITE INFINITO
Deputados do PMDB lamentam que a trapalhada da presidenta Dilma sobre a compra de refinaria pela Petrobras tenha ocorrido só depois da reforma ministerial, impossibilitando mais pressão da sigla por cargos.
RECADO DADO
Indicado para comissão externa que investigará denúncias contra a Petrobras, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) já avisou que adotará postura independente: “Eu quero é apurar, doa a quem doer”.
FUMAÇA ECONOMIZADA
Dois sócios comentavam a decisão do Comodoro do Iate Clube de Brasília de cortar o fornecimento de carvão ao restaurante dos funcionários. Um deles, venenoso, tascou: “É economia de fumaça…”
PENSANDO BEM…
…os sucessivos escândalos da Petrobras já ameaçam atingir a camada do pré-sal.