Para a inflação futura cair, a inflação corrente vai subir
O Banco Central vai segurar a taxa de juros, o governo vai explodir o gasto público, a taxa de câmbio sofrerá uma forte desvalorização, a inflação baterá no teto da meta ou mais e a atividade vai definhar.
Na macroeconomia, eram esses os prognósticos que predominavam no fim do ano passado nas agendas dos economistas de mercado para 2014, amparados no comportamento costumeiro dos governantes em tempos de reeleição.
Confrontada com o cenário acima, a realidade hoje é melhor. Os juros subiram para 10,75% ao ano - voltando ao patamar que Lula deixou em dezembro de 2010 - e podem chegar a 11% na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) em 1° e 2 de abril; o câmbio está razoavelmente comportado no regime de taxas flutuantes; o governo se comprometeu com superávit primário de 1,9% do PIB quando o mercado esperava 1,4% do PIB; a inflação acumulada em doze meses é de 5,59% até janeiro.
Ontem veio uma boa notícia: o crescimento no último trimestre de 2013 não foi tão ruim quanto se temia. O PIB cresceu 0,7% enquanto o mercado estimava 0,3%.
No ano, a expansão da economia foi de 2,3%, exatamente como previa o relatório de inflação do BC divulgado em dezembro. Isso significa que a herança estatística de 2013 para o PIB de 2014 já garante um crescimento de algo próximo a 0,7% este ano. Pode não ser suficiente para confirmar as expectativas do Ministério da Fazenda, de crescimento de 2,5% este ano, mas desautoriza projeções mais pessimistas de um PIB abaixo de 1% para 2014.
O esforço fiscal prometido pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, está e ficará sob observação por algum tempo, até que a execução das contas públicas mês a mês venha a dirimir as dúvidas. Mas é inegável que o governo fez uma correção de postura. Não só está empenhado em produzir esse superávit em um ano eleitoral, mas dispôs-se a dialogar com os representantes do mercado financeiro antes e depois do anúncio do programa fiscal. Sabe, também, que estará sob intenso escrutínio dos agentes econômicos.
A tarefa de Mantega apenas começou. Há muito o que definir, a começar da solução para o financiamento da despesa de energia pelo uso das térmicas. No campo fiscal, porém, obteve-se uma trégua. Economistas que estiveram com Mantega em reunião na segunda feira em São Paulo até admitiram que o governo de Dilma está mais amigável com o mercado.
A expansão da oferta de crédito público desacelera, conforme a presidente anunciou que faria em setembro de 2013, durante seminário sobre investimentos em infraestrutura no Brasil, em Nova York, logo após o seu discurso na Assembleia da ONU.
Mantega ainda não divulgou qual será o aporte do Tesouro Nacional ao BNDES este ano para irrigar o crédito, mas a Caixa já avisou que nas suas agências ele será mais regrado. Em 2013 o crescimento da carteira de crédito da Caixa foi de 36% e em 2014 vai cair para a casa dos 20%.
Passada a divulgação do programa fiscal, é hora de atacar outros problemas de curto prazo que também minaram a confiança do setor privado nas ações do governo.
Dois casos são gritantes e reforçam a percepção de que Dilma Rousseff não acredita no sistema de preços e considera que o Palácio do Planalto está melhor equipado do que o mercado para estabelecer quando e de quanto devem ser os reajustes da Petrobras e do setor elétrico.
O valor de mercado da Petrobras, que chegou a R$ 472 bilhões em maio de 2008, caiu para R$ 373 bilhões logo após a capitalização, em setembro de 2010, e ontem fechou em R$ 177,9 bilhões. Foram as decisões de governo seguidas do controle des preços dos combustíveis que fizeram derreter o valor da maior companhia do país.
Decisões de governo também levaram a uma pesada distorção no mercado de energia. As três empresas estaduais de energia - Cemig, Cesp e Copel - que rejeitaram os termos do acordo oferecido por Dilma para renovar por 30 anos os contratos de concessões de suas hidrelétricas estão, hoje, nadando em dinheiro com a disparada de preços no mercado livre. Essas companhias, ironicamente controladas por governos de oposição, venderam energia em fevereiro a R$ 822,83 o MWh. Já a Eletrobras, que contra a vontade dos acionistas minoritários teve que aderir ao acordo, vende boa parcela da energia que produz por menos de R$ 30,00 o MWh.
Cálculos do J.P.Morgan apontam que as três empresas, em um cenário de manutenção dos preços de fevereiro, poderão ganhar R$ 7 bilhões de receitas adicionais este ano. Valor superior ao que embolsariam nos 30 anos de concessão, calculam especialistas.
Foi para controlar a inflação que o governo interferiu nos preços da energia. Mesmo assim, a inflação no país continua alta.
Paradoxalmente, ao optar pela política de controle de preços e tarifas públicas acumularam-se defasagens que impedem uma melhora nas expectativas de inflação futura. Para este ano, as expectativas são de 6%. Mantega, aliás, deixou claro na reunião com os economistas que ele não gosta de acumular defasagens , sugerindo que a decisão foi tomada fora do Ministério da Fazenda.
Se descongelar os preços que mantém a inflação corrente mais baixa, o governo poderá colher uma taxa de inflação melhor no futuro próximo. Ou seja, para o IPCA cair, ele primeiro terá que subir.
O governo de 2013 para 2014 não é o mesmo de 2011 para 2012. A duras penas, ele está aprendendo com a falta de resultados da política econômica que empreendeu.
Experientes assessores da presidente constatam que quando confrontada com a inteireza dos problemas, Dilma Rousseff, se move na direção certa. A proeminência do temperamento da presidente nem sempre estimula a crueza dos relatos e argumentos de seus colaboradores.
Na macroeconomia, hoje ela estaria delegando mais aos profissionais do ramo, atestam esses assessores, depois de tentar reduzir os juros e desvalorizar o câmbio de forma mais autônoma. Na questão energética, sua especialidade, Dilma ainda não estaria convencida das soluções.