ZERO HORA - 29/01
O site www.vakinha.com.br permite que qualquer pessoa organize uma vaquinha com um propósito determinado, desde conseguir dinheiro para a festa de formatura da filha até reformar o teto da igreja, desde reunir fundos para uma cirurgia até realizar uma viagem para conhecer o neto que nasceu em Sergipe. A pessoa estipula quanto vai precisar e, ao alcançar a quantia desejada, sai automaticamente do site – não há excedente. As contribuições podem ser feitas por boleto bancário ou cartão de crédito, e, se não estou enganada, o valor mínimo é de R$ 5.
Atualmente, há uma vaquinha em prol do dono do carro incendiado durante um protesto em São Paulo. O serralheiro Itamar Santos passava com seu velho Fusca ano 75 e mais quatro pessoas, incluindo uma criança, na Avenida Consolação, quando foi surpreendido por colchões pegando fogo no meio do caminho. Achou que conseguiria desviar da barricada, não conseguiu e, quando deu por si, o veículo estava em chamas. Foi o tempo de estacionar e retirar todos de dentro. Uma sorte terem escapado ilesos, mas o Fusca deu perda total, e o serralheiro ficou sem o carro com que entregava portões, seu ganha-pão. Agora, há uma vaquinha em benefício do seu Itamar a fim de que ele receba R$ 10 mil: R$ 7,5 mil para comprar um novo fusca e R$ 2,5 mil para cobrir os dias que está sem trabalhar. Até este momento, foram coletados R$ 2.768,50.
Esmola eletrônica, exatamente. Mas o termo “vaquinha” é mais simpático. Gosto da ideia de que cada um de nós, doando uns trocados, pode colaborar para que alguém realize um sonho (terminar a obra da casa, fazer um tratamento dentário etc) ou que seja ressarcido por uma perda, como é o caso do seu Itamar, que, se fosse esperar providências das autoridades, ficaria anos passando o chapéu nas ruas sem jamais alcançar os seus R$ 10 mil. As pessoas são mais solidárias quando conhecem o problema de quem precisa. Por isso, a vaquinha realizada através de sites e redes sociais é mais eficiente, pois ficamos sabendo para quem vai o dinheiro e que uso terá.
Você pode estar pensando que há quem se aproveite desse recurso para projetos menos nobres, como organizar um churrasco para a galera. Sem problema. O que há de estranho? A galera convidada é quem contribui e o churrasco sai. Rachar a conta é o que importa, seja pelo meio que for.
Estranho seria alguém contribuir para alguma bizarrice, tipo, sei lá, deixe-me pensar em algo bem esquisito... Imagine que alguns políticos ajudaram a fazer com que nossos impostos não fossem utilizados de forma correta, que tenham roubado dos cidadãos que neles confiaram. Imagine que esses políticos foram condenados a devolver para o país, em forma de multa, o prejuízo causado, e que eles organizassem uma vaquinha para tal. Você contribuiria? Estranho seria isso. Você estaria pagando duas vezes o mesmo imposto.
quarta-feira, janeiro 29, 2014
Para que serve a celebridade? - ROBERTO DAMATTA
O GLOBO - 29/01
Quero começar com uma nota sobre a celebrização como um problema e como um valor. A ultima besteira aprontada pelo jovem cantor Justin Bieber, que minhas netas mais novas idolatram (ou idolatravam), ajuda e, intrigantemente, coincide com o que elaborei na semana passada sobre esse tema.
Uma sociologia da modernidade avançada, globalizada e marcada pelo hiperconsumo não pode deixar de meditar sobre a celebrização e o sucesso como paradoxos. Pois como distinguir e buscar a fama que inevitavelmente leva as pessoas para cima ou para baixo numa sociedade fundada num individualismo igualitário que horizontaliza?
Deste ponto de vista, a celebrização traz à tona a hierarquia (ou um centro desejado) como um valor implícito ou até mesmo envergonhado num sistema que, idealizadamente, se pensa como descentralizado porque é feito de iguais. A celebrização revela também como o sistema oscila entre a ênfase no individual (ou nas suas peças ou partes) e em como essas partes se relacionam entre si formando um tecido ou uma totalidade. A regra é salientar a parte, mas a celebrização não nos deixa esquecer o todo. Talvez essa seja sua principal função e ela está contida na pergunta: por que ele (ou ela) e não eu?
Não se trata, como bem viu Tocqueville, de achar que o regime igualitário suprima a excelência ou a singularidade extraordinária que dimensionam o ideal da aristocracia; mas de ter suficiente lucidez para compreender que a igualdade não suprime a gradação; e que a ênfase no individuo ou na parte não acabam com o todo. O numero um em alguma esfera das artes não liquida os elos entre as pessoas. As coletividades humanas são reconhecidamente humanas, justamente porque preservam essas dimensões.
Há o momento da celebrização e o momento em que ela, como o Justin Bieber condenado, revela o jovenzinho banal, igualzinho aos nossos filhos e netos.
Num mundo igualitário, o processo de celebrização legitima a crença de que todos são iguais e alguns se diferenciam pelo talento. É o caso especifico do esporte e das artes musicais e cênicas, mas isso não exclui paternalismos, favores, preferências e familismos que marcam todos os campos, sobretudo o do poder.
O que chama a atenção hoje em dia é o acasalamento às vezes patológico entre uma hiperdistinção (caso de alguns astros da música popular e do esporte) e uma espécie de autoflagelação por meio do uso abusivo da liberdade. Um menino que fica milionário aos 15 anos e vive numa sociedade que lhe garante o espaço de ser feliz a seu modo corre o risco de ser engolido e, eventualmente, morto pelo seu tão desejado sucesso!
Como naquela famosa capa da “New Yorker”, comentada nesta coluna, na qual os Oscars comiam como sobremesa os artistas premiados. Afinal, se os cavalos não são domados, eles acabam nos guiando.
Para que serve então a celebridade? Ela agencia uma diferenciação num mundo que se deseja construído de iguais. Os seus perigos são claros: toda pessoa célebre tem uma superespecialização que se confunde com um dom. O famoso é a tela na qual as pessoas comuns projetam os que lhes falta. Os mitos das celebridades insistem em dizer como elas foram pessoas simples e pobres antes de obterem a tão desejada fama. O astro é, entre outras coisas, um especialista no que faz e um modelo do que faz. Daí a tendência a confundir o seu papel público com a sua intimidade. A suposição de uma excepcionalidade em tudo se desfaz e decepciona quando ocorre um desvio entre a figura que aparece no palco e a figura que surge — bêbado, burro, arrogante, desonesto, corrupto e, acima de tudo, infeliz como todo mundo — na vida real. Isso é acentuado pela nossa busca de coerência, a qual inventou sua tecnologia.
Do outro lado do universo das celebrizações para cima, há o conjunto de empregados e de inferiores que congrega as “celebridades para baixo”. Os garçons, engraxates, motoristas, porteiros e empregados em geral que fazem a nossa comida, lavam a nossa roupa, vigiam nosso lar e nos protegem do mundo. Esses fornecedores de amor, atenção e carinho preenchem um espaço que não ocupamos e passam a impressão de que vivem apenas para o que fazem. Para muitos, ver a empregada namorando é tão surpreendente quanto descobrir que a sua celebridade favorita tem um péssimo caráter.
Esse time de empregados: secretários, assessores e subdiretores que, na política, desculpam-se pelos seus superiores quando a Fifa ou Comité Olímpico Internacional ou uma chuvarada revela como nada está pronto e há um atraso crônico e insuportável na infraestrutura nacional.
No Brasil, as autoridades não pedem desculpas. No máximo, elas dãodesculpas por meio dos seus “peles” ou asseclas. As obras que jamais ficam prontas em tempo e o cara de pau ministro diz que as empreiteiras precisam ser mais responsáveis. Mas quem contrata essas empresas?
Se as celebridades não podem ser escusadas dos seus delitos, o mesmo deve ocorrer com a autoridade que, na maioria dos casos, lamentavelmente torna-se uma celebridade pelo que não fez; ou, pior que isso, pela sua inestimável contribuição ao atraso do país.
Quero começar com uma nota sobre a celebrização como um problema e como um valor. A ultima besteira aprontada pelo jovem cantor Justin Bieber, que minhas netas mais novas idolatram (ou idolatravam), ajuda e, intrigantemente, coincide com o que elaborei na semana passada sobre esse tema.
Uma sociologia da modernidade avançada, globalizada e marcada pelo hiperconsumo não pode deixar de meditar sobre a celebrização e o sucesso como paradoxos. Pois como distinguir e buscar a fama que inevitavelmente leva as pessoas para cima ou para baixo numa sociedade fundada num individualismo igualitário que horizontaliza?
Deste ponto de vista, a celebrização traz à tona a hierarquia (ou um centro desejado) como um valor implícito ou até mesmo envergonhado num sistema que, idealizadamente, se pensa como descentralizado porque é feito de iguais. A celebrização revela também como o sistema oscila entre a ênfase no individual (ou nas suas peças ou partes) e em como essas partes se relacionam entre si formando um tecido ou uma totalidade. A regra é salientar a parte, mas a celebrização não nos deixa esquecer o todo. Talvez essa seja sua principal função e ela está contida na pergunta: por que ele (ou ela) e não eu?
Não se trata, como bem viu Tocqueville, de achar que o regime igualitário suprima a excelência ou a singularidade extraordinária que dimensionam o ideal da aristocracia; mas de ter suficiente lucidez para compreender que a igualdade não suprime a gradação; e que a ênfase no individuo ou na parte não acabam com o todo. O numero um em alguma esfera das artes não liquida os elos entre as pessoas. As coletividades humanas são reconhecidamente humanas, justamente porque preservam essas dimensões.
Há o momento da celebrização e o momento em que ela, como o Justin Bieber condenado, revela o jovenzinho banal, igualzinho aos nossos filhos e netos.
Num mundo igualitário, o processo de celebrização legitima a crença de que todos são iguais e alguns se diferenciam pelo talento. É o caso especifico do esporte e das artes musicais e cênicas, mas isso não exclui paternalismos, favores, preferências e familismos que marcam todos os campos, sobretudo o do poder.
O que chama a atenção hoje em dia é o acasalamento às vezes patológico entre uma hiperdistinção (caso de alguns astros da música popular e do esporte) e uma espécie de autoflagelação por meio do uso abusivo da liberdade. Um menino que fica milionário aos 15 anos e vive numa sociedade que lhe garante o espaço de ser feliz a seu modo corre o risco de ser engolido e, eventualmente, morto pelo seu tão desejado sucesso!
Como naquela famosa capa da “New Yorker”, comentada nesta coluna, na qual os Oscars comiam como sobremesa os artistas premiados. Afinal, se os cavalos não são domados, eles acabam nos guiando.
Para que serve então a celebridade? Ela agencia uma diferenciação num mundo que se deseja construído de iguais. Os seus perigos são claros: toda pessoa célebre tem uma superespecialização que se confunde com um dom. O famoso é a tela na qual as pessoas comuns projetam os que lhes falta. Os mitos das celebridades insistem em dizer como elas foram pessoas simples e pobres antes de obterem a tão desejada fama. O astro é, entre outras coisas, um especialista no que faz e um modelo do que faz. Daí a tendência a confundir o seu papel público com a sua intimidade. A suposição de uma excepcionalidade em tudo se desfaz e decepciona quando ocorre um desvio entre a figura que aparece no palco e a figura que surge — bêbado, burro, arrogante, desonesto, corrupto e, acima de tudo, infeliz como todo mundo — na vida real. Isso é acentuado pela nossa busca de coerência, a qual inventou sua tecnologia.
Do outro lado do universo das celebrizações para cima, há o conjunto de empregados e de inferiores que congrega as “celebridades para baixo”. Os garçons, engraxates, motoristas, porteiros e empregados em geral que fazem a nossa comida, lavam a nossa roupa, vigiam nosso lar e nos protegem do mundo. Esses fornecedores de amor, atenção e carinho preenchem um espaço que não ocupamos e passam a impressão de que vivem apenas para o que fazem. Para muitos, ver a empregada namorando é tão surpreendente quanto descobrir que a sua celebridade favorita tem um péssimo caráter.
Esse time de empregados: secretários, assessores e subdiretores que, na política, desculpam-se pelos seus superiores quando a Fifa ou Comité Olímpico Internacional ou uma chuvarada revela como nada está pronto e há um atraso crônico e insuportável na infraestrutura nacional.
No Brasil, as autoridades não pedem desculpas. No máximo, elas dãodesculpas por meio dos seus “peles” ou asseclas. As obras que jamais ficam prontas em tempo e o cara de pau ministro diz que as empreiteiras precisam ser mais responsáveis. Mas quem contrata essas empresas?
Se as celebridades não podem ser escusadas dos seus delitos, o mesmo deve ocorrer com a autoridade que, na maioria dos casos, lamentavelmente torna-se uma celebridade pelo que não fez; ou, pior que isso, pela sua inestimável contribuição ao atraso do país.
FOGO CERRADO - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 29/01
PRAÇA
Os seguranças portam armas de fogo e de contenção, como pistolas Taser, que disparam dardos elétricos.
CANETA
A ação da Polícia Civil na cracolândia na quinta-feira passada levou pesquisadores da área de drogas a escrever um manifesto contra a operação. Eles classificam como "inaceitável" o "uso arbitrário de medidas repressivas e violentas" para lidar com o problema. O texto, que será divulgado hoje, é assinado por 54 estudiosos dos campos de saúde, ciências sociais e direito, de São Paulo e de outros Estados.
RECOMEÇO
Eduardo Campos (PSB-PE) pode deixar o governo de Pernambuco no dia 1º de abril para se lançar candidato à Presidência. Na mesma data, em 1964, seu avô, Miguel Arraes, foi preso depois do golpe militar. Tropas cercaram o Palácio das Princesas, no Recife, e propuseram que ele renunciasse ao cargo de governador de Pernambuco. Arraes rechaçou.
PEDRA
Caso a sugestão, feita por colaboradores próximos ao governador, vingue, será passada a ideia de que ele sai do mesmo lugar em que o avô foi preso para cumprir um "destino interrompido". O único porém: 1º de abril é também o dia da mentira.
TABUADA
A expectativa entre ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) é a de que Luiz Fux, relator dos embargos infringentes, rejeite pedidos de advogados de réus do mensalão para que o tamanho das penas de alguns condenados sejam rediscutidas. Ele só admitiria nova análise do mérito das condenações que tiveram quatro votos pela absolvição.
ENDEREÇO
A casa em que os escritores Jorge Amado e Zélia Gattai passaram os últimos anos de suas vidas será administrada pela Prefeitura de Salvador. Desde a morte do casal, o imóvel, no Rio Vermelho, está vazio. Os herdeiros já tentaram até fazer um restaurante no lugar, mas a ideia não vingou.
NUMA ILHA
O plano é investir R$ 6 milhões na reforma e manutenção de objetos de Jorge Amado, como louças, roupas, mobiliário e presentes que ganhou em viagens pelo mundo. O exemplo a ser copiado é o do Chile, em que a casa de Pablo Neruda em Isla Negra segue intacta, funcionando como um museu.
TOGA E AVENTAL
Ex-empregada doméstica, a ministra do TST (Tribunal Superior do Trabalho) Delaíde Arantes vai fazer uma palestra na Sorbonne, em março, para juristas franceses e alunos de pós-graduação. Ela defendeu junto à OIT (Organização Internacional do Trabalho) que os Estados deveriam oferecer ensino fundamental, médio e superior aos profissionais que lavam, passam e cozinham.
INGRESSO ESGOTADO
E a palestra que Joaquim Barbosa fará hoje em Londres teve tanta procura que o King's College vai abrir um auditório para exibir a fala do ministro em uma tela a quem ficar de fora. A transmissão será em tempo real.
MEMÓRIAS VIVAS
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) esteve na cerimônia em memória às vítimas do Holocausto, no Palácio dos Bandeirantes, organizada pela Confederação Israelita do Brasil e a Federação Israelita do Estado de SP. O ator Juca de Oliveira participou da homenagem, anteontem. O governador de SP, Geraldo Alckmin, recebeu os convidados, como o presidente da Federação Israelita do Rio, Jayme Salim Salomão.
MEMÓRIAS PÓSTUMAS
A cantora Sandy Leah, grávida de quatro meses, esteve na pré-estreia do filme "Quando Eu Era Vivo", que protagoniza ao lado de Antonio Fagundes e Marat Descartes. O quadrinista e escritor Lourenço Mutarelli, que também faz parte do elenco, e o diretor do longa, Marco Dutra, receberam convidados como os atores Arieta Corrêa e Milhem Cortaz, no evento realizado anteontem, no shopping Cidade Jardim.
CURTO-CIRCUITO
Rodrigo Savazoni lança hoje o livro "A Onda Rosa-Choque", às 19h, na Balsa, no vale do Anhangabaú.
Luciana Oliveira faz show de lançamento do disco "Pura", hoje, às 20h30, no Sesc Vila Mariana. 12 anos.
Lilian Pacce é a única brasileira no júri do LVMH Prize, prêmio do conglomerado de luxo de Paris para novos estilistas.
A peça "Domésticas" é atração hoje no Itaú Cultural, na avenida Paulista, às 20h. Grátis. 12 anos.
A Drogaria São Paulo lançou campanha para incentivar funcionários a doar sangue. Desde 2004, já foram 21 mil doações.
A cantora Dri Vallejo canta hoje, às 20h30, no Ipê Clube, no Ibirapuera. Livre.
Tragédia sem fim - ANCELMO GOIS
O GLOBO - 29/01
Bateu o martelo
Marta Suplicy escolheu Ana Cristina Wanzeler, superintendente nacional de Repasses da Caixa, para assumir a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura. Vai estar à frente da liberação de recursos da Lei Rouanet.
Operação de guerra
Há gente na Fifa dizendo que a Copa no Brasil está se tornando uma operação de guerra, e que nem na Alemanha, onde havia possibilidade de terrorismo, foi assim. Durante os jogos, 15 estados serão vigiados pelas forças de segurança. No total, cerca de dez mil homens da Força Nacional estarão envolvidos.
Crise na Argentina
Semana passada, no Rio, a equipe responsável pelo caixa da petroleira Shell na América do Sul precisou comprar 3,4 milhões de dólares em Buenos Aires. Recebeu ofertas e fechou com a menor cotação: 6,8 pesos argentinos por dólar. Sexta, a Shell procurou fornecedor para 1,6 milhão de dólares. Apenas o banco HSBC se apresentou. O preço: 8,7 pesos por dólar. Aumento de 27,9% em apenas 72 horas.
Juntos no picadeiro
Vincent Cassel, o francês, e Lázaro Ramos, o baiano, vão trabalhar juntos. Será em “O Grande Circo Místico”, de Cacá Diegues, com produção de Renata Magalhães e Paula Lavigne, que será rodado em Portugal.
Palavras cruzadas
A Duetto Editorial, braço de revistas do Grupo Ediouro, forte no ramo de palavras cruzadas, chegou ao fim. O anúncio foi feito ontem aos 48 funcionários da Duetto, que foram demitidos. Os títulos da empresa foram vendidos para a Editora Segmento.
Caixa-alta
Veja como plano de saúde é um bom negócio. A Unimed anuncia, nos próximos dias, o balanço de 2013: o número de clientes aumentou 28%, e a empresa ultrapassou, pela primeira vez, os R$ 3,5 bilhões de faturamento. Cerca de 3% são usados em marketing, incluindo o patrocínio ao Fluminense.
Aliás...
Cláudio Salles, candidato de oposição a Celso Barros na eleição da Unimed, em fevereiro, diz que, caso eleito, irá rever os valores pagos hoje ao tricolor.
De volta
A Rocco vai publicar dois livros de Donald Barthelme, escritor americano que, há anos, está fora de catálogo no Brasil. Sairão aqui “The dead father” e “Forty stories”.
Adeus aos gramados
Juninho Pernambucano, o jogador, bateu o martelo: vai se aposentar agora.
Dudu na avenida
O sambista Dudu Nobre vai se apresentar na Sapucaí, no dia 23 de fevereiro. Acompanhado por 150 ritmistas, ele vai passar num trio elétrico cantando sambas-enredo.
O show, da Riotur, é parte das celebrações pelos 30 anos do Sambódromo.
Alô, Cedae!
Uma cascata de água jorra há mais de dez dias, na Rua Humberto de Campos, no Leblon, entre as ruas General Urquiza e Bartolomeu Mitre. Mais adiante, depois da Rua João Lira, um generoso olho-d’água brotou, semana passada, no meio da rua. Outro, mais modesto, está alagando a esquina da Rua José Linhares.
O fim de Félix, ora pois
Uma senhorinha portuguesa abordou ontem um brasileiro na saída do Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa. É que ela queria saber sobre... o que vai acontecer com o Félix, de Mateus Solano, na reta final de “Amor à vida”. Por lá, a novela está com dois meses de atraso e todo mundo só pergunta sobre Félix. Ninguém nem fala da Copa.
Vai Ter Copa! E Argentina ganha! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 29/01
E o Fidel, El Coma Andante, com o agasalho Adidas! Devia mudar o nome pra Fadigas! Agasalho Fadigas!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Hoje eu tenho duas notícias, uma boa e uma ruim. Ou duas boas, ou duas ruins: Vai ter Copa e a Argentina vai ganhar! Rarará!
Atenção, black brócolis! Vai ter Copa e a Argentina ganha!
Pensamento de black brócolis: não vai ter Copa. Não vai ter Carnaval. Não vai ter verão. Não vai ter praia! Não vai ter pipoca! E não vai ter mais Brasil!
E sabe como se chama o dono do fusquinha queimado nos protestos? ITAMAR! Até em protesto tem predestinado!
E a oposição revoltada porque a Dilma parou pra dormir em Lisboa? Eu apoio a escala da Dilma em Lisboa por razões humanitárias: direto do Blatter pro Raúl Castro, sem escala? Sem tomar fôlego?! "Posso dormir antes?". Rarará!
Quando denúncia vira implicância, perde a credibilidade!
E Dilma e Cristina Kirchner! A Dilma tá parecendo o Bob Esponja, quadrado e com dois dentinhos.
A Cristina Kirchner tá parecendo a Gretchen. Com aquela boca de bico de tênis Conga. Com aquela boca de "VOU TE BEIJAR!". Rarará.
E a Dilma tuitou lá de Cuba: "Estou numa ilha aqui em cima, governada pela mesma família há 50 anos".
"São Luís!", gritou o Sarney. Ela estava em São Luís! Rarará!
E avisaram pra Dilma que tomara que caia em Cuba se chama "Abaja e Chupa"?
E eu sempre repito a definição de Cuba, dada por um repórter da "Newsweek". Três são as causas da vitória da revolução cubana: saúde, educação e habitação.
E três são as causas do fracasso: café da manhã, almoço e jantar! Rarará!
E o Fidel, El Coma Andante, com o agasalho Adidas! Devia mudar o nome pra Fadigas! Agasalho Fadigas!
E diz que o Fidel confundiu a Dilma com o Lula. "Lula, você tirou a barba?". "Não, comandante, yo soy Dilma". Rarará.
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Olha o nome desse prédio em Piuma, Espírito Santo: "Edifício EU". Rarará. Cúmulo do egocêntrico!
E a crise na Argentina? O site Twitteiro mostra o cartaz na loja de um argentino: "Vendo todo e me voy a la mierda". Rarará.
Nóis sofre, mas nóis goza!
Hoje, só amanhã!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
E o Fidel, El Coma Andante, com o agasalho Adidas! Devia mudar o nome pra Fadigas! Agasalho Fadigas!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Hoje eu tenho duas notícias, uma boa e uma ruim. Ou duas boas, ou duas ruins: Vai ter Copa e a Argentina vai ganhar! Rarará!
Atenção, black brócolis! Vai ter Copa e a Argentina ganha!
Pensamento de black brócolis: não vai ter Copa. Não vai ter Carnaval. Não vai ter verão. Não vai ter praia! Não vai ter pipoca! E não vai ter mais Brasil!
E sabe como se chama o dono do fusquinha queimado nos protestos? ITAMAR! Até em protesto tem predestinado!
E a oposição revoltada porque a Dilma parou pra dormir em Lisboa? Eu apoio a escala da Dilma em Lisboa por razões humanitárias: direto do Blatter pro Raúl Castro, sem escala? Sem tomar fôlego?! "Posso dormir antes?". Rarará!
Quando denúncia vira implicância, perde a credibilidade!
E Dilma e Cristina Kirchner! A Dilma tá parecendo o Bob Esponja, quadrado e com dois dentinhos.
A Cristina Kirchner tá parecendo a Gretchen. Com aquela boca de bico de tênis Conga. Com aquela boca de "VOU TE BEIJAR!". Rarará.
E a Dilma tuitou lá de Cuba: "Estou numa ilha aqui em cima, governada pela mesma família há 50 anos".
"São Luís!", gritou o Sarney. Ela estava em São Luís! Rarará!
E avisaram pra Dilma que tomara que caia em Cuba se chama "Abaja e Chupa"?
E eu sempre repito a definição de Cuba, dada por um repórter da "Newsweek". Três são as causas da vitória da revolução cubana: saúde, educação e habitação.
E três são as causas do fracasso: café da manhã, almoço e jantar! Rarará!
E o Fidel, El Coma Andante, com o agasalho Adidas! Devia mudar o nome pra Fadigas! Agasalho Fadigas!
E diz que o Fidel confundiu a Dilma com o Lula. "Lula, você tirou a barba?". "Não, comandante, yo soy Dilma". Rarará.
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Olha o nome desse prédio em Piuma, Espírito Santo: "Edifício EU". Rarará. Cúmulo do egocêntrico!
E a crise na Argentina? O site Twitteiro mostra o cartaz na loja de um argentino: "Vendo todo e me voy a la mierda". Rarará.
Nóis sofre, mas nóis goza!
Hoje, só amanhã!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Estamos preparados para a nova lei anticorrupção? - LEONARDO RUIZ MACHADO
Valor Econômico - 29/01
A inexistência de um único órgão responsável pela aplicação da lei tende a gerar uma forte insegurança jurídica
Enquanto muitos acompanham preocupados - e com razão - o possível rebaixamento do Brasil pela agência de rating Standard & Poor's, pouca gente deu importância para o fato de termos caído no índice de percepção publicado anualmente pela Transparência Internacional, organização que mede o nível de corrupção no setor público em 177 países. Caímos pouco, é verdade, da 69ª para a 72ª posição, mas o fato é que caímos e isso precisa ser entendido com cuidado. Muitas empresas globais consideram este índice, em conjunto com outros tantos, no momento de analisar o grau de risco de seus investimentos mundo afora.
Apesar da queda, não podemos negar que 2013 foi um ano de grande avanço em áreas importantes do combate à corrupção. A prisão dos mensaleiros, por exemplo, pode ser um sinal que a impunidade - tão apreciada pelos corruptos - estaria com os seus dias contados. Mas a quebra de paradigma para 2014 estará no foco deste combate, tendo em vista que a Lei 12.846, sancionada pela presidente Dilma em 1º de agosto de 2013, terá como alvo exclusivo as empresas que cometerem atos contra a administração pública.
Hoje, dia 29, a lei entrou em vigor, inserindo em nosso ordenamento jurídico novos dispositivos legais que passarão a responsabilizar, na esfera civil e administrativa, as empresas envolvidas - por exemplo - em atos de corrupção.
Até então, apenas os indivíduos respondiam criminalmente pelo pagamento de propina para agentes públicos, enquanto as empresas beneficiadas pela corrupção limitavam-se a pagar os advogados de seus executivos e - em alguns poucos casos - defendiam-se dos dispositivos das leis de improbidade administrativa e de licitações, os quais quase sempre deixam de ser aplicados pela dificuldade na produção de provas capazes de confirmar o malfeito.
Com o advento da nova lei, a responsabilidade da pessoa jurídica passará a ser objetiva. Vale dizer, portanto, que a empresa poderá passar a responder independente da comprovação de dolo ou culpa, ainda que o ato lesivo tenha sido praticado sem seu conhecimento por um terceiro que represente seus interesses perante uma autoridade pública. Ou seja, a responsabilidade estará atrelada ao fato de a empresa ter se beneficiado, direta ou indiretamente, de um ato lesivo assim definido pela lei.
Na esteira das leis estrangeiras FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e UK Bribery Act, bem como para atender às pressões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - que há tempos vem cobrando uma postura mais proativa do Brasil no combate à corrupção -, as sanções previstas pela legislação brasileira são pesadas e preveem, por exemplo, multa administrativa de até 20% do faturamento bruto da empresa e penas na esfera civil que farão, por exemplo, com que a mesma seja proibida de receber incentivos e investimentos públicos ou, pior, tenha a sua dissolução compulsória decretada por um magistrado.
Como vimos nas últimas semanas no escândalo envolvendo o metrô de São Paulo, o pedido judicial de dissolução poderá ser usado indiscriminadamente como forma de persuasão para que as empresas aceitem acordos financeiros milionários propostos pelo Ministério Público.
A Lei 12.846/2013 é autônoma e autoaplicável, devendo ser regulamentada apenas no que se refere às condicionantes que serão levadas em consideração pelas autoridades competentes quando da sua atuação. A Controladoria Geral da União (CGU) está na iminência de publicar um normativo que, dentre outros temas, deve endereçar as dúvidas sobre aquilo que está sendo chamado de "Programa Estruturado", algo que em outros países é conhecido como Programa de Compliance que, em suma, é composto por um conjunto de mecanismos de prevenção e procedimentos internos de integridade, tais como políticas escritas, treinamentos, auditorias e canais de comunicação confidenciais que incentivam a denúncia de irregularidades.
O mais interessante é que o legislador optou por considerar tais iniciativas como atenuantes ou agravantes para a dosimetria das sanções, isto é, se a empresa demonstrar que implementou seu programa de boa-fé e, o mais importante, envida todos os esforços para torná-lo efetivo, as penas poderão ser fixadas em patamares menos agressivos. Caso contrário, as consequências poderão ser muito negativas.
Do ponto de vista da responsabilidade civil, está claro que caberá ao Ministério Público investigar e ajuizar a competente Ação Civil Pública. No entanto, o grande gargalo da lei está na definição de quem será a autoridade competente por aplicá-la na esfera administrativa. A lei confere esta atribuição à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa.
Ao mesmo tempo em que a escolha feita pelo legislador por um poder administrativo sancionador descentralizado poderá dar maior celeridade e efetividade à aplicação de multas significativas para empresas que insistem em adotar práticas espúrias em seus negócios, a inexistência de um único órgão administrativo responsável pela aplicação da lei (como é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - Cade - no âmbito concorrencial) tende a gerar uma forte insegurança jurídica que, como se sabe, é uma das grandes causas da judicialização do processo administrativo.
Antes de descobrirmos se as autoridades que aplicarão a lei na esfera administrativa o farão de maneira adequada - o que evitaria mais uma enxurrada de ações que sufocarão ainda mais o nosso já combalido Poder Judiciário - duas perguntas deverão ser respondidas, sendo que a primeira dá o tom à segunda.
Quais serão os mecanismos de integridade escolhidos pela CGU? Uma vez definidos, será que as empresas estarão preparadas para utilizá-los com sucesso para ajudar a combater com efetividade a corrupção que assola o nosso país?
Enquanto muitos acompanham preocupados - e com razão - o possível rebaixamento do Brasil pela agência de rating Standard & Poor's, pouca gente deu importância para o fato de termos caído no índice de percepção publicado anualmente pela Transparência Internacional, organização que mede o nível de corrupção no setor público em 177 países. Caímos pouco, é verdade, da 69ª para a 72ª posição, mas o fato é que caímos e isso precisa ser entendido com cuidado. Muitas empresas globais consideram este índice, em conjunto com outros tantos, no momento de analisar o grau de risco de seus investimentos mundo afora.
Apesar da queda, não podemos negar que 2013 foi um ano de grande avanço em áreas importantes do combate à corrupção. A prisão dos mensaleiros, por exemplo, pode ser um sinal que a impunidade - tão apreciada pelos corruptos - estaria com os seus dias contados. Mas a quebra de paradigma para 2014 estará no foco deste combate, tendo em vista que a Lei 12.846, sancionada pela presidente Dilma em 1º de agosto de 2013, terá como alvo exclusivo as empresas que cometerem atos contra a administração pública.
Hoje, dia 29, a lei entrou em vigor, inserindo em nosso ordenamento jurídico novos dispositivos legais que passarão a responsabilizar, na esfera civil e administrativa, as empresas envolvidas - por exemplo - em atos de corrupção.
Até então, apenas os indivíduos respondiam criminalmente pelo pagamento de propina para agentes públicos, enquanto as empresas beneficiadas pela corrupção limitavam-se a pagar os advogados de seus executivos e - em alguns poucos casos - defendiam-se dos dispositivos das leis de improbidade administrativa e de licitações, os quais quase sempre deixam de ser aplicados pela dificuldade na produção de provas capazes de confirmar o malfeito.
Com o advento da nova lei, a responsabilidade da pessoa jurídica passará a ser objetiva. Vale dizer, portanto, que a empresa poderá passar a responder independente da comprovação de dolo ou culpa, ainda que o ato lesivo tenha sido praticado sem seu conhecimento por um terceiro que represente seus interesses perante uma autoridade pública. Ou seja, a responsabilidade estará atrelada ao fato de a empresa ter se beneficiado, direta ou indiretamente, de um ato lesivo assim definido pela lei.
Na esteira das leis estrangeiras FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e UK Bribery Act, bem como para atender às pressões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - que há tempos vem cobrando uma postura mais proativa do Brasil no combate à corrupção -, as sanções previstas pela legislação brasileira são pesadas e preveem, por exemplo, multa administrativa de até 20% do faturamento bruto da empresa e penas na esfera civil que farão, por exemplo, com que a mesma seja proibida de receber incentivos e investimentos públicos ou, pior, tenha a sua dissolução compulsória decretada por um magistrado.
Como vimos nas últimas semanas no escândalo envolvendo o metrô de São Paulo, o pedido judicial de dissolução poderá ser usado indiscriminadamente como forma de persuasão para que as empresas aceitem acordos financeiros milionários propostos pelo Ministério Público.
A Lei 12.846/2013 é autônoma e autoaplicável, devendo ser regulamentada apenas no que se refere às condicionantes que serão levadas em consideração pelas autoridades competentes quando da sua atuação. A Controladoria Geral da União (CGU) está na iminência de publicar um normativo que, dentre outros temas, deve endereçar as dúvidas sobre aquilo que está sendo chamado de "Programa Estruturado", algo que em outros países é conhecido como Programa de Compliance que, em suma, é composto por um conjunto de mecanismos de prevenção e procedimentos internos de integridade, tais como políticas escritas, treinamentos, auditorias e canais de comunicação confidenciais que incentivam a denúncia de irregularidades.
O mais interessante é que o legislador optou por considerar tais iniciativas como atenuantes ou agravantes para a dosimetria das sanções, isto é, se a empresa demonstrar que implementou seu programa de boa-fé e, o mais importante, envida todos os esforços para torná-lo efetivo, as penas poderão ser fixadas em patamares menos agressivos. Caso contrário, as consequências poderão ser muito negativas.
Do ponto de vista da responsabilidade civil, está claro que caberá ao Ministério Público investigar e ajuizar a competente Ação Civil Pública. No entanto, o grande gargalo da lei está na definição de quem será a autoridade competente por aplicá-la na esfera administrativa. A lei confere esta atribuição à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa.
Ao mesmo tempo em que a escolha feita pelo legislador por um poder administrativo sancionador descentralizado poderá dar maior celeridade e efetividade à aplicação de multas significativas para empresas que insistem em adotar práticas espúrias em seus negócios, a inexistência de um único órgão administrativo responsável pela aplicação da lei (como é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - Cade - no âmbito concorrencial) tende a gerar uma forte insegurança jurídica que, como se sabe, é uma das grandes causas da judicialização do processo administrativo.
Antes de descobrirmos se as autoridades que aplicarão a lei na esfera administrativa o farão de maneira adequada - o que evitaria mais uma enxurrada de ações que sufocarão ainda mais o nosso já combalido Poder Judiciário - duas perguntas deverão ser respondidas, sendo que a primeira dá o tom à segunda.
Quais serão os mecanismos de integridade escolhidos pela CGU? Uma vez definidos, será que as empresas estarão preparadas para utilizá-los com sucesso para ajudar a combater com efetividade a corrupção que assola o nosso país?
Ingratos! - ROBERTO ROMANO
O Estado de S.Paulo - 29/01
Ao falar sobre defeitos e virtudes humanos, Spinoza afirma que "só os homens livres têm reciprocamente, uns para com os outros, o mais alto reconhecimento" (Ética). Quando, sob pressão oficial, a um povo é subtraída a escolha efetiva, torna-se uma perigosa crueldade dele exigir gratidão pelos feitos dos governantes. A lição foi dada a Spinoza por Maquiavel.
Os palácios brasileiros, movidos pela propaganda, tentam coibir a oposição e a crítica usando a chantagem orçamentária ou abusando da força física. Acostumada à demagogia que, desde Vargas, lhe rende uma legitimidade de encomenda, a cortesania não aceita que o povo, presumidamente beneficiado por suas administrações, recuse praticar as zumbaias e os rapapés tão comuns nos gabinetes. Com muitos eleitores ainda funciona o "é dando que se recebe". Mas graças às formas de comunicação como a internet, tal prática se atenua a olhos vistos. O controle face a face, tradicional no Brasil, perde terreno para formas coletivas de trato entre mandatários e cidadania. Exigir gratidão pelo favor recebido mostra pleno anacronismo e sinaliza uma tendência reacionária dos governantes.
Segundo entoam os atuais ocupantes do poder federal, imitados por seus bajuladores, vivemos sob um governo de esquerda. Toda crítica aos dirigentes é vista como atentado ao processo revolucionário que habita a alma dos líderes e militantes, mas é invisível aos seres humanos comuns. Quem está a par da teoria leninista conhece a distinção lógica entre o bom proletário e a massa apegada às reivindicações "puramente econômicas" (aumento de salário, condições de consumo, etc). O primeiro sacrifica tudo, até a vida, em favor do socialismo. A segunda só chegaria à lucidez sob o guante dos intelectuais (a consciência vinda de fora...) e do partido. Sem tal obediência o trabalhador é visto como inimigo pelos apparatchiks. Se for grato e adiar suas reclamações financeiras ou políticas, ele é reconhecido pelo Estado, recebe medalhas como digno êmulo de Alexei Stakhanov. Com semelhante domesticação se construiu o poder estatal na pátria do socialismo.
Ainda hoje, na mente de muitos líderes nominalmente de esquerda e modernizadores, a massa popular tem apenas o direito de ser tangida pelos iluminados que, em seu nome, a conduzem rumo ao melhor dos mundos possíveis. Josef Stalin, num retrocesso histórico à guisa de realismo político, retomou com mão de ferro os ritos czaristas para impor os seus planos à plebe ignara (leia-se O Homem, o Capital Mais Precioso). Nos governantes brasileiros de agora se afirma o mesmo sestro contrário à soberania popular.
Em comícios, Luiz Inácio da Silva repreende a massa e define quem deve ser por ela enaltecido ou excomungado. Na faina de controlar os adeptos e com abuso do cajado no pastoreio, chegou ao ponto sublime no enunciado (com sotaque do Antigo Regime) de que José Sarney não é um cidadão comum. A populaça levanta-se contra o patrimonialismo maranhense porque, imagina o Grande Líder, ignora o saber político. Ela precisa aprender históricas lições de realismo tendo em vista a governabilidade, ou seja, a grata obediência ao oligarca. Outra cena caricata e trágica de retorno ao passado ocorreu nos jardins da casa de Paulo Maluf num abraço que apunhalou a própria elite esquerdista.
O dono do partido considera a política pública que, desde o Plano Real, incluiu no mercado milhões de brasileiros um favor devido à sua pessoa. Stalin regrediu ao período monárquico, unindo a honraria de ser "pai do povo" (título comum aos reis europeus antes da Revolução Francesa) ao populismo sem peias. Herdeiro da cultura política imposta pelo absolutismo português, o Brasil jamais aniquilou a prática do favor, da clientela, da suposta gratidão dos pobres diante dos "benfeitores". Tais costumes vêm da República Romana, que jamais foi democrata. Nela a fé pública dependia do rico que mantinha a plebe na abjeta dependência. O favor prestado pelo patrão era retribuído agradecidamente pelo favor do voto. Como a soberania popular era um mito a ser respeitado, embora desobedecido, mesmo o aristocrata que concorria aos cargos era obrigado a pedir o voto dos clientes como se fosse um beneficium.
O eufemismo ainda encobre o controle político. Poucos (fora os ditadores que se atribuíram o título de Benefactor, como Anastasio Somoza) ousam exigir "gratidão" das massas por suas benfeitorias, reais ou imaginárias. Gilberto Carvalho, secretário da Presidência, rompeu a barreira das formas decorosas ao evidenciar o seu estado de espírito em face das manifestações populares (que ameaçam retornar em ano eleitoral). Em junho de 2013, confessa ele, "houve quase que um sentimento de ingratidão, de dizer: 'fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós'". O lapso revela muito da alma governista.
Temos, ademais, notícias de preparo das Forças Armadas e da polícia para a próxima Copa do Mundo. No manual repressivo com normas para o uso da força física pelos agentes oficiais (o Ministério da Defesa prepara uma edição mais branda, para inglês ler) o inimigo é o povo ingrato. Este não amadureceu o bastante para reconhecer os benefícios trazidos pelos patrões do Planalto. A fala do ministro evidencia: se houve ideal modernizante em sua grei, ele foi sepultado na vala do realismo político.
De tanto se unir aos oligarcas que forçam seus eleitores a ver como "um favor" as obras públicas e os recursos arrancados do campo federal, os governistas os mimetizam. Nunca antes neste país os nhonhôs foram tão gratos aos que habitam os palácios. A palavra "esquerda" é folha de parreira que encobre uma prática que deveria, se exibida na TV, ser proibida aos menores de idade. "Ah, sai daí", senhor ministro!
Ao falar sobre defeitos e virtudes humanos, Spinoza afirma que "só os homens livres têm reciprocamente, uns para com os outros, o mais alto reconhecimento" (Ética). Quando, sob pressão oficial, a um povo é subtraída a escolha efetiva, torna-se uma perigosa crueldade dele exigir gratidão pelos feitos dos governantes. A lição foi dada a Spinoza por Maquiavel.
Os palácios brasileiros, movidos pela propaganda, tentam coibir a oposição e a crítica usando a chantagem orçamentária ou abusando da força física. Acostumada à demagogia que, desde Vargas, lhe rende uma legitimidade de encomenda, a cortesania não aceita que o povo, presumidamente beneficiado por suas administrações, recuse praticar as zumbaias e os rapapés tão comuns nos gabinetes. Com muitos eleitores ainda funciona o "é dando que se recebe". Mas graças às formas de comunicação como a internet, tal prática se atenua a olhos vistos. O controle face a face, tradicional no Brasil, perde terreno para formas coletivas de trato entre mandatários e cidadania. Exigir gratidão pelo favor recebido mostra pleno anacronismo e sinaliza uma tendência reacionária dos governantes.
Segundo entoam os atuais ocupantes do poder federal, imitados por seus bajuladores, vivemos sob um governo de esquerda. Toda crítica aos dirigentes é vista como atentado ao processo revolucionário que habita a alma dos líderes e militantes, mas é invisível aos seres humanos comuns. Quem está a par da teoria leninista conhece a distinção lógica entre o bom proletário e a massa apegada às reivindicações "puramente econômicas" (aumento de salário, condições de consumo, etc). O primeiro sacrifica tudo, até a vida, em favor do socialismo. A segunda só chegaria à lucidez sob o guante dos intelectuais (a consciência vinda de fora...) e do partido. Sem tal obediência o trabalhador é visto como inimigo pelos apparatchiks. Se for grato e adiar suas reclamações financeiras ou políticas, ele é reconhecido pelo Estado, recebe medalhas como digno êmulo de Alexei Stakhanov. Com semelhante domesticação se construiu o poder estatal na pátria do socialismo.
Ainda hoje, na mente de muitos líderes nominalmente de esquerda e modernizadores, a massa popular tem apenas o direito de ser tangida pelos iluminados que, em seu nome, a conduzem rumo ao melhor dos mundos possíveis. Josef Stalin, num retrocesso histórico à guisa de realismo político, retomou com mão de ferro os ritos czaristas para impor os seus planos à plebe ignara (leia-se O Homem, o Capital Mais Precioso). Nos governantes brasileiros de agora se afirma o mesmo sestro contrário à soberania popular.
Em comícios, Luiz Inácio da Silva repreende a massa e define quem deve ser por ela enaltecido ou excomungado. Na faina de controlar os adeptos e com abuso do cajado no pastoreio, chegou ao ponto sublime no enunciado (com sotaque do Antigo Regime) de que José Sarney não é um cidadão comum. A populaça levanta-se contra o patrimonialismo maranhense porque, imagina o Grande Líder, ignora o saber político. Ela precisa aprender históricas lições de realismo tendo em vista a governabilidade, ou seja, a grata obediência ao oligarca. Outra cena caricata e trágica de retorno ao passado ocorreu nos jardins da casa de Paulo Maluf num abraço que apunhalou a própria elite esquerdista.
O dono do partido considera a política pública que, desde o Plano Real, incluiu no mercado milhões de brasileiros um favor devido à sua pessoa. Stalin regrediu ao período monárquico, unindo a honraria de ser "pai do povo" (título comum aos reis europeus antes da Revolução Francesa) ao populismo sem peias. Herdeiro da cultura política imposta pelo absolutismo português, o Brasil jamais aniquilou a prática do favor, da clientela, da suposta gratidão dos pobres diante dos "benfeitores". Tais costumes vêm da República Romana, que jamais foi democrata. Nela a fé pública dependia do rico que mantinha a plebe na abjeta dependência. O favor prestado pelo patrão era retribuído agradecidamente pelo favor do voto. Como a soberania popular era um mito a ser respeitado, embora desobedecido, mesmo o aristocrata que concorria aos cargos era obrigado a pedir o voto dos clientes como se fosse um beneficium.
O eufemismo ainda encobre o controle político. Poucos (fora os ditadores que se atribuíram o título de Benefactor, como Anastasio Somoza) ousam exigir "gratidão" das massas por suas benfeitorias, reais ou imaginárias. Gilberto Carvalho, secretário da Presidência, rompeu a barreira das formas decorosas ao evidenciar o seu estado de espírito em face das manifestações populares (que ameaçam retornar em ano eleitoral). Em junho de 2013, confessa ele, "houve quase que um sentimento de ingratidão, de dizer: 'fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós'". O lapso revela muito da alma governista.
Temos, ademais, notícias de preparo das Forças Armadas e da polícia para a próxima Copa do Mundo. No manual repressivo com normas para o uso da força física pelos agentes oficiais (o Ministério da Defesa prepara uma edição mais branda, para inglês ler) o inimigo é o povo ingrato. Este não amadureceu o bastante para reconhecer os benefícios trazidos pelos patrões do Planalto. A fala do ministro evidencia: se houve ideal modernizante em sua grei, ele foi sepultado na vala do realismo político.
De tanto se unir aos oligarcas que forçam seus eleitores a ver como "um favor" as obras públicas e os recursos arrancados do campo federal, os governistas os mimetizam. Nunca antes neste país os nhonhôs foram tão gratos aos que habitam os palácios. A palavra "esquerda" é folha de parreira que encobre uma prática que deveria, se exibida na TV, ser proibida aos menores de idade. "Ah, sai daí", senhor ministro!
Opacidade - IGOR GIELOW
FOLHA DE SP - 29/01
BRASÍLIA - Enquanto os "rolezinhos" se encaminhavam ao previsível oblívio midiático, cortesia de ressurgentes "black blocs" paulistanos, Dilma Rousseff dava o seu rolé pela terrinha no sábado passado.
O moralismo barato apresenta-se tentador. Ora, Dilma deve ficar em um bom hotel. É preciso hospedar a comitiva que transitava entre encontros internacionais. E todos podem comer num restaurante estrelado se decidirem pagar por isso.
O problema é outro: falta de transparência. É a visão distorcida de um valor absoluto conferido à privacidade na agenda presidencial. De que explicações não são devidas quando quem paga a conta somos nós.
Sob Dilma, no ano passado a Presidência passou a esconder seus variados gastos de viagem, com a duvidosa alegação de risco à segurança.
Sobram perguntas legítimas. A escala do Airbus presidencial é obrigatória, sim, mas por que não encher o tanque e seguir viagem para Havana? É também cabível perguntar se não haveria opção mais barata para acomodar o resto da comitiva.
São meras perguntas, para as quais provavelmente há respostas razoáveis, mas a menção a elas gera indignação, versões e enrolação generalizada. Dilma ontem propagandeou que não usa cartão corporativo; por que não aproveita e acaba com o meio nos gastos da Presidência?
No fundo, está o DNA dos nossos políticos. Basta ver a primeira reação de qualquer uma das tantas autoridades flagradas fazendo uso pouco republicano de aviões da FAB.
O que parece escapar à presidente é que há muitos fios desencapados na confusa malha social brasileira. Coisas assim, que antes passariam por "bobagem" ainda que não o fossem, geram curtos-circuitos.
É curioso o enfado, já que a própria reação hiperbólica do governo aos "rolezinhos" mostrava uma ansiedade quanto a esses detalhes. Afinal de contas, a reeleição está longe de ser uma realidade garantida.
BRASÍLIA - Enquanto os "rolezinhos" se encaminhavam ao previsível oblívio midiático, cortesia de ressurgentes "black blocs" paulistanos, Dilma Rousseff dava o seu rolé pela terrinha no sábado passado.
O moralismo barato apresenta-se tentador. Ora, Dilma deve ficar em um bom hotel. É preciso hospedar a comitiva que transitava entre encontros internacionais. E todos podem comer num restaurante estrelado se decidirem pagar por isso.
O problema é outro: falta de transparência. É a visão distorcida de um valor absoluto conferido à privacidade na agenda presidencial. De que explicações não são devidas quando quem paga a conta somos nós.
Sob Dilma, no ano passado a Presidência passou a esconder seus variados gastos de viagem, com a duvidosa alegação de risco à segurança.
Sobram perguntas legítimas. A escala do Airbus presidencial é obrigatória, sim, mas por que não encher o tanque e seguir viagem para Havana? É também cabível perguntar se não haveria opção mais barata para acomodar o resto da comitiva.
São meras perguntas, para as quais provavelmente há respostas razoáveis, mas a menção a elas gera indignação, versões e enrolação generalizada. Dilma ontem propagandeou que não usa cartão corporativo; por que não aproveita e acaba com o meio nos gastos da Presidência?
No fundo, está o DNA dos nossos políticos. Basta ver a primeira reação de qualquer uma das tantas autoridades flagradas fazendo uso pouco republicano de aviões da FAB.
O que parece escapar à presidente é que há muitos fios desencapados na confusa malha social brasileira. Coisas assim, que antes passariam por "bobagem" ainda que não o fossem, geram curtos-circuitos.
É curioso o enfado, já que a própria reação hiperbólica do governo aos "rolezinhos" mostrava uma ansiedade quanto a esses detalhes. Afinal de contas, a reeleição está longe de ser uma realidade garantida.
Passado a limpo - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 29/01
Não está claro quando a verdade saiu contundida: se no presente ou no passado.
Mas, tenha maquiado a realidade antes ou esteja agora adaptando o discurso às circunstâncias eleitorais, fato é que o governo apresenta versões diferentes daquelas que divulgava meses atrás sobre os protestos de junho e o grau de dificuldade da reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Todo mundo tem direito a mudar de opinião. Desde que, principalmente em se tratando de governos, fique bem explicado e justificado que se trata de uma mudança de posição. Do contrário, o que se tem é um exercício de "apagamento" da memória coletiva, a falta consentida de compromisso com a palavra dita.
Na sexta-feira passada, o secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, disse no Fórum Social, em Porto Alegre (enquanto Dilma falava no Fórum Econômico, na Suíça) que houve perplexidade no governo federal e até um sentimento de "ingratidão" em relação aos manifestantes do mês de junho de 2013.
Segundo Carvalho, levou-se "um susto" em Brasília. "Nós ficamos perplexos". E, por "nós", explicou, falava do governo e dos "movimentos tradicionais". Sentiram "dor", como quem diz, "fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós", relatou o assessor presidencial à plateia.
Perplexo e assustado certamente ficou, ao ler a declaração, quem se lembrava das declarações de governistas à época dos protestos. Nada a ver com o que disse o secretário-geral agora.
A avaliação corrente entre esse grupo era a de que as manifestações ocorreram devido aos êxitos das administrações do PT, pois elas melhoraram a vida das pessoas e aumentaram o nível de exigência dos incluídos. Além disso, os protestos, afirmavam com razão, não eram contra o governo federal, mas contra todos os partidos e políticos.
A presidente Dilma, especificamente, disse mais de uma vez que entendia e ouvia a voz das ruas, que o "Brasil acordou mais forte" e que as queixas e os queixosos mereciam todo respeito e consideração. Onde a mágoa? Onde o sentimento de ingratidão? Onde a sensação de que "fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós"? Onde a verdade? Neste caso, provavelmente na fala atual de Gilberto Carvalho. Maquiados estavam os discursos oficiais da época.
Reportagem de João Domingos publicada na edição de segunda-feira do Estado, tendo como personagens vários petistas importantes, mostra que na avaliação do partido a disputa eleitoral será muito difícil e sem perspectiva de vitória no primeiro turno.
Os analistas citados: Gilberto Carvalho, o ex-presidente Lula da Silva, o presidente do PT, Rui Falcão, e o vice- presidente da Câmara, André Vargas.
Eram os mesmos que juntos a outros tantos até recentemente ironizavam a oposição, menosprezavam os oponentes, provocavam, davam a entender que a eleição seria praticamente uma formalidade. Apenas por acidente Dilma não seria reeleita no primeiro turno.
O jornalista João Santana, tido como 40.º ministro tal a sua influência como arquiteto das magias palacianas e eleitorais, disse em altaneiro tom após a primeira grande queda da presidente nas pesquisas, ao prever a recuperação: "A Dilma vai ganhar no primeiro turno, porque ocorrerá uma antropofagia de anões. Eles (os adversários) vão se comer lá embaixo e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo".
Onde a verdade? Nas palavras de Santana, na arrogância anterior das lideranças ou nas avaliações mais comedidas de hoje? Aqui, tudo indica que as circunstâncias atuais recomendaram uma conciliação entre realidade e humildade. Pela razão prática do recuo estratégico para abrir espaço ao avanço tático.
Não está claro quando a verdade saiu contundida: se no presente ou no passado.
Mas, tenha maquiado a realidade antes ou esteja agora adaptando o discurso às circunstâncias eleitorais, fato é que o governo apresenta versões diferentes daquelas que divulgava meses atrás sobre os protestos de junho e o grau de dificuldade da reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Todo mundo tem direito a mudar de opinião. Desde que, principalmente em se tratando de governos, fique bem explicado e justificado que se trata de uma mudança de posição. Do contrário, o que se tem é um exercício de "apagamento" da memória coletiva, a falta consentida de compromisso com a palavra dita.
Na sexta-feira passada, o secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, disse no Fórum Social, em Porto Alegre (enquanto Dilma falava no Fórum Econômico, na Suíça) que houve perplexidade no governo federal e até um sentimento de "ingratidão" em relação aos manifestantes do mês de junho de 2013.
Segundo Carvalho, levou-se "um susto" em Brasília. "Nós ficamos perplexos". E, por "nós", explicou, falava do governo e dos "movimentos tradicionais". Sentiram "dor", como quem diz, "fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós", relatou o assessor presidencial à plateia.
Perplexo e assustado certamente ficou, ao ler a declaração, quem se lembrava das declarações de governistas à época dos protestos. Nada a ver com o que disse o secretário-geral agora.
A avaliação corrente entre esse grupo era a de que as manifestações ocorreram devido aos êxitos das administrações do PT, pois elas melhoraram a vida das pessoas e aumentaram o nível de exigência dos incluídos. Além disso, os protestos, afirmavam com razão, não eram contra o governo federal, mas contra todos os partidos e políticos.
A presidente Dilma, especificamente, disse mais de uma vez que entendia e ouvia a voz das ruas, que o "Brasil acordou mais forte" e que as queixas e os queixosos mereciam todo respeito e consideração. Onde a mágoa? Onde o sentimento de ingratidão? Onde a sensação de que "fizemos tanto por essa gente e agora eles se levantam contra nós"? Onde a verdade? Neste caso, provavelmente na fala atual de Gilberto Carvalho. Maquiados estavam os discursos oficiais da época.
Reportagem de João Domingos publicada na edição de segunda-feira do Estado, tendo como personagens vários petistas importantes, mostra que na avaliação do partido a disputa eleitoral será muito difícil e sem perspectiva de vitória no primeiro turno.
Os analistas citados: Gilberto Carvalho, o ex-presidente Lula da Silva, o presidente do PT, Rui Falcão, e o vice- presidente da Câmara, André Vargas.
Eram os mesmos que juntos a outros tantos até recentemente ironizavam a oposição, menosprezavam os oponentes, provocavam, davam a entender que a eleição seria praticamente uma formalidade. Apenas por acidente Dilma não seria reeleita no primeiro turno.
O jornalista João Santana, tido como 40.º ministro tal a sua influência como arquiteto das magias palacianas e eleitorais, disse em altaneiro tom após a primeira grande queda da presidente nas pesquisas, ao prever a recuperação: "A Dilma vai ganhar no primeiro turno, porque ocorrerá uma antropofagia de anões. Eles (os adversários) vão se comer lá embaixo e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo".
Onde a verdade? Nas palavras de Santana, na arrogância anterior das lideranças ou nas avaliações mais comedidas de hoje? Aqui, tudo indica que as circunstâncias atuais recomendaram uma conciliação entre realidade e humildade. Pela razão prática do recuo estratégico para abrir espaço ao avanço tático.
Da banca de peixes ao mercado de escravos - JOSÉ NÊUMANNE
O Estado de S.Paulo - 29/01
Em seu discurso no Fórum Econômico de Davos Dilma Rousseff tentou, ao que tudo indica, erigir um marco de referência para sua campanha. Como o fora a Carta aos Brasileiros, na qual o PT abandonou seu discurso avesso ao sistema financeiro internacional para facilitar o acesso de Lula à rampa do Planalto afastando a desconfiança dos investidores. E da Suíça Sua Excelência embarcou para Cuba para agradecer a Raúl Castro os médicos exportados para o Brasil e assim conquistar votos para candidatos oficiais combatendo as falhas da saúde pública no interior.
Há 12 anos, inspirado pela visão pragmática do ex-prefeito de Ribeirão Preto Antônio Palocci, que passou a coordenar o programa de governo do candidato petista na campanha presidencial após a morte do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel, Lula deu uma guinada de 180 graus na retórica econômica do PT. Com isso, acalmou o mercado inquieto e ganhou a eleição. Hábil, intuitivo e esperto, o ex-dirigente sindical apoiou seu compromisso nos pilares da austeridade monetária, do equilíbrio fiscal e da flutuação cambial ao nomear o banqueiro tucano Henrique Meirelles para a presidência do Banco Central.
E não ficou nisso: solidamente ancorado em seu proverbial bom senso, o antecessor, padrinho e fiador da atual presidente nunca estimulou nem permitiu que nenhum espírito santo da sua orelha esquerda desautorizasse a política, na prática, autônoma, da autoridade monetária nacional. Foi isso que amainou a procela que parecia inevitável caso prevalecessem os impulsos desenvolvimentistas e os flertes populistas com seus melodiosos, mas também venenosos, cantos de sereia. Nem mesmo a queda de Palocci no epicentro de um furacão de escândalos de corrupção e sua substituição pelo inexpressivo, e às vezes até caricato, Guido Mantega alteraram a rota singrada pela nau da economia, que correria o risco de ficar à deriva. E assim o País continuou prosperando e os eleitores garantiram seus dois mandatos e o triunfo de Dilma.
Já a sucessora de padim Lula de Caetés é mandona, voluntariosa e pouco afeita ao exercício da esperteza política. Embora Lula tenha sido mantido no alto posto de eminência parda, a gestão de rotina da política econômica, sob a insignificância de Mantega e a absoluta falta de brilho e de estilo próprio de Alexandre Tombini, um burocrata incapaz de suceder a Meireles à altura, independe da sensatez do profeta do ABC. Ao contrário, limita-se tão somente aos espasmos tirânicos de vontade da chefe geral, economista de formação acadêmica basal, mas sempre disposta a deitar regra em função do diploma. A Carta foi feita para a campanha e entrou na História. A peça de Dilma é mera fantasia de palanque.
No reino encantado de dona Dilma, "a inflação permanece sob controle. Nos últimos anos, perseguimos o centro da meta e trabalhamos para lograr esse objetivo". Trata-se de um logro de fazer o Dr. Pangloss corar de pudor. Pois pelo quarto ano consecutivo a inflação fechou 2013 acima do centro da meta, embora abaixo do teto preestabelecido de 6,5%. "Nosso sucesso estará associado à parceria com os investidores do Brasil e de todo o mundo" - é o doce sonho da chefe do governo. Com 13 procedimentos exigidos e 107,5 dias de prazo para abrir uma empresa, o Brasil está no 116.º lugar entre 189 nações no ranking "Facilidade para Fazer Negócios" do Banco Mundial. Quase um terço de executivos do mundo ouvidos em levantamento da KPMG apontou a complexidade tributária como maior obstáculo para investir no País.
Justiça seja feita, a presidente teve um momento de modéstia realista ao registrar a necessidade de investir muito mais em infraestrutura, lembrando que apoia as parcerias com o setor privado. No entanto, protecionismo, barreiras governamentais, questões políticas e incertezas na regulação põem o Brasil em 71.º lugar entre 148 nações, segundo o Fórum.
Após haver afagado na banca de peixes de Davos bolsos dos quais deverão sair doações para a campanha de sua reeleição, à qual é favorita, menos por competência própria do que por incompetência da oposição, Dilma foi a Cuba. Lá inaugurou a primeira etapa da construção do porto de Mariel, bancado por nós e para o qual doou mais US$ 290 milhões de mão beijada. Então, se não pôde fugir da obviedade de que é preciso investir mais para melhorar nossas condições rodoviárias, portuárias, aeroportuárias e de outros setores necessários à circulação de mercadorias, financiar um porto no qual nunca será embarcada uma saca de soja nacional é uma contradição. Na ocasião, atacou o embargo dos Estados Unidos a Cuba, uma decisão anacrônica e nada inteligente dos gringos, que só serve para reforçar a desculpa furada de que a situação deplorável da economia da ilha caribenha se deve à intransigência ianque. Sua posição é correta, mas óbvia e dispensável. Não parece lógico que os americanos corrijam tal erro só para lhe agradar. E o Brasil até tem cacife para sustentar Cuba, como antes o fizeram a União Soviética e a Venezuela. Mas para quê?
O aspecto mais surreal de sua visita ao canavial dos irmãos Castro, contudo, foi ter levado na comitiva o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, candidato petista ao governo paulista, e seu sucessor, Arthur Chioro, para os três agradecerem em coro o envio de paramédicos cubanos para preencher vagas do Mais Médicos nos grotões pátrios. Ora, esculápios são o maior produto de exportação da miserável Cuba e o Brasil paga o equivalente a R$ 10 mil por mês diretamente aos tiranetes locais por profissional importado, ficando para cada um destes um mísero troco. Trata-se de uma inversão na prática da mendicância: é a primeira vez na História que quem dá a esmola agradece ao mendigo. Ao anunciar mais 2 mil contratados em tais condições, a vendedora de peixe na Suíça comporta-se como receptadora de escravos no Caribe 125 anos após a Abolição.
Em seu discurso no Fórum Econômico de Davos Dilma Rousseff tentou, ao que tudo indica, erigir um marco de referência para sua campanha. Como o fora a Carta aos Brasileiros, na qual o PT abandonou seu discurso avesso ao sistema financeiro internacional para facilitar o acesso de Lula à rampa do Planalto afastando a desconfiança dos investidores. E da Suíça Sua Excelência embarcou para Cuba para agradecer a Raúl Castro os médicos exportados para o Brasil e assim conquistar votos para candidatos oficiais combatendo as falhas da saúde pública no interior.
Há 12 anos, inspirado pela visão pragmática do ex-prefeito de Ribeirão Preto Antônio Palocci, que passou a coordenar o programa de governo do candidato petista na campanha presidencial após a morte do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel, Lula deu uma guinada de 180 graus na retórica econômica do PT. Com isso, acalmou o mercado inquieto e ganhou a eleição. Hábil, intuitivo e esperto, o ex-dirigente sindical apoiou seu compromisso nos pilares da austeridade monetária, do equilíbrio fiscal e da flutuação cambial ao nomear o banqueiro tucano Henrique Meirelles para a presidência do Banco Central.
E não ficou nisso: solidamente ancorado em seu proverbial bom senso, o antecessor, padrinho e fiador da atual presidente nunca estimulou nem permitiu que nenhum espírito santo da sua orelha esquerda desautorizasse a política, na prática, autônoma, da autoridade monetária nacional. Foi isso que amainou a procela que parecia inevitável caso prevalecessem os impulsos desenvolvimentistas e os flertes populistas com seus melodiosos, mas também venenosos, cantos de sereia. Nem mesmo a queda de Palocci no epicentro de um furacão de escândalos de corrupção e sua substituição pelo inexpressivo, e às vezes até caricato, Guido Mantega alteraram a rota singrada pela nau da economia, que correria o risco de ficar à deriva. E assim o País continuou prosperando e os eleitores garantiram seus dois mandatos e o triunfo de Dilma.
Já a sucessora de padim Lula de Caetés é mandona, voluntariosa e pouco afeita ao exercício da esperteza política. Embora Lula tenha sido mantido no alto posto de eminência parda, a gestão de rotina da política econômica, sob a insignificância de Mantega e a absoluta falta de brilho e de estilo próprio de Alexandre Tombini, um burocrata incapaz de suceder a Meireles à altura, independe da sensatez do profeta do ABC. Ao contrário, limita-se tão somente aos espasmos tirânicos de vontade da chefe geral, economista de formação acadêmica basal, mas sempre disposta a deitar regra em função do diploma. A Carta foi feita para a campanha e entrou na História. A peça de Dilma é mera fantasia de palanque.
No reino encantado de dona Dilma, "a inflação permanece sob controle. Nos últimos anos, perseguimos o centro da meta e trabalhamos para lograr esse objetivo". Trata-se de um logro de fazer o Dr. Pangloss corar de pudor. Pois pelo quarto ano consecutivo a inflação fechou 2013 acima do centro da meta, embora abaixo do teto preestabelecido de 6,5%. "Nosso sucesso estará associado à parceria com os investidores do Brasil e de todo o mundo" - é o doce sonho da chefe do governo. Com 13 procedimentos exigidos e 107,5 dias de prazo para abrir uma empresa, o Brasil está no 116.º lugar entre 189 nações no ranking "Facilidade para Fazer Negócios" do Banco Mundial. Quase um terço de executivos do mundo ouvidos em levantamento da KPMG apontou a complexidade tributária como maior obstáculo para investir no País.
Justiça seja feita, a presidente teve um momento de modéstia realista ao registrar a necessidade de investir muito mais em infraestrutura, lembrando que apoia as parcerias com o setor privado. No entanto, protecionismo, barreiras governamentais, questões políticas e incertezas na regulação põem o Brasil em 71.º lugar entre 148 nações, segundo o Fórum.
Após haver afagado na banca de peixes de Davos bolsos dos quais deverão sair doações para a campanha de sua reeleição, à qual é favorita, menos por competência própria do que por incompetência da oposição, Dilma foi a Cuba. Lá inaugurou a primeira etapa da construção do porto de Mariel, bancado por nós e para o qual doou mais US$ 290 milhões de mão beijada. Então, se não pôde fugir da obviedade de que é preciso investir mais para melhorar nossas condições rodoviárias, portuárias, aeroportuárias e de outros setores necessários à circulação de mercadorias, financiar um porto no qual nunca será embarcada uma saca de soja nacional é uma contradição. Na ocasião, atacou o embargo dos Estados Unidos a Cuba, uma decisão anacrônica e nada inteligente dos gringos, que só serve para reforçar a desculpa furada de que a situação deplorável da economia da ilha caribenha se deve à intransigência ianque. Sua posição é correta, mas óbvia e dispensável. Não parece lógico que os americanos corrijam tal erro só para lhe agradar. E o Brasil até tem cacife para sustentar Cuba, como antes o fizeram a União Soviética e a Venezuela. Mas para quê?
O aspecto mais surreal de sua visita ao canavial dos irmãos Castro, contudo, foi ter levado na comitiva o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, candidato petista ao governo paulista, e seu sucessor, Arthur Chioro, para os três agradecerem em coro o envio de paramédicos cubanos para preencher vagas do Mais Médicos nos grotões pátrios. Ora, esculápios são o maior produto de exportação da miserável Cuba e o Brasil paga o equivalente a R$ 10 mil por mês diretamente aos tiranetes locais por profissional importado, ficando para cada um destes um mísero troco. Trata-se de uma inversão na prática da mendicância: é a primeira vez na História que quem dá a esmola agradece ao mendigo. Ao anunciar mais 2 mil contratados em tais condições, a vendedora de peixe na Suíça comporta-se como receptadora de escravos no Caribe 125 anos após a Abolição.
Contas externas - ARMANDO CASTELAR
CORREIO BRAZILIENSE - 29/01
O Brasil registrou em 2013 o maior deficit externo de sua história: US$ 81 bilhões. O número é não apenas alto e superior às expectativas, como veio acompanhado de outras tendências que causam justificada apreensão. Primeiro, ele marca uma forte alta em relação a 2012: exatos 50%, apesar da modesta alta no PIB. Segundo, enquanto em 2012 o investimento estrangeiro direto (IED) somou 120% do deficit em conta-corrente, em 2013 ele cobriu apenas 79% do deficit. A composição do IED também piorou: em 2012, 81% do IED foram investimentos em participação no capital e 19% empréstimos intercompanhias, forma de financiamento externo de pior qualidade; um ano depois, essas proporções mudaram para 65% e 35%, respectivamente.
Ainda que todas as principais contas em transações correntes tenham piorado, o destaque ficou com a balança comercial, cujo saldo caiu de US$ 19,4 bilhões para US$ 2,6 bilhões. A maioria dos analistas acredita que esse saldo será maior em 2014, ajudando a reduzir o deficit em conta-corrente. Para o Banco Central (BC), o saldo comercial este ano vai a US$ 10 bilhões, com o deficit em conta-corrente caindo a US$ 78 bilhões. A expectativa mediana do mercado, de acordo com o boletim Focus do Banco Central, é de um saldo comercial de US$ 8 bilhões e um deficit em conta-corrente de US$ 73 bilhões.
Essa expectativa de melhora está ancorada em dois argumentos. Primeiro, que o câmbio mais desvalorizado vai reduzir importações e elevar exportações. Segundo, que o crescimento mais alto nos EUA e na Europa vai puxar a demanda por exportações. Esses são pontos frágeis, no meu entendimento.
O real mais fraco ajuda, mas apenas em parte, devido ao semicongelamento do preço de combustíveis. De fato, apesar de toda a desvalorização cambial em 2013, a inflação de produtos não comercializáveis foi 40% maior do que a de comercializáveis. Isto é, os preços continuam se movendo em favor de piora, e não de melhora, do saldo comercial. De fato, nas primeiras quatro semanas deste mês, o saldo comercial por dia útil ficou US$ 31 milhões menor do que em janeiro de 2013.
O FMI prevê que os EUA e a União Europeia cresçam, respectivamente, 1,0% e 1,2% a mais em 2014 do que em 2013, o que ajuda. Porém, esses países perderam participação nas nossas exportações, respondendo por 30% do total, contra 19% da China, 8% da Argentina e 2% da Venezuela, países que devem crescer menos este ano que ano passado. A Argentina, em especial, deve reduzir bem suas compras de produtos brasileiros, afetando especialmente a indústria automobilística. Outros países latino-americanos também devem desacelerar, reduzindo suas compras de produtos brasileiros.
Outro fator que deve jogar contra um aumento do saldo comercial é a queda dos termos de troca. Na média dos dois últimos anos, o preço das exportações caiu 4% ao ano, enquanto o das importações permaneceu virtualmente estável. Se isso se repetir este ano, serão US$ 9,7 bilhões a menos no saldo comercial.
Como proporção do PIB, o deficit em conta-corrente saltou de 2,4% para 3,7% entre 2012 e 2013. O BC projeta que ele caia para 3,5% do PIB este ano, mas isso supõe um PIB em dólar constante. Não parece uma boa hipótese, visto que a desvalorização do câmbio - 12,2%, de acordo com o mercado - deve superar a alta do PIB nominal cerca de 7,9%.
Assim, eu acredito que o deficit em conta-corrente deve aumentar outra vez em 2014, e aproximando-se de 4% do PIB. De fato, desde 2005, o saldo em conta corrente vem piorando a uma média de 0,6% do PIB ao ano.
Esse é o resultado de um modelo econômico que estimula uma alta da demanda doméstica superior à do PIB, o que exige uma forte expansão das importações para compensar. É difícil acreditar que, em ano eleitoral, o governo esteja disposto a reduzir o crescimento do consumo privado e do investimento a ponto de mudar essa tendência. Especialmente, porque teria de ser uma desaceleração não trivial, devido à tendência de queda do preço das exportações.
O financiamento desse deficit também será de pior qualidade, ficando mais dependente das altas taxas de juros para se atrair capital volátil. No todo, portanto, as contas externas devem piorar mais este ano, ainda que menos do que em 2013. Com o Banco Central americano reduzindo as injeções de liquidez no mercado internacional, a preocupação com esse tema vai aumentar.
Mercosul - ANTONIO DELFIM NETTO
FOLHA DE SP - 29/01
Se tomarmos distância e tentarmos discernir quais os fenômenos que caracterizam o momento em que vivemos, talvez possamos apontar seis deles:
1. A evolução do clima, que, em parte, é resultado da dinâmica do sistema planetário (sobre a qual pouco podemos fazer) e, em parte, é resultado da ação do homem na apropriação da natureza finita para atender ao crescimento da população mundial.
2. Uma globalização do sistema produtivo, estimulada pela "mundialização" financeira gestada pela livre movimentação dos capitais e pela facilidade de informação. Nela, as nações politicamente independentes são, cada vez mais, peças importantes, mas dispensáveis, na produção global.
3. O resultado mais deplorável dessa dominância financeira foi uma exacerbada concentração de renda. A solução da grande recessão de 2007 mostrou que, em larga medida, o mercado financeiro apropriou-se do sistema político, com graves consequências: os patifes que promoveram o assalto ao cidadão incauto (sob a proteção dos olhos complacentes dos governos) estão muito bem, enquanto mais de 40 milhões de honestos trabalhadores de todo o mundo ainda estão sem emprego. A falta de uma resposta política eficiente e rápida para esse problema é uma das mais sérias ameaças à democracia.
4. Houve, em compensação, um claro avanço das relações entre a organização econômica (o "mercado"), que o homem foi encontrando num processo de seleção histórica para satisfazer objetivos não inteiramente compatíveis, e o processo democrático (a "urna"), o que reduziu a angústia da procura de soluções mágicas para resolvê-los.
5. Um rápido processo de urbanização, que acarreta profundas consequências ecológicas no comportamento humano e cria um ambiente vulnerável.
6. E, finalmente, a emergência de uma forma revolucionária de interação popular paralela à da representação democrática clássica. Ela tornou-se possível pelos rápidos e incontroláveis avanços da tecnologia de informação. Ainda estamos longe de entender suas consequências práticas, a longo prazo, nas relações entre o cidadão e o Estado (que tenta controlar a tecnologia).
Como resulta claro desses fenômenos, nenhum grupo de pequenos países pode enfrentá-los. Se, por um lado, é preciso uma coordenação mundial, por outro, é necessário o reconhecimento de cada um, por mais importante que pense ser, de que é apenas uma engrenagem pequena ou grande que, ou se integra no processo produtivo global, ou será desembreado dele! Esse será, por exemplo, o destino dos países do Mercosul se não entenderem o processo...
Se tomarmos distância e tentarmos discernir quais os fenômenos que caracterizam o momento em que vivemos, talvez possamos apontar seis deles:
1. A evolução do clima, que, em parte, é resultado da dinâmica do sistema planetário (sobre a qual pouco podemos fazer) e, em parte, é resultado da ação do homem na apropriação da natureza finita para atender ao crescimento da população mundial.
2. Uma globalização do sistema produtivo, estimulada pela "mundialização" financeira gestada pela livre movimentação dos capitais e pela facilidade de informação. Nela, as nações politicamente independentes são, cada vez mais, peças importantes, mas dispensáveis, na produção global.
3. O resultado mais deplorável dessa dominância financeira foi uma exacerbada concentração de renda. A solução da grande recessão de 2007 mostrou que, em larga medida, o mercado financeiro apropriou-se do sistema político, com graves consequências: os patifes que promoveram o assalto ao cidadão incauto (sob a proteção dos olhos complacentes dos governos) estão muito bem, enquanto mais de 40 milhões de honestos trabalhadores de todo o mundo ainda estão sem emprego. A falta de uma resposta política eficiente e rápida para esse problema é uma das mais sérias ameaças à democracia.
4. Houve, em compensação, um claro avanço das relações entre a organização econômica (o "mercado"), que o homem foi encontrando num processo de seleção histórica para satisfazer objetivos não inteiramente compatíveis, e o processo democrático (a "urna"), o que reduziu a angústia da procura de soluções mágicas para resolvê-los.
5. Um rápido processo de urbanização, que acarreta profundas consequências ecológicas no comportamento humano e cria um ambiente vulnerável.
6. E, finalmente, a emergência de uma forma revolucionária de interação popular paralela à da representação democrática clássica. Ela tornou-se possível pelos rápidos e incontroláveis avanços da tecnologia de informação. Ainda estamos longe de entender suas consequências práticas, a longo prazo, nas relações entre o cidadão e o Estado (que tenta controlar a tecnologia).
Como resulta claro desses fenômenos, nenhum grupo de pequenos países pode enfrentá-los. Se, por um lado, é preciso uma coordenação mundial, por outro, é necessário o reconhecimento de cada um, por mais importante que pense ser, de que é apenas uma engrenagem pequena ou grande que, ou se integra no processo produtivo global, ou será desembreado dele! Esse será, por exemplo, o destino dos países do Mercosul se não entenderem o processo...
Dilma em Cuba - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 29/01
Sem entrar no mérito das negociações diplomáticas e comerciais do governo brasileiro com o de Cuba, que resultam no momento em decisiva contribuição dos cofres públicos nacionais para a implantação da Zona de Desenvolvimento Especial do Porto de Mariel na ilha dos irmãos Castro, este mais recente afago à ditadura cubana reitera o carinho de Dilma Rousseff pelo dogmatismo ideológico que o lulopetismo compartilha com os Castros e só não logrou ainda consagrar plenamente entre nós por duas razões. Primeiro, porque, pragmaticamente, sua prioridade passou a ser manter-se no poder a qualquer custo; depois, pela razão histórica de que a superação de dois regimes discricionários no século passado, o getulista e o militar, teve o dom de fortalecer nossas instituições democráticas e dificultar a escalada de aventuras autoritárias, especialmente a partir da promulgação da Carta Magna de 1988 - a cujo texto, aliás, o PT fez ferrenha oposição.
A conquista do poder e seu exercício por onze anos converteram o lulopetismo, nunca é demais repetir, em um pragmatismo que hoje o identifica com as piores práticas políticas que são, desde sempre, a principal característica do patrimonialismo. Mas, principalmente para efeito externo - mas também para satisfazer a militância que ainda imagina pertencer ao velho PT -, o discurso "libertário" do "socialismo do século 21" mantém-se inalterado e foi para exercitá-lo que Dilma Rousseff decidiu encerrar na ilha dos Castros seu último périplo internacional. Pois precisava de algum modo exorcizar eventuais fluidos negativos remanescentes de sua passagem por Davos, o covil do capitalismo, onde foi praticamente implorar por investimentos estrangeiros no Brasil.
Ao lado de Raúl Castro e no indispensável beija-mão de Fidel, Dilma esteve perfeitamente à vontade. Não se poupou de reafirmar que tem "muito orgulho" da boa relação que mantém com a dupla que há mais de meio século domina a ilha com mão de ferro e nenhum apreço pelas liberdades democráticas. Derreteu-se em agradecimentos ao favor que Cuba presta ao Brasil ao fornecer, para o programa Mais Médicos, a um custo altíssimo só parcialmente repassado aos profissionais, os doutores que aqui desembarcam para suprir a deficiência de atendimento básico nos grotões que a incompetente política nacional de saúde não tem conseguido alcançar. Para conferir maior brilho a esse tópico de sua agenda em Havana, Dilma levou a tiracolo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que brevemente será o candidato do PT ao governo de São Paulo.
Mas foi no Porto de Mariel, no qual o nosso Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já havia investido mais de US$ 800 milhões e agora vai colocar outros US$ 290 milhões - menos mal que com a condição de serem gastos com fornecedores brasileiros de bens e serviços -, que Dilma escancarou sua admiração pela mítica ilha dos sonhos da esquerda inconsequente. Chegou mesmo a enaltecer o fato de que "Cuba gera um dos três maiores volumes de comércio do Caribe", algo assim tão relevante e extraordinário para a economia globalizada quanto, para o futebol mundial, saber que o Confiança Futebol Clube, de Aracaju, é uma das três maiores forças do ludopédio sergipano.
A presidente foi a Havana também para bater ponto na 2.ª Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos (Celac), preciosa oportunidade para mais uma manifestação de simpatia pela ideologia "libertária" que irmana o lulopetismo aos Castros e a outros aventureiros bolivarianos do continente.
Ao procurar sua turma, Dilma Rousseff deixa no ar uma questão fundamental para o futuro da democracia brasileira, que a tão duras penas tenta se consolidar: o que o PT planeja para o Brasil é o mesmo que, para ficar apenas no continente, os amigos de fé de Lula e Dilma oferecem a cubanos, nicaraguenses, venezuelanos, bolivianos, equatorianos e argentinos? Sonho por sonho, melhor acreditar que tudo é apenas jogo de cena.
Sem entrar no mérito das negociações diplomáticas e comerciais do governo brasileiro com o de Cuba, que resultam no momento em decisiva contribuição dos cofres públicos nacionais para a implantação da Zona de Desenvolvimento Especial do Porto de Mariel na ilha dos irmãos Castro, este mais recente afago à ditadura cubana reitera o carinho de Dilma Rousseff pelo dogmatismo ideológico que o lulopetismo compartilha com os Castros e só não logrou ainda consagrar plenamente entre nós por duas razões. Primeiro, porque, pragmaticamente, sua prioridade passou a ser manter-se no poder a qualquer custo; depois, pela razão histórica de que a superação de dois regimes discricionários no século passado, o getulista e o militar, teve o dom de fortalecer nossas instituições democráticas e dificultar a escalada de aventuras autoritárias, especialmente a partir da promulgação da Carta Magna de 1988 - a cujo texto, aliás, o PT fez ferrenha oposição.
A conquista do poder e seu exercício por onze anos converteram o lulopetismo, nunca é demais repetir, em um pragmatismo que hoje o identifica com as piores práticas políticas que são, desde sempre, a principal característica do patrimonialismo. Mas, principalmente para efeito externo - mas também para satisfazer a militância que ainda imagina pertencer ao velho PT -, o discurso "libertário" do "socialismo do século 21" mantém-se inalterado e foi para exercitá-lo que Dilma Rousseff decidiu encerrar na ilha dos Castros seu último périplo internacional. Pois precisava de algum modo exorcizar eventuais fluidos negativos remanescentes de sua passagem por Davos, o covil do capitalismo, onde foi praticamente implorar por investimentos estrangeiros no Brasil.
Ao lado de Raúl Castro e no indispensável beija-mão de Fidel, Dilma esteve perfeitamente à vontade. Não se poupou de reafirmar que tem "muito orgulho" da boa relação que mantém com a dupla que há mais de meio século domina a ilha com mão de ferro e nenhum apreço pelas liberdades democráticas. Derreteu-se em agradecimentos ao favor que Cuba presta ao Brasil ao fornecer, para o programa Mais Médicos, a um custo altíssimo só parcialmente repassado aos profissionais, os doutores que aqui desembarcam para suprir a deficiência de atendimento básico nos grotões que a incompetente política nacional de saúde não tem conseguido alcançar. Para conferir maior brilho a esse tópico de sua agenda em Havana, Dilma levou a tiracolo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que brevemente será o candidato do PT ao governo de São Paulo.
Mas foi no Porto de Mariel, no qual o nosso Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já havia investido mais de US$ 800 milhões e agora vai colocar outros US$ 290 milhões - menos mal que com a condição de serem gastos com fornecedores brasileiros de bens e serviços -, que Dilma escancarou sua admiração pela mítica ilha dos sonhos da esquerda inconsequente. Chegou mesmo a enaltecer o fato de que "Cuba gera um dos três maiores volumes de comércio do Caribe", algo assim tão relevante e extraordinário para a economia globalizada quanto, para o futebol mundial, saber que o Confiança Futebol Clube, de Aracaju, é uma das três maiores forças do ludopédio sergipano.
A presidente foi a Havana também para bater ponto na 2.ª Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos (Celac), preciosa oportunidade para mais uma manifestação de simpatia pela ideologia "libertária" que irmana o lulopetismo aos Castros e a outros aventureiros bolivarianos do continente.
Ao procurar sua turma, Dilma Rousseff deixa no ar uma questão fundamental para o futuro da democracia brasileira, que a tão duras penas tenta se consolidar: o que o PT planeja para o Brasil é o mesmo que, para ficar apenas no continente, os amigos de fé de Lula e Dilma oferecem a cubanos, nicaraguenses, venezuelanos, bolivianos, equatorianos e argentinos? Sonho por sonho, melhor acreditar que tudo é apenas jogo de cena.
Dilma em Lisboa - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
GAZETA DO POVO - PR - 29/01
Gastos exagerados e versões que não se sustentam caracterizam a “parada técnica” da presidente em Portugal, no fim de semana
O episódio da “parada técnica” em Lisboa do avião presidencial que levaria Dilma Rousseff e sua numerosa comitiva de Davos (Suíça) para Cuba, no último fim de semana, está mais coberto de sombras do que exige a absoluta transparência que deve reger as relações entre o poder público e a sociedade. Se há questões técnicas a respeito da necessidade da escala da aeronave em Portugal, aspecto mais apropriado à opinião de especialistas aeronáuticos, há outras sobre as quais é impossível calar, tamanhas e tão grotescas são as contradições que vieram à tona. Afinal, dado o conforto que a aeronave presidencial oferece a seus ocupantes, especialmente à presidente, o próprio pernoite na capital portuguesa se torna questionável.
O assunto é do mais alto interesse público, tendo em vista as somas de recursos orçamentários envolvidos. Os fatos: Dilma e comitiva aterrissaram no aeroporto de Lisboa e lá se dividiram em 45 apartamentos em dois dos mais luxuosos hotéis lisboetas; para o repasto, escolheram o mais caro restaurante da capital, único de Lisboa a figurar no Guia Michelin como ombreado aos melhores do mundo. O ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, alegou que pelo menos a conta do restaurante foi paga pelos comensais, e não com o cartão corporativo (o que jamais teremos como saber ao certo, já que o governo blinda o máximo possível a divulgação de gastos com esses cartões).
Depois, vêm as contradições. Segundo Figueiredo, a escala em Lisboa só foi decidida no dia do voo, após se verificar que seria impossível cumprir o plano original de realizar a parada técnica nos Estados Unidos em razão do mau tempo lá reinante. Seria aceitável a explicação se dois dias antes o governo português já não tivesse sido notificado da escala em Lisboa e preparado a recepção de praxe.
Da mesma forma, o “improviso” do jantar, supostamente decidido de última hora, não confere com informações do próprio restaurante, que teria recebido pedido de reserva das mesas com a confortável antecedência dos mesmos dois dias. Mas por que no mais caro restaurante? Outro mistério não devidamente esclarecido.
E por que não abrigar a presidente e pelo menos alguns membros mais ilustres da comitiva na sede da embaixada brasileira, tradicional hospedaria de outros presidentes brasileiros no passado? De novo, o mesmo ministro se encarrega da explicação um tanto capenga: a embaixada não dispõe de instalações suficientes nem adequadas, e nunca terá – daí a razão da reserva dos dois luxuosos cinco estrelas lisboetas. Segundo ele, embora a diária da suíte presidencial no Hotel Ritz custe normalmente R$ 27 mil e a dos demais apartamentos, R$ 1.180,00, quando no “atacado” os preços são menores.
Repete-se o mesmo acontecimento de Roma: no ano passado, a imensa comitiva de Dilma gastou nada menos de R$ 324 mil em hospedagem e aluguel de veículos para representar o Brasil na inauguração do pontificado do papa Francisco, fato que chamou a atenção da imprensa internacional. Isso tudo apesar de a sede da embaixada brasileira, o Palácio Pamphilj, na Piazza Navona, ser conhecida pelo luxo e pelas condições de hospedagem que oferece – aproveitadas, por exemplo, pelo ex-presidente Lula quando ainda ocupava o cargo.
Ninguém pretende que a presidente recorra a hotéis ou restaurantes populares quando em viagem; a dignidade do cargo exige um tratamento à altura. Mas é preciso haver parcimônia com o dinheiro público, parcimônia esta que faltou em Roma e também em Lisboa. O roteiro turístico-gastronômico a que se deu a presidente Dilma Rousseff acaba sendo um acinte à pobreza do Brasil – país que se diz muito carente de recursos para atender às mais simples demandas de sua população. Um desrespeito que não enaltece o dever de responsabilidade da presidente na utilização de recursos públicos – principalmente quando se constata que o destino final da viagem foi Cuba, nação que os irmãos Castro relegaram à condição de uma das mais pobres do continente e que encontra no Brasil um parceiro a ajudá-la.
Tudo surreal e incompreensível. Do começo ao fim.
Gastos exagerados e versões que não se sustentam caracterizam a “parada técnica” da presidente em Portugal, no fim de semana
O episódio da “parada técnica” em Lisboa do avião presidencial que levaria Dilma Rousseff e sua numerosa comitiva de Davos (Suíça) para Cuba, no último fim de semana, está mais coberto de sombras do que exige a absoluta transparência que deve reger as relações entre o poder público e a sociedade. Se há questões técnicas a respeito da necessidade da escala da aeronave em Portugal, aspecto mais apropriado à opinião de especialistas aeronáuticos, há outras sobre as quais é impossível calar, tamanhas e tão grotescas são as contradições que vieram à tona. Afinal, dado o conforto que a aeronave presidencial oferece a seus ocupantes, especialmente à presidente, o próprio pernoite na capital portuguesa se torna questionável.
O assunto é do mais alto interesse público, tendo em vista as somas de recursos orçamentários envolvidos. Os fatos: Dilma e comitiva aterrissaram no aeroporto de Lisboa e lá se dividiram em 45 apartamentos em dois dos mais luxuosos hotéis lisboetas; para o repasto, escolheram o mais caro restaurante da capital, único de Lisboa a figurar no Guia Michelin como ombreado aos melhores do mundo. O ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, alegou que pelo menos a conta do restaurante foi paga pelos comensais, e não com o cartão corporativo (o que jamais teremos como saber ao certo, já que o governo blinda o máximo possível a divulgação de gastos com esses cartões).
Depois, vêm as contradições. Segundo Figueiredo, a escala em Lisboa só foi decidida no dia do voo, após se verificar que seria impossível cumprir o plano original de realizar a parada técnica nos Estados Unidos em razão do mau tempo lá reinante. Seria aceitável a explicação se dois dias antes o governo português já não tivesse sido notificado da escala em Lisboa e preparado a recepção de praxe.
Da mesma forma, o “improviso” do jantar, supostamente decidido de última hora, não confere com informações do próprio restaurante, que teria recebido pedido de reserva das mesas com a confortável antecedência dos mesmos dois dias. Mas por que no mais caro restaurante? Outro mistério não devidamente esclarecido.
E por que não abrigar a presidente e pelo menos alguns membros mais ilustres da comitiva na sede da embaixada brasileira, tradicional hospedaria de outros presidentes brasileiros no passado? De novo, o mesmo ministro se encarrega da explicação um tanto capenga: a embaixada não dispõe de instalações suficientes nem adequadas, e nunca terá – daí a razão da reserva dos dois luxuosos cinco estrelas lisboetas. Segundo ele, embora a diária da suíte presidencial no Hotel Ritz custe normalmente R$ 27 mil e a dos demais apartamentos, R$ 1.180,00, quando no “atacado” os preços são menores.
Repete-se o mesmo acontecimento de Roma: no ano passado, a imensa comitiva de Dilma gastou nada menos de R$ 324 mil em hospedagem e aluguel de veículos para representar o Brasil na inauguração do pontificado do papa Francisco, fato que chamou a atenção da imprensa internacional. Isso tudo apesar de a sede da embaixada brasileira, o Palácio Pamphilj, na Piazza Navona, ser conhecida pelo luxo e pelas condições de hospedagem que oferece – aproveitadas, por exemplo, pelo ex-presidente Lula quando ainda ocupava o cargo.
Ninguém pretende que a presidente recorra a hotéis ou restaurantes populares quando em viagem; a dignidade do cargo exige um tratamento à altura. Mas é preciso haver parcimônia com o dinheiro público, parcimônia esta que faltou em Roma e também em Lisboa. O roteiro turístico-gastronômico a que se deu a presidente Dilma Rousseff acaba sendo um acinte à pobreza do Brasil – país que se diz muito carente de recursos para atender às mais simples demandas de sua população. Um desrespeito que não enaltece o dever de responsabilidade da presidente na utilização de recursos públicos – principalmente quando se constata que o destino final da viagem foi Cuba, nação que os irmãos Castro relegaram à condição de uma das mais pobres do continente e que encontra no Brasil um parceiro a ajudá-la.
Tudo surreal e incompreensível. Do começo ao fim.
Governo em xeque no mercado - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 29/01
O governo está em xeque, forçado a responder às pressões e cobranças do mercado já no começo do ano de eleições. Diante da turbulência cambial e da insegurança financeira, a presidente e sua equipe têm um motivo a mais, e muito forte, para apresentar um programa sério e crível de arrumação das contas públicas. Mas até agora as autoridades se limitaram a prometer medidas para fortalecer a situação fiscal, sem especificá-las, e para continuar reduzindo a dívida líquida. Até a semana passada, a preocupação principal era com o risco de rebaixamento do País pelas agências de classificação de crédito. Uma redução da nota poderia causar danos consideráveis, especialmente numa fase de menor oferta de financiamentos. A oferta menor seria uma consequência normal de uma expansão monetária menor nos Estados Unidos. Mas o quadro piorou desde quinta-feira, quando o peso argentino caiu 15% em um dia e evidenciou uma nova onda de insegurança em relação aos emergentes.
Uma corrida especulativa pode ocasionar estragos notáveis antes de qualquer iniciativa das agências de classificação. O governo sabe disso, ou deveria saber. Os dirigentes do Banco Central da Índia reagiram com rapidez e anunciaram na segunda-feira uma elevação dos juros. Os do Banco Central da Turquia marcaram uma reunião extraordinária, dando sinais de um novo aperto monetário para conter a inflação e manter alguma atratividade para os investidores. Na terça, as bolsas europeias subiram, numa aparente reação positiva às notícias da Índia e da Turquia. No Brasil, o dólar caiu e voltou a subir. No meio da tarde, a cotação era muito parecida com a do dia anterior.
As autoridades brasileiras continuam devendo respostas ao mercado. A nova meta fiscal deverá ser conhecida em fevereiro, quando sair a primeira reprogramação orçamentária. Nenhuma decisão sobre números havia sido tomada até ontem, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Em Londres, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, havia prometido no dia anterior todas as medidas necessárias para conter a inflação e limitar as oscilações do câmbio. Suas declarações reforçaram a expectativa de nova alta do juro básico na próxima reunião do Comitê de Política Monetária, em fevereiro.
A promessa de Tombini é avalizada pelas ações recentes do BC - uma elevação gradual do juro a partir de abril. Mas a presidente da República e o ministro da Fazenda nada têm apresentado, em suas manifestações oficiais, além de promessas desmentidas pelos fatos e acompanhadas, depois de algum tempo, de outras promessas. Por que acreditar, agora, na seriedade de seus propósitos?
A resposta mais favorável talvez esteja fora das palavras da presidente e de seus auxiliares. Os sinais de temor de novos problemas e o empenho na busca de credibilidade são dados aparentemente positivos. Mas são insuficientes para interromper a dinâmica dos mercados.
Essa dinâmica inclui as análises produzidas, no dia a dia, pelas instituições financeiras e pelas consultorias. Uma aposta positiva no curto prazo foi feita pela consultoria Eurasia Group. De imediato, Brasil, Índia e Indonésia são os menos preocupantes dentre os atingidos pelas turbulências dos últimos dias, segundo o diretor para mercados emergentes, Chris Garman. As perspectivas, afirmou, são piores para Argentina, Turquia e África do Sul. No mesmo dia, o Banco Morgan Stanley divulgou uma análise bem diferente, com Brasil e Turquia apresentados como os emergentes mais expostos aos riscos atuais nas áreas de câmbio, juros, crédito soberano e crédito corporativo.
Enquanto isso, no Brasil, o pessoal do Ministério da Fazenda consulta especialistas do mercado em busca de elementos para fixar um objetivo fiscal crível e aceitável. Algo próximo de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) seria uma boa resposta, segundo analistas. Mas há quem aposte num alvo menos ambicioso e menos trabalhoso para o governo. Enquanto se espera a decisão, a insegurança permanece e muita pressão poderá ainda ocorrer até o governo anunciar seu plano.
O governo está em xeque, forçado a responder às pressões e cobranças do mercado já no começo do ano de eleições. Diante da turbulência cambial e da insegurança financeira, a presidente e sua equipe têm um motivo a mais, e muito forte, para apresentar um programa sério e crível de arrumação das contas públicas. Mas até agora as autoridades se limitaram a prometer medidas para fortalecer a situação fiscal, sem especificá-las, e para continuar reduzindo a dívida líquida. Até a semana passada, a preocupação principal era com o risco de rebaixamento do País pelas agências de classificação de crédito. Uma redução da nota poderia causar danos consideráveis, especialmente numa fase de menor oferta de financiamentos. A oferta menor seria uma consequência normal de uma expansão monetária menor nos Estados Unidos. Mas o quadro piorou desde quinta-feira, quando o peso argentino caiu 15% em um dia e evidenciou uma nova onda de insegurança em relação aos emergentes.
Uma corrida especulativa pode ocasionar estragos notáveis antes de qualquer iniciativa das agências de classificação. O governo sabe disso, ou deveria saber. Os dirigentes do Banco Central da Índia reagiram com rapidez e anunciaram na segunda-feira uma elevação dos juros. Os do Banco Central da Turquia marcaram uma reunião extraordinária, dando sinais de um novo aperto monetário para conter a inflação e manter alguma atratividade para os investidores. Na terça, as bolsas europeias subiram, numa aparente reação positiva às notícias da Índia e da Turquia. No Brasil, o dólar caiu e voltou a subir. No meio da tarde, a cotação era muito parecida com a do dia anterior.
As autoridades brasileiras continuam devendo respostas ao mercado. A nova meta fiscal deverá ser conhecida em fevereiro, quando sair a primeira reprogramação orçamentária. Nenhuma decisão sobre números havia sido tomada até ontem, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Em Londres, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, havia prometido no dia anterior todas as medidas necessárias para conter a inflação e limitar as oscilações do câmbio. Suas declarações reforçaram a expectativa de nova alta do juro básico na próxima reunião do Comitê de Política Monetária, em fevereiro.
A promessa de Tombini é avalizada pelas ações recentes do BC - uma elevação gradual do juro a partir de abril. Mas a presidente da República e o ministro da Fazenda nada têm apresentado, em suas manifestações oficiais, além de promessas desmentidas pelos fatos e acompanhadas, depois de algum tempo, de outras promessas. Por que acreditar, agora, na seriedade de seus propósitos?
A resposta mais favorável talvez esteja fora das palavras da presidente e de seus auxiliares. Os sinais de temor de novos problemas e o empenho na busca de credibilidade são dados aparentemente positivos. Mas são insuficientes para interromper a dinâmica dos mercados.
Essa dinâmica inclui as análises produzidas, no dia a dia, pelas instituições financeiras e pelas consultorias. Uma aposta positiva no curto prazo foi feita pela consultoria Eurasia Group. De imediato, Brasil, Índia e Indonésia são os menos preocupantes dentre os atingidos pelas turbulências dos últimos dias, segundo o diretor para mercados emergentes, Chris Garman. As perspectivas, afirmou, são piores para Argentina, Turquia e África do Sul. No mesmo dia, o Banco Morgan Stanley divulgou uma análise bem diferente, com Brasil e Turquia apresentados como os emergentes mais expostos aos riscos atuais nas áreas de câmbio, juros, crédito soberano e crédito corporativo.
Enquanto isso, no Brasil, o pessoal do Ministério da Fazenda consulta especialistas do mercado em busca de elementos para fixar um objetivo fiscal crível e aceitável. Algo próximo de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) seria uma boa resposta, segundo analistas. Mas há quem aposte num alvo menos ambicioso e menos trabalhoso para o governo. Enquanto se espera a decisão, a insegurança permanece e muita pressão poderá ainda ocorrer até o governo anunciar seu plano.
O discurso do rei - ALEXANDRE SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 29/01
Resumindo Dilma: 'Fazemos tudo certo, mas vocês não reconhecem; admitam que somos fantásticos e invistam'
Visto em certos círculos como capitulação, a presidente discursou em Davos numa tentativa de recuperar a confiança perdida pelo país junto a investidores internacionais. Intenção louvável (ainda que tardia) à parte, o resultado não foi dos melhores. O discurso está permeado dos mesmos vícios que criaram o problema, a saber, autossuficiência no limite da arrogância, assim como uma inacreditável incapacidade de entender as críticas ao desempenho medíocre do país.
Um olhar mais detalhado revela que a fala trouxe obviedades, inverdades e promessas. Nenhuma colabora particularmente para a construção da confiança.
É muito bom saber, por exemplo, que parcela considerável da população brasileira ascendeu social e economicamente na última década ou que as reservas internacionais do Brasil são da ordem de US$ 375 bilhões. O problema é que essas informações só ajudariam a melhorar a imagem do país caso fossem desconhecidas da audiência e reveladas naquele momento feliz em que a presidente ofereceu ao mundo uma visão inédita sobre a realidade brasileira, o que, convenhamos, está longe de ser o caso.
Pelo contrário, a audiência já conhece a história e mesmo assim permanece reticente quanto ao país, não, obviamente, porque desgosta de reservas elevadas e melhora social, mas porque tem visto outros desenvolvimentos nada positi- vos, como inflação alta, crescimento baixo e contas fiscais sob crescente suspeita. Nesse aspecto esperava-se algo de concreto acerca de como lidar com esses temas. O que se viu, contudo, foi a negação da sua existência.
Assim, a presidente reitera que o país busca, "com determinação, o centro da meta inflacionária". Caso fosse verdade, a diretoria do BC já estaria na rua. Não se atinge a meta (não existe "centro da meta"; só a meta) de inflação desde 2009, e, de acordo com as previsões do BC, isso não ocorrerá pelo menos até 2015. Se isso é "determinação", não quero nem imaginar o que teria ocorrido caso tivessem feito "corpo mole".
Na mesma toada afirma que "as despesas correntes do governo federal estão sob controle e houve uma melhora qualitativa (!) das contas públicas nos últimos anos". Uma breve inspeção dos números oficiais do Tesouro, porém, revela que as despesas correntes saltaram de 16,5% do PIB em 2010 para 17,7% do PIB nos 12 meses terminados em novembro do ano passado, para ficar apenas no período mais recente (em 2003, por exemplo, eram 14,5% do PIB). De novo, se isso significa controle, arrepia-me pensar o que poderia ser uma situação de descontrole.
Afirmações como as acima podem funcionar para uma audiência despreparada, mas dificilmente no que se refere a investidores familiarizados com os números e as ações de política econômica no Brasil. O resultado no caso é o oposto: a percepção de que o governo não reconhece seus próprios problemas apenas reforça a desconfiança na gestão do país.
Contra esse pano de fundo sobram as promessas, mas, vamos falar a verdade, estas só funcionam se houver confiança, o que nos traz de volta à estaca zero.
Em nenhum momento houve reconhecimento dos erros (e não foram poucos!) de política, os diagnósticos equivocados, a execução malfeita de projetos. Houvesse autocrítica, certamente seria possível construir uma base para a credibilidade acerca de rumos futuros que incorporassem a correção dos enganos anteriores.
Assim, se tivesse que resumir o discurso, seria algo na linha: "Estamos fazendo tudo certo, mas vocês não reconhecem; tratem de admitir que somos fantásticos e invistam".
O governo prefere acreditar que a questão se resume a dificuldades de comunicação e que um exercício algo despudorado de autolouvação há de corrigi-las, apesar da evidência em contrário. Se quisessem mesmo resolver o assunto, poderiam começar ensinando à presidente o que aprendi com minha avó: "Elogio em boca própria é vitupério".
Resumindo Dilma: 'Fazemos tudo certo, mas vocês não reconhecem; admitam que somos fantásticos e invistam'
Visto em certos círculos como capitulação, a presidente discursou em Davos numa tentativa de recuperar a confiança perdida pelo país junto a investidores internacionais. Intenção louvável (ainda que tardia) à parte, o resultado não foi dos melhores. O discurso está permeado dos mesmos vícios que criaram o problema, a saber, autossuficiência no limite da arrogância, assim como uma inacreditável incapacidade de entender as críticas ao desempenho medíocre do país.
Um olhar mais detalhado revela que a fala trouxe obviedades, inverdades e promessas. Nenhuma colabora particularmente para a construção da confiança.
É muito bom saber, por exemplo, que parcela considerável da população brasileira ascendeu social e economicamente na última década ou que as reservas internacionais do Brasil são da ordem de US$ 375 bilhões. O problema é que essas informações só ajudariam a melhorar a imagem do país caso fossem desconhecidas da audiência e reveladas naquele momento feliz em que a presidente ofereceu ao mundo uma visão inédita sobre a realidade brasileira, o que, convenhamos, está longe de ser o caso.
Pelo contrário, a audiência já conhece a história e mesmo assim permanece reticente quanto ao país, não, obviamente, porque desgosta de reservas elevadas e melhora social, mas porque tem visto outros desenvolvimentos nada positi- vos, como inflação alta, crescimento baixo e contas fiscais sob crescente suspeita. Nesse aspecto esperava-se algo de concreto acerca de como lidar com esses temas. O que se viu, contudo, foi a negação da sua existência.
Assim, a presidente reitera que o país busca, "com determinação, o centro da meta inflacionária". Caso fosse verdade, a diretoria do BC já estaria na rua. Não se atinge a meta (não existe "centro da meta"; só a meta) de inflação desde 2009, e, de acordo com as previsões do BC, isso não ocorrerá pelo menos até 2015. Se isso é "determinação", não quero nem imaginar o que teria ocorrido caso tivessem feito "corpo mole".
Na mesma toada afirma que "as despesas correntes do governo federal estão sob controle e houve uma melhora qualitativa (!) das contas públicas nos últimos anos". Uma breve inspeção dos números oficiais do Tesouro, porém, revela que as despesas correntes saltaram de 16,5% do PIB em 2010 para 17,7% do PIB nos 12 meses terminados em novembro do ano passado, para ficar apenas no período mais recente (em 2003, por exemplo, eram 14,5% do PIB). De novo, se isso significa controle, arrepia-me pensar o que poderia ser uma situação de descontrole.
Afirmações como as acima podem funcionar para uma audiência despreparada, mas dificilmente no que se refere a investidores familiarizados com os números e as ações de política econômica no Brasil. O resultado no caso é o oposto: a percepção de que o governo não reconhece seus próprios problemas apenas reforça a desconfiança na gestão do país.
Contra esse pano de fundo sobram as promessas, mas, vamos falar a verdade, estas só funcionam se houver confiança, o que nos traz de volta à estaca zero.
Em nenhum momento houve reconhecimento dos erros (e não foram poucos!) de política, os diagnósticos equivocados, a execução malfeita de projetos. Houvesse autocrítica, certamente seria possível construir uma base para a credibilidade acerca de rumos futuros que incorporassem a correção dos enganos anteriores.
Assim, se tivesse que resumir o discurso, seria algo na linha: "Estamos fazendo tudo certo, mas vocês não reconhecem; tratem de admitir que somos fantásticos e invistam".
O governo prefere acreditar que a questão se resume a dificuldades de comunicação e que um exercício algo despudorado de autolouvação há de corrigi-las, apesar da evidência em contrário. Se quisessem mesmo resolver o assunto, poderiam começar ensinando à presidente o que aprendi com minha avó: "Elogio em boca própria é vitupério".
Vai sobrar petróleo no mundo - TASSO AZEVEDO
O GLOBO - 29/01
À medida que os custos da energia solar e eólica caem, ficam evidentes as vantagens destas fontes
A produção de petróleo está alcançando o seu pico, mas as reservas existentes ainda são suficientes para várias décadas de oferta. As reservas de carvão mineral são ainda mais extensas e também poderiam abastecer a demanda além deste século. Mas, se a trajetória de queima de combustíveis fósseis for mantida, caminhamos para um cenário de aumento da temperatura global na casa de quatro a seis graus, uma catástrofe.
Felizmente existem vários sinais de que, muito antes de a escassez destas fontes energéticas ser um problema, sua demanda será reduzida contundentemente. As energias de fontes renováveis estão ganhando momento de forma expressiva e esta década será lembrada como aquela em que o mundo iniciou uma radical transformação das suas fontes de energia.
A Agencia Internacional de Energia Renovável publicou este mês o REmap 2030 (Renewable Energy Road Map 2030), com um mapa do caminho para se dobrar a proporção de energia renovável no planeta dos atuais 18% para 36% até 2030. Todo este incremento se vale de tecnologias já existentes em escala comercial e em projeções de aumento de eficiência energética conservadoras.
Essencialmente, as mudanças devem ocorrer nos setores de transportes, indústria, geração de eletricidade e construções/habitações, e envolvem, por um lado, o descolamento da relação direta entre crescimento econômico e demanda de energia e, de outro, a redução dos subsídios aos combustíveis fósseis e aumento do investimento e incentivos a energias renováveis.
À medida que os custos da energia solar e eólica caem, ficam evidentes as inúmeras vantagens logísticas, operacionais, econômicas e sociais destas fontes e ampliam-se os esforços para resolver os seus limitantes, como os sistemas de armazenamento e operação de geração distribuída. No cenário do REmap, o consumo de combustíveis fósseis será reduzido em 10% até 2030 e após o declínio se acentuará.
Até 2050 a energia solar estará tão difundida e distribuída a um custo tão competitivo que para a geração que nascer nessa década será difícil entender como passamos tantos anos dependentes de fontes de energia tão complicadas e trabalhosas como o petróleo e carvão.
A percepção deste cenário é fundamental para refletir sobre os investimentos na produção como estratégia de desenvolvimento atualmente em curso no Brasil. Por motivos ambientais, sociais, tecnológicos e econômicos, a demanda por petróleo será reduzida e quase 1 trilhão de dólares em investimentos nas próximas décadas podem se transformar num tremendo mico.
À medida que os custos da energia solar e eólica caem, ficam evidentes as vantagens destas fontes
A produção de petróleo está alcançando o seu pico, mas as reservas existentes ainda são suficientes para várias décadas de oferta. As reservas de carvão mineral são ainda mais extensas e também poderiam abastecer a demanda além deste século. Mas, se a trajetória de queima de combustíveis fósseis for mantida, caminhamos para um cenário de aumento da temperatura global na casa de quatro a seis graus, uma catástrofe.
Felizmente existem vários sinais de que, muito antes de a escassez destas fontes energéticas ser um problema, sua demanda será reduzida contundentemente. As energias de fontes renováveis estão ganhando momento de forma expressiva e esta década será lembrada como aquela em que o mundo iniciou uma radical transformação das suas fontes de energia.
A Agencia Internacional de Energia Renovável publicou este mês o REmap 2030 (Renewable Energy Road Map 2030), com um mapa do caminho para se dobrar a proporção de energia renovável no planeta dos atuais 18% para 36% até 2030. Todo este incremento se vale de tecnologias já existentes em escala comercial e em projeções de aumento de eficiência energética conservadoras.
Essencialmente, as mudanças devem ocorrer nos setores de transportes, indústria, geração de eletricidade e construções/habitações, e envolvem, por um lado, o descolamento da relação direta entre crescimento econômico e demanda de energia e, de outro, a redução dos subsídios aos combustíveis fósseis e aumento do investimento e incentivos a energias renováveis.
À medida que os custos da energia solar e eólica caem, ficam evidentes as inúmeras vantagens logísticas, operacionais, econômicas e sociais destas fontes e ampliam-se os esforços para resolver os seus limitantes, como os sistemas de armazenamento e operação de geração distribuída. No cenário do REmap, o consumo de combustíveis fósseis será reduzido em 10% até 2030 e após o declínio se acentuará.
Até 2050 a energia solar estará tão difundida e distribuída a um custo tão competitivo que para a geração que nascer nessa década será difícil entender como passamos tantos anos dependentes de fontes de energia tão complicadas e trabalhosas como o petróleo e carvão.
A percepção deste cenário é fundamental para refletir sobre os investimentos na produção como estratégia de desenvolvimento atualmente em curso no Brasil. Por motivos ambientais, sociais, tecnológicos e econômicos, a demanda por petróleo será reduzida e quase 1 trilhão de dólares em investimentos nas próximas décadas podem se transformar num tremendo mico.
Anos de tormenta - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 29/01
Ninguém pode considerar-se feliz enquanto estiver vivo, ensinou o legislador ateniense Sólon ao rei Creso, da Lídia, no século 6.° antes de Cristo. É um princípio que vale para avaliar a qualidade da administração dos mais importantes comandantes de políticas públicas.
Ben Bernanke deixa dia 31 a presidência do mais poderoso banco central do mundo, o Federal Reserve (Fed), depois de ter comandado a política monetária dos Estados Unidos durante a maior crise financeira desde a Grande Depressão. Ele continua colecionando calorosas críticas e elogios, a começar pelas avaliações negativas feitas pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que aparentemente não gostava dele.
Bernanke pilotou o navio no meio de tempestades avassaladoras e de pânico nos mercados. Emitiu cerca de US$ 4 trilhões, na fronteira da irresponsabilidade, para inchar o balanço do Fed com títulos públicos e privados, com o objetivo de criar alguma demanda para o que passou a ser chamado de lixo tóxico. E manteve no nível do chão, por 62 meses, os juros básicos dos Estados Unidos (Fed funds).
Seus admiradores insistem em que o fato de ter evitado o naufrágio já é feito heroico para consagrá-lo como grande comandante. Seus detratores o acusam de não ter previsto o furacão, de ter contribuído para ele com sua política monetária frouxa demais e, depois, de ter sido arrastado por ele. Argumentam, ainda, que a atividade econômica dos Estados Unidos continua insatisfatória, que há hoje 1,2 milhão de desempregados além dos que existiam no início da crise e que há uma bomba atômica pairando sobre nossas cabeças à espera de quem a desarme.
Bernanke chega ao final do mandato sem completar o serviço. Uma coisa é ter concebido e conduzido a maior armação não convencional de política monetária, as tais megaemissões de dólares para recompra de títulos, também conhecida como afrouxamento quantitativo (quantitative easing). Outra tarefa tão importante e perigosa consiste em reverter essa política, agora a cargo da sucessora, Janet Yellen, a primeira mulher à frente do Fed.
Trazer de volta essa dinheirama antes que provoque inflação devastadora e sem criar pânico é o complemento da missão a cumprir, e sem sua avaliação será impossível um juízo equilibrado sobre o conjunto da obra.
No entanto, o mercado financeiro e a atividade bancária dos Estados Unidos já não são mais o vale-tudo que prevaleceu antes de 2007 e que atirou o mundo no rodamoinho. A tarefa saneadora produziu efeitos, há mais regulação no mercado financeiro e, ainda onde não há dela o suficiente, há pelo menos a consciência de que é preciso mais.
Mas a economia global é outra, a estrutura do fator trabalho está mudando em toda a parte com o uso intensivo de tecnologia da informação e já não se sabe até que ponto o nível de emprego deve comandar a política monetária, especialmente a do Fed, como é hoje.
Os Estados Unidos começam a viver os tempos de uma revolução energética, que, em princípio, nada tem a ver com a atuação do Fed. Essa, sim, poderá ser a redenção da economia americana. Se isso se confirmar, também a avaliação da administração Bernanke poderá ganhar outra direção.
Ninguém pode considerar-se feliz enquanto estiver vivo, ensinou o legislador ateniense Sólon ao rei Creso, da Lídia, no século 6.° antes de Cristo. É um princípio que vale para avaliar a qualidade da administração dos mais importantes comandantes de políticas públicas.
Ben Bernanke deixa dia 31 a presidência do mais poderoso banco central do mundo, o Federal Reserve (Fed), depois de ter comandado a política monetária dos Estados Unidos durante a maior crise financeira desde a Grande Depressão. Ele continua colecionando calorosas críticas e elogios, a começar pelas avaliações negativas feitas pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que aparentemente não gostava dele.
Bernanke pilotou o navio no meio de tempestades avassaladoras e de pânico nos mercados. Emitiu cerca de US$ 4 trilhões, na fronteira da irresponsabilidade, para inchar o balanço do Fed com títulos públicos e privados, com o objetivo de criar alguma demanda para o que passou a ser chamado de lixo tóxico. E manteve no nível do chão, por 62 meses, os juros básicos dos Estados Unidos (Fed funds).
Seus admiradores insistem em que o fato de ter evitado o naufrágio já é feito heroico para consagrá-lo como grande comandante. Seus detratores o acusam de não ter previsto o furacão, de ter contribuído para ele com sua política monetária frouxa demais e, depois, de ter sido arrastado por ele. Argumentam, ainda, que a atividade econômica dos Estados Unidos continua insatisfatória, que há hoje 1,2 milhão de desempregados além dos que existiam no início da crise e que há uma bomba atômica pairando sobre nossas cabeças à espera de quem a desarme.
Bernanke chega ao final do mandato sem completar o serviço. Uma coisa é ter concebido e conduzido a maior armação não convencional de política monetária, as tais megaemissões de dólares para recompra de títulos, também conhecida como afrouxamento quantitativo (quantitative easing). Outra tarefa tão importante e perigosa consiste em reverter essa política, agora a cargo da sucessora, Janet Yellen, a primeira mulher à frente do Fed.
Trazer de volta essa dinheirama antes que provoque inflação devastadora e sem criar pânico é o complemento da missão a cumprir, e sem sua avaliação será impossível um juízo equilibrado sobre o conjunto da obra.
No entanto, o mercado financeiro e a atividade bancária dos Estados Unidos já não são mais o vale-tudo que prevaleceu antes de 2007 e que atirou o mundo no rodamoinho. A tarefa saneadora produziu efeitos, há mais regulação no mercado financeiro e, ainda onde não há dela o suficiente, há pelo menos a consciência de que é preciso mais.
Mas a economia global é outra, a estrutura do fator trabalho está mudando em toda a parte com o uso intensivo de tecnologia da informação e já não se sabe até que ponto o nível de emprego deve comandar a política monetária, especialmente a do Fed, como é hoje.
Os Estados Unidos começam a viver os tempos de uma revolução energética, que, em princípio, nada tem a ver com a atuação do Fed. Essa, sim, poderá ser a redenção da economia americana. Se isso se confirmar, também a avaliação da administração Bernanke poderá ganhar outra direção.
O Brasil pode ajudar a Argentina? - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 29/01
Para ajudar a Argentina, e não Kirchner, o Brasil teria de exigir medidas que não adota nem aqui
O BRASIL TEM meios para ajudar a Argentina a atravessar a crise. "Atravessar a crise", porém, significa sair dela. Para tanto, seria necessário que o Brasil assumisse mais ou menos um papel semelhante ao do Fundo Monetário Internacional, de preferência com menos tolices perversas, mas ainda assim um FMI.
Assumir o papel de FMI significa, de um modo ou outro, exigir contrapartidas ao auxílio. A fim de que o auxílio não seja mero enxugamento de gelo, a Argentina teria de abandonar a política econômica que causa a crise.
Parece politicamente inviável, não só devido à resistência argentina a condições impostas pelo Brasil. Os problemas estão deste lado da fronteira também. Um deles é que o Brasil teria de solicitar à Argentina que tomasse providências também evitadas pelo governo brasileiro.
O Brasil está muito, muitíssimo longe do descalabro argentino, mas, em essência, na "estrutura", os problemas são semelhantes: excessos de consumo, em especial do governo, problemas que se tornaram ainda mais agudos devido às mudanças na economia mundial. Isto é, crescimento mais vagaroso em geral, agora o da China em particular; o começo do fim da superabundância de capital barato. Enfim, há menos dólares para financiar nossos excessos; temos inflação.
O governo da Argentina tem deficit porque elevou demais o subsídio que dá ao preço da energia e do transporte público, principalmente, e devido a reajustes de salários de servidores. Não tem como financiar seu deficit no mercado internacional, onde está enrolada em processos devido aos calotes de 2001-02.
Não financia seu deficit no mercado doméstico porque teria de pagar juros altos, o que levaria o país à recessão (que, no entanto, será mais ou menos inevitável). No fim das contas, o banco central paga os excessos de gastos do governo, o que é gasolina no fogo da inflação e um método primitivo de fazer política econômica.
O excesso de consumo e a desorganização da atividade produtiva causada pelas intervenções desastrosas do governo causam deficit externos (o país compra mais do que vende no exterior), os quais não pode financiar a não ser por um incerto e cadente investimento direto, daí a escassez de dólares, grosso modo.
O Brasil pode ajudar a Argentina a mudar de dieta de modo mais organizado. A evitar uma desvalorização descontrolada do peso, embora a desvalorização seja requisito para o país sair da crise (seus produtos são caros, dada a inflação muito alta). Mas, para a desvalorização funcionar, o governo da Argentina precisa conter a inflação, controlar gastos, o que no caso implica reduzir subsídios.
Tem de ser aos poucos, para não esfolar o povo, o que de resto provocaria outro caos político. Enfim, a Argentina precisa elevar seus juros, ora negativos (menores que a inflação. Não faz sentido poupar, pois, a não ser em dólares escassos).
Mesmo que comedido, tal programa tende a arruinar a popularidade de Cristina Kirchner; significaria a rendição do modelo político e econômico da última dúzia de anos, que se esgotou após a crise de 2008-09.
Vê-se que o programa que o FMI-Brasil teria de solicitar à Argentina não difere, em essência, do mesmo remédio de que precisamos aqui, embora em escala muitíssimo menor.
Para ajudar a Argentina, e não Kirchner, o Brasil teria de exigir medidas que não adota nem aqui
O BRASIL TEM meios para ajudar a Argentina a atravessar a crise. "Atravessar a crise", porém, significa sair dela. Para tanto, seria necessário que o Brasil assumisse mais ou menos um papel semelhante ao do Fundo Monetário Internacional, de preferência com menos tolices perversas, mas ainda assim um FMI.
Assumir o papel de FMI significa, de um modo ou outro, exigir contrapartidas ao auxílio. A fim de que o auxílio não seja mero enxugamento de gelo, a Argentina teria de abandonar a política econômica que causa a crise.
Parece politicamente inviável, não só devido à resistência argentina a condições impostas pelo Brasil. Os problemas estão deste lado da fronteira também. Um deles é que o Brasil teria de solicitar à Argentina que tomasse providências também evitadas pelo governo brasileiro.
O Brasil está muito, muitíssimo longe do descalabro argentino, mas, em essência, na "estrutura", os problemas são semelhantes: excessos de consumo, em especial do governo, problemas que se tornaram ainda mais agudos devido às mudanças na economia mundial. Isto é, crescimento mais vagaroso em geral, agora o da China em particular; o começo do fim da superabundância de capital barato. Enfim, há menos dólares para financiar nossos excessos; temos inflação.
O governo da Argentina tem deficit porque elevou demais o subsídio que dá ao preço da energia e do transporte público, principalmente, e devido a reajustes de salários de servidores. Não tem como financiar seu deficit no mercado internacional, onde está enrolada em processos devido aos calotes de 2001-02.
Não financia seu deficit no mercado doméstico porque teria de pagar juros altos, o que levaria o país à recessão (que, no entanto, será mais ou menos inevitável). No fim das contas, o banco central paga os excessos de gastos do governo, o que é gasolina no fogo da inflação e um método primitivo de fazer política econômica.
O excesso de consumo e a desorganização da atividade produtiva causada pelas intervenções desastrosas do governo causam deficit externos (o país compra mais do que vende no exterior), os quais não pode financiar a não ser por um incerto e cadente investimento direto, daí a escassez de dólares, grosso modo.
O Brasil pode ajudar a Argentina a mudar de dieta de modo mais organizado. A evitar uma desvalorização descontrolada do peso, embora a desvalorização seja requisito para o país sair da crise (seus produtos são caros, dada a inflação muito alta). Mas, para a desvalorização funcionar, o governo da Argentina precisa conter a inflação, controlar gastos, o que no caso implica reduzir subsídios.
Tem de ser aos poucos, para não esfolar o povo, o que de resto provocaria outro caos político. Enfim, a Argentina precisa elevar seus juros, ora negativos (menores que a inflação. Não faz sentido poupar, pois, a não ser em dólares escassos).
Mesmo que comedido, tal programa tende a arruinar a popularidade de Cristina Kirchner; significaria a rendição do modelo político e econômico da última dúzia de anos, que se esgotou após a crise de 2008-09.
Vê-se que o programa que o FMI-Brasil teria de solicitar à Argentina não difere, em essência, do mesmo remédio de que precisamos aqui, embora em escala muitíssimo menor.
Preço e custo - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 29/01
Há um problema extra no setor de energia. As distribuidoras não conseguiram contratar toda a eletricidade que elas têm que entregar aos seus consumidores. Não é falta de energia ou possibilidade de apagão. O risco é de preço alto. Ao todo, elas estão com uma falta de 4.000 MWH. Tem que comprar no mercado à vista e o preço disparou. Custa hoje quase o dobro do que na média do ano passado.
Houve alguns dias de chuvas fortes nas grandes cidades do Sudeste. Quem viu a tempestade achou que, pelo menos, um problema estava afastado. Não está. Tanto a subcontratação quanto o uso das térmicas aumentarão o custo. Para não bater na conta do consumidor, terá que aumentar a conta do contribuinte.
A confusão foi a seguinte: pelo mecanismo de leilão, feito pela EPE, as distribuidoras contratam a energia que têm que fornecer aos seus consumidores. Quando não têm tudo, precisam ir ao mercado spot e comprar. O problema é que, na segunda-feira, o preço estava em R$ 484 o megawatt hora. No ano passado, o preço médio foi de R$ 263 o MWH.
Energia existe no sistema. O mecanismo de leilões falhou porque o preço máximo estabelecido pela EPE foi baixo demais. Alguns leilões “deram vazio", como se diz no setor: não apareceu oferta. Se toda essa energia tiver que ser comprada no mercado livre ao preço de segunda-feira, significa R$ 1,4 bilhão por mês.
Especialistas do mercado de energia dizem que, na hora de fazer os leilões no fim do ano passado, a EPE fixou um preço máximo baixo demais, de R$161, e aí ninguém ofertou energia a esse preço. Mais tarde elevou para R$ 193 o Megawatt hora. E apareceu oferta de 2.500 MWH. Mesmo assim, ficou faltando.
— Quando as distribuidoras estão subcontratadas como agora, não quer dizer que faltará energia, mas elas terão que comprar no mercado spot e isso eleva o custo que, pela lei, teria que ser repassado para o consumidor. Teremos dificuldade de carregar esse custo até ele ser remunerado — disse um empresário do setor.
Por isso o governo teria que agir para evitar esse estrangulamento. Por essa conta gráfica, se toda energia tiver que ser comprada no mercado à vista, vai aumentar o preço da eletricidade. Ou terá que haver mais transferências do Tesouro para cobrir os desequilíbrios financeiros do sistema.
Esse problema se soma a outro que também encarecerá a energia: o nível dos reservatórios. No Sudeste e Centro-Oeste, os reservatórios estão com 41,5% e eles são os mais importantes para abastecimento de energia do país. No Nordeste, o nível está em 42%; no Sul, 63% e no Norte, 57%. Já houve situações piores, como a do começo do ano passado, e o mercado não prevê risco de racionamento. Mas isso significa mais uso de térmicas, que elevará o custo. No ano passado, essa diferença entre custo e preço impactou o Tesouro em R$ 10 bilhões; para 2014, estão previstos no Orçamento R$ 9 bilhões.
— E pensar que nós estamos em pleno verão, época em que, normalmente, estaria vertendo água nos reservatórios — disse um empresário.
O problema foi a tentativa de realizar leilões com o preço máximo abaixo do que o mercado estava disposto a vender a oferta. Não deu certo e a situação acabou ficando assim: o país entra na estação chuvosa com os reservatórios com um nível baixo e com desequilíbrio de energia contratada.
O divórcio entre custo e preço está criando um ambiente mais artificial, com um subsídio cada vez maior. As empresas distribuidoras reclamam que não têm caixa para carregar o prejuízo até serem ressarcidas; o governo decidiu pagar o subsídio que for para manter a ficção do marketing político de que reduziu o preço da energia. O consumidor é poupado; e o contribuinte, onerado.
Há um problema extra no setor de energia. As distribuidoras não conseguiram contratar toda a eletricidade que elas têm que entregar aos seus consumidores. Não é falta de energia ou possibilidade de apagão. O risco é de preço alto. Ao todo, elas estão com uma falta de 4.000 MWH. Tem que comprar no mercado à vista e o preço disparou. Custa hoje quase o dobro do que na média do ano passado.
Houve alguns dias de chuvas fortes nas grandes cidades do Sudeste. Quem viu a tempestade achou que, pelo menos, um problema estava afastado. Não está. Tanto a subcontratação quanto o uso das térmicas aumentarão o custo. Para não bater na conta do consumidor, terá que aumentar a conta do contribuinte.
A confusão foi a seguinte: pelo mecanismo de leilão, feito pela EPE, as distribuidoras contratam a energia que têm que fornecer aos seus consumidores. Quando não têm tudo, precisam ir ao mercado spot e comprar. O problema é que, na segunda-feira, o preço estava em R$ 484 o megawatt hora. No ano passado, o preço médio foi de R$ 263 o MWH.
Energia existe no sistema. O mecanismo de leilões falhou porque o preço máximo estabelecido pela EPE foi baixo demais. Alguns leilões “deram vazio", como se diz no setor: não apareceu oferta. Se toda essa energia tiver que ser comprada no mercado livre ao preço de segunda-feira, significa R$ 1,4 bilhão por mês.
Especialistas do mercado de energia dizem que, na hora de fazer os leilões no fim do ano passado, a EPE fixou um preço máximo baixo demais, de R$161, e aí ninguém ofertou energia a esse preço. Mais tarde elevou para R$ 193 o Megawatt hora. E apareceu oferta de 2.500 MWH. Mesmo assim, ficou faltando.
— Quando as distribuidoras estão subcontratadas como agora, não quer dizer que faltará energia, mas elas terão que comprar no mercado spot e isso eleva o custo que, pela lei, teria que ser repassado para o consumidor. Teremos dificuldade de carregar esse custo até ele ser remunerado — disse um empresário do setor.
Por isso o governo teria que agir para evitar esse estrangulamento. Por essa conta gráfica, se toda energia tiver que ser comprada no mercado à vista, vai aumentar o preço da eletricidade. Ou terá que haver mais transferências do Tesouro para cobrir os desequilíbrios financeiros do sistema.
Esse problema se soma a outro que também encarecerá a energia: o nível dos reservatórios. No Sudeste e Centro-Oeste, os reservatórios estão com 41,5% e eles são os mais importantes para abastecimento de energia do país. No Nordeste, o nível está em 42%; no Sul, 63% e no Norte, 57%. Já houve situações piores, como a do começo do ano passado, e o mercado não prevê risco de racionamento. Mas isso significa mais uso de térmicas, que elevará o custo. No ano passado, essa diferença entre custo e preço impactou o Tesouro em R$ 10 bilhões; para 2014, estão previstos no Orçamento R$ 9 bilhões.
— E pensar que nós estamos em pleno verão, época em que, normalmente, estaria vertendo água nos reservatórios — disse um empresário.
O problema foi a tentativa de realizar leilões com o preço máximo abaixo do que o mercado estava disposto a vender a oferta. Não deu certo e a situação acabou ficando assim: o país entra na estação chuvosa com os reservatórios com um nível baixo e com desequilíbrio de energia contratada.
O divórcio entre custo e preço está criando um ambiente mais artificial, com um subsídio cada vez maior. As empresas distribuidoras reclamam que não têm caixa para carregar o prejuízo até serem ressarcidas; o governo decidiu pagar o subsídio que for para manter a ficção do marketing político de que reduziu o preço da energia. O consumidor é poupado; e o contribuinte, onerado.
Os espaços ‘Fan Protest’ - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 29/01
CUT quer o lugar de Berzoini
O presidente da CUT, o bancário Vagner Freitas de Moraes, vai concorrer à Câmara disputando votos na base do deputado Ricardo Berzoini (PT-SP). Por isso, Berzoini não deve concorrer, habilitando-se para integrar o Ministério do governo Dilma. Mas ele não está só nesse movimento. É sustentado por um grupo integrado pelo líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e pelo ex-presidente da Casa Marco Maia (PT-RS). Eles estão de olho em futura disputa pela direção da Câmara. E, para isso, tentam derrubar a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) ou o ministro Paulo Bernardo (Comunicações). Este último é o alvo preferido de Berzoini.
“Rodei 1.760 km, em quatro dias, no interior do Ceará, e constatei que o PAC Estiagem não saiu do papel e o programa Água Para Todos não supre com eficiência as necessidades”
Danilo Forte - Deputado (PMDB-CE), relator da LDO de 2014
Reação da Câmara
Diante da proposta da senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, de colocar um senador na Agricultura, o líder na Câmara, Eduardo Cunha, pergunta: “Os senadores do PMDB querem que a bancada de deputados vá para a oposição?”.
A aposta
Os estrategistas do candidato Aécio Neves (PSDB) apostam em duas linhas nas eleições. A inflação, que está corroendo o poder de compra da população. E os protestos na Copa. As pesquisas feitas para eles mostram que, depois da classe política de uma forma geral, o governo federal é o principal alvo das manifestações.
Podia ter sido a Flórida
O piloto da presidente Dilma, o brigadeiro Joseli Camelo, sugeriu duas alternativas de parada técnica no voo de Davos a Cuba. A presidente escolheu Portugal. Mas poderia ter sido a Flórida, terra adotiva dos opositores do governo cubano.
O primeiro passo
O governo publica hoje portaria, dos ministérios de Relações Institucionais e Planejamento, com as regras e o fluxo de liberação das emendas parlamentares. Ontem, o funcionamento do orçamento impositivo foi explicado para assessores de partidos do governo e da oposição.
Campanha dura
A candidata do PT ao governo do Paraná, ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil), foi informada de que seus adversários encomendaram uma biografia sobre sua trajetória política. O livreto deve ser lançado ainda neste semestre.
A grande pergunta
Petistas e governistas se perguntam. Agora que Aloizio Mercadante será o poderoso chefe da Casa Civil, será que ele vai deixar de interferir na gestão do ministro Guido Mantega (Fazenda)? Esta é a expectativa da presidente Dilma.
A ASSESSORIA da presidência do STF registra que o ex-relator do mensalão mineiro, Joaquim Barbosa, facilitou a vida do relator, Roberto Barroso.
Dois para o tango - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 29/01
Com anuência de Dilma Rousseff e Lula, João Santana e Franklin Martins definiram no início do ano o papel de cada um na coordenação da comunicação da campanha da presidente à reeleição. O marqueteiro será responsável pelos programas de TV e rádio, enquanto o ex-ministro de Lula cuidará de imprensa e redes sociais. Segundo um ministro, o desenho isola a Pepper Comunicação, empresa que presta serviços para o PT e deve cuidar de campanhas estaduais do partido.
Vacinados Petistas trabalharam para afastar a Pepper do comando da campanha após texto divulgado no último dia 7, produzido por um jornalista contratado pela agência, chamando Eduardo Campos de "playboy mimado'', que foi considerado grosseiro pela cúpula petista.
Piloto O primeiro trabalho da dupla será definir o conteúdo dos programas regionais do PT, que vão ao ar em fevereiro com Dilma e Lula.
Em campo Está prevista para os próximos dias, em Brasília, a primeira reunião da coordenação completa de campanha de Dilma para começar a montar a agenda de viagens de Lula e organizar a logística da reeleição.
Para fora No almoço ontem com FHC e Aécio Neves, em São Paulo, o ex-embaixador Rubens Barbosa demonstrou preocupação com a situação da Argentina e a deterioração da imagem da América do Sul junto aos demais países e aos investidores.
Vai que é sua O pré-candidato tucano e o ex-presidente convenceram Tasso Jereissati a concorrer ao Senado pelo Ceará. Com isso, Aécio passa a ter um palanque no Estado, onde o PSDB coleciona derrotas nos últimos anos.
Aí pode Após vetar alianças estaduais com o PSB, o PT negocia participar das chapas de Renato Casagrande (ES) e Camilo Capiberibe (AP). Os petistas receberam sinais de que os dois governadores estão dispostos a "ajudar" a campanha de Dilma.
Vista grossa Aliados de Campos também admitem essa possibilidade. Segundo eles, a prioridade do PSB nesses Estados, de eleitorado pequeno, é a reeleição dos governadores, e não o desempenho do pernambucano.
Suprema... Ricardo Lewandowski autorizou ontem a autuação de inquérito contra José Aníbal (PSDB) no STF por injúria. O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) entrou com queixa-crime contra Aníbal por uso de "expressões injuriosas" contra ele no curso das investigações do cartel em São Paulo.
... briga Interino na presidência do STF, Lewandowski mandou notificar o tucano para que ele responda a queixa-crime em até 15 dias.
O socialista O advogado Marcos Malan se filiou ao PSB no Rio para se candidatar a deputado federal. Ele é irmão de Pedro Malan, ministro da Fazenda de FHC.
Local Marina Silva vai ao Acre esta semana para comandar uma reunião da Rede e do PSB em seu Estado natal. A ex-senadora defende o apoio dos grupos à reeleição de Tião Viana (PT).
Ritual Depois de apresentar as diretrizes do PSB e da Rede, no próximo dia 4, Eduardo Campos vai à sede do PPS, em Brasília, para entregar o documento a Roberto Freire. Simbolicamente, o presidente do PPS passará então a integrar a campanha do presidenciável.
Turma Lula confirmou a sindicalistas que irá ao ato que as centrais de trabalhadores realizarão no sábado, em São Bernardo do Campo, para homenagear vítimas da ditadura. A cerimônia marca os 50 anos do golpe de 1964.
Visita à Folha Maria Alice Setubal, presidente do Conselho de Administração do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), visitou ontem a Folha. Estava acompanhada de Nilson de Oliveira e Valéria Cabrera, assessores de imprensa.
tiroteio
"Dilma tem no Brasil um PAC cheio de obras atrasadas. Deve ser por isso que lançou outro PAC: o Programa de Aceleração de Cuba."
DO DEPUTADO ANTÔNIO IMBASSAHY (PSDB-BA), sobre o investimento de R$ 701 milhões anunciado por Dilma para o porto de Mariel, em Havana.
contraponto
Salvo pelo choro
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, anunciou ontem o nascimento de seu quinto filho, Miguel. Não é a primeira vez que ele concilia uma campanha e a paternidade.
Em 2006, o então deputado convocou entrevista para anunciar que disputaria o governo. Seu filho José balbuciava e chorava no colo da mãe, Renata. Campos aproveitou a deixa para fazer uma pausa:
--José está pedindo um aparte. Fale, meu filho!
Com anuência de Dilma Rousseff e Lula, João Santana e Franklin Martins definiram no início do ano o papel de cada um na coordenação da comunicação da campanha da presidente à reeleição. O marqueteiro será responsável pelos programas de TV e rádio, enquanto o ex-ministro de Lula cuidará de imprensa e redes sociais. Segundo um ministro, o desenho isola a Pepper Comunicação, empresa que presta serviços para o PT e deve cuidar de campanhas estaduais do partido.
Vacinados Petistas trabalharam para afastar a Pepper do comando da campanha após texto divulgado no último dia 7, produzido por um jornalista contratado pela agência, chamando Eduardo Campos de "playboy mimado'', que foi considerado grosseiro pela cúpula petista.
Piloto O primeiro trabalho da dupla será definir o conteúdo dos programas regionais do PT, que vão ao ar em fevereiro com Dilma e Lula.
Em campo Está prevista para os próximos dias, em Brasília, a primeira reunião da coordenação completa de campanha de Dilma para começar a montar a agenda de viagens de Lula e organizar a logística da reeleição.
Para fora No almoço ontem com FHC e Aécio Neves, em São Paulo, o ex-embaixador Rubens Barbosa demonstrou preocupação com a situação da Argentina e a deterioração da imagem da América do Sul junto aos demais países e aos investidores.
Vai que é sua O pré-candidato tucano e o ex-presidente convenceram Tasso Jereissati a concorrer ao Senado pelo Ceará. Com isso, Aécio passa a ter um palanque no Estado, onde o PSDB coleciona derrotas nos últimos anos.
Aí pode Após vetar alianças estaduais com o PSB, o PT negocia participar das chapas de Renato Casagrande (ES) e Camilo Capiberibe (AP). Os petistas receberam sinais de que os dois governadores estão dispostos a "ajudar" a campanha de Dilma.
Vista grossa Aliados de Campos também admitem essa possibilidade. Segundo eles, a prioridade do PSB nesses Estados, de eleitorado pequeno, é a reeleição dos governadores, e não o desempenho do pernambucano.
Suprema... Ricardo Lewandowski autorizou ontem a autuação de inquérito contra José Aníbal (PSDB) no STF por injúria. O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) entrou com queixa-crime contra Aníbal por uso de "expressões injuriosas" contra ele no curso das investigações do cartel em São Paulo.
... briga Interino na presidência do STF, Lewandowski mandou notificar o tucano para que ele responda a queixa-crime em até 15 dias.
O socialista O advogado Marcos Malan se filiou ao PSB no Rio para se candidatar a deputado federal. Ele é irmão de Pedro Malan, ministro da Fazenda de FHC.
Local Marina Silva vai ao Acre esta semana para comandar uma reunião da Rede e do PSB em seu Estado natal. A ex-senadora defende o apoio dos grupos à reeleição de Tião Viana (PT).
Ritual Depois de apresentar as diretrizes do PSB e da Rede, no próximo dia 4, Eduardo Campos vai à sede do PPS, em Brasília, para entregar o documento a Roberto Freire. Simbolicamente, o presidente do PPS passará então a integrar a campanha do presidenciável.
Turma Lula confirmou a sindicalistas que irá ao ato que as centrais de trabalhadores realizarão no sábado, em São Bernardo do Campo, para homenagear vítimas da ditadura. A cerimônia marca os 50 anos do golpe de 1964.
Visita à Folha Maria Alice Setubal, presidente do Conselho de Administração do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), visitou ontem a Folha. Estava acompanhada de Nilson de Oliveira e Valéria Cabrera, assessores de imprensa.
tiroteio
"Dilma tem no Brasil um PAC cheio de obras atrasadas. Deve ser por isso que lançou outro PAC: o Programa de Aceleração de Cuba."
DO DEPUTADO ANTÔNIO IMBASSAHY (PSDB-BA), sobre o investimento de R$ 701 milhões anunciado por Dilma para o porto de Mariel, em Havana.
contraponto
Salvo pelo choro
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, anunciou ontem o nascimento de seu quinto filho, Miguel. Não é a primeira vez que ele concilia uma campanha e a paternidade.
Em 2006, o então deputado convocou entrevista para anunciar que disputaria o governo. Seu filho José balbuciava e chorava no colo da mãe, Renata. Campos aproveitou a deixa para fazer uma pausa:
--José está pedindo um aparte. Fale, meu filho!