FOLHA DE SP - 25/11
Em jantares inteligentes, a sobremesa é sempre leve, porque essa gente é muito crítica
Um dos traços essenciais de nossa psicologia é que queremos ser aceitos. Muitos filósofos, entre eles Adam Smith (1723-1790), diziam que nossa imaginação é constantemente presa à inquietação de como somos vistos pelos outros, fato este que é parte saudável da vida moral social, mas que também facilmente degenera numa angústia de dependência afetiva destruidora da autonomia.
Uma das formas mais seguras de se sentir aceito pelo grupo é desenvolver opiniões de rebanho. No fundo, temos horror a sermos recusados pelo bando, mas, hoje em dia, esse desejo de agradar é avassalador.
As redes sociais e sua mesmice brega, espaço de repetição do irrelevante, são prova de nossa condição de rebanho como pilar da (in)segurança psicológica.
As redes sociais criaram um novo perfil, o do crítico de bolso em versão pós-moderninha. O sonho dessa moçada, que se afoga na irrelevância e no desespero do anonimato cotidiano (que assola todos nós), é ter opiniões sobre as coisas, mas acaba mesmo falando da pizza que comeu ontem ou xingando os inimigos de plantão. O sonho de muitas dessas pessoas é frequentar jantares inteligentes nos quais gente bacana emite opiniões bacanas.
A forma mais fácil de frequentar jantares inteligentes é atacar a igreja, os EUA e a polícia. Mais sofisticado, mas que também garante acesso aos jantares inteligentes das zonas oeste e sul de São Paulo, é dizer que "o modelo social está ultrapassado". Esta frase leva algumas pessoas ao orgasmo (risadas?).
"O modelo social está ultrapassado" é a típica frase de quem quer se passar por crítico (mas, na realidade, é crítico de bolso), porque é a sociedade de mercado (ou como dizia Adam Smith, "commercial society"), a mesma que os comunistas chamam de "capitalismo", que nos retirou da miséria que é o estado natural da vida (e à qual voltamos rapidinho se o Brasil virar a Venezuela de Chávez e Maduro).
Toda riqueza que sustenta esse povo de jantares inteligentes, a começar pelo "bom vinho em conta", é fruto do mesmo modelo que consideram ultrapassado.
Aqui e ali, faça uma caricatura de quem você não consegue enfrentar porque lhe falta repertório conceitual. Diga que são racistas, "sequicistas" e homófobos. Conte, fingindo segredo, que seu filho é do círculo íntimo dos "maravilhosos" meninos do MPL e que sua filha é (incrível!!) black bloc, mas nunca bateu em ninguém.
Assim você chegará à sobremesa (leve, pois em jantares inteligentes ninguém quer engordar, porque sabe que os parceiros de jantares inteligentes são pessoas muito críticas) com segurança, sem dizer nada que ponha em risco sua cidadania de gente bacana.
Mas o que marca essa gente bacana é que na verdade nunca fala, nem tem contato real, com as pessoas fora das escolas de R$ 3.000 que paga para os seus filhos críticos desde os cinco anos de idade frequentarem, ou do seu círculo profissional chique e/ou da praia chique onde tem sua casa de praia típica de praias chiques.
O problema, quando você é um cidadão de jantares inteligentes, é que você acaba mesmo alienado e acreditando nas suas próprias críticas de bolso. Mas vamos ao que interessa. Vamos falar de um dos tópicos que autorizam você a se achar bacana e a frequentar jantares inteligentes: a polícia.
Outro dia, por acaso, conversei por cerca de três horas com um policial militar aposentado do Estado de São Paulo. Muito instrutivo, uma vez que sou egresso do mundo de gente bacana, que, portanto, nada sabe acerca do mundo real.
Ele definia sua classe como aquela que vive com a "mão no lixo" que essa gente bacana nunca vê de fato --a não ser quando resolve fazer ensaios fotográficos sobre "injustiça social". Reclama de como eles são invisíveis e de como a sociedade, na sua maioria, os considera parte do lixo. Um sofrimento profundo, devido a essa invisibilidade, marcava seu rosto de solitário. A polícia é um dos setores mais maltratados da sociedade, apesar de essencial.
Essa gente bacana sai correndo do jantar inteligente para o carro, com medo, sonhando com um baseado e uma bike em Amsterdã nas férias.
segunda-feira, novembro 25, 2013
Covarde e ousado - LÚCIA GUIMARÃES
O Estado de S.Paulo - 25/11
A descrição é do próprio Jeff Bezos. Ao contratar um veterano do exército para trabalhar na Amazon, ele disse: "Fisicamente sou um covarde ('chicken'), mentalmente sou ousado."
Imagine se Jeff Bezos tivesse levado adiante sua ideia de batizar a companhia que fundou há 20 anos de Relentless (implacável). "Vamos agora ouvir o CEO da Implacável.com", convocaria o líder da comissão do Senado em Washington, que um dia há de plantar o fundador da Amazon numa cadeira e ouvir sua risada nervosa numa investigação anti-truste.
Mas não é preciso ter título explícito para confirmar a intenção do nome que não emplacou, como fica claro no livro fascinante de Brad Stone, The Everything Store (A Loja de Tudo). A narrativa sobre a emergência do gigante do comércio on-line, que chega a 200 milhões de consumidores, acaba de ser escolhida Livro de Negócios do Ano pelo Financial Times. O que torna a resenha negativa escrita por Mackenzie Bezos no site da Amazon (uma estrela, de um total de cinco) ainda mais embaraçosa. Sim, Mackenzie é a senhora Bezos. E publica seus romances numa editora tradicional, não na fundada pelo marido.
O gênio analítico de Bezos o coloca entre seus pares, como Bill Gates e Steve Jobs. E, como no caso de Gates e Jobs, é o elefante que, se um dia sair da sala, traz uma interrogação para o futuro da Amazon. No momento, a companhia com vendas de US $180 bilhões, 90 mil funcionários (mais 70 mil são contratados temporariamente para o fim do ano) vai continuar a crescer.
O livro de Brad Stone foi alterado no final quando, em agosto, Bezos comprou o Washington Post da família Graham por US$ 250 milhões. Mas, ao digerir a decisão, Stone começou a ver mais coerência num Bezos dono de jornal. Lembra que ele é um leitor voraz e defensor da palavra escrita, ainda que inimigo de editoras de livros e livrarias físicas. As reuniões na Amazon começam com a leitura silenciosa de um memorando de seis páginas. Lembra que Bezos é consumido pelo fascínio com a ruptura dos modelos tradicionais de negócios e, se há uma indústria tradicional que sofre com a economia digital, é a que leva a você, leitor, esta coluna.
E, não sejamos ingênuos, o empresário de ideias descritas como vagamente libertárias, um ferrenho inimigo de limites, como a cobrança de impostos, acaba de adquirir uma influência política poderosa. De sua mansão de 2.700 m² no Lago Washington, em Seattle, Bezos pode orquestrar um exército de lobistas que lutaram, Estado por Estado, para impedir a cobrança de impostos sobre vendas on-line. Pode destruir pequenos comerciantes, ao bloquear suas lojas do site da Amazon, em Estados que não dão refresco fiscal como a Califórnia e Nova York, para mostrar a vizinhos mais pobres o poder de sua fúria competitiva. Mas, ser dono do Washington Post na capital de uma indústria só, a política, é um novo estágio de influência.
A surpresa da compra do Post não impede Stone de fazer suas previsões, na conclusão de The Everything Store. Ele deixa clara a sua admiração pela companhia "mais sedutora que já existiu", embora, ao longo da narrativa, possamos notar a diferença entre respeitar um empresário e gostar dele. O objetivo de Jeff Bezos é vender tudo em toda parte. Stone prevê que Bezos vai ser dono de uma frota de caminhões para eliminar o último obstáculo independente ao sistema de entregas. Vai estender a venda de alimentos além de algumas cidades da Costa Oeste, enfrentando o Golias Walmart, de quem tomou tantos executivos que acabou sendo processado pelo concorrente. Vai se envolver em telefonia celular, já se envolve em produção e transmissão de TV.
Um dos serviços prestados por Brad Stone é desmistificar a lenda criada por Bezos sobre sua paciência (e a de seus acionistas) para aceitar prejuízos e lucros baixos por ter o foco apenas no consumidor. A Amazon mantém uma vigilância implacável sobre qualquer 'start-up' que demonstre o menor talento de cruzar seu caminho no futuro. Um caso famoso é o da bem sucedida Diapers.com, que vendia fraldas descartáveis on-line e foi colocada de joelhos até capitular e ser comprada por Bezos. Quando a Zappos.com, especializada em venda de sapatos e roupas, começou a dar atenção especial aos consumidores, recebeu o mesmo tratamento, que pode ser ilustrado com um desses filmes de natureza na África, em que a hiena mastiga partes da zebra ainda viva. A lealdade do consumidor, muito mais do que sua satisfação, move a Amazon. Uma lealdade conquistada com voracidade napoleônica.
É mais fácil se opor às condições das fábricas chinesas de iPads da Apple do que às condições desumanas nos depósitos da Amazon e corrigidas graças à reportagem de um pequeno jornal de papel na Pensilvânia. A longo prazo, as sociedades hão de examinar a ideia de que uma transação comercial existe de forma abstrata. E de que para comprar tudo por preços que não remuneram a produção, compensa destruir industrias inteiras até sobrar um só balcão planetário de vendas. Por enquanto, a refeição de Jeff Bezos está apenas começando.
A descrição é do próprio Jeff Bezos. Ao contratar um veterano do exército para trabalhar na Amazon, ele disse: "Fisicamente sou um covarde ('chicken'), mentalmente sou ousado."
Imagine se Jeff Bezos tivesse levado adiante sua ideia de batizar a companhia que fundou há 20 anos de Relentless (implacável). "Vamos agora ouvir o CEO da Implacável.com", convocaria o líder da comissão do Senado em Washington, que um dia há de plantar o fundador da Amazon numa cadeira e ouvir sua risada nervosa numa investigação anti-truste.
Mas não é preciso ter título explícito para confirmar a intenção do nome que não emplacou, como fica claro no livro fascinante de Brad Stone, The Everything Store (A Loja de Tudo). A narrativa sobre a emergência do gigante do comércio on-line, que chega a 200 milhões de consumidores, acaba de ser escolhida Livro de Negócios do Ano pelo Financial Times. O que torna a resenha negativa escrita por Mackenzie Bezos no site da Amazon (uma estrela, de um total de cinco) ainda mais embaraçosa. Sim, Mackenzie é a senhora Bezos. E publica seus romances numa editora tradicional, não na fundada pelo marido.
O gênio analítico de Bezos o coloca entre seus pares, como Bill Gates e Steve Jobs. E, como no caso de Gates e Jobs, é o elefante que, se um dia sair da sala, traz uma interrogação para o futuro da Amazon. No momento, a companhia com vendas de US $180 bilhões, 90 mil funcionários (mais 70 mil são contratados temporariamente para o fim do ano) vai continuar a crescer.
O livro de Brad Stone foi alterado no final quando, em agosto, Bezos comprou o Washington Post da família Graham por US$ 250 milhões. Mas, ao digerir a decisão, Stone começou a ver mais coerência num Bezos dono de jornal. Lembra que ele é um leitor voraz e defensor da palavra escrita, ainda que inimigo de editoras de livros e livrarias físicas. As reuniões na Amazon começam com a leitura silenciosa de um memorando de seis páginas. Lembra que Bezos é consumido pelo fascínio com a ruptura dos modelos tradicionais de negócios e, se há uma indústria tradicional que sofre com a economia digital, é a que leva a você, leitor, esta coluna.
E, não sejamos ingênuos, o empresário de ideias descritas como vagamente libertárias, um ferrenho inimigo de limites, como a cobrança de impostos, acaba de adquirir uma influência política poderosa. De sua mansão de 2.700 m² no Lago Washington, em Seattle, Bezos pode orquestrar um exército de lobistas que lutaram, Estado por Estado, para impedir a cobrança de impostos sobre vendas on-line. Pode destruir pequenos comerciantes, ao bloquear suas lojas do site da Amazon, em Estados que não dão refresco fiscal como a Califórnia e Nova York, para mostrar a vizinhos mais pobres o poder de sua fúria competitiva. Mas, ser dono do Washington Post na capital de uma indústria só, a política, é um novo estágio de influência.
A surpresa da compra do Post não impede Stone de fazer suas previsões, na conclusão de The Everything Store. Ele deixa clara a sua admiração pela companhia "mais sedutora que já existiu", embora, ao longo da narrativa, possamos notar a diferença entre respeitar um empresário e gostar dele. O objetivo de Jeff Bezos é vender tudo em toda parte. Stone prevê que Bezos vai ser dono de uma frota de caminhões para eliminar o último obstáculo independente ao sistema de entregas. Vai estender a venda de alimentos além de algumas cidades da Costa Oeste, enfrentando o Golias Walmart, de quem tomou tantos executivos que acabou sendo processado pelo concorrente. Vai se envolver em telefonia celular, já se envolve em produção e transmissão de TV.
Um dos serviços prestados por Brad Stone é desmistificar a lenda criada por Bezos sobre sua paciência (e a de seus acionistas) para aceitar prejuízos e lucros baixos por ter o foco apenas no consumidor. A Amazon mantém uma vigilância implacável sobre qualquer 'start-up' que demonstre o menor talento de cruzar seu caminho no futuro. Um caso famoso é o da bem sucedida Diapers.com, que vendia fraldas descartáveis on-line e foi colocada de joelhos até capitular e ser comprada por Bezos. Quando a Zappos.com, especializada em venda de sapatos e roupas, começou a dar atenção especial aos consumidores, recebeu o mesmo tratamento, que pode ser ilustrado com um desses filmes de natureza na África, em que a hiena mastiga partes da zebra ainda viva. A lealdade do consumidor, muito mais do que sua satisfação, move a Amazon. Uma lealdade conquistada com voracidade napoleônica.
É mais fácil se opor às condições das fábricas chinesas de iPads da Apple do que às condições desumanas nos depósitos da Amazon e corrigidas graças à reportagem de um pequeno jornal de papel na Pensilvânia. A longo prazo, as sociedades hão de examinar a ideia de que uma transação comercial existe de forma abstrata. E de que para comprar tudo por preços que não remuneram a produção, compensa destruir industrias inteiras até sobrar um só balcão planetário de vendas. Por enquanto, a refeição de Jeff Bezos está apenas começando.
Uma vez rato - RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 25/11
RIO DE JANEIRO - Mickey, o rato, está fazendo 85 anos. Os EUA comemoram isso com estardalhaço e, como sempre, intimam o mundo a soprar velinhas para um personagem que só a eles diz respeito. Mickey representa os americanos como eles se veem: adultos, justos, responsáveis, gentis, inatacáveis. Mas não é assim que o mundo enxerga os americanos.
Para mim, muito mais representativo no cânone de Walt Disney é o inimigo de Mickey, João Bafodeonça, criado em 1925 --três anos antes do próprio Mickey, cinco antes de Pluto, sete antes do Pateta e nove antes de Donald. Mas era típico de Walt que um maravilhoso vilão como João Bafodeonça, em ação até hoje, nunca passasse de coadjuvante, destinado a perder todas para o rato.
Rato este que não tinha nada de santo ao nascer. Logo em seu primeiro desenho, "Steamboat Willie" (1928), Mickey tortura um gato, roda-o pela cauda e o atira dentro do rio. E cometeu outras ignomínias com animais nos desenhos seguintes, até que Disney ordenou a sua desratização e conversão em algo parecido com um ser humano.
Mas, uma vez rato, sempre rato, e não é por acaso o ódio de Walt aos gatos, evidente em toda a sua produção. Em "Pinóquio" (1940), o gato Gedeão é um malandro odioso e repulsivo. Em "Cinderela" (1950), o gato Lúcifer, gordo e perverso, é uma constante ameaça para dois ratos esqueléticos, Gus e Jaq. Em "Alice no País das Maravilhas" (1951), o Gato é lógico, frio e insensível. Em "A Dama e o Vagabundo" (1955), os siameses Si e Õ destroem as cortinas, atacam o canário e afogam o peixinho dourado. E mesmo em "As Aristogatas" (1970), um filme que se imagina pró-gatos, há um bando de gatos vadios e desprezíveis, e o herói é um rato chamado Roquefort.
Daí ser inevitável que Walt um dia fizesse a Disney World --a ma-ior ratoeira humana já construída por um rato.
RIO DE JANEIRO - Mickey, o rato, está fazendo 85 anos. Os EUA comemoram isso com estardalhaço e, como sempre, intimam o mundo a soprar velinhas para um personagem que só a eles diz respeito. Mickey representa os americanos como eles se veem: adultos, justos, responsáveis, gentis, inatacáveis. Mas não é assim que o mundo enxerga os americanos.
Para mim, muito mais representativo no cânone de Walt Disney é o inimigo de Mickey, João Bafodeonça, criado em 1925 --três anos antes do próprio Mickey, cinco antes de Pluto, sete antes do Pateta e nove antes de Donald. Mas era típico de Walt que um maravilhoso vilão como João Bafodeonça, em ação até hoje, nunca passasse de coadjuvante, destinado a perder todas para o rato.
Rato este que não tinha nada de santo ao nascer. Logo em seu primeiro desenho, "Steamboat Willie" (1928), Mickey tortura um gato, roda-o pela cauda e o atira dentro do rio. E cometeu outras ignomínias com animais nos desenhos seguintes, até que Disney ordenou a sua desratização e conversão em algo parecido com um ser humano.
Mas, uma vez rato, sempre rato, e não é por acaso o ódio de Walt aos gatos, evidente em toda a sua produção. Em "Pinóquio" (1940), o gato Gedeão é um malandro odioso e repulsivo. Em "Cinderela" (1950), o gato Lúcifer, gordo e perverso, é uma constante ameaça para dois ratos esqueléticos, Gus e Jaq. Em "Alice no País das Maravilhas" (1951), o Gato é lógico, frio e insensível. Em "A Dama e o Vagabundo" (1955), os siameses Si e Õ destroem as cortinas, atacam o canário e afogam o peixinho dourado. E mesmo em "As Aristogatas" (1970), um filme que se imagina pró-gatos, há um bando de gatos vadios e desprezíveis, e o herói é um rato chamado Roquefort.
Daí ser inevitável que Walt um dia fizesse a Disney World --a ma-ior ratoeira humana já construída por um rato.
Bem-vindo ao Círculo - DANIEL GALERA
O GLOBO - 25/11
As pessoas são obrigadas a compartilhar os detalhes mais íntimos de suas vidas
Na coluna da semana passada, falei um pouco sobre o desafio de escrever ficção contemporânea na era digital e usei como exemplos Steven Hall e Thomas Pynchon. Naquela ocasião, deixei de fora outra leitura recente que também se relaciona ao tema e rendia um comentário à parte: o romance “The Circle”, de Dave Eggers. Embora seja um livro comportado em termos de forma e linguagem, ele se destaca por abordar de maneira bastante direta não apenas as novas tecnologias e serviços que transformam nossas vidas, mas também as ideologias que movem muitas empresas do setor e vêm embutidas em seus produtos.
“The Circle”, o Círculo, é o nome da empresa que, dentro do futuro próximo inventado por Eggers, desbancou o Google e o Facebook e se tornou a marca dominante no ecossistema de redes sociais, gadgets e serviços on-line. A protagonista do livro, Mae Holland, é uma garota de 24 anos que consegue um cobiçado emprego no enorme e extravagantecampus (termo pelo qual as gigantes do Vale do Silício costumam se referir a suas sedes) do Círculo.
Mae começa por baixo, trabalhando no setor de atendimento aos anunciantes. Logo nos primeiros dias, precisa abrir contas em todos os serviços do Círculo, enviar todas as suas fotos e vídeos para a nuvem, comparecer ao máximo de eventos e grupos de discussão organizados por seus milhares de contatos e galgar posições em vários rankings de participação e eficiência. Eggers tira uma onda com o estilo de vida do tech people, que o livro retrata como uma massa homogênea de escravos da originalidade, carente de aprovação nas redes sociais, para quem a experiência direta foi substituída por estatísticas, interfaces virtuais, enquetes sobre o menu vegan da cantina e abaixo-assinados contra a opressão em países distantes.
Até aí, não é um retrato muito distante do imaginário comum. Mas logo o incentivo à conectividade se transforma em coação. Mae é pressionada a compartilhar seus dados médicos e os hábitos mais íntimos. Deve monitorar e exibir seus passos, sinais vitais, sentimentos e opiniões sobre tudo em nome de um valor supremo: a transparência. Ser transparente, ou seja, abrir mão da privacidade, é sinônimo de ser generoso. A ideologia do compartilhamento total vai ganhando proporções perturbadoras. As únicas vozes dissidentes, entre elas os pais e o ex-namorado de Mae, vão sendo esmagadas em nome do direito comunitário de ter acesso a toda informação concebível. Um dos projetos do Círculo é contar os grãos de areia do Saara. Na crença de seus fundadores, o compartilhamento online do pensamento humano em tempo real só dependerá da tecnologia necessária.
O livro é em parte uma distopia totalitarista no molde de “1984”, em parte uma paródia da ideologia da geração Google. Os três lemas do Círculo — Segredos são Mentiras; Compartilhar é se Importar; Privacidade é Roubo — são alicerces da visão dominante segundo a qual um estado de vigilância total traria benefícios à Humanidade reduzindo crimes, aproximando os seres humanos e aprimorando a democracia. Eggers leva essa lógica às últimas consequências, rumo ao “fechamento do Círculo”, quando as esferas privada e pública se fundem e todo o conhecimento possível fica disponível a todos.
Pode-se argumentar que há um certo desequilíbrio entre o realismo e a fantasia no mundo apresentado por Eggers, bem como personagens-espantalho facilmente incendiáveis, e leitores versados nos detalhes tecnológicos podem torcer o nariz diante de imprecisões técnicas, mas esse mundo é coerente o bastante com certas tendências atuais para que a leitura traga momentos de desconforto. Como protagonista, Mae pode parecer ingênua e submissa demais, mas ela faz parte de uma sociedade imaginada em que o conceito de privacidade já se tornou obsoleto. No mundo real, a privacidade ainda conta com legiões de defensores e é tema de debates encarniçados como o que tivemos recentemente em torno das biografias no Brasil. A força simbólica da distopia do romance depende muito da crença do leitor a respeito do valor que a privacidade continuará tendo nas próximas gerações.
De todo modo, há trechos em que o texto de Eggers consegue emular a sensação de ser tragado pelo fluxo das redes sociais com uma precisão exasperante. A vida de Mae vai sendo substituída pela administração da informação acerca da vida. É confortante ver a ficção literária dando conta disso, ou pelo menos tentando.
Dia desses o Google Plus abocanhou meus álbuns de fotos privados do Picasa e o conteúdo brotou num passe de mágica no meu smartphone. Foi tão fascinante quanto desconfortável. Em momentos assim, e ao ouvir expressões como “fulano se suicidou no Facebook”, é preciso lembrar que o Círculo não deve se fechar nunca, e que a abertura deve ser larga o bastante para que possamos sair.
As pessoas são obrigadas a compartilhar os detalhes mais íntimos de suas vidas
Na coluna da semana passada, falei um pouco sobre o desafio de escrever ficção contemporânea na era digital e usei como exemplos Steven Hall e Thomas Pynchon. Naquela ocasião, deixei de fora outra leitura recente que também se relaciona ao tema e rendia um comentário à parte: o romance “The Circle”, de Dave Eggers. Embora seja um livro comportado em termos de forma e linguagem, ele se destaca por abordar de maneira bastante direta não apenas as novas tecnologias e serviços que transformam nossas vidas, mas também as ideologias que movem muitas empresas do setor e vêm embutidas em seus produtos.
“The Circle”, o Círculo, é o nome da empresa que, dentro do futuro próximo inventado por Eggers, desbancou o Google e o Facebook e se tornou a marca dominante no ecossistema de redes sociais, gadgets e serviços on-line. A protagonista do livro, Mae Holland, é uma garota de 24 anos que consegue um cobiçado emprego no enorme e extravagantecampus (termo pelo qual as gigantes do Vale do Silício costumam se referir a suas sedes) do Círculo.
Mae começa por baixo, trabalhando no setor de atendimento aos anunciantes. Logo nos primeiros dias, precisa abrir contas em todos os serviços do Círculo, enviar todas as suas fotos e vídeos para a nuvem, comparecer ao máximo de eventos e grupos de discussão organizados por seus milhares de contatos e galgar posições em vários rankings de participação e eficiência. Eggers tira uma onda com o estilo de vida do tech people, que o livro retrata como uma massa homogênea de escravos da originalidade, carente de aprovação nas redes sociais, para quem a experiência direta foi substituída por estatísticas, interfaces virtuais, enquetes sobre o menu vegan da cantina e abaixo-assinados contra a opressão em países distantes.
Até aí, não é um retrato muito distante do imaginário comum. Mas logo o incentivo à conectividade se transforma em coação. Mae é pressionada a compartilhar seus dados médicos e os hábitos mais íntimos. Deve monitorar e exibir seus passos, sinais vitais, sentimentos e opiniões sobre tudo em nome de um valor supremo: a transparência. Ser transparente, ou seja, abrir mão da privacidade, é sinônimo de ser generoso. A ideologia do compartilhamento total vai ganhando proporções perturbadoras. As únicas vozes dissidentes, entre elas os pais e o ex-namorado de Mae, vão sendo esmagadas em nome do direito comunitário de ter acesso a toda informação concebível. Um dos projetos do Círculo é contar os grãos de areia do Saara. Na crença de seus fundadores, o compartilhamento online do pensamento humano em tempo real só dependerá da tecnologia necessária.
O livro é em parte uma distopia totalitarista no molde de “1984”, em parte uma paródia da ideologia da geração Google. Os três lemas do Círculo — Segredos são Mentiras; Compartilhar é se Importar; Privacidade é Roubo — são alicerces da visão dominante segundo a qual um estado de vigilância total traria benefícios à Humanidade reduzindo crimes, aproximando os seres humanos e aprimorando a democracia. Eggers leva essa lógica às últimas consequências, rumo ao “fechamento do Círculo”, quando as esferas privada e pública se fundem e todo o conhecimento possível fica disponível a todos.
Pode-se argumentar que há um certo desequilíbrio entre o realismo e a fantasia no mundo apresentado por Eggers, bem como personagens-espantalho facilmente incendiáveis, e leitores versados nos detalhes tecnológicos podem torcer o nariz diante de imprecisões técnicas, mas esse mundo é coerente o bastante com certas tendências atuais para que a leitura traga momentos de desconforto. Como protagonista, Mae pode parecer ingênua e submissa demais, mas ela faz parte de uma sociedade imaginada em que o conceito de privacidade já se tornou obsoleto. No mundo real, a privacidade ainda conta com legiões de defensores e é tema de debates encarniçados como o que tivemos recentemente em torno das biografias no Brasil. A força simbólica da distopia do romance depende muito da crença do leitor a respeito do valor que a privacidade continuará tendo nas próximas gerações.
De todo modo, há trechos em que o texto de Eggers consegue emular a sensação de ser tragado pelo fluxo das redes sociais com uma precisão exasperante. A vida de Mae vai sendo substituída pela administração da informação acerca da vida. É confortante ver a ficção literária dando conta disso, ou pelo menos tentando.
Dia desses o Google Plus abocanhou meus álbuns de fotos privados do Picasa e o conteúdo brotou num passe de mágica no meu smartphone. Foi tão fascinante quanto desconfortável. Em momentos assim, e ao ouvir expressões como “fulano se suicidou no Facebook”, é preciso lembrar que o Círculo não deve se fechar nunca, e que a abertura deve ser larga o bastante para que possamos sair.
Pela liberdade da rede - FRANK LARUE
FOLHA DE SP - 25/11
Aceitar que o acesso à internet de baixa qualidade seja o único oferecido para quem possa pagar menos trará um impacto profundo na conectividade
No ano passado, países adotaram por unanimidade na ONU a primeira resolução sobre direitos humanos e internet. O texto é direto: "Os mesmos direitos que as pessoas têm fora da internet devem ser protegidos dentro dela, em particular a liberdade de expressão". Se a formulação é clara, sua implementação na prática é um desafio permanente.
Se liberdade de expressão e privacidade são reconhecidos faz tempo como direitos humanos fundamentais, qualquer proposta de regulação para a internet deve sempre levar em conta a necessidade primordial de promovê-los. No entanto, por todo o mundo, leis inconsistentes abrem espaço para iniciativas que terminam por violá-los.
O Brasil tem tido um papel de liderança nesse tema. Na abertura da Assembleia Geral da ONU em setembro, a presidenta brasileira, reagindo às revelações sobre a espionagem norte-americana, listou com precisão pontos fundamentais que deveriam nortear qualquer debate sobre como regular a internet. Em primeiro lugar, ela mencionou a importância de garantir a liberdade de expressão e a privacidade.
Neste momento, o Congresso Nacional brasileiro debate a adoção do projeto de Marco Civil da Internet. O projeto de lei, já pela sua elaboração participativa, vinha sendo usado no mundo como um exemplo interessante de regulação da internet. Se algumas qualidades fundamentais do texto original forem mantidas pelos congressistas, o Brasil poderá oferecer ao mundo uma referência. Mas se tais qualidades forem perdidas, a regulação poderá ser ineficaz ou até danosa.
Garantir a neutralidade da rede significa que toda medida que regule o tráfego e o acesso de informações on-line seja ancorada pelos princípios fundamentais da igualdade e não discriminação.
Assegurar à população, sem discriminação, acesso seguro e de qualidade às novas tecnologias de comunicação é elementar para a consolidação da democracia. Num país marcado por desigualdades econômicas como o Brasil, aceitar que o acesso de baixa qualidade seja o único oferecido para quem possa pagar menos trará um impacto profundo na conectividade de uma vasta parcela da população.
Garantias como os dispositivos que determinam que provedores de serviços na internet só poderão ser responsabilizados por não cumprir uma ordem judicial que os obrigue a remover ou bloquear o acesso a conteúdo de terceiros são também importantes para evitar que se crie um ambiente jurídico hostil à livre circulação de ideias. Nesse sentido, preocupam sugestões recentes para incluir exceções nos casos de violação aos direitos autorais.
O projeto de lei original reafirma a proteção da privacidade, sendo a identificação de dados de comunicação somente aceitável com autorização judicial para casos específicos. No entanto, a proposição obrigando a armazenagem de dados da comunicação em território nacional parece ser tecnicamente inócua.
Sem exageros, promover o livre e seguro acesso à internet é hoje uma das chaves para a consolidação da vida democrática. Assim que é preciso olhar com atenção para qualquer regulação que desconheça o papel crucial da proteção da liberdade. Os debates no Brasil interessam ao mundo, e muito.
Aceitar que o acesso à internet de baixa qualidade seja o único oferecido para quem possa pagar menos trará um impacto profundo na conectividade
No ano passado, países adotaram por unanimidade na ONU a primeira resolução sobre direitos humanos e internet. O texto é direto: "Os mesmos direitos que as pessoas têm fora da internet devem ser protegidos dentro dela, em particular a liberdade de expressão". Se a formulação é clara, sua implementação na prática é um desafio permanente.
Se liberdade de expressão e privacidade são reconhecidos faz tempo como direitos humanos fundamentais, qualquer proposta de regulação para a internet deve sempre levar em conta a necessidade primordial de promovê-los. No entanto, por todo o mundo, leis inconsistentes abrem espaço para iniciativas que terminam por violá-los.
O Brasil tem tido um papel de liderança nesse tema. Na abertura da Assembleia Geral da ONU em setembro, a presidenta brasileira, reagindo às revelações sobre a espionagem norte-americana, listou com precisão pontos fundamentais que deveriam nortear qualquer debate sobre como regular a internet. Em primeiro lugar, ela mencionou a importância de garantir a liberdade de expressão e a privacidade.
Neste momento, o Congresso Nacional brasileiro debate a adoção do projeto de Marco Civil da Internet. O projeto de lei, já pela sua elaboração participativa, vinha sendo usado no mundo como um exemplo interessante de regulação da internet. Se algumas qualidades fundamentais do texto original forem mantidas pelos congressistas, o Brasil poderá oferecer ao mundo uma referência. Mas se tais qualidades forem perdidas, a regulação poderá ser ineficaz ou até danosa.
Garantir a neutralidade da rede significa que toda medida que regule o tráfego e o acesso de informações on-line seja ancorada pelos princípios fundamentais da igualdade e não discriminação.
Assegurar à população, sem discriminação, acesso seguro e de qualidade às novas tecnologias de comunicação é elementar para a consolidação da democracia. Num país marcado por desigualdades econômicas como o Brasil, aceitar que o acesso de baixa qualidade seja o único oferecido para quem possa pagar menos trará um impacto profundo na conectividade de uma vasta parcela da população.
Garantias como os dispositivos que determinam que provedores de serviços na internet só poderão ser responsabilizados por não cumprir uma ordem judicial que os obrigue a remover ou bloquear o acesso a conteúdo de terceiros são também importantes para evitar que se crie um ambiente jurídico hostil à livre circulação de ideias. Nesse sentido, preocupam sugestões recentes para incluir exceções nos casos de violação aos direitos autorais.
O projeto de lei original reafirma a proteção da privacidade, sendo a identificação de dados de comunicação somente aceitável com autorização judicial para casos específicos. No entanto, a proposição obrigando a armazenagem de dados da comunicação em território nacional parece ser tecnicamente inócua.
Sem exageros, promover o livre e seguro acesso à internet é hoje uma das chaves para a consolidação da vida democrática. Assim que é preciso olhar com atenção para qualquer regulação que desconheça o papel crucial da proteção da liberdade. Os debates no Brasil interessam ao mundo, e muito.
PUNIÇÃO SOLIDÁRIA - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 25/11
A Igreja Católica foi condenada a pagar indenização em um caso de pedofilia no Paraná. A ministra Nancy Andrighi, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), negou recurso da Diocese de Umuarama e determinou a responsabilidade solidária da entidade eclesiástica em ação movida contra o padre José Cipriano da Silva.
PUNIÇÃO 2
A igreja e o sacerdote vão pagar R$ 100 mil (metade cada um), de forma solidária, pelos danos morais decorrentes do delito. A vítima tinha 14 anos em 2002. "A igreja não pode ser indiferente --em especial no plano da responsabilidade civil, frise-se-- aos atos praticados por quem age em seu nome ou em proveito da função religiosa, sob pena de trair a confiança que nela própria depositam os fiéis", declarou a ministra em seu voto.
PUNIÇÃO 3
A Mitra Diocesana de Umuarama vai recorrer da decisão. "O ato da pessoa física, em suas atividades privadas, nada tem a ver com o ofício do sacerdócio e não pode ser creditado à instituição", entende Hugo Cysneiros, advogado da diocese.
PUNIÇÃO 4
Em seu voto, a ministra rebate os argumentos da defesa: "Mais do que simples relação de subordinação, o ministro ordenado é para os fiéis a própria personificação da Igreja Católica, no qual depositam justas expectativas de retidão moral". E diz que a instituição não pode ser indiferente ao crime praticado pelo sacerdote que "convencia as vítimas a pernoitarem na casa paroquial para praticar atos libidinosos".
NA PRORROGAÇÃO
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Marco Aurélio Mello, prevê que a minirreforma eleitoral criará a mesma celeuma da Lei da Ficha Limpa. Segundo o ministro, as regras recém-aprovadas pelo Senado não podem vigorar no pleito de 2014. Pelo princípio da anuidade previsto na Constituição, a lei passa a vigorar de imediato, mas não vale para a eleição do ano seguinte. As regras só vão incidir sobre as eleições municipais em 2016.
PARA A PLATEIA
"Os parlamentares têm o tempo todo para promulgar leis, mas deixam para fazer em cima da hora para dar uma satisfação vã à sociedade", critica o novo presidente do TSE.
HELLO
Cat Stevens ligou para Eduardo Suplicy (PT-SP) na quinta-feira passada. Pediu desculpas por não poder ter recebido o senador e os filhos, no dia 17, após show em SP. O cantor, que mudou o nome para Yusuf, confirmou ter recebido o exemplar de "Renda de Cidadania - A Saída É pela Porta", enviado pelo político com dedicatória em inglês. Na conversa, Suplicy revelou ao britânico a vontade dos filhos Supla e João, os Brothers of Brazil, de tocar com ele "em algum lugar da Terra".
GAROTA-PROPAGANDA
Livro de estreia da atriz Fernanda Torres, "Fim" terá divulgação digna de grande lançamento. Andrucha Waddington, marido da colunista da Folha, dirige os vídeos da campanha, criada pela agência WMcCann.
ÁLBUM
O Museu do Futebol abre exposição no sábado com objetos que fazem parte da memória impressa do esporte. Além de figurinhas e postais, "Futebol de Papel" exibe itens como os ingressos de todas as Copas do Mundo.
SEM CHORO
Gustavo Rosa, que morreu no dia 12, será homenageado nos espetáculos "Mover-se" e "Entrelaços", da companhia Cinque Sensi. Obras do artista plástico farão parte do cenário e um vídeo sobre ele será exibido, nesta sexta, no teatro Anhembi Morumbi.
AU AU AU
A atriz Larissa Manoela, 12, vai festejar os dois anos de sua cachorrinha, Guilhermina, no bufê Mega Magic, em SP, nesta quarta. A yorkshire da estrela de "Carrossel" tem dez fã-clubes.
MAR À VISTA A estilista Fernanda de Goeye exibiu a boa forma para divulgar a coleção de alto verão de Adriana Degreas em um ensaio caseiro entre amigas
BRILHA MUITO
O joalheiro Jack Vartanian e o artista plástico Kleber Matheus receberam convidados na inauguração da exposição "Variação sobre Pedras", nos Jardins. A empresária Karina Motta, a estilista Juliana Jabour e a mulher de Jack, Cassia Avila, foram à abertura da mostra.
HISTÓRIA CONSTRUÍDA
Os arquitetos e sócios Fernando Vidal, Luiz Fernando Rocco e Douglas Tolaine lançaram o livro "Rocco Vidal", sobre o escritório que comandam. Felipe Aflalo e Kiko Salomão, também arquitetos, estiveram no evento, no Museu da Casa Brasileira.
CURTO-CIRCUITO
Luiz Felipe d'Avila lança o livro "Caráter & Liderança: Nove Estadistas que Construíram a Democracia Brasileira". Amanhã, às 18h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional.
A blogueira Lala Rudge vai assinar coleção para a marca de sapatos Schutz.
Nizan Guanaes oferece jantar hoje, nos Jardins, em homenagem ao publicitário PJ Pereira, que lança "O Livro do Silêncio".
Rubens Barrichello comanda leilão de artigos esportivos hoje, no Noite do Bem, evento beneficente no Grand Hyatt.
A Igreja Católica foi condenada a pagar indenização em um caso de pedofilia no Paraná. A ministra Nancy Andrighi, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), negou recurso da Diocese de Umuarama e determinou a responsabilidade solidária da entidade eclesiástica em ação movida contra o padre José Cipriano da Silva.
PUNIÇÃO 2
A igreja e o sacerdote vão pagar R$ 100 mil (metade cada um), de forma solidária, pelos danos morais decorrentes do delito. A vítima tinha 14 anos em 2002. "A igreja não pode ser indiferente --em especial no plano da responsabilidade civil, frise-se-- aos atos praticados por quem age em seu nome ou em proveito da função religiosa, sob pena de trair a confiança que nela própria depositam os fiéis", declarou a ministra em seu voto.
PUNIÇÃO 3
A Mitra Diocesana de Umuarama vai recorrer da decisão. "O ato da pessoa física, em suas atividades privadas, nada tem a ver com o ofício do sacerdócio e não pode ser creditado à instituição", entende Hugo Cysneiros, advogado da diocese.
PUNIÇÃO 4
Em seu voto, a ministra rebate os argumentos da defesa: "Mais do que simples relação de subordinação, o ministro ordenado é para os fiéis a própria personificação da Igreja Católica, no qual depositam justas expectativas de retidão moral". E diz que a instituição não pode ser indiferente ao crime praticado pelo sacerdote que "convencia as vítimas a pernoitarem na casa paroquial para praticar atos libidinosos".
NA PRORROGAÇÃO
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Marco Aurélio Mello, prevê que a minirreforma eleitoral criará a mesma celeuma da Lei da Ficha Limpa. Segundo o ministro, as regras recém-aprovadas pelo Senado não podem vigorar no pleito de 2014. Pelo princípio da anuidade previsto na Constituição, a lei passa a vigorar de imediato, mas não vale para a eleição do ano seguinte. As regras só vão incidir sobre as eleições municipais em 2016.
PARA A PLATEIA
"Os parlamentares têm o tempo todo para promulgar leis, mas deixam para fazer em cima da hora para dar uma satisfação vã à sociedade", critica o novo presidente do TSE.
HELLO
Cat Stevens ligou para Eduardo Suplicy (PT-SP) na quinta-feira passada. Pediu desculpas por não poder ter recebido o senador e os filhos, no dia 17, após show em SP. O cantor, que mudou o nome para Yusuf, confirmou ter recebido o exemplar de "Renda de Cidadania - A Saída É pela Porta", enviado pelo político com dedicatória em inglês. Na conversa, Suplicy revelou ao britânico a vontade dos filhos Supla e João, os Brothers of Brazil, de tocar com ele "em algum lugar da Terra".
GAROTA-PROPAGANDA
Livro de estreia da atriz Fernanda Torres, "Fim" terá divulgação digna de grande lançamento. Andrucha Waddington, marido da colunista da Folha, dirige os vídeos da campanha, criada pela agência WMcCann.
ÁLBUM
O Museu do Futebol abre exposição no sábado com objetos que fazem parte da memória impressa do esporte. Além de figurinhas e postais, "Futebol de Papel" exibe itens como os ingressos de todas as Copas do Mundo.
SEM CHORO
Gustavo Rosa, que morreu no dia 12, será homenageado nos espetáculos "Mover-se" e "Entrelaços", da companhia Cinque Sensi. Obras do artista plástico farão parte do cenário e um vídeo sobre ele será exibido, nesta sexta, no teatro Anhembi Morumbi.
AU AU AU
A atriz Larissa Manoela, 12, vai festejar os dois anos de sua cachorrinha, Guilhermina, no bufê Mega Magic, em SP, nesta quarta. A yorkshire da estrela de "Carrossel" tem dez fã-clubes.
MAR À VISTA A estilista Fernanda de Goeye exibiu a boa forma para divulgar a coleção de alto verão de Adriana Degreas em um ensaio caseiro entre amigas
BRILHA MUITO
O joalheiro Jack Vartanian e o artista plástico Kleber Matheus receberam convidados na inauguração da exposição "Variação sobre Pedras", nos Jardins. A empresária Karina Motta, a estilista Juliana Jabour e a mulher de Jack, Cassia Avila, foram à abertura da mostra.
HISTÓRIA CONSTRUÍDA
Os arquitetos e sócios Fernando Vidal, Luiz Fernando Rocco e Douglas Tolaine lançaram o livro "Rocco Vidal", sobre o escritório que comandam. Felipe Aflalo e Kiko Salomão, também arquitetos, estiveram no evento, no Museu da Casa Brasileira.
CURTO-CIRCUITO
Luiz Felipe d'Avila lança o livro "Caráter & Liderança: Nove Estadistas que Construíram a Democracia Brasileira". Amanhã, às 18h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional.
A blogueira Lala Rudge vai assinar coleção para a marca de sapatos Schutz.
Nizan Guanaes oferece jantar hoje, nos Jardins, em homenagem ao publicitário PJ Pereira, que lança "O Livro do Silêncio".
Rubens Barrichello comanda leilão de artigos esportivos hoje, no Noite do Bem, evento beneficente no Grand Hyatt.
A terra treme - ANCELMO GOIS
O GLOBO - 25/11
Esta semana um representante do governo Dilma deve se encontrar com, pelo menos, três ministros do STF. Vai alertar sobre os danos à economia no julgamento das ações que tratam das perdas na caderneta nos planos econômicos.
A conta é estimada em R$ 150 bilhões.
Marina e o bispo
A ex-senadora Marina Silva, que é evangélica, vem ao Rio hoje. Terá um encontro com o arcebispo D. Orani Tempesta, às 14 horas.
A aproximação foi feita pelo deputado Miro Teixeira.
Querido Papai Noel
Veja só como as crianças mudaram. As cartinhas para Papai Noel, que meninas e meninos carentes mandam para os Correios, dentro da campanha para que um carioca realize o sonho dos pequenos, não têm mais pedidos de bonecas ou bolas.
O que eles querem...
Nas cartas que chegaram à agência da Siqueira Campos, em Copacabana, a criançada pediu tablets ou videogames modernos, além de TV compatível.
Faz sentido.
Implosão virou arte
Sob a direção do cineasta Andrucha Waddington e do artista plástico Vik Muniz, 80 tomadas de câmera registraram ontem a implosão do Elevado da Perimetral. A Conspiração filmou em diferentes velocidades. Foram até mil quadros por segundo, enquanto um filme normal tem 24 quadros.
Essas imagens se transformarão numa mega instalação de videoarte. IPTU é baixo no Brasil
O economista José Roberto Afonso, especialista em contas públicas, apresentou, sexta, no Ministério das Cidades, em Brasília, um estudo que mostra, veja só, que o brasileiro paga um IPTU camarada. “O Brasil é o campeão mundial de carga tributária entre os emergentes, mas na hora de tributar os imóveis, cobra menos impostos que a China, Rússia, Bulgária, Cazaquistão e Letônia.” Israel, por exemplo, cobra cinco vezes mais do que o Brasil.
Custo político
Para ele, tem prefeito que prefere pedir verbas em Brasília ou aos governadores ou então cobrar impostos embutidos nos preços de mercadorias, porque passam despercebidos pelos contribuintes.
Aliás
Um estudo dos professores Lucio Rennó (UnB) e Carlos Pereira (Ebape-FGV), premiado semana passada pelo Tesouro Nacional, concluiu, após avaliação detalhada, que “municípios que receberam recursos de emendas parlamentares por mais tempo, reduzem a mortalidade infantil, bem como aumentam a geração de emprego formal e incrementam o salário na esfera municipal.”
Imagina se cobrasse mais IPTU.
Hermès em leilão
Começa no próximo dia 2 o leilão de peças da coleção pessoal de Betty Lagardère, ex-modelo e empresária, organizado por Soraia Cals e Evandro Carneiro, no Rio.
Entre os itens mais cobiçados, está a bolsa Birkin, da Hermès, aquela que tem fila de espera e custa uns 30 mil euros. O lance inicial será de R$ 5 mil.
Passagem de bastão
Eduardo Paes viaja hoje à noite para Nova York.
É que o prefeito Michael Bloomberg passará a ele o cargo de presidente do C40, grupo de 40 cidades grandes que estão atuando em conjunto na questão dos riscos climáticos.
450 anos do Rio
Aliás, a agenda do prefeito está cheia. No dia 5, ele pretende reunir gente da sociedade carioca, no Palácio da Cidade, para a cerimônia de abertura das festas do 4509 aniversário do Rio de Janeiro, em 2015.
O Rio foi fundado em 19 de março de 1565.
Os coleguinhas
A violência contra jornalistas será o tema de uma audiência pública amanhã, na Câmara Municipal, às 10h. Depois, ocorre um ato na Cinelândia
Segundo o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município, o Rio, palco das maiores manifestações de rua do país, concentra mais de 20% dos casos de agressão ou hostilidade contra trabalhadores da imprensa.
Vermelho e preto
O Flamengo fecha 2013 como o ano em que o clube mais pagou impostos em sua história: R$ 80 milhões.
A conta é estimada em R$ 150 bilhões.
Marina e o bispo
A ex-senadora Marina Silva, que é evangélica, vem ao Rio hoje. Terá um encontro com o arcebispo D. Orani Tempesta, às 14 horas.
A aproximação foi feita pelo deputado Miro Teixeira.
Querido Papai Noel
Veja só como as crianças mudaram. As cartinhas para Papai Noel, que meninas e meninos carentes mandam para os Correios, dentro da campanha para que um carioca realize o sonho dos pequenos, não têm mais pedidos de bonecas ou bolas.
O que eles querem...
Nas cartas que chegaram à agência da Siqueira Campos, em Copacabana, a criançada pediu tablets ou videogames modernos, além de TV compatível.
Faz sentido.
Implosão virou arte
Sob a direção do cineasta Andrucha Waddington e do artista plástico Vik Muniz, 80 tomadas de câmera registraram ontem a implosão do Elevado da Perimetral. A Conspiração filmou em diferentes velocidades. Foram até mil quadros por segundo, enquanto um filme normal tem 24 quadros.
Essas imagens se transformarão numa mega instalação de videoarte. IPTU é baixo no Brasil
O economista José Roberto Afonso, especialista em contas públicas, apresentou, sexta, no Ministério das Cidades, em Brasília, um estudo que mostra, veja só, que o brasileiro paga um IPTU camarada. “O Brasil é o campeão mundial de carga tributária entre os emergentes, mas na hora de tributar os imóveis, cobra menos impostos que a China, Rússia, Bulgária, Cazaquistão e Letônia.” Israel, por exemplo, cobra cinco vezes mais do que o Brasil.
Custo político
Para ele, tem prefeito que prefere pedir verbas em Brasília ou aos governadores ou então cobrar impostos embutidos nos preços de mercadorias, porque passam despercebidos pelos contribuintes.
Aliás
Um estudo dos professores Lucio Rennó (UnB) e Carlos Pereira (Ebape-FGV), premiado semana passada pelo Tesouro Nacional, concluiu, após avaliação detalhada, que “municípios que receberam recursos de emendas parlamentares por mais tempo, reduzem a mortalidade infantil, bem como aumentam a geração de emprego formal e incrementam o salário na esfera municipal.”
Imagina se cobrasse mais IPTU.
Hermès em leilão
Começa no próximo dia 2 o leilão de peças da coleção pessoal de Betty Lagardère, ex-modelo e empresária, organizado por Soraia Cals e Evandro Carneiro, no Rio.
Entre os itens mais cobiçados, está a bolsa Birkin, da Hermès, aquela que tem fila de espera e custa uns 30 mil euros. O lance inicial será de R$ 5 mil.
Passagem de bastão
Eduardo Paes viaja hoje à noite para Nova York.
É que o prefeito Michael Bloomberg passará a ele o cargo de presidente do C40, grupo de 40 cidades grandes que estão atuando em conjunto na questão dos riscos climáticos.
450 anos do Rio
Aliás, a agenda do prefeito está cheia. No dia 5, ele pretende reunir gente da sociedade carioca, no Palácio da Cidade, para a cerimônia de abertura das festas do 4509 aniversário do Rio de Janeiro, em 2015.
O Rio foi fundado em 19 de março de 1565.
Os coleguinhas
A violência contra jornalistas será o tema de uma audiência pública amanhã, na Câmara Municipal, às 10h. Depois, ocorre um ato na Cinelândia
Segundo o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município, o Rio, palco das maiores manifestações de rua do país, concentra mais de 20% dos casos de agressão ou hostilidade contra trabalhadores da imprensa.
Vermelho e preto
O Flamengo fecha 2013 como o ano em que o clube mais pagou impostos em sua história: R$ 80 milhões.
Tamanho da conta - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 25/11
Em reuniões recentes no Palácio do Planalto para discutir o financiamento dos programas de concessões de rodovias e ferrovias, representantes de bancos privados manifestaram preocupação com o impacto de projetos de grande porte nas contas do governo. O setor apontou, em ao menos três encontros, que ainda não tem clareza sobre o custo dessas operações para o Tesouro, que precisará fazer aportes ao BNDES, o que gera incerteza sobre a garantia desses recursos.
Lista... A CNI (Confederação Nacional da Indústria) começou a discutir com as associações setoriais projetos que serão apresentados aos presidenciáveis para aumentar a competitividade do país.
... de pedidos Com base no Mapa Estratégico da Indústria 2013-2022, a entidade vai elaborar 43 projetos em dez áreas, como educação para o trabalho, desburocratização tributária e gestão fiscal.
O chamado Geraldo Alckmin (PSDB) vai reunir seu secretariado na quarta-feira para cobrar números do programa de corte de gastos do governo. Quer anunciar um balanço, em oposição às denúncias sobre a ação do cartel no Metrô e na CPTM.
Blindado A base do governo na Assembleia articula para que o Conselho de Ética abra procedimento contra o deputado licenciado Simão Pedro (PT) e apure suposta interferência política no acordo entre a Siemens e o Cade.
Divã O deputado Walter Feldman (PSB-SP) telefonou para Marina Silva ao ser informado sobre documento que relatava "relação muito próxima" com um lobista, o que ele nega. Disse que ela prestou solidariedade e "em momento nenhum manifestou qualquer preocupação".
Abraço partido Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Jair Bolsonaro (PP-RJ) trocaram abraços na Câmara durante a semana. Eles foram cobrados a fazer as pazes por colegas após bate-boca em setembro.
Teste... A campanha de Dilma Rousseff tentará reforçar a imagem do Pronatec, programa de ensino técnico do governo federal. A avaliação de aliados é que o projeto pode ser uma das principais bandeiras do governo.
... de DNA Pesquisas do PT, no entanto, indicam que a maioria relaciona os cursos profissionalizantes oferecidos pelo programa com entidades como Sesi e Senai, e não com o governo federal, que investiu R$ 14 bilhões.
Trunfo Pesquisa encomendada pelo PSB mostra que Eduardo Campos salta de 12% para 18% quando Marina é indicada como sua vice e fica à frente de Aécio Neves (PSDB), que vai de 16% a 17% quando José Serra compõe a chapa. Dilma oscila de 43% para 41% quando Michel Temer (PMDB) é apresentado.
No papel Um dos pontos centrais da proposta de governo que Aécio apresentará em dezembro será a redistribuição de poderes da Federação, tema que defendeu na semana passada, em Minas. Os tucanos dizem que o poder hoje é concentrado nas mãos da Presidência, esvaziando governos estaduais.
Curto prazo Dirigentes do PSD afirmam que a adesão do partido ao campo petista tem data de validade. Por enquanto, o plano da sigla é se aproximar de Campos para a eleição presidencial de 2018, quando a legenda projeta uma "virada de página" em relação à gestão do PT.
Segundo plano Na última semana, petistas levaram ao governo seu desconforto com a falta de empenho do Planalto na montagem de palanques para candidaturas estaduais. Para o grupo, o partido está perdendo espaço nas articulações de suas chapas no Rio e em Pernambuco.
com BRUNO BOGHOSSIAN e PAULO GAMA
tiroteio
"Os equívocos na gestão da Petrobras criaram saia justa para o reajuste de combustíveis. O governo agora faz a festa dos especuladores."
DO EX-DEPUTADO LUIZ PAULO VELOZO LUCAS (PSDB-ES), sobre a indefinição do governo a respeito do mecanismo de aumento do diesel e da gasolina.
contraponto
Espelho meu
Enquanto presidia uma sessão esvaziada do Senado, Paulo Paim (PT-RS) decidiu fazer uma brincadeira com a semelhança entre seu nome e o de seu colega de Congresso, o também senador Paulo Davim (PV-RN).
Após um discurso de Alvaro Dias (PSDB-PR), o presidente aproveitou o momento em que chamava o colega para que fizesse sua fala na tribuna:
--Passo a palavra ao nobre senador Paulo Paim. Digo, Paulo Davim! Todos confundem-- disse Paim, rindo.
Davim também sorriu e retribuiu a brincadeira:
--É uma honra ser confundido com V.Exa.
Em reuniões recentes no Palácio do Planalto para discutir o financiamento dos programas de concessões de rodovias e ferrovias, representantes de bancos privados manifestaram preocupação com o impacto de projetos de grande porte nas contas do governo. O setor apontou, em ao menos três encontros, que ainda não tem clareza sobre o custo dessas operações para o Tesouro, que precisará fazer aportes ao BNDES, o que gera incerteza sobre a garantia desses recursos.
Lista... A CNI (Confederação Nacional da Indústria) começou a discutir com as associações setoriais projetos que serão apresentados aos presidenciáveis para aumentar a competitividade do país.
... de pedidos Com base no Mapa Estratégico da Indústria 2013-2022, a entidade vai elaborar 43 projetos em dez áreas, como educação para o trabalho, desburocratização tributária e gestão fiscal.
O chamado Geraldo Alckmin (PSDB) vai reunir seu secretariado na quarta-feira para cobrar números do programa de corte de gastos do governo. Quer anunciar um balanço, em oposição às denúncias sobre a ação do cartel no Metrô e na CPTM.
Blindado A base do governo na Assembleia articula para que o Conselho de Ética abra procedimento contra o deputado licenciado Simão Pedro (PT) e apure suposta interferência política no acordo entre a Siemens e o Cade.
Divã O deputado Walter Feldman (PSB-SP) telefonou para Marina Silva ao ser informado sobre documento que relatava "relação muito próxima" com um lobista, o que ele nega. Disse que ela prestou solidariedade e "em momento nenhum manifestou qualquer preocupação".
Abraço partido Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Jair Bolsonaro (PP-RJ) trocaram abraços na Câmara durante a semana. Eles foram cobrados a fazer as pazes por colegas após bate-boca em setembro.
Teste... A campanha de Dilma Rousseff tentará reforçar a imagem do Pronatec, programa de ensino técnico do governo federal. A avaliação de aliados é que o projeto pode ser uma das principais bandeiras do governo.
... de DNA Pesquisas do PT, no entanto, indicam que a maioria relaciona os cursos profissionalizantes oferecidos pelo programa com entidades como Sesi e Senai, e não com o governo federal, que investiu R$ 14 bilhões.
Trunfo Pesquisa encomendada pelo PSB mostra que Eduardo Campos salta de 12% para 18% quando Marina é indicada como sua vice e fica à frente de Aécio Neves (PSDB), que vai de 16% a 17% quando José Serra compõe a chapa. Dilma oscila de 43% para 41% quando Michel Temer (PMDB) é apresentado.
No papel Um dos pontos centrais da proposta de governo que Aécio apresentará em dezembro será a redistribuição de poderes da Federação, tema que defendeu na semana passada, em Minas. Os tucanos dizem que o poder hoje é concentrado nas mãos da Presidência, esvaziando governos estaduais.
Curto prazo Dirigentes do PSD afirmam que a adesão do partido ao campo petista tem data de validade. Por enquanto, o plano da sigla é se aproximar de Campos para a eleição presidencial de 2018, quando a legenda projeta uma "virada de página" em relação à gestão do PT.
Segundo plano Na última semana, petistas levaram ao governo seu desconforto com a falta de empenho do Planalto na montagem de palanques para candidaturas estaduais. Para o grupo, o partido está perdendo espaço nas articulações de suas chapas no Rio e em Pernambuco.
com BRUNO BOGHOSSIAN e PAULO GAMA
tiroteio
"Os equívocos na gestão da Petrobras criaram saia justa para o reajuste de combustíveis. O governo agora faz a festa dos especuladores."
DO EX-DEPUTADO LUIZ PAULO VELOZO LUCAS (PSDB-ES), sobre a indefinição do governo a respeito do mecanismo de aumento do diesel e da gasolina.
contraponto
Espelho meu
Enquanto presidia uma sessão esvaziada do Senado, Paulo Paim (PT-RS) decidiu fazer uma brincadeira com a semelhança entre seu nome e o de seu colega de Congresso, o também senador Paulo Davim (PV-RN).
Após um discurso de Alvaro Dias (PSDB-PR), o presidente aproveitou o momento em que chamava o colega para que fizesse sua fala na tribuna:
--Passo a palavra ao nobre senador Paulo Paim. Digo, Paulo Davim! Todos confundem-- disse Paim, rindo.
Davim também sorriu e retribuiu a brincadeira:
--É uma honra ser confundido com V.Exa.
MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO
FOLHA DE SP - 25/11
BB e Correios unem-se para explorar outros serviços no Banco Postal
O Banco do Brasil e os Correios anunciam hoje uma joint venture para criar definitivamente o Banco Postal.
O BB já tem uma concessão para atuar nas agências de correios como correspondente bancário, o que restringe a ampliação dos negócios.
Além de serviços de pagamento e recebimento, o BB passará a explorar um leque maior de operações, como seguros, outras linhas de crédito, capitalização, cartões pré pagos e consórcios.
As duas partes assinam o memorando de entendimentos para promover estudos e obter licenças antes de instituir o banco, segundo a coluna apurou.
Não há desembolso financeiro previsto por ora, pois será usada a estrutura atual. As receitas e as despesas serão divididas. A intenção inicial é que BB e Correios tenham participações societárias iguais. A conclusão dos estudos deverá ocorrer no segundo semestre de 2014.
A implantação do novo modelo dependerá da autorização de Banco Central, Cade e ministérios.
Afora melhorar a inclusão bancária, o Banco Postal poderá ajudar a reduzir gastos e desafogar o atendimento no BB, o que tende a elevar a sua produtividade.
Os Correios têm mais de 6 mil agências (sem as franqueadas), número semelhante ao de unidades do BB, que passará a operar também nas franquias. A capilaridade dos Correios é maior. Está em 100% dos municípios. O BB venceu o leilão pelo Postal em 2011, com lance de R$ 2,3 bilhões, e começou a operá-lo em janeiro de 2012.
Expansão de polo tecnológico em MG terá aporte de R$ 480 milhões
O BH-Tec (Parque Tecnológico de Belo Horizonte) irá conceder à iniciativa privada o direito de construir e operar cinco edifícios que serão usados na expansão do local.
As obras irão demandar investimentos estimados em cerca de R$ 480 milhões.
O grupo vencedor da concessão terá de construir os prédios e poderá explorá-los pelo prazo de 30 anos.
"A remuneração [da concessionária] virá dos aluguéis que serão cobrados dos futuras inquilinos", afirma Ronaldo Tadeu Pena, diretor-presidente do parque.
O grupo vencedor será o que propuser o pagamento do maior valor de taxa de outorga, com piso fixado em R$ 1,7 milhão por ano.
O objetivo da expansão é criar mais espaço para empresas que têm projetos inovadores --hoje são 17 em operação. Só no primeiro dos cinco prédios, a expectativa é que sejam abertas cem novas vagas.
O BH-Tec é quem vai definir as companhias que poderão ser alojadas --70% dos imóveis serão ocupados por grupos de tecnologia.
"Nos 30% restantes do espaço, a concessionária poderá alugar para empresas de apoio, como restaurantes e escritórios de contabilidade."
O parque tem como gestores a UFMG, o governo de Minas, a Prefeitura de Belo Horizonte, a Fiemg (federação das indústrias) e o Sebrae-MG.
VAREJO DESTEMIDO
Depois de criar marcas de sucesso como Workout e Le Lis Blanc --ela permanece apenas como acionista investidora, na holding Restoque-- Traudi Guida afirma que o varejo de moda está muito difícil.
"Está todo mundo com medo, mas em época de crise tem de ser arrojado para que o consumidor se apaixone. As vitrines estão uma pobreza", diz ela.
Em sociedade com o filho Bento Guida (que trabalhou no mercado financeiro), Traudi acaba de fundar a SouQ, uma loja de presentes inspirada em outros mercados, os árabes, onde se vende de tudo um pouco.
"Tem pipoca, acessórios femininos, de decoração, papelaria... uma pincelada de moda, só 10%. Você pode entrar só para ver e sair com presentes para amigos ou para você mesma."
São mais de mil itens selecionados por Traudi e "infelizmente" importados, frisa a empresária. "Os artigos nacionais estão caros e ruins", lamenta. Os preços vão de R$ 2 a R$ 2.500 e o ticket médio é de R$ 110.
A expectativa é abrir em 2014 até quatro lojas próprias em São Paulo ou em grandes capitais, além da unidade localizada no shopping JK (em SP), segundo Bento. O investimento inicial foi de R$ 6 milhões.
"É um negócio novo, mas nosso ideal é terminar 2015 com dez pontos de venda."
Unimed de SP assume gestão de hospital no interior
A Unimed Paulistana, operadora de saúde que atua na região metropolitana de São Paulo, assumiu a gestão do Hospital Mantiqueira, no município de Bragança Paulista. A unidade hospitalar pertence à Unimed Bragança.
O negócio não envolveu valores, segundo a cooperativa da capital paulista, mas poderá resultar em uma fusão entre os grupos no futuro.
"A operadora local não vinha conseguindo manter o uso total da unidade", afirma Paulo José Leme de Barros, presidente da Unimed Paulistana.
O hospital tem 75 leitos, mas hoje funciona com apenas 25% de sua capacidade.
Com o acordo, o grupo paulistano vai atender clientes próprios no local, mas também manterá o recebimento de pacientes que possuem o plano de saúde do município.
"Para nós é um negócio estratégico porque já temos aproximadamente 20 mil usuários na região de Bragança Paulista", diz Barros.
Ao todo, a operadora de saúde tem 850 mil clientes, segundo o presidente.
Além do atendimento aos conveniados, o hospital deverá firmar contratos com prefeituras da região para o recebimento de pacientes do sistema público de saúde.
DE OLHO NO QUINTAL
Quase oito em cada dez brasileiros dizem concordar que, dada a situação atual da economia do país, o governo precisa se concentrar menos no mundo e mais em questões domésticas, segundo pesquisa feita pela Ipsos.
Do total de entrevistados pela empresa no Brasil, 77% defenderam essa atitude. O percentual ficou próximo da média global, de 78% dos ouvidos em 23 países.
África do Sul, Hungria e Estados Unidos tiveram os maiores índices: 91%, 88% e 88%, respectivamente.
Na outra ponta, Suécia (44%) e Alemanha (68%) apresentaram os percentuais mais baixos dos que consideram que temas internos devem ser priorizados.
A maioria dos entrevistados no mundo (79%), no entanto, afirma que os países devem ajudar outras localidades que enfrentam dificuldades, tais como fome ou desastres naturais.
No Brasil, a parcela dos que disseram concordar com o auxílio foi de 82%.
Foram entrevistadas para o estudo 18.083 pessoas, das quais cerca de mil brasileiros, entre 1º e 15 de outubro.
BB e Correios unem-se para explorar outros serviços no Banco Postal
O Banco do Brasil e os Correios anunciam hoje uma joint venture para criar definitivamente o Banco Postal.
O BB já tem uma concessão para atuar nas agências de correios como correspondente bancário, o que restringe a ampliação dos negócios.
Além de serviços de pagamento e recebimento, o BB passará a explorar um leque maior de operações, como seguros, outras linhas de crédito, capitalização, cartões pré pagos e consórcios.
As duas partes assinam o memorando de entendimentos para promover estudos e obter licenças antes de instituir o banco, segundo a coluna apurou.
Não há desembolso financeiro previsto por ora, pois será usada a estrutura atual. As receitas e as despesas serão divididas. A intenção inicial é que BB e Correios tenham participações societárias iguais. A conclusão dos estudos deverá ocorrer no segundo semestre de 2014.
A implantação do novo modelo dependerá da autorização de Banco Central, Cade e ministérios.
Afora melhorar a inclusão bancária, o Banco Postal poderá ajudar a reduzir gastos e desafogar o atendimento no BB, o que tende a elevar a sua produtividade.
Os Correios têm mais de 6 mil agências (sem as franqueadas), número semelhante ao de unidades do BB, que passará a operar também nas franquias. A capilaridade dos Correios é maior. Está em 100% dos municípios. O BB venceu o leilão pelo Postal em 2011, com lance de R$ 2,3 bilhões, e começou a operá-lo em janeiro de 2012.
Expansão de polo tecnológico em MG terá aporte de R$ 480 milhões
O BH-Tec (Parque Tecnológico de Belo Horizonte) irá conceder à iniciativa privada o direito de construir e operar cinco edifícios que serão usados na expansão do local.
As obras irão demandar investimentos estimados em cerca de R$ 480 milhões.
O grupo vencedor da concessão terá de construir os prédios e poderá explorá-los pelo prazo de 30 anos.
"A remuneração [da concessionária] virá dos aluguéis que serão cobrados dos futuras inquilinos", afirma Ronaldo Tadeu Pena, diretor-presidente do parque.
O grupo vencedor será o que propuser o pagamento do maior valor de taxa de outorga, com piso fixado em R$ 1,7 milhão por ano.
O objetivo da expansão é criar mais espaço para empresas que têm projetos inovadores --hoje são 17 em operação. Só no primeiro dos cinco prédios, a expectativa é que sejam abertas cem novas vagas.
O BH-Tec é quem vai definir as companhias que poderão ser alojadas --70% dos imóveis serão ocupados por grupos de tecnologia.
"Nos 30% restantes do espaço, a concessionária poderá alugar para empresas de apoio, como restaurantes e escritórios de contabilidade."
O parque tem como gestores a UFMG, o governo de Minas, a Prefeitura de Belo Horizonte, a Fiemg (federação das indústrias) e o Sebrae-MG.
VAREJO DESTEMIDO
Depois de criar marcas de sucesso como Workout e Le Lis Blanc --ela permanece apenas como acionista investidora, na holding Restoque-- Traudi Guida afirma que o varejo de moda está muito difícil.
"Está todo mundo com medo, mas em época de crise tem de ser arrojado para que o consumidor se apaixone. As vitrines estão uma pobreza", diz ela.
Em sociedade com o filho Bento Guida (que trabalhou no mercado financeiro), Traudi acaba de fundar a SouQ, uma loja de presentes inspirada em outros mercados, os árabes, onde se vende de tudo um pouco.
"Tem pipoca, acessórios femininos, de decoração, papelaria... uma pincelada de moda, só 10%. Você pode entrar só para ver e sair com presentes para amigos ou para você mesma."
São mais de mil itens selecionados por Traudi e "infelizmente" importados, frisa a empresária. "Os artigos nacionais estão caros e ruins", lamenta. Os preços vão de R$ 2 a R$ 2.500 e o ticket médio é de R$ 110.
A expectativa é abrir em 2014 até quatro lojas próprias em São Paulo ou em grandes capitais, além da unidade localizada no shopping JK (em SP), segundo Bento. O investimento inicial foi de R$ 6 milhões.
"É um negócio novo, mas nosso ideal é terminar 2015 com dez pontos de venda."
Unimed de SP assume gestão de hospital no interior
A Unimed Paulistana, operadora de saúde que atua na região metropolitana de São Paulo, assumiu a gestão do Hospital Mantiqueira, no município de Bragança Paulista. A unidade hospitalar pertence à Unimed Bragança.
O negócio não envolveu valores, segundo a cooperativa da capital paulista, mas poderá resultar em uma fusão entre os grupos no futuro.
"A operadora local não vinha conseguindo manter o uso total da unidade", afirma Paulo José Leme de Barros, presidente da Unimed Paulistana.
O hospital tem 75 leitos, mas hoje funciona com apenas 25% de sua capacidade.
Com o acordo, o grupo paulistano vai atender clientes próprios no local, mas também manterá o recebimento de pacientes que possuem o plano de saúde do município.
"Para nós é um negócio estratégico porque já temos aproximadamente 20 mil usuários na região de Bragança Paulista", diz Barros.
Ao todo, a operadora de saúde tem 850 mil clientes, segundo o presidente.
Além do atendimento aos conveniados, o hospital deverá firmar contratos com prefeituras da região para o recebimento de pacientes do sistema público de saúde.
DE OLHO NO QUINTAL
Quase oito em cada dez brasileiros dizem concordar que, dada a situação atual da economia do país, o governo precisa se concentrar menos no mundo e mais em questões domésticas, segundo pesquisa feita pela Ipsos.
Do total de entrevistados pela empresa no Brasil, 77% defenderam essa atitude. O percentual ficou próximo da média global, de 78% dos ouvidos em 23 países.
África do Sul, Hungria e Estados Unidos tiveram os maiores índices: 91%, 88% e 88%, respectivamente.
Na outra ponta, Suécia (44%) e Alemanha (68%) apresentaram os percentuais mais baixos dos que consideram que temas internos devem ser priorizados.
A maioria dos entrevistados no mundo (79%), no entanto, afirma que os países devem ajudar outras localidades que enfrentam dificuldades, tais como fome ou desastres naturais.
No Brasil, a parcela dos que disseram concordar com o auxílio foi de 82%.
Foram entrevistadas para o estudo 18.083 pessoas, das quais cerca de mil brasileiros, entre 1º e 15 de outubro.
Diplomacia desorientada - MARCELO COUTINHO
O GLOBO - 25/11
Pouco conseguimos além de alguns cargos em organismos internacionais desvalorizados. A política de prestígio produziu um retrocesso de meio século
Apolítica externa brasileira mudou de ministro duas vezes nos últimos três anos, mas não encontrou ainda uma direção. Já são mais de cinco anos sem um projeto consistente com o Brasil. A crise global de 2008 desorientou a nossa diplomacia.
Lula deu continuidade à política de cooperação iniciada por Fernando Henrique na reunião dos presidentes sul-americanos no ano 2000, porém, com mais ênfase nos aspectos políticos do que no comércio. A política externa se tornou leniente com a vizinhança, que voltou a ter focos de instabilidade.
Quando surgiram os Brics, tornamos secundária nossa própria região. A China virou prioridade. Coincidência ou não, passamos a adotar uma política antidireitos humanos no mundo, sempre ao lado das ditaduras.
Pouco conseguimos além de alguns cargos em organismos internacionais desvalorizados. A política de prestígio produziu um retrocesso de meio século na diversidade econômica das nossas relações internacionais. A qualidade das exportações brasileiras hoje é similar ao que tínhamos no Pós-Segunda Guerra.
Por sua vez, o antigo projeto de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU nunca esteve tão distante. Sequer somos membros temporários, e tudo indica que continuaremos fora nos próximos anos. Há décadas isso também não acontecia.
Não se sabe ao certo em nome de que o governo abdicou de tais projetos. Certamente, não foi porque aderiu a projetos mais compatíveis com o século XXI, pois temos a pior política externa dos direitos humanos desde o regime militar.
O argumento de que fechamos os olhos para ditaduras em países parceiros porque realizamos negócios é muito frequente. A África é sempre lembrada. De fato, cresceu muito o comércio com essa região (R$ 26 bi em 2012). No entanto, aumentou principalmente entre países mais democráticos como a África do Sul.
Só no primeiro semestre de 2013, o governo brasileiro perdoou 900 milhões de dólares em dívidas de meia dúzia de países africanos, o que supera em quase 300 milhões a soma de tudo que exportamos a eles. Não foi solidariedade. Sem esse perdão, por norma, o BNDES não teria como apoiar novos investimentos brasileiros nesses lugares.
O mais sensato seria flexibilizar o ordenamento legal no Brasil que impede empresas brasileiras de continuarem exportando serviços a crédito. Sairia bem mais barato do que simplesmente perdoar dívidas de países que estão crescendo.
O motivo de perdoar tantas dívidas e misturar assuntos diferentes foi a campanha pela Direção Geral da OMC. Dívidas perdoadas por votos. E aí também nos metemos em uma cilada. Se Roberto Azevedo for bem-sucedido, conseguirá destravar a Rodada Doha que vai nos tornar ainda mais dependentes da venda de produtos básicos. Se fracassar, isso significa que desperdiçou uma montanha de recursos diplomáticos movidos pelo Brasil.
Atualmente, não temos nem mesmo uma diplomacia presidencial, iniciada por Sarney e bastante desenvolvida por FHC e Lula. Seguimos em ziguezague o fluxo dos ventos, sem propósito, estratégia ou entusiasmo.
Pouco conseguimos além de alguns cargos em organismos internacionais desvalorizados. A política de prestígio produziu um retrocesso de meio século
Apolítica externa brasileira mudou de ministro duas vezes nos últimos três anos, mas não encontrou ainda uma direção. Já são mais de cinco anos sem um projeto consistente com o Brasil. A crise global de 2008 desorientou a nossa diplomacia.
Lula deu continuidade à política de cooperação iniciada por Fernando Henrique na reunião dos presidentes sul-americanos no ano 2000, porém, com mais ênfase nos aspectos políticos do que no comércio. A política externa se tornou leniente com a vizinhança, que voltou a ter focos de instabilidade.
Quando surgiram os Brics, tornamos secundária nossa própria região. A China virou prioridade. Coincidência ou não, passamos a adotar uma política antidireitos humanos no mundo, sempre ao lado das ditaduras.
Pouco conseguimos além de alguns cargos em organismos internacionais desvalorizados. A política de prestígio produziu um retrocesso de meio século na diversidade econômica das nossas relações internacionais. A qualidade das exportações brasileiras hoje é similar ao que tínhamos no Pós-Segunda Guerra.
Por sua vez, o antigo projeto de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU nunca esteve tão distante. Sequer somos membros temporários, e tudo indica que continuaremos fora nos próximos anos. Há décadas isso também não acontecia.
Não se sabe ao certo em nome de que o governo abdicou de tais projetos. Certamente, não foi porque aderiu a projetos mais compatíveis com o século XXI, pois temos a pior política externa dos direitos humanos desde o regime militar.
O argumento de que fechamos os olhos para ditaduras em países parceiros porque realizamos negócios é muito frequente. A África é sempre lembrada. De fato, cresceu muito o comércio com essa região (R$ 26 bi em 2012). No entanto, aumentou principalmente entre países mais democráticos como a África do Sul.
Só no primeiro semestre de 2013, o governo brasileiro perdoou 900 milhões de dólares em dívidas de meia dúzia de países africanos, o que supera em quase 300 milhões a soma de tudo que exportamos a eles. Não foi solidariedade. Sem esse perdão, por norma, o BNDES não teria como apoiar novos investimentos brasileiros nesses lugares.
O mais sensato seria flexibilizar o ordenamento legal no Brasil que impede empresas brasileiras de continuarem exportando serviços a crédito. Sairia bem mais barato do que simplesmente perdoar dívidas de países que estão crescendo.
O motivo de perdoar tantas dívidas e misturar assuntos diferentes foi a campanha pela Direção Geral da OMC. Dívidas perdoadas por votos. E aí também nos metemos em uma cilada. Se Roberto Azevedo for bem-sucedido, conseguirá destravar a Rodada Doha que vai nos tornar ainda mais dependentes da venda de produtos básicos. Se fracassar, isso significa que desperdiçou uma montanha de recursos diplomáticos movidos pelo Brasil.
Atualmente, não temos nem mesmo uma diplomacia presidencial, iniciada por Sarney e bastante desenvolvida por FHC e Lula. Seguimos em ziguezague o fluxo dos ventos, sem propósito, estratégia ou entusiasmo.
Caracas, Teerã - VINICIUS MOTA
FOLHA DE SP - 25/11
SÃO PAULO - Não é trivial governar uma sociedade populosa cuja renda provenha sobretudo da exploração de um só produto. O bem-estar das pessoas condiciona-se a quanto as outras nações pagam pela mercadoria ali abundante. Fica sujeito a variações colossais e repentinas.
A face política da economia circunscrita a uma atividade costuma ser governo forte e centralizador. De sua atuação depende decisivamente a distribuição da renda, originada de modo concentrado.
A regra vale menos para países pouco habitados, na comparação com sua riqueza territorial. Mas duplique, leitor, a população do organizado Chile, menor que a da Grande São Paulo, troque o cobre pelo petróleo e terá ideia do problema da Venezuela. Dobre de novo o número de habitantes e chegará perto do desafio do Irã.
Teerã e Caracas vivem hoje a ressaca deixada pelo fim de uma década de bonança na cotação do petróleo. A renda do petróleo não compra mais a quantidade de bens e serviços suficiente para manter o progresso material da sociedade.
Os governos fazem o que podem para mitigar o empobrecimento relativo da população, o que parece inevitável. Ampliam gastos e dívida, manipulam a moeda local e saqueiam as receitas das estatais petrolíferas.
Mas podem pouco. O PIB se desacelera, e os preços ao consumidor arrancam. O custo de vida sobe 40% ao ano. No Irã, o boicote internacional agrava o desabastecimento interno. Na Venezuela, os decretos para baixar preços o vão exacerbar.
Ao Irã ainda restam a moeda de seu programa nuclear --cuja desaceleração temporária acaba de pactuar com o Ocidente-- e o enraizamento do regime islâmico. A Venezuela não tem nada disso.
O Brasil se prepare para uma crise no vizinho. O socialismo começa com discursos gloriosos e braços erguidos, mas acaba em filas e penúria econômica.
SÃO PAULO - Não é trivial governar uma sociedade populosa cuja renda provenha sobretudo da exploração de um só produto. O bem-estar das pessoas condiciona-se a quanto as outras nações pagam pela mercadoria ali abundante. Fica sujeito a variações colossais e repentinas.
A face política da economia circunscrita a uma atividade costuma ser governo forte e centralizador. De sua atuação depende decisivamente a distribuição da renda, originada de modo concentrado.
A regra vale menos para países pouco habitados, na comparação com sua riqueza territorial. Mas duplique, leitor, a população do organizado Chile, menor que a da Grande São Paulo, troque o cobre pelo petróleo e terá ideia do problema da Venezuela. Dobre de novo o número de habitantes e chegará perto do desafio do Irã.
Teerã e Caracas vivem hoje a ressaca deixada pelo fim de uma década de bonança na cotação do petróleo. A renda do petróleo não compra mais a quantidade de bens e serviços suficiente para manter o progresso material da sociedade.
Os governos fazem o que podem para mitigar o empobrecimento relativo da população, o que parece inevitável. Ampliam gastos e dívida, manipulam a moeda local e saqueiam as receitas das estatais petrolíferas.
Mas podem pouco. O PIB se desacelera, e os preços ao consumidor arrancam. O custo de vida sobe 40% ao ano. No Irã, o boicote internacional agrava o desabastecimento interno. Na Venezuela, os decretos para baixar preços o vão exacerbar.
Ao Irã ainda restam a moeda de seu programa nuclear --cuja desaceleração temporária acaba de pactuar com o Ocidente-- e o enraizamento do regime islâmico. A Venezuela não tem nada disso.
O Brasil se prepare para uma crise no vizinho. O socialismo começa com discursos gloriosos e braços erguidos, mas acaba em filas e penúria econômica.
Brasil atrita com EUA e namora a China - SERGIO LEO
VALOR ECONÔMICO - 25/11
Dilma ordenou informações detalhadas sobre o recente 13º Congresso do Partido Comunista Chinês, que estabeleceu os rumos da presidência de Xi Jinping e da estratégia para reformar o sistema econômico da China, redimensionar o aparato estatal e converter-se, de máquina exportadora, em um país estimulado pelo crescente mercado interno. É enorme a expectativa no Planalto em relação à visita de Estado que Xi Jinping fará ao Brasil, em abril.
O interesse de Dilma tem menos a ver com o claro desgaste na relação com os americanos que com o encanto, no Planalto, em relação aos chineses. Eles entraram pesadamente no leilão das reservas de petróleo no campo de Libra e encorajam sonhos palacianos de que voltarão, importantes, na futura licitação de ferrovias e outros investimentos de infraestrutura no Brasil. Dos EUA, Dilma espera até hoje deferência igual à recebida por Angela Merkel, a quem pediram desculpas e prometeram mudanças, após lhe grampearem o telefone.
No caso da OMC, o Brasil foi vitorioso no processo contra subsídios ilegais dos EUA aos produtores de algodão; e ganhou o direito de ver eliminada essa ajuda desleal ao produto americano. Enquanto não retiram os subsídios, os EUA se comprometeram a financiar pesquisas do Instituto do Algodão brasileiro, caso contrário seriam sujeitos à retaliação.
O Congresso, lá, não garante que vá cortar os subsídios na lei agrícola que deve votar em breve. E o Executivo, pressionado pela demanda dos radicais da oposição por corte profundo de gastos, não incluiu o dinheiro devido ao Brasil, no próximo orçamento. Pior: há dois meses não paga o que deveria.
A Camex decide, na quarta-feira, a punição contra produtos americanos. A OMC autoriza o Brasil a incluir, na retaliação, até a suspensão de patentes e outros direitos de propriedade intelectual de firmas do país, como a Monsanto, a Cargill, a Disney ou laboratórios farmacêuticos. O governo promete serenidade e tratamento técnico, não político, ao caso. Mas cogita bloquear pagamentos de royalties das filiais às matrizes americanas. Tem a compreensão de grandes empresários americanos que assistem alarmados à inação da Casa Branca.
"É imperativo que os EUA cumpram o acordo [com o Brasil] para evitar sanções custosas e destruidoras de emprego contra industriais, ruralistas e inovadores americanos", alertou, na quinta-feira, o presidente da Câmara de Comércio dos EUA, Tom Donahue, em carta ao presidente Barack Obama, criticando o secretário de Agricultura dos EUA por ter dito, em visita ao Brasil, não ter como pagar o que prometeu na OMC. A visita antecedeu a crise diplomática com a espionagem americana.
Os produtores de algodão contrataram a consultoria do ex-secretário de Comércio Exterior, Welber Barral que, há dias, coordena, intenso lobby, em Brasília. Para a associação do setor, a Abrapa, o melhor instrumento de pressão sobre os EUA é a ameaça de retaliação, no atrativo mercado brasileiro, contra influentes detentores e direitos de propriedade intelectual americanos. Outra medida cogitada, com apoio do setor, é aumento da tarifa de importação do trigo americano.
"Ganhamos o caso em 2008, os EUA empurram com a barriga, e ainda romperam o acordo unilateralmente", reclamou, na sexta-feira, o presidente da Abrapa, em romaria por gabinetes ministeriais. "Se não fizermos nada o Brasil e a OMC ficarão desmoralizados". Ele prevê retaliação contra as multinacionais dos EUA que atuam na agricultura. "Infelizmente alguns parceiros nossos, do agronegócio, serão prejudicados."
A Confederação Nacional da Indústria (CNI), que recentemente cobrou do governo esforços para um acordo de livre comércio com os EUA, avalia que o Brasil terá de retaliar. "O Brasil foi até compreensivo quando os EUA pararam de pagar, mudou a interpretação legal para dar mais prazo, mas os EUA não corresponderam", diz o gerente-executivo de Comércio Exterior da CNI, Diego Bonomo. Ele não vê influência da questão da espionagem no impasse. "O caso ficou refém da briga entre Executivo e Legislativo nos EUA", acredita. "A Casa Branca deve culpar o Congresso pelo problema."
Esse caso raro, de atrito provocado por algodão, agrava o momento de grande irritação com Brasília, em Washington, especialmente depois que Shannon, um dos maiores defensores da importância do Brasil para os EUA, recebeu, como despedida, um almoço sem presença de ministro ou secretário-geral, e um brinde no qual, em vez de menções à sua atuação simpática ao Brasil, ouviu uma extensa bronca pelo caso da espionagem. Diplomatas estrangeiros, no almoço, ficaram chocados com o tom do discurso, hostil a um diplomata de peso, hoje assessor direto do secretário do Departamento de Estado John Kerry.
Dilma, em reuniões privadas, até elogia Shannon, mas o governo decidiu que ele não merecia gestos públicos de carinho após o telegrama, vazado pelo ex-agente Edward Snowden, em que o ex-embaixador agradece a providencial ajuda da NSA na primeira Cúpula das Américas com Barack Obama - embora não se saiba se houve grampo nos dados fornecidos pela agência de inteligência, cuja função é municiar o governo de informações estratégicas.
Seria bom contar com a ajuda de Shannon nessa hora.
O encontro de mundos paralelos - LUÍS EDUARDO ASSIS
O Estado de S.Paulo - 25/11
A economia anda tão devagar que deu tempo para que os economistas a alcançassem com um diagnóstico que é quase consensual.
As condições internacionais já não são favoráveis e o descaso que tivemos no passado com mudanças estruturais cobra agora o seu preço. A inflação vem sendo pressionada pelo fim do dólar barato e pela liberação de preços represados, ao passo que os investimentos empacam, à mercê das incertezas da política econômica e da dificuldade do governo em lidar com as concessões. Os juros sobem e a expansão do produto é medíocre. Com o crescimento estimado de 2,5% agora, em 2013, o aumento médio anual na gestão Dilma Rousseff ficará em 2%, exatamente metade do registrado no mandato do presidente Lula. Na área externa, o déficit em transações correntes já é o pior da história e caminha para fechar o ano perto de US$ 85 bilhões. Não há crise nem expectativa de uma ruptura purgativa. Apenas a mesmice de uma economia semiestagnada, que nos faz tatear lentamente por um labirinto escuro.
Ainda assim, o governo parece se confundir com duas perspectivas distintas para a realidade da economia.
De um lado, nutre esforçado desprezo, quase asco, pela visão dos analistas de mercado que se comprazem em enumerar os múltiplos equívocos da política econômica dos últimos anos.
Não há dúvida de que vários desses palpiteiros se comportam como o torcedor furioso que tem certeza de que não teria perdido o gol que o craque desperdiçou - como se tudo fosse trivial. Um analista de investimentos americano, por exemplo, criticou a política brasileira em entrevista ao Wall Street Journal por ser "muito confusa". Como assim, cara-pálida? Por acaso é fácil entender o sistema eleitoral dos Estados Unidos ou como um governo para de operar por falta de acordo entre as lideranças do Congresso?
Há muito de caricatura na visão que se tem do exterior. Muitas vezes, não há tempo nem disposição para uma análise mais aprofundada. Não é difícil de encontrar entre os analistas internacionais quem acredite que o Brasil tem uma economia baseada em commodities, o que é erro crasso. Mas essa crença simplifica o diagnóstico, torna a história mais saborosa e, melhor de tudo, funciona, já que acaba se transformando numa profecia autorrealizável.
O equívoco do governo, no entanto, é não perceber que este é um jogo de espelhos e não vale a pena dizer que não brinca. O mercado não tem ideologia, não tem sequer caráter. Para quem realmente decide - pessoas que não assinam relatórios nem dão entrevistas -, ser feliz é apenas estar "long", quando o mercado sobe, e "short", quando ele cai (e, parafraseando Fernando Pessoa, nunca ao contrário).
Em que pese a superficialidade da avaliação, no entanto, é contraproducente desqualificar a análise econômica feita pelo mercado financeiro, até porque não pairam dúvidas sobre a insuficiência da política fiscal, núcleo duro da perda de credibilidade que contamina a imagem que projetamos no mundo.
A segunda perspectiva, que encanta e seduz, se apoia na suposição de que o crescimento do PIB é uma medida insatisfatória das condições econômicas e mais vale prestar atenção às boas notícias que nos trazem a baixíssima taxa de desemprego (5,4%, menos da metade dos 11,2% registrados quando da ascensão do PT) e o aumento da massa salarial (10,5% anualizados em agosto último, ganhando com folga da inflação). Nessa vertente, o que importa é a sensação de bem-estar da camada mais pobre da população, alheia aos meneios de economistas agourentos. Uma ideia assemelhada à substituição da mensuração do PIB pela FIB, a Felicidade Interna Bruta, proposta estrambótica posta em prática pelo rei do Butão, país cujo PIB é um sétimo da multa a ser paga pelo JP Morgan pela venda de derivativos de hipotecas subprime e onde a mortalidade infantil é 2,8 vezes maior do que no Brasil.
Se há emprego e o salário sobe, é o que basta, pensa o governo - o que parece ser confirmado pelas pesquisas de opinião que colocam a presidente Dilma em posição bastante confortável, malgrado o derrotismo do mercado financeiro. Aqui o perigo é o analista oficial ser vítima do conhecido viés da confirmação, uma tendência a filtrar informações que supostamente atestem a veracidade da versão que mais lhe interessa, descartando todos os outros dados que contrariem a sua tese.
Tempo. O tempo se encarregará de conciliar esses dois mundos paralelos. Além dos preconceitos do analista internacional preguiçoso e da conveniência do governo em se satisfazer com dados incompletos, há uma realidade inconveniente que se aproxima. A incúria com os indicadores usuais da economia, a começar pelo desempenho nefasto das contas públicas, cobrará logo seu preço.
Há várias conexões entre esses dois mundos. O salário mínimo, por exemplo, assim como as aposentadorias a ele indexadas, deverá ser elevado em algo como 6,4% em 2014, ante 8,8%, em 2013, e 14%, no ano passado. Não há descolamento possível entre essas duas realidades. Não tardará e a mediocridade do PIB contaminará salários e emprego.
Dos Faustos a Dorian Gray, passando por Riobaldo, a literatura está cheia de exemplos de personagens que trocaram um futuro melhor por prazeres momentâneos, um tema que os economistas estudam (com menor inspiração) na teoria das escolhas intertemporais. Do ponto de vista do governo, parece ser preferível garantir a reeleição no curto prazo, mesmo que ao custo de fazer desandar ainda mais as condições de crescimento sustentado. A reeleição pode ser garantida, mas o futuro mostrará que descuidar dos fundamentos que dão suporte ao crescimento econômico no longo prazo é apenas um pacto com o diabo.
A economia anda tão devagar que deu tempo para que os economistas a alcançassem com um diagnóstico que é quase consensual.
As condições internacionais já não são favoráveis e o descaso que tivemos no passado com mudanças estruturais cobra agora o seu preço. A inflação vem sendo pressionada pelo fim do dólar barato e pela liberação de preços represados, ao passo que os investimentos empacam, à mercê das incertezas da política econômica e da dificuldade do governo em lidar com as concessões. Os juros sobem e a expansão do produto é medíocre. Com o crescimento estimado de 2,5% agora, em 2013, o aumento médio anual na gestão Dilma Rousseff ficará em 2%, exatamente metade do registrado no mandato do presidente Lula. Na área externa, o déficit em transações correntes já é o pior da história e caminha para fechar o ano perto de US$ 85 bilhões. Não há crise nem expectativa de uma ruptura purgativa. Apenas a mesmice de uma economia semiestagnada, que nos faz tatear lentamente por um labirinto escuro.
Ainda assim, o governo parece se confundir com duas perspectivas distintas para a realidade da economia.
De um lado, nutre esforçado desprezo, quase asco, pela visão dos analistas de mercado que se comprazem em enumerar os múltiplos equívocos da política econômica dos últimos anos.
Não há dúvida de que vários desses palpiteiros se comportam como o torcedor furioso que tem certeza de que não teria perdido o gol que o craque desperdiçou - como se tudo fosse trivial. Um analista de investimentos americano, por exemplo, criticou a política brasileira em entrevista ao Wall Street Journal por ser "muito confusa". Como assim, cara-pálida? Por acaso é fácil entender o sistema eleitoral dos Estados Unidos ou como um governo para de operar por falta de acordo entre as lideranças do Congresso?
Há muito de caricatura na visão que se tem do exterior. Muitas vezes, não há tempo nem disposição para uma análise mais aprofundada. Não é difícil de encontrar entre os analistas internacionais quem acredite que o Brasil tem uma economia baseada em commodities, o que é erro crasso. Mas essa crença simplifica o diagnóstico, torna a história mais saborosa e, melhor de tudo, funciona, já que acaba se transformando numa profecia autorrealizável.
O equívoco do governo, no entanto, é não perceber que este é um jogo de espelhos e não vale a pena dizer que não brinca. O mercado não tem ideologia, não tem sequer caráter. Para quem realmente decide - pessoas que não assinam relatórios nem dão entrevistas -, ser feliz é apenas estar "long", quando o mercado sobe, e "short", quando ele cai (e, parafraseando Fernando Pessoa, nunca ao contrário).
Em que pese a superficialidade da avaliação, no entanto, é contraproducente desqualificar a análise econômica feita pelo mercado financeiro, até porque não pairam dúvidas sobre a insuficiência da política fiscal, núcleo duro da perda de credibilidade que contamina a imagem que projetamos no mundo.
A segunda perspectiva, que encanta e seduz, se apoia na suposição de que o crescimento do PIB é uma medida insatisfatória das condições econômicas e mais vale prestar atenção às boas notícias que nos trazem a baixíssima taxa de desemprego (5,4%, menos da metade dos 11,2% registrados quando da ascensão do PT) e o aumento da massa salarial (10,5% anualizados em agosto último, ganhando com folga da inflação). Nessa vertente, o que importa é a sensação de bem-estar da camada mais pobre da população, alheia aos meneios de economistas agourentos. Uma ideia assemelhada à substituição da mensuração do PIB pela FIB, a Felicidade Interna Bruta, proposta estrambótica posta em prática pelo rei do Butão, país cujo PIB é um sétimo da multa a ser paga pelo JP Morgan pela venda de derivativos de hipotecas subprime e onde a mortalidade infantil é 2,8 vezes maior do que no Brasil.
Se há emprego e o salário sobe, é o que basta, pensa o governo - o que parece ser confirmado pelas pesquisas de opinião que colocam a presidente Dilma em posição bastante confortável, malgrado o derrotismo do mercado financeiro. Aqui o perigo é o analista oficial ser vítima do conhecido viés da confirmação, uma tendência a filtrar informações que supostamente atestem a veracidade da versão que mais lhe interessa, descartando todos os outros dados que contrariem a sua tese.
Tempo. O tempo se encarregará de conciliar esses dois mundos paralelos. Além dos preconceitos do analista internacional preguiçoso e da conveniência do governo em se satisfazer com dados incompletos, há uma realidade inconveniente que se aproxima. A incúria com os indicadores usuais da economia, a começar pelo desempenho nefasto das contas públicas, cobrará logo seu preço.
Há várias conexões entre esses dois mundos. O salário mínimo, por exemplo, assim como as aposentadorias a ele indexadas, deverá ser elevado em algo como 6,4% em 2014, ante 8,8%, em 2013, e 14%, no ano passado. Não há descolamento possível entre essas duas realidades. Não tardará e a mediocridade do PIB contaminará salários e emprego.
Dos Faustos a Dorian Gray, passando por Riobaldo, a literatura está cheia de exemplos de personagens que trocaram um futuro melhor por prazeres momentâneos, um tema que os economistas estudam (com menor inspiração) na teoria das escolhas intertemporais. Do ponto de vista do governo, parece ser preferível garantir a reeleição no curto prazo, mesmo que ao custo de fazer desandar ainda mais as condições de crescimento sustentado. A reeleição pode ser garantida, mas o futuro mostrará que descuidar dos fundamentos que dão suporte ao crescimento econômico no longo prazo é apenas um pacto com o diabo.
A involução venezuelana - RODRIGO BOTERO MONTOYA
O GLOBO - 25/11
Com os poderes que lhe concede a Lei Habilitante, Maduro poderá tornar realidade o desejo de Chávez de levar o país ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba
O regime bolivariano se debate entre a farsa e o dramatismo heroico. Algumas de suas atuações são hilárias; outras, causam tristeza. As grosserias espetaculares e a retórica explicativa correspondente parecem sair de uma ópera-bufa. Por este motivo, a convulsionada retórica da atualidade venezuelana geralmente traz à mente o que se dizia do decadente Império Austro-Húngaro: “A situação é grave, mas não é séria.”
O presidente Nicolás Maduro anunciou a criação de um vice-ministério ao qual se confiaria a transcedental missão de conseguir a suprema felicidade do povo venezuelano. Semelhante iniciativa burocrática tem sua origem numa tradução inadequada de “the greatest happiness for the greater number” (“a maior felicidade para o maior número de pessoas”), o critério sugerido por Bentham para avaliar as políticas públicas, doutrina que se conhece como utilitarismo. Jeremy Bentham (1748-1832) foi um filósofo britânico de ideias avançadas, que teve grande influência sobre as reformas administrativas do Século XIX. Sua concepção política equivale à antítese da dos ideólogos do socialismo do Século XXI.
As declarações governamentais acerca do caos cambial oferecem um exemplo adicional de incoerência. Enquanto um funcionário afirma que o mercado paralelo de divisas é uma ficção, outro se compromete a pulverizá-lo. A Venezuela administra um sistema de controle de câmbio. O poder de compra da moeda nacional está em queda livre como consequência de um manejo econômico inábil. O mercado paralelo de câmbio reflete a perda da confiança na política do governo. O preço em bolívares de um dólar no mercado paralelo é cerca de dez vezes maior do que estabelece a taxa de câmbio oficial.
A inflação é um problema que escapou ao controle das autoridades. Num mundo em que a tendência dos índices de preços é de queda, a Venezuela registra um ritmo de inflação anual de 54%. A cifra correspondente ao índice de preços dos alimentos é de 70%. É difícil que se possa modificar a situação enquanto persistir a prática de financiar o gasto público descontrolado com emissão monetária.
O governo declarou que o setor privado e a oposição são os causadores da inflação. Como resposta a uma suposta guerra econômica, Maduro pretende controlar os preços por meio da força pública (polícia). Uma cadeia de eletrodomésticos sofreu intervenção manu militari. Com grande aparato, seus estoques têm sido oferecidos à venda com grandes descontos. Os administradores da empresa foram presos.
Uma interpretação benévola deste episódio seria que se trata de uma manobra desesperada para se contrapor ao mal-estar da opinião pública diante do desabastecimento, da carestia e das falhas frequentes no sistema de eletricidade, causas de apagões.
Mas, se Maduro utilizar os poderes que lhe concede a Lei Habilitante para arruinar as empresas e impor um sistema econômico do tipo soviético, estaria tornando realidade o desejo de Hugo Chávez de levar a Venezuela ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba.
Com os poderes que lhe concede a Lei Habilitante, Maduro poderá tornar realidade o desejo de Chávez de levar o país ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba
O regime bolivariano se debate entre a farsa e o dramatismo heroico. Algumas de suas atuações são hilárias; outras, causam tristeza. As grosserias espetaculares e a retórica explicativa correspondente parecem sair de uma ópera-bufa. Por este motivo, a convulsionada retórica da atualidade venezuelana geralmente traz à mente o que se dizia do decadente Império Austro-Húngaro: “A situação é grave, mas não é séria.”
O presidente Nicolás Maduro anunciou a criação de um vice-ministério ao qual se confiaria a transcedental missão de conseguir a suprema felicidade do povo venezuelano. Semelhante iniciativa burocrática tem sua origem numa tradução inadequada de “the greatest happiness for the greater number” (“a maior felicidade para o maior número de pessoas”), o critério sugerido por Bentham para avaliar as políticas públicas, doutrina que se conhece como utilitarismo. Jeremy Bentham (1748-1832) foi um filósofo britânico de ideias avançadas, que teve grande influência sobre as reformas administrativas do Século XIX. Sua concepção política equivale à antítese da dos ideólogos do socialismo do Século XXI.
As declarações governamentais acerca do caos cambial oferecem um exemplo adicional de incoerência. Enquanto um funcionário afirma que o mercado paralelo de divisas é uma ficção, outro se compromete a pulverizá-lo. A Venezuela administra um sistema de controle de câmbio. O poder de compra da moeda nacional está em queda livre como consequência de um manejo econômico inábil. O mercado paralelo de câmbio reflete a perda da confiança na política do governo. O preço em bolívares de um dólar no mercado paralelo é cerca de dez vezes maior do que estabelece a taxa de câmbio oficial.
A inflação é um problema que escapou ao controle das autoridades. Num mundo em que a tendência dos índices de preços é de queda, a Venezuela registra um ritmo de inflação anual de 54%. A cifra correspondente ao índice de preços dos alimentos é de 70%. É difícil que se possa modificar a situação enquanto persistir a prática de financiar o gasto público descontrolado com emissão monetária.
O governo declarou que o setor privado e a oposição são os causadores da inflação. Como resposta a uma suposta guerra econômica, Maduro pretende controlar os preços por meio da força pública (polícia). Uma cadeia de eletrodomésticos sofreu intervenção manu militari. Com grande aparato, seus estoques têm sido oferecidos à venda com grandes descontos. Os administradores da empresa foram presos.
Uma interpretação benévola deste episódio seria que se trata de uma manobra desesperada para se contrapor ao mal-estar da opinião pública diante do desabastecimento, da carestia e das falhas frequentes no sistema de eletricidade, causas de apagões.
Mas, se Maduro utilizar os poderes que lhe concede a Lei Habilitante para arruinar as empresas e impor um sistema econômico do tipo soviético, estaria tornando realidade o desejo de Hugo Chávez de levar a Venezuela ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba.
O Brasil deu certo? - RUBENS RICUPERO
FOLHA DE SP - 25/11
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade brasileira a crença de que "o céu era o limite"
Em Zurique ou Seul ninguém precisa asseverar que a Suíça ou a Coreia do Sul deram certo. A frequência com que se vem fazendo essa afirmação entre nós indica que aumentaram ultimamente as dúvidas, já consideráveis no passado.
Em parte, isso tem a ver com os protestos. Demoliram a ilusão de que o Brasil se tornara um país "normal", no qual as massas não precisavam descer às ruas para suprir falhas das instituições. Outra razão: a economia não cresce, e, um a um, todos os estímulos fracassaram.
Cedo ou tarde se esgotarão os recursos para transferências sociais, inviabilizando continuar a reduzir a pobreza e a desigualdade, acarretando a seguir a inelutável erosão dos ganhos conquistados.
De 1999 a 2012, segundo Mansueto de Almeida, as transferências de renda a famílias representaram a assombrosa porcentagem de 84% da alta da despesa não financeira do governo. A partir de 2003, a proporção superaria 91%! É óbvio não ser possível ir muito além disso.
A contrapartida não é apenas a falta de recursos para investir. Já não haverá dinheiro para mais nada, nem para inevitáveis aumentos de salários de funcionários. Se a expansão de gastos se devesse ao custeio da máquina governamental, conforme alegado por alguns, seria talvez mais fácil obter consenso na sociedade para reagir.
O problema é que num país com consciência de culpa pelo passado de escravidão e injustiça, "transferência social" soa como algo ilimitadamente desejável, do qual jamais se poderá ter o bastante. Não existe no Brasil nem de longe o horror moral que os americanos sentem pelos "entitlements", isto é, as garantias de transferência de dinheiro sem contrapartida.
Depende da liderança política a iniciativa de educar o país a fazer a distinção entre o mais e o menos desejável nas transferências, que vão da Bolsa Família aos benefícios do INSS, da Loas para idosos e doentes, aos mais abusados seguro-desemprego e abono salarial.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade a crença de que "o céu era o limite". Tomou por prova de que o Brasil tinha dado certo para sempre o que não passava do efeito da maré que, ao subir, eleva todos os barcos. Elogiava-se o presidente porque, em seu governo, todos ganhavam e ninguém perdia.
Agora que a maré começou a baixar, não há espaço para que todos ganhem e os conflitos distributivos voltam a aparecer, constituindo um dos elementos dos recentes protestos. Evitar que eles polarizem e radicalizem a sociedade como nos anos 1960 e na Venezuela e Argentina de hoje vai ser o desafio existencial do próximo governo.
Como tudo prenuncia a reeleição de governo que não passou no teste da realidade, alguns concluíram que teremos quatro anos de declínio lento e gradual, na melhor das hipóteses. Esses tentam se proteger como podem. Não é porque o Brasil deu certo que uma em cada dez vendas de imóveis em Nova York tem brasileiro como comprador.
Aos outros resta a esperança de que uma equipe econômica renovada regenere a economia e que de alguma maneira a mesma liderança convença políticos e sociedade a moderar o apetite distributivo.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade brasileira a crença de que "o céu era o limite"
Em Zurique ou Seul ninguém precisa asseverar que a Suíça ou a Coreia do Sul deram certo. A frequência com que se vem fazendo essa afirmação entre nós indica que aumentaram ultimamente as dúvidas, já consideráveis no passado.
Em parte, isso tem a ver com os protestos. Demoliram a ilusão de que o Brasil se tornara um país "normal", no qual as massas não precisavam descer às ruas para suprir falhas das instituições. Outra razão: a economia não cresce, e, um a um, todos os estímulos fracassaram.
Cedo ou tarde se esgotarão os recursos para transferências sociais, inviabilizando continuar a reduzir a pobreza e a desigualdade, acarretando a seguir a inelutável erosão dos ganhos conquistados.
De 1999 a 2012, segundo Mansueto de Almeida, as transferências de renda a famílias representaram a assombrosa porcentagem de 84% da alta da despesa não financeira do governo. A partir de 2003, a proporção superaria 91%! É óbvio não ser possível ir muito além disso.
A contrapartida não é apenas a falta de recursos para investir. Já não haverá dinheiro para mais nada, nem para inevitáveis aumentos de salários de funcionários. Se a expansão de gastos se devesse ao custeio da máquina governamental, conforme alegado por alguns, seria talvez mais fácil obter consenso na sociedade para reagir.
O problema é que num país com consciência de culpa pelo passado de escravidão e injustiça, "transferência social" soa como algo ilimitadamente desejável, do qual jamais se poderá ter o bastante. Não existe no Brasil nem de longe o horror moral que os americanos sentem pelos "entitlements", isto é, as garantias de transferência de dinheiro sem contrapartida.
Depende da liderança política a iniciativa de educar o país a fazer a distinção entre o mais e o menos desejável nas transferências, que vão da Bolsa Família aos benefícios do INSS, da Loas para idosos e doentes, aos mais abusados seguro-desemprego e abono salarial.
Nos anos de fastígio, o governo passou à sociedade a crença de que "o céu era o limite". Tomou por prova de que o Brasil tinha dado certo para sempre o que não passava do efeito da maré que, ao subir, eleva todos os barcos. Elogiava-se o presidente porque, em seu governo, todos ganhavam e ninguém perdia.
Agora que a maré começou a baixar, não há espaço para que todos ganhem e os conflitos distributivos voltam a aparecer, constituindo um dos elementos dos recentes protestos. Evitar que eles polarizem e radicalizem a sociedade como nos anos 1960 e na Venezuela e Argentina de hoje vai ser o desafio existencial do próximo governo.
Como tudo prenuncia a reeleição de governo que não passou no teste da realidade, alguns concluíram que teremos quatro anos de declínio lento e gradual, na melhor das hipóteses. Esses tentam se proteger como podem. Não é porque o Brasil deu certo que uma em cada dez vendas de imóveis em Nova York tem brasileiro como comprador.
Aos outros resta a esperança de que uma equipe econômica renovada regenere a economia e que de alguma maneira a mesma liderança convença políticos e sociedade a moderar o apetite distributivo.
Os grandes temas a debater - RENATO JANINE RIBEIRO
VALOR ECONÔMICO - 25/11
Quais serão os grandes temas da disputa eleitoral, em 2014? De tanto se discutir filiação partidária e minutos no horário eleitoral, acaba-se esquecendo o que considero decisivo: a disputa pela hegemonia. Uma eleição não é só apuração de votos. É a luta pela alma dos cidadãos, na fórmula de Marco Aurélio Nogueira. Se tivéssemos um consenso forte entre os partidos - como no último pleito afirmava Plinio Sampaio, do PSOL, ao acusar Dilma, Serra e Marina de serem farinha de um único saco - apenas discutiríamos qual deles é mais apto a cumprir uma agenda comum. Mas nossa política está dividida. Sustentarei que temos três grandes temas para a sociedade debater; a questão é quais candidatos querem tratar de cada um deles.
O primeiro é o da inclusão social. Está no horizonte há décadas; desde Itamar Franco, os governos agiram nesse rumo. Mas só o governo Lula o inscreveu como política de Estado, como prioridade de governo. A inclusão fez os cem milhões de brasileiros que viviam na grande pobreza ou miséria, em 2005, baixarem em apenas cinco anos para metade desse número. Não acredito que em algum lugar do mundo já tenha havido ascensão social de tantos em tão pouco tempo. Mas esse inegável êxito dos governos petistas não está concluído. Restam dezenas de milhões no patamar mais baixo. O tema continua candente.
O segundo tema é o da corrupção. Aqui temos - infelizmente - um carimbo temático. Quem é pelo governo destaca seu sucesso na inclusão social. Quem é contra ressalta a corrupção. A crítica à corrupção do governo (federal, apenas) é o grande tema da oposição. Se a inclusão social gera apoio ao PT, a corrupção reúne o ódio a ele. Mas não importam nossas simpatias políticas: é um assunto importante. Há corrupção no país, embora não tenhamos indicadores objetivos para saber quem é mais corrupto. E a corrupção desmoraliza a política. Não pode ser tolerada. Foi um grave erro dos petistas relegar esse assunto a um segundo plano na discussão pública. Levou muitos a acreditar que só lhe deram importância enquanto estavam na oposição, virando a casaca mal chegaram ao governo. Não há como deixá-lo de lado.
O terceiro ponto é o que, a meu ver, foi trazido pelas ruas este ano: a exigência de serviços públicos de qualidade. Alguns amigos meus se incomodaram com as manifestações, considerando-as conservadoras. Não concordo, como não concordo com a desqualificação das queixas da classe média. Pagamos impostos para ter educação, saúde, transporte e segurança públicos. Mas estes não têm qualidade. Daí que a classe média pague - uma segunda vez - pelos mesmos serviços: põe os filhos em escolas particulares, paga plano de saúde, compra carro, contrata segurança na rua ou no prédio. Está aí a raiz de seu descontentamento com os impostos e com o governo federal, e não apenas, ou não essencialmente, em ideologias conservadoras. É justo, é necessário, a classe média indignar-se com isso. E sobretudo os pobres, que não podem pagar a mais: nosso maio começou com o clamor por transporte coletivo bom e barato para eles. A questão dos serviços públicos deverá estar na ordem do dia. Sustento que esse é o próximo grande desafio para a democracia brasileira, que foi capaz de conquistar as liberdades (1985), a estabilidade monetária (1994) e avançar significativamente na inclusão social (desde 2003).
Agora, a questão para as eleições: que candidatos, que partidos podem falar de cada um destes assuntos?
O PT continua sendo o melhor para falar em inclusão social, mas Aécio sabe muito bem que precisa disputar nessa área - rompendo com a rejeição de parte de sua base ao Bolsa Família. Seu mote pode ser: completar a inclusão social e ir além das medidas de emergência. Já a corrupção é um tema que o PT hoje subdiscute, enquanto as oposições o hiperdiscutem. Há exageros dos dois lados, mas é improvável que esse tema mude de dono. Quanto à qualidade dos serviços, que deverá logo tornar-se a bola da vez, o PSDB fala mais a respeito. Prometeu inúmeras vezes um choque de gestão (assunto do qual o PT pouco fala), mas é certo que os tucanos não mostram sucessos nesse capítulo. Quanto à Rede + PSB, tem estado omissa sobre os três pontos, o que me deixa cético, hoje, quanto a suas chances eleitorais.
Por ora, a oposição prefere falar aos empresários, não se sabendo ainda o que conseguirá propor ao eleitorado. O governo também corteja o capital, mas fala mais aos eleitores.
Porque nosso sistema eleitoral é curioso. Estamos agora no turno zero, em que os candidatos - sobretudo de oposição - fazem o tour do capital, para granjear apoio e financiamento. Os dois turnos, porém, são junto ao povo, cujas prioridades não são as dos ricos. O PT é o mais popular - embora sem ter maioria absoluta - nas urnas. Mas depois há um terceiro turno, que dura três anos, até as eleições seguintes, e de novo o dinheiro se faz ouvir. Equilibrar demandas sociais justas e o liberalismo inato dos empresários é um grande desafio. Por ora, prevalece a conversa com o dinheiro. Mas em breve os candidatos terão de falar ao povo, e os principais temas devem ser os que apontei.
É uma lástima que na última semana, em vez de discutirmos o futuro do país, tenhamos sido pautados pela questão da vida ou morte do deputado José Genoino. A execução das sentenças dividiria, de qualquer forma, a opinião. Portanto, esse assunto, por ser delicado, deveria ter sido tratado com a delicadeza necessária. Não o foi. O que aconteceu - e o que poderá acontecer - só aumentará o ódio no debate político brasileiro. A campanha se prefigura sombria.
O primeiro é o da inclusão social. Está no horizonte há décadas; desde Itamar Franco, os governos agiram nesse rumo. Mas só o governo Lula o inscreveu como política de Estado, como prioridade de governo. A inclusão fez os cem milhões de brasileiros que viviam na grande pobreza ou miséria, em 2005, baixarem em apenas cinco anos para metade desse número. Não acredito que em algum lugar do mundo já tenha havido ascensão social de tantos em tão pouco tempo. Mas esse inegável êxito dos governos petistas não está concluído. Restam dezenas de milhões no patamar mais baixo. O tema continua candente.
O segundo tema é o da corrupção. Aqui temos - infelizmente - um carimbo temático. Quem é pelo governo destaca seu sucesso na inclusão social. Quem é contra ressalta a corrupção. A crítica à corrupção do governo (federal, apenas) é o grande tema da oposição. Se a inclusão social gera apoio ao PT, a corrupção reúne o ódio a ele. Mas não importam nossas simpatias políticas: é um assunto importante. Há corrupção no país, embora não tenhamos indicadores objetivos para saber quem é mais corrupto. E a corrupção desmoraliza a política. Não pode ser tolerada. Foi um grave erro dos petistas relegar esse assunto a um segundo plano na discussão pública. Levou muitos a acreditar que só lhe deram importância enquanto estavam na oposição, virando a casaca mal chegaram ao governo. Não há como deixá-lo de lado.
O terceiro ponto é o que, a meu ver, foi trazido pelas ruas este ano: a exigência de serviços públicos de qualidade. Alguns amigos meus se incomodaram com as manifestações, considerando-as conservadoras. Não concordo, como não concordo com a desqualificação das queixas da classe média. Pagamos impostos para ter educação, saúde, transporte e segurança públicos. Mas estes não têm qualidade. Daí que a classe média pague - uma segunda vez - pelos mesmos serviços: põe os filhos em escolas particulares, paga plano de saúde, compra carro, contrata segurança na rua ou no prédio. Está aí a raiz de seu descontentamento com os impostos e com o governo federal, e não apenas, ou não essencialmente, em ideologias conservadoras. É justo, é necessário, a classe média indignar-se com isso. E sobretudo os pobres, que não podem pagar a mais: nosso maio começou com o clamor por transporte coletivo bom e barato para eles. A questão dos serviços públicos deverá estar na ordem do dia. Sustento que esse é o próximo grande desafio para a democracia brasileira, que foi capaz de conquistar as liberdades (1985), a estabilidade monetária (1994) e avançar significativamente na inclusão social (desde 2003).
Agora, a questão para as eleições: que candidatos, que partidos podem falar de cada um destes assuntos?
O PT continua sendo o melhor para falar em inclusão social, mas Aécio sabe muito bem que precisa disputar nessa área - rompendo com a rejeição de parte de sua base ao Bolsa Família. Seu mote pode ser: completar a inclusão social e ir além das medidas de emergência. Já a corrupção é um tema que o PT hoje subdiscute, enquanto as oposições o hiperdiscutem. Há exageros dos dois lados, mas é improvável que esse tema mude de dono. Quanto à qualidade dos serviços, que deverá logo tornar-se a bola da vez, o PSDB fala mais a respeito. Prometeu inúmeras vezes um choque de gestão (assunto do qual o PT pouco fala), mas é certo que os tucanos não mostram sucessos nesse capítulo. Quanto à Rede + PSB, tem estado omissa sobre os três pontos, o que me deixa cético, hoje, quanto a suas chances eleitorais.
Por ora, a oposição prefere falar aos empresários, não se sabendo ainda o que conseguirá propor ao eleitorado. O governo também corteja o capital, mas fala mais aos eleitores.
Porque nosso sistema eleitoral é curioso. Estamos agora no turno zero, em que os candidatos - sobretudo de oposição - fazem o tour do capital, para granjear apoio e financiamento. Os dois turnos, porém, são junto ao povo, cujas prioridades não são as dos ricos. O PT é o mais popular - embora sem ter maioria absoluta - nas urnas. Mas depois há um terceiro turno, que dura três anos, até as eleições seguintes, e de novo o dinheiro se faz ouvir. Equilibrar demandas sociais justas e o liberalismo inato dos empresários é um grande desafio. Por ora, prevalece a conversa com o dinheiro. Mas em breve os candidatos terão de falar ao povo, e os principais temas devem ser os que apontei.
É uma lástima que na última semana, em vez de discutirmos o futuro do país, tenhamos sido pautados pela questão da vida ou morte do deputado José Genoino. A execução das sentenças dividiria, de qualquer forma, a opinião. Portanto, esse assunto, por ser delicado, deveria ter sido tratado com a delicadeza necessária. Não o foi. O que aconteceu - e o que poderá acontecer - só aumentará o ódio no debate político brasileiro. A campanha se prefigura sombria.
Desfaçatez - PAULO BROSSARD
ZERO HORA - 25/11
Escrevendo outro dia sobre o mensalão, notei que o processo se estendera por oito anos ou nem tanto, tendo em vista o número de acusados, 38, cada qual com suas peculiaridades, e este dado poderia explicar a aparente demora do feito. O certo é que sua inegável singularidade fez com que o andamento do processo fosse acompanhado pela opinião pública. Se não estou em erro, o resultado foi bem recebido, embora de início um certo ceticismo mareasse a iniciativa, fosse pela gravidade dos fatos articulados, fosse pelo envolvimento neles de algumas personagens; muitas vezes ouvi que terminaria em pizza. No entanto, volto a dizer, a decisão em geral foi bem recebida pela coletividade, tanto que não faltou quem visse nele o sinal de uma nova era, a derrota da corrupção e até seu extermínio. Note-se que dos 38 acusados 25 foram condenados e 12 absolvidos.
Por sua origem e destinação, o caso teve repercussão e ninguém poderia esperar que os acusados pudessem merecer a "legião de honra", no entanto, um dos condenados, em escrito de sua lavra, por ele publicado no dia de sua prisão, permitiu-se asseverar que a Suprema Corte fizera "do caso um julgamento de exceção e político"...
Quando se afirma que "a sentença é espúria", quando se proclama que o Supremo tribunal Federal "fez do caso um julgamento de exceção e político", o fato adquire proporções inauditas e de particular ineditismo, uma vez que os condenados de condenados passam a acusadores e o Poder Judiciário deixa de ser juiz para se converter em vilão, passando a ser alvo da insigne ofensa. A partir daí, começou a ser repetida a qualificação dada pelos condenados da sentença que os condenou. "Julgamento político" passou a ser o chavão. Chamou-me a atenção um grupo de adolescentes portando cartazes nos quais se usava a nódoa do "julgamento político". O ardil empregado pelos condenados revela à evidência as habilidades por eles possuídas, como se a condenação não passasse de uma conduta condenável do Poder Judiciário a isso se reduziria a uma "sentença espúria" e a um "julgamento de exceção".
Muitas considerações poderiam ser articuladas, mas ficarei em uma e das mais singelas, nem por isso menos digna de exame. Basta lembrar que a maioria absoluta do Supremo tribunal, que teria editado "sentença espúria", e que de uma questão judicial teria se convertido em "um julgamento de exceção e político", em sua maioria absoluta, repito, oito em 11, fora nomeada por presidentes do PT. Sem o voto dessa maioria, a Corte não poderia concluir como concluíra, mas nada disso embaraçava a permissividade revelada pelos condenados em envolver o Poder Judiciário. Astuciosamente os condenados cediam o seu lugar ao Supremo tribunal.
Com essa manipulação, membros da quadrilha destinada a manejar gordas quantias para fins ilícitos seriam acobertados sob a designação falaz de julgamento político. Poderia estender-me a respeito, mas acredito haver dito o suficiente para sinalar a felonia assacada por condenados contra a mais eminente Corte de Justiça da nação que os condenou.
Atinge as raias da desfaçatez o desembaraço com que condenados pela Justiça dela escarnecem, rotulando-a de espúria e de exceção.
Por sua origem e destinação, o caso teve repercussão e ninguém poderia esperar que os acusados pudessem merecer a "legião de honra", no entanto, um dos condenados, em escrito de sua lavra, por ele publicado no dia de sua prisão, permitiu-se asseverar que a Suprema Corte fizera "do caso um julgamento de exceção e político"...
Quando se afirma que "a sentença é espúria", quando se proclama que o Supremo tribunal Federal "fez do caso um julgamento de exceção e político", o fato adquire proporções inauditas e de particular ineditismo, uma vez que os condenados de condenados passam a acusadores e o Poder Judiciário deixa de ser juiz para se converter em vilão, passando a ser alvo da insigne ofensa. A partir daí, começou a ser repetida a qualificação dada pelos condenados da sentença que os condenou. "Julgamento político" passou a ser o chavão. Chamou-me a atenção um grupo de adolescentes portando cartazes nos quais se usava a nódoa do "julgamento político". O ardil empregado pelos condenados revela à evidência as habilidades por eles possuídas, como se a condenação não passasse de uma conduta condenável do Poder Judiciário a isso se reduziria a uma "sentença espúria" e a um "julgamento de exceção".
Muitas considerações poderiam ser articuladas, mas ficarei em uma e das mais singelas, nem por isso menos digna de exame. Basta lembrar que a maioria absoluta do Supremo tribunal, que teria editado "sentença espúria", e que de uma questão judicial teria se convertido em "um julgamento de exceção e político", em sua maioria absoluta, repito, oito em 11, fora nomeada por presidentes do PT. Sem o voto dessa maioria, a Corte não poderia concluir como concluíra, mas nada disso embaraçava a permissividade revelada pelos condenados em envolver o Poder Judiciário. Astuciosamente os condenados cediam o seu lugar ao Supremo tribunal.
Com essa manipulação, membros da quadrilha destinada a manejar gordas quantias para fins ilícitos seriam acobertados sob a designação falaz de julgamento político. Poderia estender-me a respeito, mas acredito haver dito o suficiente para sinalar a felonia assacada por condenados contra a mais eminente Corte de Justiça da nação que os condenou.
Atinge as raias da desfaçatez o desembaraço com que condenados pela Justiça dela escarnecem, rotulando-a de espúria e de exceção.
O Brasil na banguela - CARLOS ALBERTO DI FRANCO
O Estado de S.Paulo - 25/11
Armação da imprensa. Distorção da mídia. Patrulhamento de jornalista. Quantas vezes, caro leitor, você registrou essa reação nas páginas dos jornais? Inúmeras, estou certo. Elas estão contidas, frequentemente, em declarações de homens públicos apanhados com a boca na botija, no constrangimento de políticos obsessivamente preocupados com a própria imagem e no destempero de lideranças que pescam nas águas turvas do radicalismo. Todos, independentemente de seu colorido ideológico, procuram um bode expiatório para justificar seus deslizes e malfeitos. A culpa é da imprensa! É preciso partir para o controle social da mídia, eufemismo esgrimido pelos que, no fundo, defendem a censura às empresas de conteúdo independentes.
Sou otimista. Acho que o Brasil é maior que seus problemas. Mas não sou cego. O Brasil está na banguela. Corrupção crescente, educação detonada e gestão pública incompetente, não obstante as lantejoulas do marketing político, começam a apresentar sua inescapável fatura. E a sociedade está acordando. As ruas, em junho deste ano, deram os primeiros recados. A violência black bloc, um desvio condenável e inaceitável dos protestos, precisa ser lida num contexto mais profundo. Há um cansaço do Estado ineficiente, corrupto e cínico. E a coisa não se resolve com discursos na TV, mas com mudanças efetivas.
Corrupção endêmica e percepção social da impunidade compõem o ambiente propício para a instalação de um quadro de desencanto cívico. Alguns, equivocadamente, vislumbram uma relação de causa e efeito entre corrupção e democracia. Outros, perigosamente desmemoriados, têm saudade de um passado autoritário de triste memória. Ambos, reféns do desalento, sinalizam um risco que não deve ser subestimado: a utopia autoritária.
O Brasil tem instituições razoavelmente sólidas, embora parcela significativa da sociedade já comece a questionar a validade de um dos pilares da democracia: o Congresso Nacional. O descrédito generalizado, sobretudo dos parlamentares, captado em inúmeras pesquisas de opinião, é preocupante.
O fisiologismo político é responsável por alianças que são monumentos erguidos à incoerência e ao cinismo. Quando vemos Lula, Dilma, Sarney, Collor e Maluf, só para citar exemplos mais vistosos, no mesmo barco, paira no ar a pergunta óbvia: o que une firmemente aqueles que estiveram em campos tão opostos? Interesse. Só interesse. Os fisiologistas têm carta-branca para gozar as benesses do poder. Os ideológicos, lenientes e tolerantes com o apetite dos fisiológicos, recebem deles o passaporte parlamentar para avançar no seu projeto autoritário.
A arquitetura democrática de fachada recebe a certidão do "habite-se" na força cega dos currais eleitorais. Para um projeto autoritário o que menos interessa é gente educada, gente que pense. Educação de qualidade, nem falemos. O sistema educacional brasileiro é um desastre. Multiplicam-se universidades, mas não se formam cidadãos: homens e mulheres livres, bem formados, capazes de desenvolver seu próprio pensamento, conscientes de seus direitos e de seus deveres. Há, sim, um apagão do espírito crítico. Desaba o Brasil no declive de uma unanimidade que, como dizia Nelson Rodrigues, é sempre perigosamente burra. Nós, jornalistas, precisamos trazer os candidatos para o terreno das verdadeiras discussões. É preciso saber o que farão, não com chavões ou com o brilho do marketing político, mas com propostas concretas em três campos: educação, infraestrutura e ética.
A competitividade global reclama crescentemente gente bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. Como lembrou recente editorial do jornal O Estado de S. Paulo, se "ainda faltasse alguma prova da crise educacional brasileira, o novo relatório da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre a escassez de pessoal para a construção seria mais que suficiente". A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da educação brasileira.
Governos, independentemente de seu colorido partidário, sempre exibem números chamativos. E daí? Educação não é prédio. Muito menos galpão. É muito mais. É projeto pedagógico. É exigência. É liberdade. É humanismo. É aposta na formação do cidadão integral. O Brasil pode morrer na praia. Só a educação de qualidade será capaz de preparar o Brasil para o grande salto. Deixarmos de ser um país fundamentalmente exportador de commodities para entrar, efetivamente, no campo da produção de bens industrializados.
Para isso, no entanto, é preciso menos discurso sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e mais investimento real em infraestrutura. É preciso fazer reportagem. Ir ver o que existe e o que não existe. O que foi feito e o que é só publicidade. Ver e contar. É o nosso papel. É a nossa missão. Nós, jornalistas, sucumbimos com frequência ao declaratório. Registramos, com destaque, a euforia presidencial com o futuro do pré-sal. Mas como andam os projetos reais que separam a propaganda da realidade? É por aí que devemos ir.
Tudo isso, no entanto, reclama o corolário da ética. Rouba-se muito. Muito dinheiro público desaparece no ralo da impunidade. Queixa-se a sociedade da impunidade radical. Seis anos após aceitar a denúncia do mensalão, o Supremo Tribunal Federal determinou a prisão dos principais condenados no esquema de corrupção do governo Lula. Trata-se de uma decisão histórica e de um claro divisor de águas.
Educação, infraestrutura e ética podem mudar o destino do Brasil.
Armação da imprensa. Distorção da mídia. Patrulhamento de jornalista. Quantas vezes, caro leitor, você registrou essa reação nas páginas dos jornais? Inúmeras, estou certo. Elas estão contidas, frequentemente, em declarações de homens públicos apanhados com a boca na botija, no constrangimento de políticos obsessivamente preocupados com a própria imagem e no destempero de lideranças que pescam nas águas turvas do radicalismo. Todos, independentemente de seu colorido ideológico, procuram um bode expiatório para justificar seus deslizes e malfeitos. A culpa é da imprensa! É preciso partir para o controle social da mídia, eufemismo esgrimido pelos que, no fundo, defendem a censura às empresas de conteúdo independentes.
Sou otimista. Acho que o Brasil é maior que seus problemas. Mas não sou cego. O Brasil está na banguela. Corrupção crescente, educação detonada e gestão pública incompetente, não obstante as lantejoulas do marketing político, começam a apresentar sua inescapável fatura. E a sociedade está acordando. As ruas, em junho deste ano, deram os primeiros recados. A violência black bloc, um desvio condenável e inaceitável dos protestos, precisa ser lida num contexto mais profundo. Há um cansaço do Estado ineficiente, corrupto e cínico. E a coisa não se resolve com discursos na TV, mas com mudanças efetivas.
Corrupção endêmica e percepção social da impunidade compõem o ambiente propício para a instalação de um quadro de desencanto cívico. Alguns, equivocadamente, vislumbram uma relação de causa e efeito entre corrupção e democracia. Outros, perigosamente desmemoriados, têm saudade de um passado autoritário de triste memória. Ambos, reféns do desalento, sinalizam um risco que não deve ser subestimado: a utopia autoritária.
O Brasil tem instituições razoavelmente sólidas, embora parcela significativa da sociedade já comece a questionar a validade de um dos pilares da democracia: o Congresso Nacional. O descrédito generalizado, sobretudo dos parlamentares, captado em inúmeras pesquisas de opinião, é preocupante.
O fisiologismo político é responsável por alianças que são monumentos erguidos à incoerência e ao cinismo. Quando vemos Lula, Dilma, Sarney, Collor e Maluf, só para citar exemplos mais vistosos, no mesmo barco, paira no ar a pergunta óbvia: o que une firmemente aqueles que estiveram em campos tão opostos? Interesse. Só interesse. Os fisiologistas têm carta-branca para gozar as benesses do poder. Os ideológicos, lenientes e tolerantes com o apetite dos fisiológicos, recebem deles o passaporte parlamentar para avançar no seu projeto autoritário.
A arquitetura democrática de fachada recebe a certidão do "habite-se" na força cega dos currais eleitorais. Para um projeto autoritário o que menos interessa é gente educada, gente que pense. Educação de qualidade, nem falemos. O sistema educacional brasileiro é um desastre. Multiplicam-se universidades, mas não se formam cidadãos: homens e mulheres livres, bem formados, capazes de desenvolver seu próprio pensamento, conscientes de seus direitos e de seus deveres. Há, sim, um apagão do espírito crítico. Desaba o Brasil no declive de uma unanimidade que, como dizia Nelson Rodrigues, é sempre perigosamente burra. Nós, jornalistas, precisamos trazer os candidatos para o terreno das verdadeiras discussões. É preciso saber o que farão, não com chavões ou com o brilho do marketing político, mas com propostas concretas em três campos: educação, infraestrutura e ética.
A competitividade global reclama crescentemente gente bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. Como lembrou recente editorial do jornal O Estado de S. Paulo, se "ainda faltasse alguma prova da crise educacional brasileira, o novo relatório da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre a escassez de pessoal para a construção seria mais que suficiente". A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da educação brasileira.
Governos, independentemente de seu colorido partidário, sempre exibem números chamativos. E daí? Educação não é prédio. Muito menos galpão. É muito mais. É projeto pedagógico. É exigência. É liberdade. É humanismo. É aposta na formação do cidadão integral. O Brasil pode morrer na praia. Só a educação de qualidade será capaz de preparar o Brasil para o grande salto. Deixarmos de ser um país fundamentalmente exportador de commodities para entrar, efetivamente, no campo da produção de bens industrializados.
Para isso, no entanto, é preciso menos discurso sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e mais investimento real em infraestrutura. É preciso fazer reportagem. Ir ver o que existe e o que não existe. O que foi feito e o que é só publicidade. Ver e contar. É o nosso papel. É a nossa missão. Nós, jornalistas, sucumbimos com frequência ao declaratório. Registramos, com destaque, a euforia presidencial com o futuro do pré-sal. Mas como andam os projetos reais que separam a propaganda da realidade? É por aí que devemos ir.
Tudo isso, no entanto, reclama o corolário da ética. Rouba-se muito. Muito dinheiro público desaparece no ralo da impunidade. Queixa-se a sociedade da impunidade radical. Seis anos após aceitar a denúncia do mensalão, o Supremo Tribunal Federal determinou a prisão dos principais condenados no esquema de corrupção do governo Lula. Trata-se de uma decisão histórica e de um claro divisor de águas.
Educação, infraestrutura e ética podem mudar o destino do Brasil.
Bandeira arriada - VALDO CRUZ
FOLHA DE SP - 25/11
BRASÍLIA - Uma das bandeiras eleitorais da presidente Dilma Rousseff caminha para ser arriada, frustrando sua estratégia de usá-la na campanha da reeleição como uma de suas grandes conquistas.
Falo da meta estabelecida pela petista de derrubar a taxa de juros durante seu mandato. Nesta semana, ela deve voltar à casa dos dois dígitos, batendo em 10% ao ano.
Pior. O cenário de incertezas na economia mundial pode levá-la aos 11% ainda no primeiro semestre do próximo ano, acima dos 10,75% herdados do ex-presidente Lula.
Em outras palavras, Dilma não só falhou no seu objetivo, como pode terminar seu mandato com juros mais altos do que recebeu.
Seu equívoco foi criar uma meta de taxa de juros, quando ela é instrumento para atingir a que de fato importa, a de inflação. Resultado, as duas ficaram comprometidas, quando uma deveria levar à outra.
Dilma poderia ter logrado mais sucesso. Em outubro de 2012, os juros caíram para seu patamar mais baixo, 7,25%. Uma maravilha. Só que se esqueceram da outra ponta, a que poderia sustentá-la.
Depois de um primeiro ano de forte ajuste fiscal, o governo se entregou às manobras contábeis para esconder sua gastança exatamente quando derrubava os juros. Deu no que deu, mais inflação, que forçou o BC a voltar a subir a taxa Selic.
Hoje, o governo busca recuperar a credibilidade perdida na área fiscal para tentar segurar a inflação e reduzir a dose dos juros. Tarefa difícil diante de sua ambiguidade.
Dilma e sua equipe têm até se esforçado para mostrar maior rigor fiscal, mas não assumem publicamente compromisso com uma meta fixa, realista, de economia de gastos para pagamento da dívida pública.
Prometem apenas algo vago ou inatingível. Sinal de que não bancam suas próprias metas. Aí, fica difícil pedir que acreditemos neles. Afinal, discurso não convence mais ninguém. É preciso entregar.
BRASÍLIA - Uma das bandeiras eleitorais da presidente Dilma Rousseff caminha para ser arriada, frustrando sua estratégia de usá-la na campanha da reeleição como uma de suas grandes conquistas.
Falo da meta estabelecida pela petista de derrubar a taxa de juros durante seu mandato. Nesta semana, ela deve voltar à casa dos dois dígitos, batendo em 10% ao ano.
Pior. O cenário de incertezas na economia mundial pode levá-la aos 11% ainda no primeiro semestre do próximo ano, acima dos 10,75% herdados do ex-presidente Lula.
Em outras palavras, Dilma não só falhou no seu objetivo, como pode terminar seu mandato com juros mais altos do que recebeu.
Seu equívoco foi criar uma meta de taxa de juros, quando ela é instrumento para atingir a que de fato importa, a de inflação. Resultado, as duas ficaram comprometidas, quando uma deveria levar à outra.
Dilma poderia ter logrado mais sucesso. Em outubro de 2012, os juros caíram para seu patamar mais baixo, 7,25%. Uma maravilha. Só que se esqueceram da outra ponta, a que poderia sustentá-la.
Depois de um primeiro ano de forte ajuste fiscal, o governo se entregou às manobras contábeis para esconder sua gastança exatamente quando derrubava os juros. Deu no que deu, mais inflação, que forçou o BC a voltar a subir a taxa Selic.
Hoje, o governo busca recuperar a credibilidade perdida na área fiscal para tentar segurar a inflação e reduzir a dose dos juros. Tarefa difícil diante de sua ambiguidade.
Dilma e sua equipe têm até se esforçado para mostrar maior rigor fiscal, mas não assumem publicamente compromisso com uma meta fixa, realista, de economia de gastos para pagamento da dívida pública.
Prometem apenas algo vago ou inatingível. Sinal de que não bancam suas próprias metas. Aí, fica difícil pedir que acreditemos neles. Afinal, discurso não convence mais ninguém. É preciso entregar.
A cor do SUS - LIGIA BAHIA
O GLOBO - 25/11
Basta dizer com convicção que recurso público deveria ser usado para atender o público para ouvir a advertência: “Está querendo nivelar por baixo.” O sentido unívoco da chamada à conservação da ordem é o de que a coexistência entre a alta qualidade e a seleção dos que podem acessá-la é inevitável. É como se o progresso, a excelência, fossem devidos a conquistas pessoais e dedicação dos bons, e cobrassem o sacrifício dos médios e ruins. A transposição desse darwinismo social para a saúde justifica-se pela ideia de que de pouquinho em pouquinho os pobres sobem degraus de acesso a serviços de saúde progressivamente melhores. Mas o padrão assistencial dos ricos, que fica no topo da escada e a todos enche de orgulho, mesmo àqueles que nem em sonho poderão utilizá-lo, não é estático, não fica parado à espera dos passos rápidos ou lentos de melhoria das condições gerais de consumo.
O modelo 3 Cs (cartão de crédito, computador e carro) e outros bens e serviços não vale para a saúde. Sintomas e doenças podem ser agravados pela restrição de assistência ou pelo atendimento medíocre ou ruim. A alta qualidade para poucos combinada com a inferiorização ou invisibilização de grupos humanos trava avanços sociais. Os indígenas, pardos e negros que representam a maioria da população brasileira adoecem mais e morrem antes dos brancos. No entanto, a cor da minoria predomina nos considerados melhores estabelecimentos de saúde, que, não por acaso, são de direito ou de fato privados. Obviamente, o fenômeno não começa nem acaba em hospitais ou clínicas. Bairros, escolas, restaurantes e bares excelentes, nos quais inexiste placa vedando a entrada de todo e qualquer brasileiro, também são monocromáticos. A objeção às inespecificidades dos males do racismo é que a importância do reconhecimento de nossa humanidade comum e de diferenças culturais é condição essencial para conseguir viver a vida agora, já.
Discriminação, preconceito e estigmas são causas objetivas de adoecimento e morte. A mortalidade infantil de negros caiu drasticamente no sul rural após a aprovação da legislação sobre os direitos civis nos EUA em 1964. Mas as desigualdades na saúde entre brancos e negros americanos retornaram aos níveis anteriores nos anos 1980, com as políticas estigmatizantes de aprisionamento e guerra contra as drogas. Estudos recentes da Organização Mundial de Saúde evidenciaram que os diferenciais de depressão entre mulheres e homens são menores em países onde existem políticas de controle dos efeitos deletérios da ideologia de gênero.
Em 2011, quando foi instituído o Dia da Consciência Negra, o Brasil foi condenado pela Organização das Nações Unidas (ONU) por violar direitos humanos de grávidas. O fato que gerou a decisão foi a morte de Alyne Silva Pimentel, de 28 anos, negra, moradora da Baixada Fluminense, que faleceu em 2002, no sexto mês de gestação, por falta de atendimento apropriado pela rede pública. O tempo passou e as desigualdades na saúde não desapareceram. Recentemente, a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial apresentou uma síntese das desvantagens dos negros em relação à saúde. Existe simultaneamente déficit e sobreuso de ações e serviços de saúde pela população negra (mais de 40% das negras nunca realizaram mamografia e 70% dos usuários do SUS são negros). A divulgação de denúncias e estatísticas sobre as desigualdades raciais é um passo essencial para reduzir e superar disparidades não econômicas na saúde. O que ainda não ficou claro no idioma governamental é como continuar a caminhada.
As concepções que consideram que somos iguais apesar das diferenças ou diferentes originam políticas públicas de saúde distintas. A diferença entre as tradições democráticas e liberais não é semântica. Um SUS exclusivamente ou predominantemente negro é uma solução ou um sintoma de discriminação? Os valores culturais que inferiorizam e impedem a paridade de participação na sociedade tais como leis matrimoniais que excluem a união entre pessoas do mesmo sexo, a rotulação de mães solteiras como irresponsáveis e associação entre raça negra e criminalidade afetam a saúde de todos.
Elizabeth Travassos, branca, doutora em antropologia, moradora de um bairro de classe média no Rio de Janeiro morreu em outubro de 2013 em decorrência de sequelas deixadas por uma simples cirurgia, para retirar um nódulo do útero, realizada em um hospital privado. As circunstâncias das mortes de Alyne e Elizabeth não são comparáveis. Entretanto, em ambos os casos, como em tantos outros, foram fornecidas informações imprecisas às famílias e houve uma demora injustificável para transferi-las para unidades de saúde mais bem equipadas. Um não está situado em uma escala evolutiva acima do outro. Uma hipótese que não pode ser descartada é que a segregação reduz a qualidade do sistema de saúde tanto de seu componente público quanto privado. Portanto, a identidade singular — que nega a complexidade das interseções culturais e a ausência de validade biológica da noção de diversidade racial — não tem sido tomada como parâmetro à organização de sistemas de saúde. O modelo dos EUA de escolas e universidades para negros não foi transposto a outras políticas sociais.
As tentativas de enfrentar a negação da humanidade comum que justificou a escravidão e se renova em novos formatos de apartheid na atenção à saúde requerem a afirmação da cidadania universal e necessidades especificas. O reconhecimento das necessidades comuns e específicas de saúde não é cortesia, privilégio ou benevolência. Não é razoável que os hospitais assassinem seus pacientes, sejam os mais ou menos abastados, e nem que o confinamento de conhecidos ou desconhecidos em um regime prisional ameace a integridade física de doentes graves. A saúde requer políticas baseadas na construção de uma humanidade compartilhada porque as pessoas não escolhem e tampouco são escolhidas, de modo meritocrático, para ficar doente, sofrer, sentir dor.
Basta dizer com convicção que recurso público deveria ser usado para atender o público para ouvir a advertência: “Está querendo nivelar por baixo.” O sentido unívoco da chamada à conservação da ordem é o de que a coexistência entre a alta qualidade e a seleção dos que podem acessá-la é inevitável. É como se o progresso, a excelência, fossem devidos a conquistas pessoais e dedicação dos bons, e cobrassem o sacrifício dos médios e ruins. A transposição desse darwinismo social para a saúde justifica-se pela ideia de que de pouquinho em pouquinho os pobres sobem degraus de acesso a serviços de saúde progressivamente melhores. Mas o padrão assistencial dos ricos, que fica no topo da escada e a todos enche de orgulho, mesmo àqueles que nem em sonho poderão utilizá-lo, não é estático, não fica parado à espera dos passos rápidos ou lentos de melhoria das condições gerais de consumo.
O modelo 3 Cs (cartão de crédito, computador e carro) e outros bens e serviços não vale para a saúde. Sintomas e doenças podem ser agravados pela restrição de assistência ou pelo atendimento medíocre ou ruim. A alta qualidade para poucos combinada com a inferiorização ou invisibilização de grupos humanos trava avanços sociais. Os indígenas, pardos e negros que representam a maioria da população brasileira adoecem mais e morrem antes dos brancos. No entanto, a cor da minoria predomina nos considerados melhores estabelecimentos de saúde, que, não por acaso, são de direito ou de fato privados. Obviamente, o fenômeno não começa nem acaba em hospitais ou clínicas. Bairros, escolas, restaurantes e bares excelentes, nos quais inexiste placa vedando a entrada de todo e qualquer brasileiro, também são monocromáticos. A objeção às inespecificidades dos males do racismo é que a importância do reconhecimento de nossa humanidade comum e de diferenças culturais é condição essencial para conseguir viver a vida agora, já.
Discriminação, preconceito e estigmas são causas objetivas de adoecimento e morte. A mortalidade infantil de negros caiu drasticamente no sul rural após a aprovação da legislação sobre os direitos civis nos EUA em 1964. Mas as desigualdades na saúde entre brancos e negros americanos retornaram aos níveis anteriores nos anos 1980, com as políticas estigmatizantes de aprisionamento e guerra contra as drogas. Estudos recentes da Organização Mundial de Saúde evidenciaram que os diferenciais de depressão entre mulheres e homens são menores em países onde existem políticas de controle dos efeitos deletérios da ideologia de gênero.
Em 2011, quando foi instituído o Dia da Consciência Negra, o Brasil foi condenado pela Organização das Nações Unidas (ONU) por violar direitos humanos de grávidas. O fato que gerou a decisão foi a morte de Alyne Silva Pimentel, de 28 anos, negra, moradora da Baixada Fluminense, que faleceu em 2002, no sexto mês de gestação, por falta de atendimento apropriado pela rede pública. O tempo passou e as desigualdades na saúde não desapareceram. Recentemente, a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial apresentou uma síntese das desvantagens dos negros em relação à saúde. Existe simultaneamente déficit e sobreuso de ações e serviços de saúde pela população negra (mais de 40% das negras nunca realizaram mamografia e 70% dos usuários do SUS são negros). A divulgação de denúncias e estatísticas sobre as desigualdades raciais é um passo essencial para reduzir e superar disparidades não econômicas na saúde. O que ainda não ficou claro no idioma governamental é como continuar a caminhada.
As concepções que consideram que somos iguais apesar das diferenças ou diferentes originam políticas públicas de saúde distintas. A diferença entre as tradições democráticas e liberais não é semântica. Um SUS exclusivamente ou predominantemente negro é uma solução ou um sintoma de discriminação? Os valores culturais que inferiorizam e impedem a paridade de participação na sociedade tais como leis matrimoniais que excluem a união entre pessoas do mesmo sexo, a rotulação de mães solteiras como irresponsáveis e associação entre raça negra e criminalidade afetam a saúde de todos.
Elizabeth Travassos, branca, doutora em antropologia, moradora de um bairro de classe média no Rio de Janeiro morreu em outubro de 2013 em decorrência de sequelas deixadas por uma simples cirurgia, para retirar um nódulo do útero, realizada em um hospital privado. As circunstâncias das mortes de Alyne e Elizabeth não são comparáveis. Entretanto, em ambos os casos, como em tantos outros, foram fornecidas informações imprecisas às famílias e houve uma demora injustificável para transferi-las para unidades de saúde mais bem equipadas. Um não está situado em uma escala evolutiva acima do outro. Uma hipótese que não pode ser descartada é que a segregação reduz a qualidade do sistema de saúde tanto de seu componente público quanto privado. Portanto, a identidade singular — que nega a complexidade das interseções culturais e a ausência de validade biológica da noção de diversidade racial — não tem sido tomada como parâmetro à organização de sistemas de saúde. O modelo dos EUA de escolas e universidades para negros não foi transposto a outras políticas sociais.
As tentativas de enfrentar a negação da humanidade comum que justificou a escravidão e se renova em novos formatos de apartheid na atenção à saúde requerem a afirmação da cidadania universal e necessidades especificas. O reconhecimento das necessidades comuns e específicas de saúde não é cortesia, privilégio ou benevolência. Não é razoável que os hospitais assassinem seus pacientes, sejam os mais ou menos abastados, e nem que o confinamento de conhecidos ou desconhecidos em um regime prisional ameace a integridade física de doentes graves. A saúde requer políticas baseadas na construção de uma humanidade compartilhada porque as pessoas não escolhem e tampouco são escolhidas, de modo meritocrático, para ficar doente, sofrer, sentir dor.