segunda-feira, julho 01, 2013

O clamor das ruas e o cabeleireiro - ROBERTO POMPEU DE TOLEDO

REVISTA VEJA


Torturar o eleitorado com ura plebiscito sobre reforma política equivale a repassar-lhe um problema de física. Plebiscitos se fazem com enunciados simples, que envolvem no máximo rudimentares cálculos aritméticos. Por exemplo:

Em nove oportunidades, uma cliente pagou 400 reais ao profissional que lhe fez. o penteado e a maquiagem. Na décima, pelo mesmo serviço, foram-lhe propostos 3125 reais. A cliente deve concordar com a proposta? Sim ou não?

Dizer que reforma política não é problema a apresentar ao eleitorado não é menosprezá-lo. Ninguém é obrigado a saber o que é voto distrital, voto distrital misto, lista fechada, lista aberta, cláusula de barreira, financiamento público de campanha ou coligações em eleição proporcional.

Isso para não falar em quociente eleitoral e em método de D"Hondt, que a qualquer momento também podem entrar em campo. Para bem votar num plebiscito desses, o eleitor precisaria fazer um curso de direito constitucional. (Atenção, donos de cursinhos: eis uma oportunidade.) Não basta, porém, saber o que significa tal palavrório. Para complicar, cada coisa implica outras. Tome-se o tão alardeado voto distrital. De que forma viria ele — convivendo com os atuais limites máximo e mínimo de deputados para cada estado? Ou seriam revistos tais limites?

Para quem não sabe (vamos começar nós mesmos o cursinho), a Constituição prevê que nenhum estado pode ter menos de oito deputados nem mais de setenta. A consequência é uma grande distorção na representação da população. Cada um dos setenta deputados de São Paulo vale 600.000 habitantes (população de 42 milhões dividida por setenta), enquanto cada um de Roraima vale 58 750 (população de 470.000 dividida por oito). Adotado o voto distrital, e mantidos os limites máximo e mínimo, a distorção continua igual na aritmética, mas no plano simbólico assume enormes proporções: haverá deputados de distrito de 600.000 pessoas e outros de distrito de 58.750. Deputados que valem mais e valem menos. Os de inquestionáveis credenciais e os questionáveis. O eleitor consciente, antes de cravar "sim" no voto distrital, precisa saber se os limites máximo e mínimo vão ser mantidos. Se vão, recomenda-se que caia fora. (Nos EUA. onde a representação é mais ajustada às populações, nove estados, além do Distrito de Colúmbia, elegem apenas um deputado. No Brasil, dez estados pouco populosos, além do Distrito Federal, estão super-representados com oito deputados cada um.)

É duvidoso que vingue a ideia do plebiscito, como não vingou a da tal "Constituinte exclusiva". Reforma política é assunto que, como nem o Executivo, nem o Congresso, nem o Supremo Tribunal conseguem resolver, o governo tenta agora enfiar goela do eleitor abaixo. Se o plebiscito vingar, arrisca gerar um monstrengo constitucional das proporções de bicho pré-histórico. Acresce que a proposta foi engendrada não como resposta, mas como tergiversação ao clamor das ruas. Bem auscultada, a voz da rua não é difícil de ser decifrada. Tirante os grupelhos que, à esquerda, por puro reflexo condicionado, se conduzem pela miragem de abalar o capitalismo e, à direita, por confundir democracia com má gestão e roubalheira, flertam com ditadura militar, o que a rua pede é um governo decente, que não se acumplicie com a corrupção, cuide bem do Erário e invista nas coisas certas. Vale dizer que o tema não é a política, mas a administração. Ou, mais precisamente: não é o arcabouço constitucional das instituições políticas, mas os métodos administrativos.

Daí não ser à toa que esteja posta, aí em cima, a história dos preços do cabeleireiro. A história é real. A cliente em questão é a presidente Dilma Rousseff. e os preços foram apurados pela reportagem da Folha de S. Paulo. Em nove ocasiões, desde o início do mandato de Dilma, a Presidência pagou 400 reais pela preparação de seu visual, antes das aparições na televisão. Na décima, em dezembro do ano passado, foi-lhe apresentada uma conta de 3 125 reais. O governo disse sim ou não? Adivinhe o leitor. Adivinhou: disse sim. E continuou dizendo sim nas duas vezes seguintes, a última das quais na semana passada, quando pagou os mesmos 3 125 reais. Ora. direis, é uma mera conta do cabeleireiro. Se a conta do cabeleireiro, tão simples de calcular, é administrada desse jeito, imagine-se a da transposição do São Francisco.


O fim do resto - J. R. GUZZO

REVISTA VEJA

Um caderno de anotações sobre os fatos que vêm acontecendo no Brasil durante as três últimas semanas poderia conter, com bastante precisão e dentro da "margem de erro" tão útil aos institutos de pesquisa, o registro das seguintes realidades:

A presidente Dilma Rousseff simplesmente não está à altura da situação que tem o dever de enfrentar. Não sabe o que fazer, o que acha que sabe está errado, e, seja lá o que resolva, ou diga que está resolvendo. não vai ser obedecida na hora da execução. O momento exige a grandeza, a inteligência e os valores pessoais de um estadista. Dilma não tem essas qualidades. O autor deste artigo também não sabe o que deveria ser feito — para dizer a verdade, não tem a menor ideia a respeito. Em compensação, ele não é presidente da República.

A mais comentada de todas as propostas que a presidente anunciou para enfrentar a crise foi um misterioso plebiscito, do qual jamais havia falado antes, para aprovar uma nova Assembleia Constituinte destinada exclusivamente a fazer uma "profunda reforma política". Não houve, também aqui, a mínima preocupação em pensar antes de falar, para ver se existiria alguma ligação entre essa ideia e a possibilidade real de executá-la dentro das leis vigentes. Não existia, é claro. Resultado: a proposta de Dilma morreu em 24 horas, afogada num coro de gargalhadas. A hipótese otimista é que o governo esteja a viver, mais uma vez, um surto agudo de desordem mental e descontrole sobre seus próprios atos. A pessimista é que o PT, sob o comando do ex-presidente Lula. esteja querendo empurrar Dilma para uma aventura golpista.

A única "reforma política" que o PT quer fazer, como se sabe há anos, é a seguinte: tirar do eleitor brasileiro o direito de escolher os deputados nos quais quer votar, obrigando a todos a votar numa "lista fechada" e composta exclusivamente de nomes que os donos dos partidos escolherem; "financiamento público" para as campanhas, ou seja, sacar dinheiro do Tesouro Nacional e entregá-lo diretamente aos políticos nos anos eleitorais. Além dos milhões que já recebem pelo "caixa dois" das empresas privadas (e que o próprio Lula. numa "entrevista" armada durante o mensalão. considerou algo perfeitamente normal), receberiam também dinheiro que vem direto do contribuinte.

A "reforma" Lula-PT não propõe nenhuma mudança, uma única que seja. em nada daquilo que a população realmente quer que mude. e que tem sido um dos alvos principais da ira das ruas: o fim de qualquer dos privilégios grotescos dos parlamentares, como carro privado para cada um, casa de graça, verbas que podem gastar como quiserem, e que acabam sistematicamente no próprio bolso ou no de sua família. Podem faltar quanto quiserem. Vendem ou alugam seus assentos a "suplentes". A reforma petista mantém o absurdo sistema eleitoral que nega ao cidadão brasileiro o direito universal de "um homem, um voto". Recusa o voto distrital, adotado em todas as democracias verdadeiras do mundo. Nada disso: num ambiente de catástrofe, em que até uma criança de 10 anos sabe que o povo tem pelos políticos uma mistura de asco, desprezo e ódio, o PT quer dar ainda mais dinheiro a eles.

A presidente disse que "está ouvindo" os indignados que foram às ruas. Mas não está. Se estivesse, não existiria, em primeiro lugar, o inferno que é a vida diária de milhões de brasileiros, a quem o governo ignora; porque dá o Bolsa Família, anuncia vitórias imaginárias e acha que governar é fazer truques de marquetagem, convenceu-se de que o povo está muito bem atendido. Escutando os protestos? Ainda em março, Dilma recusou uma suíte de 80 metros quadrados num hotel de luxo da África do Sul, por achar que era pequena demais. A culpa, é claro, foi passada ao Itamaraty. Mas, quando o fato se tornou conhecido, a presidente não disse nenhuma palavra de desculpa, nem mandou o Itamaraty tomar alguma providência para que um fato assim não se repita. Foi adotada uma única medida: de agora em diante o governo não vai mais revelar nenhum dado das viagens presidenciais.

Ao longo de vinte dias, Dilma, seus 39 ministros e os mais de 20.000 altos funcionários de "livre nomeação" do governo não vieram com uma única ideia que pudesse merecer o nome de ideia. Suas propostas demoraram até a semana passada para aparecer — e, quando enfim vieram, anunciaram coisas desconectadas com a realidade ou entre si próprias, pequenas na concepção e nos objetivos, incompreensíveis ou apenas tolas. Foram tirando ao acaso de uma sacola, e jogando em cima do público, as miudezas que passaram por seu circuito mental nestes dias de ira: mudar a distribuição de royalties do petróleo, importar 10.000 médicos estrangeiros, punir a "corrupção dolosa" como "crime hediondo" (Dilma, pelo jeito, imagina que possa haver algum tipo de corrupção não dolosa), dar "mais recursos" para isso ou aquilo, melhorar a "mobilidade urbana". É puro PAC.

No jogo jogado, tudo isso quer dizer três vezes zero. Numa hora dessas eles vêm falar em royalties, assunto técnico que exigirá meses ou anos para ser reformulado? Importação de médicos? Só agora descobriram que faltam médicos no serviço público por causa da miséria que lhes pagam? Só depois que o povo foi para a rua perceberam que a corrupção é um crime abominável? Se os que mais roubam estão dentro da máquina do governo, como acreditar num mínimo de sinceridade nesse palavrório todo? A presidente e seu entorno anunciaram medidas que só o Congresso pode aprovar. Outras dependem do Judiciário, ou de estados e prefeituras. O que sobra é o fim do resto.

Os números apresentados até agora não fazem nenhum sentido. Falou-se em aplicar "50 bilhões" de reais em obras de "mobilidade urbana". Que raio quer dizer isso? Parece que se trata de melhorar o transporte em metrô, trens e ônibus — mas não existe a mais remota informação concreta sobre como fazer isso na prática, nem onde, nem quando. Não é uma providência de verdade; é apenas uma cifra chutada e um amontoado de dúvidas. O trem-bala. por exemplo — será que entra nessa conta? Há algum projeto de engenharia pronto para alguma obra a ser feita? Alguém no governo sabe dizer onde estão os tais "50 bilhões"? Não é surpresa que um grupinho de garotos do Movimento Passe Livre tenha saído de um encontro com Dilma dizendo que ela é "completamente despreparada" no assunto. Os números citados para a saúde são igualmente desconexos: 7 bilhões de reais para "20.000" unidades de atendimento médico. Quais unidades? Onde? Esses "7 bilhões", se existissem, equivaleriam a 20% do que se estima que será gasto nas obras para a Copa de 2014. Dá para entender? É a fé cega na incapacidade do povo brasileiro em fazer contas.

A marca mais notável da defesa que o governo fez de si próprio, durante estes dias de revolta, é que não há uma defesa. Pedem que o povo reconheça as "transformações" que fizeram no país. Quais? Após dez anos de governo popular do PT, o Brasil está em 85° lugar no IDH — subiu apenas 5% em todo esse tempo, e teve crescimento praticamente nulo durante os anos Dilma. Isso ocorreu num período de dramáticos avanços na renda de todos os países pobres: apenas entre 2005 e 2011, 500 milhões de pessoas saíram da pobreza em todo o mundo. O governo do petismo transformou o Brasil num país com 50 000 assassinatos por ano, e onde 75% da população não é capaz de entender plenamente o que lê. A rede pública de saúde foi transformada num monstro em que o cidadão pode esperar seis meses, ou um ano, por um exame clínico, e pacientes aguardam atendimento jogados no chão de hospitais, como se vivessem num país em guerra. A transformação do sistema portuário criou um Brasil que não consegue embarcar o que produz nem desembarcar o que compra lá fora. Conseguiram, até, transformar o significado da palavra "corrupção", ao venderem a ideia de que qualquer denúncia contra a roubalheira do governo é "moralismo" — ou seja, o erro é denunciar o erro.

As ruas iradas de junho deixaram à vista de todos um fato que muita gente já sabe, mas quase nunca é mencionado: o ex-presidente Lula é um homem sem coragem. Líderes corajosos jamais se escondem nas horas de dificuldade brava. Ao contrário, vão para a frente, tomam posição nos lugares mais arriscados, e assumem a luta em defesa do que acreditam. Não ficam escondidos da população, fazendo seus pequenos cálculos para descobrir o lucro ou prejuízo que teriam ao aceitar suas responsabilidades — pensam, apenas, no seu dever moral, nos seus princípios e nos seus valores. Coragem é isso — e isso Lula não foi capaz de mostrar. Onde está ele? Na hora em que o Brasil mais precisou de uma liderança em sua história recente, o homem sumiu. Vive dizendo que não há no mundo ninguém que saiba, como ele. subir no carro de som ou no palanque e "virar" qualquer situação de massas. Na hora de agir, trancou-se na segurança do seu esconderijo. E a "negociação" — na qual também se julga um ás incomparável —, onde foi parar? Para quem tem certeza de que negociou "a paz no Oriente Médio", Lula teria de estar desde os primeiros momentos tratando de montar algum tipo de negociação. Na vida real, limitou-se a cochichar com subalternos, dar palpite e falar mal dos outros. Lula sempre fez questão de achar "inimigos". Pois achou, agora, todos os que poderia querer.

Ficou claro que o governo está errando há dez anos na avaliação que faz da imprensa livre. Confundiram tudo: acharam que a internet, com a sua audiência sem limites, estava anulando jornais e revistas, quando na verdade tem feito exatamente o contrário: reproduz o que sai na imprensa para milhões de pessoas que não leram o noticiário escrito. E agora? A internet mostrou-se um multiplicador incontrolável do conteúdo da imprensa, e a mais poderosa alavanca de notícias que jamais se viu no país. Vídeos amadores, diversos deles falados em inglês com legendas em português e dirigidos aos internautas do mundo todo, apresentaram denúncias devastadoras e bem articuladas sobre a insânia governamental que levou o povo à rua. Em apenas uma semana, de 14 a 21 de junho, um desses vídeos, entre dezenas de outros, teve mais de 1.3 milhão de visualizações. Todas as informações que estão ali foram tiradas da imprensa livre. O governo não entendeu nada. Mas desta vez não teve como mentir: não conseguiu dizer que as manifestações eram invenção da "imprensa de direita".

Os descontentes de junho mostraram mais uma vez. como a Bíblia nos diz em Provérbios 16:18, que "a soberba vem antes da queda". Nunca, possivelmente, o Brasil esteve sob o comando de gente tão soberba quanto Lula. Dilma e os barões do PT, e tão à vontade em exibir sua arrogância. Estão levando, agora, o susto de suas vidas, ao descobrirem que marquetagem, demagogia e exploração da ignorância não são mais suficientes para desviar a atenção do povo para o desastre permanente que causam ao país. Espantam-se que o povo faça contas — e se sinta roubado com uma Copa do Mundo que pode acabar custando até 35 bilhões de reais, mais do que as últimas três somadas. Espantam-se que as suas esperanças de livrar da cadeia, com velhacaria jurídica, os mensaleiros mais graúdos estejam desabando. Espantam-se ao saber que muita gente está cada vez mais cheia de gastar cinco horas diárias para ir ao trabalho e voltar para casa. Desafiaram o ensinamento básico de Abraham Lincoln: "Pode-se enganar a todos durante algum tempo; pode-se enganar alguns durante todo o tempo; mas não se pode enganar a todos durante o tempo todo". Estão colhendo o que semearam.


E a notícia foi à passeata - EUGÊNIO BUCCI

REVISTA ÉPOCA


"A dor da gente não sai no jornal." Ainda hoje, o verso antigo de Chico Buarque ecoa na imaginação de muito jornalista. Não sem motivo: por mais que se esforce, um repórter não é capaz de trazer para dentro do noticiário o sofrimento vivo de toda gente - especialmente dos mais pobres, como a "Joana de Tal" do samba que tentou a morte "por causa de um tal João". A imprensa ainda não conseguiu representar o país de verdade. "Gente humilde" só aparece na manchete quando serve para apimentar o submundo cão. Fora isso, tome celebridade sorridente e outras frugalidades.

Sabemos todos que o jornalismo no Brasil precisa melhorar, precisa marcar um encontro com o Brasil, olho no olho. O difícil, ao menos até aqui, tem sido saber a data e o local desse encontro. Foi então que vieram as passeatas de junho e, aí, no meio das passeatas, insinuou-se uma pergunta que também é uma proposta séria: por que não agora?

Se olharmos pelo avesso o verso de Chico Buarque, entenderemos melhor essa pergunta e esse encontro. Sim, a tragédia dos humildes continua não saindo nos jornais, mas muito, muito mesmo do que a imprensa andou publicando de uns tempos para cá foi para as ruas e desfilou junto com a dor dos rebelados. Os milhares de cartazes que marcham sobre o asfalto trazem como palavra de ordem, como reivindicação, o que até outro dia era apenas uma notícia ruim.

Para dar aqui um único exemplo: como os brasileiros souberam da PEC 37 - derrotada na terça-feira numa Câmara dos Deputados aflita para "mostrar serviço" ao povo brasileiro? Simples: os cidadãos entenderam a gravidade dessa emenda constitucional, que pretendia tirar do Ministério Público poderes de investigação, porque o assunto entrou no noticiário. Não há como não reconhecer que, sem o trabalho da imprensa, as passeatas não teriam uma boa (e consistente) lista de reivindicações.

É verdade que são as redes sociais - e não os diários, as revistas ou as emissoras de rádio - que convocam os protestos. Mas as investigações jornalísticas que deram origem a cada bandeira, a quase todas as faixas e cartazes, estas apareceram em reportagens da imprensa sobre as bandalheiras praticadas com o dinheiro público. Foi o jornalismo crítico, o jornalismo que soube resistir ao assédio das autoridades que gostariam de domesticá-lo, que forneceu boa parte do repertório dessa imensa revolta popular: os gastos de aloprados deslumbrados com a Copa do Mundo, as mazelas da Saúde, a caixa-preta do sistema de transporte urbano. O levante foi obra de gente bem informada, que agiu em rede e, principalmente, que agiu por sua própria conta, sem precisar de partidos, de sindicatos ou de ONGs. É bom não esquecer: as entidades tradicionais do movimento social (centrais sindicais, as grandes agremiações estudantis, sindicatos rurais) ficaram de fora, ocupadas que estavam em bater palmas para a propaganda do governo. As multidões foram às ruas sem ser tuteladas. Foram às ruas porque têm informação.

Também por aí podemos perceber que a imprensa livre é um componente essencial dos protestos. Existem uns poucos que não entenderam esse fato. São os que saíram por aí quebrando prédios públicos e ateando fogo em carros de emissoras de televisão. Alguns desses pensam que são anarquistas. São apenas fascistas, quando não provocadores pagos por bandidos, interessados em inviabilizar as manifestações. Embora uma dose de violência sempre apareça em grandes mobilizações públicas (trata-se de um dado previsível), as depredações têm sido, nas passeatas de junho, um incidente deplorável - e sua face mais fascista se volta contra as unidades móveis de TV.

Por mais que uma emissora bajule ministros ou promova o sensacionalismo policial, ela não é meramente um símbolo do poder. Ela também representa a liberdade de imprensa, sem a qual não haveria informação sobre coisa nenhuma. A grande maioria dos manifestantes sabe muito bem disso e exibe confiante seus cartazes para as câmeras. Sabe que o mesmo jornalismo que lhe contou sobre os abusos das autoridades constituídas agora conta ao mundo a história de um levante que mudará o país.

A dor do Brasil saiu às ruas sem medo de desbancar o sorriso falso dos políticos. Saiu às ruas graças aos brasileiros de coragem e aos jornalistas que cumprem seu dever. E vem mais por aí. A dor das ruas quer ser alegre, como nos sambas que são feitos com beleza. E a imprensa, a imprensa que conta, quer se encontrar com a dor e a alegria dos brasileiros.


Plebiscito é golpe - CARTA AO LEITOR - REVISTA VEJA


O plebiscito proposto pelo governo e pelo PT é um golpismo por diversos motivos. Primeiro porque, se ninguém de bom-senso discorda da tese de que o Brasil precisa de uma reforma do sistema político, também não se encontra ninguém igualmente sensato que ache que isso deva ser feito via consulta popular. Segundo, porque a iniciativa é uma tentativa rasteira do PT e do governo de mudar de assunto, de lançar uma cortina de fumaça entre eles e os clamores populares. Se há uma coisa que os manifestantes têm demonstrado à exaustão é que os brasileiros estão cansados de golpes baixos e promessas vãs. Terceiro, porque não se faz plebiscito para jogar nos ombros das pessoas o peso de decisões sobre o funcionamento de coisas complexas. As pessoas não podem ser obrigadas a decidir exatamente como as instituições devem funcionar. Elas querem simplesmente que as instituições funcionem bem, que os funcionários públicos sejam honestos, imparciais e eficientes. que os políticos representem seus eleitores nas assembleias e no Congresso. Uma reportagem desta edição revela que o PT e o governo não estão genuinamente interessados na consulta popular. Eles querem mesmo é usar o tempo de televisão destinado à discussão das questões a ser propostas no plebiscito para colocar Lula fazendo propaganda da presidente Dilma Rousseff, a candidata do partido à reeleição em 2014. Isso é inaceitável.

Os brasileiros foram às ruas exigir a reforma dos políticos, não uma reforma política. Com seus cânticos, suas faixas e cartazes, as pessoas cobraram honestidade, transparência e eficiência dos políticos e das autoridades de todos os níveis e partidos. Elas exigiram, principalmente, o fim da corrupção. Ora. não requer muito tirocínio concluir que esses anseios podem e precisam ser atendidos imediatamente, na vigência do atual sistema político. Não há razão alguma para que os políticos e as autoridades não possam começar desde já a ser e parecer honestos e funcionais. É escárnio fingir que isso só é possível depois de um plebiscito em que se vai exigir dos brasileiros uma opinião sobre tecnicalidades de funcionamento das engrenagens eleitorais. Isso equivale a médicos perguntarem a familiares de um paciente de UTI se eles estão de acordo com os remédios perfundidos ou com a porcentagem de oxigênio no tubo traqueal. Obviamente, eles não vão saber responder. Mas isso não torna menos justo seu direito de que o paciente tenha o tratamento adequado. Assim deve ser em relação às instituições. Não se pode colocar como pré-requisito para a honestidade, eficiência e transparência delas que as pessoas sejam experts em detalhes de seu funcionamento. Erigir isso é iludir a plateia. E a plateia tem demonstrado com todo o vigor que se cansou de ser iludida.

Pobre Dilma! - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 01/08


"É como se os políticos e os poderes estivessem na era analógica e a sociedade, no sistema digital."
 Eduardo Campos


Receita simples de um experiente observador da política brasileira para que o governo de Dilma se recupere já e vença as eleições do próximo ano:

- É preciso mudar e muito a relação política com a sociedade, o Congresso, os partidos, os governadores e prefeitos, as entidades empresariais, sindicais e populares. Além de mudar sua comunicação e a gestão e execução dos principais programas do governo.

E por fim:

- É preciso reavaliar prioridades e manter o rumo da política econômica para crescer sem inflação e distribuindo renda. É preciso também ouvir as críticas, demandas e reivindicações da cidadania. Além de ouvir as ruas e ir para as ruas defender e debater com o povo o plebiscito e a reforma política. No mais, é preciso mobilizar a base social e política do governo para defendê-lo e defender a obra do PT.

Que tal? Moleza?

Apresento-lhes o autor da receita para salvar o governo que mais perdeu pontos de uma única vez desde que pesquisas começaram a ser aplicadas no país: José Dirceu de Oliveira, ex-coordenador da campanha vitoriosa de Lula em 2002 para presidente da República, ex-ministro-chefe da Casa Civil, deputado federal cassado por seus pares, e finalmente condenado pela Justiça como chefe da quadrilha do mensalão.

Em resumo, ele recomenda uma mudança radical de comportamento do governo faltando 15 meses para a eleição que poderá estender o mandato de Dilma por mais quatro anos – ou não.

A mudança não é radical porque seus ingredientes sejam. É radical porque implica em virar o governo pelo avesso, a presidente pelo avesso.

Mudar a relação com a sociedade... Com os políticos, os líderes sindicais, o povo...

Perguntem a Dilma se ela enxerga problemas na sua relação com a sociedade, os políticos seus parceiros, os líderes sindicais, e o povo que até recentemente a sustentava no mais alto pedestal jamais alcançado por um presidente.

Talvez admita que enfrente alguns problemas com os políticos, sim, mas por culpa deles. Os políticos querem empregos e dinheiro sem limite. E chantageiam o presidente.

Pobre Dilma!

Os sindicalistas se parecem com os políticos. E se ela ceder aos seus apelos será o fim. De resto, não disfarçam seu despreparo. E falam muitas bobagens.

Mais de uma vez – pobre Dilma! – ela foi obrigada a mandar alguns deles calarem a boca. Ou a interromper a reunião com eles porque tinha mais o que fazer. Admira a paciência de Lula, mas a dela é menor. Fazer o quê?

José Dirceu propõe a mudança da gestão e da execução dos principais programas do governo. O que quer dizer com isso? Que os programas, verdadeiras joias da coroa do governo, estão sendo mal conduzidos?

Até aqui só quem dizia uma coisa dessas era a oposição.

Os principais programas do governo são mal geridos e mal executados...

Quero só ver Dilma concordar. Caso concorde assinaria o atestado de óbito de sua administração.

Agora é fácil falar em ouvir as críticas e demandas das ruas porque elas começaram a gritar. Mas quem foi capaz de prever que todo esse desmantelo ocorreria? Quem foi?

Não é justo cobrar das pessoas o que elas não estão preparadas para dar.

Jamais passou pela cabeça de Dilma aspirar à presidência.

Ela não pediu para suceder Lula. Acreditou que poderia dar conta do recado se contasse com os conselhos inteligentes dele.

Enganou-se.

Lula não esconde dos mais íntimos que também se enganou ao indicar como candidata a mulher que dizia ser melhor gestora do que ele.

Dilma está ameaçada de passar à História como a presidente que marcou o fim da Era do PT no poder.

Pobre Dilma!

Lula versus Dilma - RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA

Por que o criador evitou apoiar a criatura no auge da crise? Por que ficou mudo?


Há uma pedra barbuda no escarpim de Dilma Rousseff, furando a meia-calça. Lula é seu nome. O maior líder popular do Brasil sumiu, escafedeu-se, silenciou sua voz rouca, justamente nas semanas em que o povo acordou da letargia para protestar contra uma herança maldita. Por que se calou o grilo falante em todas as celebrações de conquistas no país e no exterior? Só aparece na boa? Por que Lula finge que nada é com ele? Por que o criador evitou apoiar a criatura no auge da crise? Por que ficou mudo e invisível, quando a turba se insurgiu, e brasileiros de todas as idades passaram a falar, gritar, discutir e analisar, mesmo aos tropeços e sob o risco de errar? O Lula que se metamorfoseou em oito anos de mandato e rasgou a bandeira da ética na política... O Lula que suspendeu suas férias para defender o ex-presidente do Senado sob o argumento de que "Sarney não pode ser julgado como homem comum"... O Lula que se locupletou com o corrupto-mor Maluf para eleger Haddad, "o novo"... O Lula que se uniu "aos picaretas do Congresso"... O Lula que quis reeditar a CPMF, uma taxa que antes chamava de extorsão... Esse Lula não põe seu bloco na rua numa hora dessas? Por lealdade, deveria ter dado o braço a Dilma. Afinal, ela chefiava sua Casa Civil e só concordou em disputar a Presidência porque, sem Dirceu nem Palocci, Lula impôs seu nome.

A técnica Dilma, a gerentona, a ex-guerrilheira, talvez um dia escreva um livro sobre sua relação com Lula. Por mais responsável que seja, como presidente, pela explosão da insatisfação no Brasil, Dilma sabe bem quem a colocou nessa roubada de "mãe do PAC". Sabe que recebeu uma herança de corrupção, impunidade, abuso de poder, desvio de verba pública, falta de representatividade dos partidos, péssima qualidade de serviços essenciais, impostos absurdos, altos salários e mordomias dos burocratas dos Três Poderes, cinismo e oportunismo de governadores e prefeitos. O Brasil já era assim quando ela foi eleita.

O Lula presidente se lamentava da "herança maldita" de Fernando Henrique Cardoso. Dilma não pode dizer nada nem parecido. Lula teve oito anos para mudar o caráter do Brasil para melhor. Tinha tudo. Tinha uma história de defesa da liberdade e dos direitos humanos, tinha credibilidade e a legitimidade do voto, tinha nas mãos a esperança de tantos jovens aglutinados pela estrela do PT. E por tantas bandeiras no ar. A ética. A educação e a saúde de qualidade ao alcance de todos. As creches, o transporte de massa. Mas Lula achou que o Bolsa Família seria suficiente.

Os jovens que protestam agora, em paz ou com raiva, mal chegavam aos 10 anos de idade quando a eleição de Lula emocionou o Brasil. A geração YouTube deveria rever a bela cerimônia em que FHC passou o poder a Lula. Se, na última década, a oposição fracassou com a juventude, imagine a autocrítica do PT. Um partido que inchou com siglas infiltradas e perdeu companheiros de raiz. Uns saíram por racha ideológico, outros por convicção de que nada mudaria na essência, e outros ainda porque foram processados, cassados e condenados.

Os jovens brasileiros de 16 a 18 anos, para quem o voto é facultativo, se afastaram das urnas e, até umas semanas atrás, pareciam alienados. Eles não acreditam nos partidos. Quem de bom-senso ainda acredita, a não ser os que ganham o pão - e os dólares - com a política partidária? Por isso a ideia de candidatura avulsa, endossada pelo presidente do STF, Joaquim Barbosa, ganha força. Joaquim defendeu um "recall" nacional dos políticos. Já pensou se os eleitores passam a ter o direito de revogar mandatos e de expulsar políticos de cargos? Renan continua com aquele sorrisinho pregado no rosto em todas as fotos. Até quando, Calheiros? Na semana passada, Dilma virou a Geni. Tudo que disse e desdisse levou pedra de aliados e oposicionistas. Uns vândalos. Constituinte, plebiscito, referendo, pactos, apelos, nada pegou bem, nem com a maquiagem e o penteado que custaram R$ 3.125. A presidente está isolada por seus pares e ímpares. Sua sorte é que, até agora, não há líderes oposicionistas com discurso consistente para o futuro do país. Aécio Neves converteu-se a uma pálida sombra do que poderia ser. Marina Silva virou uma analista em cima do muro, com o aposto de "evangélica". Eduardo Campos desistiu do combate às claras e age nos bastidores à espera de uma derrapagem fatal.

E Lula... Bem, Lula recebeu alguns jovens em seu instituto. A aliados, diz-se que acusou Dilma de cometer "barbeiragens" na articulação e na resposta à nação. Lula é hoje a pedra mais incômoda no sapato alto da presidente.


Tourada em Madri I - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 01/07

O saldo desta Copa das Confederações é que o brasileiro fez bonito no campo, na arquibancada e nos protestos das ruas, em que pese alguns vândalos.
Imagina na Copa!

Lula Schumacher
Antes de Dilma despencar nas pesquisas, Lula vinha repetindo, a quem o incentivava a se candidatar em 2014, que não queria ser o Michael Schumacher da política.
Como se sabe, em 2009, o alemão, heptacampeão na Fórmula 1, resolveu, aos 41 anos, voltar a correr sem repetir o êxito anterior.

Tourada em Madri II
Ontem, no Maracanã, a exemplo do que ocorreu em outras arenas nesta Copa, era raro encontrar preto e, provavelmente, pobre, entre o público.
Teve madame indo para o jogo de salto alto e usando bolsa da grife americana Michael Kors, aquela da Carminha, de “Avenida Brasil”.

Que é isso, Paulinho?
Presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, saiu insatisfeito da reunião das centrais sindicais com a presidente Dilma Rousseff, na última quarta-feira.
Em meio às reclamações, disparou uma grosseria: “Ela parece a mulher da gente.” Na roda, ninguém entendeu, e ele explicou: “Chata!”

Arbitragem trabalhista
A Comissão de Juristas que examina o novo anteprojeto da Lei de Arbitragem e Mediação, presidida pelo ministro Luís Felipe Salomão, vai propor a possibilidade de arbitragem por terceiros, nas causas trabalhistas, mas só quando o empregado quiser.

As partes ficariam longe da Justiça do Trabalho, que é, por sua natureza, lenta. 

Gois na Flip I
Baixa importante na Flip 2013, que começa quarta, agora, em Paraty.

Por causa dessa proposta de Dilma pedindo a convocação do plebiscito para aprovar uma reforma política, a ministra Cármen Lúcia, que já tinha comprado ingressos e reservado hotel para assistir à festa literária, ficará em Brasília.
Em quase todas as edições anteriores da Flip, a presidente do TSE era uma presença discreta nas filas e na plateia.

Gois na Flip II
Antes de cada mesa da Flip, será exibido um depoimento em vídeo sobre Graciliano Ramos.
Ao todo são 20 filmes dirigidos por Marcelo Machado e Fernando Fonini, com críticos e escritores, como Raimundo Carrero, Marçal Aquino, Antonio Torres, Luiz Costa Lima, e também moradores de Paraty.

Gois na Flip III
Um dos depoimentos é do escritor e artista plástico Nuno Ramos, que comenta a ligação de Graciliano com o Partidão.
Apesar de militante de carteirinha, diz Nuno, a obra de Graciliano é marcado pelo horror ao poder:
— Talvez fosse preciso hoje pesquisar e descobrir um Graciliano anarquista.
Faz sentido.

Tourada em Madri III
A audiência prévia da transmissão do jogo de Brasil e Espanha ontem, pela TV Globo, foi de 34 pontos, com 54% de share. Isto é 16 pontos acima da audiência do horário.

Falta dinheiro
Há quem estime em R$150 milhões o déficit nas contas da Jornada Mundial da Juventude.
O Kit Peregrino — foram colocados à venda 750 mil — está encalhado. Ele inclui mochila, camiseta, boné, guia do peregrino, livro e guia turístico.

Diário de Justiça
A 4ª Vara Criminal da Capital começa a julgar amanhã os ex- policiais civis Bruno Souza da Cruz e Bruno Rocha Andrade.
Em outubro de 2010, eles estavam numa blitz, na Grajaú-Jacarepaguá, no Rio, e atiraram num carro que deu ré. Era o veículo onde estavam o juiz Marcelo Alexandrino e parte de sua família.
Duas crianças foram atingidas.

Tourada em Madri IV
Teve gente reclamando que o Juizado Especial Criminal do Maracanã ficou às moscas por um tempo. O pessoal de serviço teria saído para ver o jogo.
Deus perdoa.

Diplomata e cinéfilo
Hoje, ao meio-dia, haverá no Parque Lage um encontro de amigos do embaixador Arnaldo Carrilho, de 76 anos, falecido semana passada.

“Ele foi um diplomata muito importante para a difusão do cinema brasileiro no exterior”, diz Cacá Diegues, um dos organizadores da homenagem.

FH, o imortal
A posse de FH na ABL será no dia 9 de setembro. 


Tourada em Madri V 
Obrigado, Padim Ciço. 

A química da democracia - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 01/07

A química das massas é volátil, incendiária e instável, apesar de a maioria ser pacífica


Estamos diante de uma crise de representação política. A democracia moderna se caracteriza por ser representativa e não direta. Elegemos representantes e eles nos representam no Executivo e no Legislativo. Há muito tempo que este vínculo representativo no Brasil opera mal --vive-se a mesma coisa na Europa ocidental.

Julgo importante momentos como o que vivemos, não somente para chamar nossos representantes de volta a suas funções (eles trabalham para nós e pagamos os salários deles), como para refletir sobre os riscos deste mesmo colapso de representação e o desordenamento político-social que dele decorre a médio prazo: sem supermercados, sem escolas, sem estradas, sem chegar ao trabalho, sem lazer, sem policiamento.

A "química das massas" é volátil, incendiária e instável, e apesar de a imensa maioria ter uma intenção pacífica, a interrupção contínua e crescente da ordem político-social, por definição, rompe esta mesma ordem trazendo à tona riscos.

Mas nem todos os clássicos em política concordam com esta visão de risco do desgaste da ordem político-social. Alguns entendem que devemos buscar este desgaste e leem este mesmo desgaste como oportunidade criativa. Esta "química das massas" pode ser interpretada de diferentes formas.

Hobbes, por exemplo, que não é bem visto pela política contemporânea por ser posto "no saco" dos autoritários, entende que quando a ordem político-social se interrompe, "nossa química", que tem uma vocação latente para a desordem, a contingência e, por tabela, a violência (o que comumente se traduz dizendo que para Hobbes o homem é mau e a sociedade faz ele ser menos mau), entrará em ebulição a qualquer momento e a representatividade tem que retornar a funcionar, se não, caímos no caos social.

Este é o chamado pessimismo hobbesiano, que tende a valorizar a ordem a tudo custo e defender o monopólio legítimo da violência na mão do Estado.

Posições como a de Hobbes têm um defeito claro que é reprimir excessivamente qualquer tentativa de renovação das formas de representação. Daí ele ser mais afeito a temperamentos temerosos com relação a crises políticas agudas.

Rousseau, por outro lado, entende este desgaste como necessário para o surgimento da criatividade em política (Marx não está muito longe disso), daí ele ser típico de temperamentos mais revolucionários em política. Neste sentido, a violência decorrente da interrupção da ordem político-social é entendida como espaço para momentos de democracia direta.

Alguns defendem esta posição falando de "violência criativa" ou mesmo "a política será feita nas ruas e não nas instituições" porque elas não mais representam os representados e seus anseios. Aqui esquerda radical e direita radical se encontram na condenação da representação (os partidos).

O defeito desta opção está no fato de a democracia direta ou "das ruas" tender facilmente (todo mundo sabe disso) à violência, linchamento e julgamentos populares sumários. Neste caso, enquanto hobbesianos tendem a temer a "química das massas", rousseaunianos parecem torcer para esta química fazer novas receitas de "bolo social".

O que pensa Tocqueville sobre esta mesma química da democracia?

Tocqueville pensava que esta mesma química deve ser "cuidada" via mecanismos de pesos e contrapesos institucionais que reúnem desde assembleias muito locais, passando pelas instâncias de razão pública (tribunais, universidades, escolas, mídia), chegando ao Legislativo e Executivo estadual e federal.

Pare ele, não podemos abrir mão deste processo institucional de mitigação da "química da democracia" sob risco de esmagar o indivíduo sob a bota da tirania da maioria, de uma liberdade destrutiva e de uma igualdade com vocação para mediocridade, que elimina a própria criatividade cotidiana.

Por exemplo, no seu "Democracia na América", ele já dizia que não pode haver reeleição de representantes na democracia, se não dá em corrupção. Podemos começar a reforma por aí. Voto em Tocqueville.

PS. Não estou no Facebook, se você "falar" comigo no Face, não sou eu.

Melhor é impossível - TOSTÃO

FOLHA DE SP - 01/07

Após a vitória sobre o Uruguai, escrevi que o Brasil estava com pinta de campeão. Nem imaginava que seria ganhando de 3 a 0 da Espanha. A atuação, individual e coletiva, do time brasileiro foi excepcional. O Brasil, durante toda a partida, marcou e atacou com vários jogadores.

Um bom início era tudo o que o Brasil precisava para ter mais espaços para contra-atacar com velocidade. Assim, criou inúmeras chances de gol. Fez três e poderia ter feito mais. Novamente, tudo deu certo, com um gol no início do jogo, outro no fim do primeiro tempo e um terceiro nos primeiros minutos da segunda etapa.

A Espanha ainda perdeu um pênalti. A atuação do time espanhol foi fraquíssima, muito pelo ótimo futebol mostrado pelo Brasil. Vicente del Bosque deve ter lamentado não escalar Martínez, no lugar de Xabi Alonso, para manter o esquema tático das últimas conquistas. A defesa era mais protegida.

A fraca atuação da Espanha não significa que não tenha um excelente time. Depois de vencer a Copa de 2010, a Espanha foi goleada por Portugal e Argentina. Na Copa das Confederações anterior, foi eliminada pelos Estados Unidos e, depois, ganhou o Mundial.

O Barcelona, base da seleção da Espanha, foi goleado, recentemente, duas vezes, pelo Bayern. Estaria decadente o estilo espanhol, de posse de bola e de trocas curtas de passe? O futuro dirá.

Todos os jogadores brasileiros tiveram atuações excepcionais, especialmente Neymar, Fred e Luiz Gustavo.

A conquista da Copa das Confederações, de uma maneira brilhante, não significa que, subitamente, o Brasil passou a ter um timaço ou que estava melhor do que se dizia. Significa que a seleção formou um time com uma maneira definida de jogar e que usou muito bem a vantagem de atuar em casa.

Há milhares de exemplos de times e seleções que, em casa, apoiados pela torcida, crescem e ganham títulos em campeonatos curtos, com jogos mata-mata, contra adversários superiores.

Nos últimos 30 dias, de treinos e jogos, o Brasil atingiu um nível técnico muito maior do que se esperava. Antes do Mundial, com os 20 dias de treinos, poderá recuperar o nível atual. Mas, dificilmente, estará melhor do que hoje.

Parabéns aos jogadores e à comissão técnica. Temos de ficar contentes com a belíssima atuação do Brasil, mas não podemos esquecer que a seleção ganhou, fora de casa, as duas últimas Copas das Confederações e foi mal nos Mundiais. Nada de oba-oba.

Muita tributação e muito gasto - GUSTAVO LOYOLA

VALOR ECONÔMICO - 01/07

As manifestações que tomam conta de diversas cidades do país nas últimas semanas comportam várias leituras. Manda a prudência que não tiremos delas conclusões apressadas, nem que encontremos soluções simples para problemas que são complexos e multifacetados. Contudo, não há como deixar de registrar o contraste abismal entre os anseios e as expectativas da cidadania, explicitados nessas manifestações, e a atuação do Estado brasileiro, que arrecada praticamente 40% do PIB nacional e oferta serviços públicos de baixa qualidade em áreas críticas como saúde e educação.

Nos últimos meses, ao lado de muitos outros economistas, tenho manifestado nesta coluna minha preocupação com a deterioração da gestão da política fiscal, cuja execução se tornou menos transparente e mais relaxada no que tange ao controle dos gastos públicos. Isso porque, caso seja mantida essa trajetória, há grande risco de o país ingressar num quadro de instabilidade macroeconômica, voltando a um passado que julgávamos superado pelas conquistas das últimas décadas.

Muito embora a gestão prudente das contas públicas seja condição necessária ao crescimento econômico, não se deve jamais esquecer que os aspectos qualitativos do sistema tributário e da estrutura de gastos públicos são fundamentais para o progresso econômico e social da nação, como nos lembram os milhões de brasileiros que se manifestam nas ruas. Na pauta diversificada e ampla dos manifestantes sobressaem-se temas como o da insatisfatória qualidade da educação, da saúde e dos transportes públicos urbanos, assim como o da ausência de priorização correta dos gastos do governo para atividades essenciais.

A Constituição de 1988 consagrou a ideia de se implantar no Brasil um abrangente Estado de bem-estar social, com extensão universal de direitos à educação, saúde e aposentadoria, entre outros. Por óbvio, a contrapartida a esses direitos é a necessidade de o Estado se financiar junto à própria sociedade, por meio de taxação. Foi o que de fato ocorreu, já que a carga tributária cresceu cerca de 50% no último quarto de século, igualando-se à praticada em muitos países europeus. Contudo, a "europeização" da carga tributária não impediu a "africanização" dos serviços públicos essenciais. Ademais, para piorar a situação, e ao contrário do que se observa nos países desenvolvidos, a carga tributária aqui cresceu com base na expansão da taxação indireta, do que resulta um sistema tributário com características marcadamente regressivas.

Certamente não há uma "bala de prata" que solucione as mazelas das políticas públicas no Brasil, construídas historicamente desde o período colonial. Porém, é necessário navegar na direção correta, levando em consideração que os anseios e as expectativas da sociedade brasileira estão se alterando nos últimos anos, mudanças que são fruto dos próprios avanços obtidos nos campos político, social e econômico a partir da redemocratização do país.

Lastimavelmente, as prioridades das políticas públicas no período recente pareceram se encaminhar na direção errada, ao reforçar a intervenção do Estado em áreas em que sua participação é dispensável e ao distribuir subsídios generosos que agravam o caráter regressivo da política fiscal no Brasil. Poderíamos mencionar vários exemplos dessas políticas equivocadas, mas, por razão de espaço, ficamos aqui apenas com o tema que funcionou como estopim para as manifestações: o transporte público.

Nesse sentido, basta recapitular, brevemente, alguns aspectos da política do governo federal nos últimos três anos: (a) redução do IPI para aquisição de automóveis; (b) redução da Cide, inclusive sobre a gasolina; (c) manutenção do preço doméstico da gasolina abaixo de seu preço internacional, trazendo prejuízos crescentes para a Petrobras; (d) estímulo, inclusive com recursos dos recolhimentos compulsórios, ao financiamento para aquisição de veículos. Nessas quatro medidas, há clara manifestação da preferência revelada do governo pela disseminação do transporte individual, em detrimento da ampliação e melhoria da qualidade do transporte público coletivo.

O atendimento às reinvindicações da população passa necessariamente pela mudança de eixo da política de alocação dos gastos públicos, nas três esferas de governo. Sabemos que isso não depende exclusivamente da vontade do Executivo, pois o Legislativo tem sido cúmplice recorrente da deterioração da qualidade da despesa. Da mesma forma, não subestimamos a importância do combate à corrupção e ao desperdício. Porém, a visível insatisfação com a baixa qualidade dos serviços prestados pelo Estado à população indica que o modelo brasileiro de muita tributação e muito gasto público para pouco resultado está esgotado. Assim como a paciência dos brasileiros.


MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 01/07

Butantan amplia fábricas para exportar vacinas contra gripe e outras doenças
Como a fábrica só é informada em setembro sobre a composição da vacina contra a gripe e o instituto tem de produzi-la até janeiro ou fevereiro para campanhas em abril, há um período de ociosidade, diz Jorge Kalil, diretor do Instituto Butantan.

"A fabricação pode se voltar nesse período do ano para o hemisfério Norte", diz Kalil. Hoje não há produção para exportar e para viabilizá-la, o Butantan já trabalha na ampliação das fábricas.

"Calculamos investir R$ 150 milhões para obras de expansão e equipamentos a fim de aumentar a capacidade já existente no instituto." Neste ano, serão investidos cerca de R$ 80 milhões e no ano que vem, serão aproximadamente R$ 70 milhões.

Os recursos vêm dos governos federal, estadual e da Fundação Butantan.

"A Fundação Bill e Melina Gates quer também vacinas contra tétano, coqueluche, além de raiva. E também há interesse na importação da de HPV, se viermos a produzi-la", afirma. Além de expandir as unidades, novos prédios estão nos planos.

O Ministério da Saúde deve decidir neste mês a instituição parceira para produzir a vacina contra o vírus do papiloma humano (HPV), a primeira para efetivamente prevenir contra o câncer.

"Temos uma proposta de transferência de tecnologia com o laboratório Merck, que, por estudos publicados no mundo, faz a melhor vacina, e que está presente em 90% dos países que a compram."

O ministério tem também a opção de produzi-la com a Biomanguinhos (que é do Rio e pertence ao governo federal), em associação com a farmacêutica GFK.

PEIXE IMPORTADO 
A entrada de pescados no mercado brasileiro bateu recorde de janeiro a maio. Foram 198,6 mil toneladas. Os maiores vendedores são China, Chile e Vietnã. Na contramão, as exportações tiveram recuo --14 mil toneladas, menos de um terço do que o país vendia há dez anos.

"O envelhecimento da frota de pesca e as dificuldades na liberação de parques aquícolas são os maiores entraves", diz Armando Burle, do Conepe (conselho do setor).

O ministro da Pesca, Marcelo Crivella, diz que o governo busca saídas, como financiamento para modernização da frota e desburocratização de projetos de aquicultura.

O crescimento das importações também é impulsionado pelo interesse do brasileiro nos chamados peixes selvagens, como os provenientes do Alasca. Desde que se instalou no Brasil em 2011, o ASMI (a agência de promoção de peixes do Alasca) diz que a comercialização subiu de 31 toneladas naquele ano para 534 toneladas em 2012.

"Os números são pequenos, mas podem crescer pela demanda que há", afirma José Madeira, diretor do ASMI.

CARTA DAS TERMELÉTRICAS
O setor de carvão mineral encaminhou um documento aos governos de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul para receber mais apoio na produção energética brasileira.

Os Estados concentram mais de 99% das reservas de carvão mineral e sediam parte das usinas termelétricas em operação no país.

Empresários, políticos da região e membros de entidades assinaram um pedido para a criação de políticas públicas de incentivo à indústria.

O presidente da ABCM (Associação Brasileira do Carvão Mineral), Fernando Zancan, diz que os Estados deveriam adotar a desoneração do ICMS sobre a venda da energia. No Rio Grande do Sul, a incidência é de 12%.

"Estamos pedindo isonomia em relação às outras fontes. As eólicas têm uma variedade de incentivos", diz ele.

O segmento, que foi incluído em um novo leilão para o segundo semestre após cerca de quatro anos de intervalo, também já enviou pedidos ao governo federal.

INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA
O Senai busca na Alemanha o modelo que ajudará a entidade a estruturar, no Brasil, a rede de inovação tecnológica de apoio à indústria.

Uma missão formada por presidentes de federações das indústrias de 14 Estados participa hoje e amanhã, em Berlim, de encontros com técnicos do Instituto Fraunhofer, reconhecido por seu trabalho de pesquisa aplicada.

"O Fraunhofer tem a melhor experiência no mundo em sistema de transferência de tecnologia para a indústria", diz o diretor-geral do Senai, Rafael Lucchesi, que também dirige a área de educação da Confederação Nacional da Indústria.

Inicialmente, serão 24 institutos de inovação nas diversas áreas da indústria em 14 Estados brasileiros. O primeiro, de eletroquímica, deve operar neste ano no Paraná.

A ideia é que, por meio da inovação tecnológica, os institutos auxiliem a indústria brasileira a ganhar competitividade, com produtos de maior valor agregado.

Posso... Criada pela TAM para auxiliar a responder dúvidas online, a atendente virtual batizada como Julia fez 71 mil interações com clientes em duas semanas. O canal trata de questões como compra de passagens, entre outras.

...ajudar? Foram respondidas 221.896 perguntas pelo sistema de inteligência artificial (82% dos questionamentos). A Gol, que lançou a robô Gal em dezembro do ano passado, diz registrar 250 mil atendimentos por mês.

Destino... A partir do dia 23 de julho, a companhia aérea Azul colocará em operação um voo direto entre as cidades de Belém e Carajás, no Pará. Atualmente, a ligação entre os dois municípios é feita com uma escala em Marabá.

...mineral A companhia aérea afirma que a criação da nova rota direta entre as duas cidades tem como objetivo principal impulsionar os negócios da região, que é rica, sobretudo, em projetos da área de mineração.

S.O.S. Brasília - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 01/07

Principal atingido pela queda de popularidade de governantes pós-protestos, Fernando Haddad (PT) aposta em negociações com Brasília para tirar a prefeitura paulistana da situação de "insolvência" que ele mesmo diagnosticou. A ofensiva se dará em três frentes: insistir na renegociação da dívida da cidade, apoiar pedido para reduzir de um terço para 10% a contrapartida dos municípios nos investimentos do PAC Mobilidade e propor mudanças no pagamento de precatórios.

Cofre Haddad vai levar ao STF, com Geraldo Alckmin (PSDB), uma proposta para que os precatórios não tenham de ser pagos em ordem cronológica. Essa dívida tem um impacto de R$ 18 bilhões por ano nas contas da prefeitura da capital paulista.

Consulta Cármen Lúcia (TSE) disse a Dilma Rousseff que responderá na quarta-feira sobre o prazo necessário para organizar o plebiscito da reforma política. Antes, a ministra pretende se reunir com os presidentes dos TREs.

Calendário Extraoficialmente, interlocutores do Planalto já trabalham com a data de 7 de setembro.

Rascunho Michel Temer e José Eduardo Cardozo (Justiça) passaram o sábado no Palácio do Jaburu elaborando a mensagem que será enviada ao Congresso para sugerir o plebiscito, mas sem elencar as perguntas da consulta.

Tudo a perder A despeito da histórica defesa do PT de temas como o voto em lista, a tendência de Dilma é não se envolver nos detalhes do plebiscito. A avaliação majoritária do Planalto é que, com a reforma política, a presidente recuperou um protagonismo que ficará sob risco caso ela tome partido.

Bloco na rua Na próxima quinta-feira, a direção do PT vai voltar a debater a realização de uma constituinte para a reforma política. Os petistas também definirão uma agenda de atos públicos e ações em redes sociais para divulgar suas propostas.

Em casa A pesquisa Datafolha mostra que Eduardo Campos (PSB) não conseguiu ganhar votos no Nordeste, apesar da queda de Dilma. A presidente perdeu 5 pontos ali, mas só Marina Silva e Joaquim Barbosa cresceram.

Prosa Empresários que serão recebidos por Dilma esta semana solicitaram ao Planalto encontros reservados com a presidente. A expectativa é que façam reparos ao novo pacote de concessões, previsto para agosto.

Alvos Auxiliares de Dilma também preveem queixas endereçadas a Guido Mantega (Fazenda) e ao secretário do Tesouro, Arno Augustin. O último é criticado por seu perfil intervencionista.

Satisfação Lulistas defenderam recentemente a saída de Augustin. Segundo aliados do ex-presidente, a mexida atenderia às queixas do empresariado sobre a taxa de retorno das concessões, considerada muito baixa.

Como está Dessa maneira, o governo daria uma resposta ao mercado sem precisar tirar o cargo de Mantega.

Três à mesa Ideli Salvatti telefonou sábado para Henrique Alves (PMDB-RN) e o convidou para uma reunião hoje. Quando recebeu a ligação, o peemedebista almoçava na Gávea Pequena com o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e com o presidenciável tucano Aécio Neves.

Núcleo duro "O PM está com a PR." A frase de assessores do Planalto para definir reuniões de Dilma com Aloizio Mercadante indica a atual importância do ministro da Educação no governo. A sigla "PR" identifica a "presidente da República" e "PM" virou "primeiro-ministro".

tiroteio
Essa pesquisa tem o valor de uma vaia em estádio: não passa de catarse temporária. Redobro a aposta: Dilma ganha no 1º turno.
DE JOÃO SANTANA, marqueteiro de Dilma Rousseff, sobre a pesquisa Datafolha que mostra uma queda de 21 pontos da presidente e aponta para um 2º turno.

Contraponto


Semântica partidária
Após as primeiras manifestações pela redução das tarifas de transporte em São Paulo, o vereador Toninho Vespoli (PSOL) esclareceu na Câmara que seu partido apoiava os protestos, mas era contrário a atos violentos.

-Nós do PSOL somos contra qualquer tipo de baderna!

Ao ouvir o vereador socialista repetir uma palavra que Geraldo Alckmin (PSDB) usou para classificar alguns manifestantes, José Américo (PT) provocou:

-Nobre vereador, só peço que não utilize a palavra "baderna", pois é uma palavra que a direita costuma usar. Melhor usar "depredação" ou outra qualquer!

Quem é jornalista? - LÚCIA GUIMARÃES

O Estado de S.Paulo - 01/07

A pergunta tem sido feita com maior frequência, nos últimos anos. Blogueiro é jornalista? Julian Assange se considera um jornalista e diz que a WikiLeaks é uma organização jornalística.

Mas um momento em vídeo colocou dois jornalistas em posições tão antagônicas que profissionais aqui e na Inglaterra tomaram posições. Falo da entrevista de David Gregory, da NBC, com Glenn Greenwald, no dia 23 de junho.

Greenwald, o nova-iorquino criado na Flórida, que fez da Gávea Pequena, no Rio, a sua residência, escreve para o jornal britânico Guardian. Ele estudou direito, não jornalismo, e trabalhou num escritório de advocacia. Com Barton Gellman, do Washington Post, outro admirado jornalista que não passou pela faculdade de jornalismo, produziu as reportagens com base no vazamento de informação fornecida por Edward Snowden, uma série comparável em importância histórica aos Papéis do Pentágono, que mudou o rumo do debate sobre a Guerra do Vietnã. Enquanto escrevo, Snowden, o ex-funcionário da inteligência americana a quem devemos um panorama da vigilância sobre a vida privada pós-11 de setembro, continua no limbo do terminal de trânsito do aeroporto Sheremetyevo de Moscou.

No programa político que comanda aos domingos, David Gregory, depois de classificar Greenwald como um polemista e um advogado (profissão inicial de inúmeros jornalistas americanos), fez a seguinte pergunta: "Já que você ajudou Snowden e foi cúmplice dele, inclusive nos seus movimentos mais recentes, por que não deveria ser acusado de um crime?".

Greenwald não se despenteou ao rechaçar Gregory, dizendo que é extraordinário que um jornalista possa sugerir que um colega seja acusado de crime por fazer reportagem investigativa, sem contar o fato de que foi Snowden quem procurou os repórteres oferecendo informação. Os dois repórteres, Greenwald, no Guardian, e Gellman, no Washington Post, não deram início a nenhum crime. Junte-se a isso o fato de que Gregory nunca fez uma pergunta tão agressiva, por exemplo, ao ex-vice-presidente Dick Cheney, com quem tem contato social através de sua mulher, que trabalhou com a mulher de Cheney. Com relação à tortura, que Gregory continua a classificar de "interrogatório reforçado", não lhe ocorreu perguntar ao Dart Vader da era Bush se ele temia um processo por crimes contra a humanidade.

Na semana passada, a ofensiva de charme da Agência de Segurança Nacional, arranhada pelo vazamento de Edward Snowden, produziu pérolas como reportagens citando "fontes do governo", afirmando que terroristas munidos de novas informações, graças ao traidor Snowden, estão mudando seus métodos de comunicação. Jornalistas produzindo press-releases travestidos de reportagem, acusaram os céticos. Lembro que Osama Bin Laden morava numa casa sem telefone fixo ou internet e queimava todo o seu lixo. Estarão os terroristas usando sinais de fumaça? Ou batendo tambores?

E antes que a mídia pudesse investigar essa cortina de fumaça vazada de propósito, duas outras bombas: o Guardian revelou que o governo Obama continuou, até 2011, violando a correspondência por e-mail dos americanos e que o programa teria sido interrompido por não dar resultados na caça a terroristas.

E um general reformado, ex-número dois do Estado-Maior das Forças Armadas, se tornou objeto de uma investigação criminal por vazamento de informação. James Cartwright está sob suspeita de ter revelado ao New York Times detalhes do ataque americano com o vírus Stuxnet contra o programa nuclear do Irã, em 2010. O governo do presidente "Yes, we can" está se revelando o governo do sim, podemos punir qualquer contato não autorizado do governo com repórteres.

O problema é que definir o papel de repórter hoje não é mais privilégio exclusivo de empresas e instituições. Nas praças de Istambul ou do Cairo, nas manifestações no Brasil, não é preciso pertencer à mídia tradicional para contar a história.

Dilma, Erdogan e a opinião das ruas - JOSÉ AUGUSTO GUILHON ALBUQUERQUE E ELIZABETH BALBACHEVSKY

O ESTADÃO - 01/07

Após mais uma noite com manifestações cívicas de protesto alternando com violentos assaltos contra símbolos do poder e da propriedade, após mais uma noite com os alvos públicos concentrados em prefeituras e no governo federal - este atacado no Congresso, no Palácio Itamaraty e nesses novos símbolos da opulência e do despotismo faraônico chamados, não por acaso, de arenas -, o governo Dilma Rousseff recebeu surpreendente solidariedade do primeiro-ministro turco. Para Recep Erdogan, seu governo e o governo brasileiro estariam sendo alvo de uma conspiração para destroná-los.

O primeiro-ministro turco referia-se à ocupação da Praça Taksim, no centro de Istambul, à qual ele reagiu tratando os manifestantes com desprezo e truculência. Erdogan não é um líder qualquer. Resgatou a economia turca da instabilidade e da estagnação, modernizou o país e o colocou na prestigiosa classe dos emergentes. Habilidoso e realizador, ele é também considerado excessivamente ambicioso e acusado de arrogância e truculência.

Talvez Erdogan se tenha identificado com os governantes brasileiros porque, nos dois casos, o que parecia um embate pontual entre uma minoria de classe média e um governante poderoso e com grande apoio popular adquiriu um valor simbólico, provocando a indignação generalizada de parcela relevante da população.

Em ambos os casos os manifestantes foram para a rua com reivindicações pontuais e concretas - parar a destruição de um parque em Istambul e cancelar o aumento de tarifas em São Paulo. Em ambos os casos os governos desqualificaram os interlocutores, tratando-os com truculência desproporcional.

A única explicação é que, tanto na Turquia como em São Paulo, os governantes não entenderam que aquelas reivindicações pontuais e concretas tinham um potencial simbólico capaz de servir como catalisador de todas as insatisfações, que não são poucas, mesmo em tempo de vacas gordas. E esse potencial foi desencadeado quando os governantes, nos dois países, desqualificaram o interlocutor e recusaram qualquer negociação.

No Brasil, as demandas são intratáveis não porque sejam difusas - são, na verdade, tão pontuais e concretas como uma moeda de vintém -, mas porque são unificadas por seu caráter simbólico. Em suas diferentes formas de manifestação pelo Brasil afora, o movimento é, neste momento, a expressão aberta de uma indignação generalizada contra tudo o que os governantes deste país representam. Indignação com a diferença abismal entre a sangria imposta aos contribuintes e a qualidade do que o cidadão recebe em troca; com o desperdício e a corrupção no setor público; com o tratamento abusado recebido cada vez que se é obrigado a cumprir obrigações oficiais; com o descaramento com que Suas Excelências se locupletam com benesses e privilégios; com a desfaçatez com que se apoderam do nosso voto para usar seu mandato como moeda de troca, para assim defenderem seus interesses pessoais. Essa lista sem fim é um sinal de que já se chegou ao limite da tolerância: "Nós todos estamos por aqui".

Muitas vezes os movimentos de ideias arrefecem com o tempo, não conseguem definir um objetivo viável nem apontar para um adversário preciso. Mas, em razão do seu caráter simbólico, conferem um caráter permanente à indignação coletiva, que voltará a se manifestar quando surgir a oportunidade.

Só é possível, para o poder público, satisfazer esse tipo de demandas encarando-as com firmeza para dar substância às questões concretas que elas suscitam. Para tanto existem duas condições. A primeira é o reconhecimento da legitimidade do interlocutor e, portanto, de seu direito ao dissenso. Não é possível abrir a agenda pública para incorporar novas demandas se, por princípio, tais demandas são consideradas ilegítimas.

A outra condição é a honesta disposição para negociar: significa estar disposto a ceder uma parte dos seus interesses para obter o que se deseja que o interlocutor ceda em troca. Negociar não se reduz a responder à demanda de melhor qualidade nos transportes urbanos com um "pacto nacional pela mobilidade". Ao contrário, pactos abstratos com objetivos difusos transformam uma questão específica, embora simbólica, numa resposta totalmente abstrata que, não por acaso, dilui entre milhares de municípios e dezenas de Estados a responsabilidade por sua solução.

Outro risco que se corre - fruto do recuo unilateral dos governos, que cancelaram o aumento das tarifas sem um arremedo sequer de negociação - é formar uma espécie de pacto simbólico, congelando os ajustes de tarifas numa "cláusula pétrea", que torne impossível o debate futuro sobre o transporte urbano.

No dia 24 de junho, Dilma finalmente se distanciou de Erdogan, Fernando Haddad e Geraldo Alckmin, tomando a iniciativa de convocar uma reunião nacional de emergência. Mas o fez no já consagrado modelo de grandes celebrações petistas em que os participantes são chamados apenas para ouvir. Quem esperava um governo que ouvisse e absorvesse a mensagem das manifestações se decepcionou. Dilma ofereceu um pacote no qual transfere para Estados, municípios e Congresso o ônus de satisfazer a ira popular por anos de governo inoperante. E traduziu, à sua maneira, a mensagem das manifestações usurpando, assim, o mandato das ruas e convidando o povo a rasgar a Constituição.

Resta saber se os jovens que foram para as ruas tomar um banho de liberdade estão dispostos a jogar fora a democracia com a água do banho.

Acabou o recreio - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 01/07

Os petistas se apressavam ontem em dizer que a eleição ainda está longe e, portanto, não dá para afirmar que Dilma Rousseff está no pior dos mundos. Mas a queda na avaliação da presidente faz com que ela fique em situação mais delicada do que aquela em que se encontrou o próprio Lula em 2005, quando o mensalão nocauteou a direção do PT. Agora é mais preocupante porque, naquele período, a economia estava bem e não havia, dentro da base aliada, ninguém com condições de seguir carreira solo. E, para completar, o PT e o PCdoB parecem ter perdidos as condições de mobilização para empreender um fica, Dilma, da mesma forma que entoaram um fica, Lula.

As manifestações, por mais que os petistas digam não estarem direcionadas à figura da presidente, prejudicam mais quem está no poder, conforme dito por todos os analistas desde o início do processo. Portanto, os petistas têm razão quando classificam o desgaste como natural. Mas o poço é mais profundo e, para percebê-lo, é preciso avaliar como foi a sobrevivência de Lula em 2005 e aplicá-la à situação atual.

Desde o mensalão, o PT se equilibra no poder por conta da popularidade de Lula, dos programas sociais de largo alcance e de um presidencialismo de coalizão que tratou de abarcar todos os partidos, sufocando adversários internos e externos. Esse último item só obteve sucesso à época graças ao carisma do então presidente perante a classe política e uma economia nos trilhos.

Dilma, até aqui, praticamente desprezou os políticos. Chamou-os na semana passada, quando sentiu o calor das manifestações às portas do Planalto. E foi atendida porque, na cabeça deles, dizer não a uma presidente popular pode terminar criando problemas maiores. Agora que a popularidade dela começa a dar sinais de vencimento, tem muita gente apostando que a vida dela perante os políticos ficará mais difícil ainda, especialmente no que se refere a votações no Congresso. Agora, ou modifica o estilo de não ouve e faz tudo do jeito dela ou passará por uma onda de derrotas.

No cenário atual, avaliam alguns, nem a hipótese do volta, Lula parece ser a mais viável para os partidos. O próprio ex-presidente tem dúvidas em relação a isso, daí o seu silêncio. Afinal, quando ele recebeu Dilma e Fernando Haddad em São Paulo, na segunda semana de junho, foi taxado de copresidente de seus postes. Agora que ele está praticamente calado, todos correm para dizer que Lula torce para que Dilma viré pó e o PT vá buscá-lo para reassumir uma candidatura. Aliados de Lula garantem que não é nem uma coisa nem outra. O PT vendeu tanto a imagem de Lula-Dilma/Dilma-Lula, que dissociá-los agora soaria falso. Portanto, a candidata ainda é Dilma, e o ex-presidente pretende voltar a campo para reelegê-la. Afinal, ele também, em todas as oportunidades, enfrentou eleição em dois turnos.

Para que esse jogo dê certo, a presidente terá que fazer a sua parte em ações combinadas com o partido. Não por acaso, ontem ela reuniu apenas os ministros do PT. Dilma sabe que é o grupo com que mais poderá contar para o que der e vier. Em relação aos aliados, a avaliação dos petistas é a de que a maioria dos partidos segue o próprio rumo, sem hesitar em dar um adeus ao PT, se essa for a jogada que resultará na sobrevivência.

A avaliação de muitos é no sentido de que a presidente pode recuperar o terreno se aproveitar esse segundo semestre para se dedicar de corpo e alma a medidas capazes de fazer a economia respirar melhor. Nesse quesito, está em curso a discussão da reforma ministerial na roda das conversas governamentais, incluindo aí a hipótese de enxugamento da máquina. Afinal, é preciso dar sinais positivos ao mercado e à população, concentrando os recursos nas áreas mais sensíveis, objeto da reunião ministerial de hoje.

E, nesse ínterim, calculam os petistas, Lula votará da África para ajudar a segurar a política. Falta, entretanto, combinar com os manifestantes, que continuam nas ruas pedindo melhoria dos serviços; e com a própria classe política, que vai ao Palácio, toma café, conversa, mas a cada dia se sente mais afastada do governo. Será a tarefa de Lula, agora, fazer com que os políticos se reaproximem de Dilma, da mesma forma que fez na campanha presidencial. Afinal, ele ainda continua popular. Embora (ainda) não se apresente como candidato.

Enquanto isso, nos estádios...

Essa Copa das Confederações talvez tenha servido para marcar o fim da carona que muitos na classe política sempre tiveram no futebol e vice-versa. Afinal, desde que Dilma recebeu aquela retumbante vaia no Mané Garrincha, em Brasília, os políticos preferiram não arriscar grandes investidas nessa área. Que receba os vencedores depois, que faça a foto palaciana. Mas posar na arena, parece restrito aos profissionais da área. Já não era sem tempo.

O PT vendeu tanto a imagem de Lula-Dilma/Dilma-Lula, que dissociá-los agora soaria falso. Portanto, a candidata ainda é Dilma, e o ex-presidente pretende voltar a campo para reelegê-la

'Que se vayan todos!' - MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

FOLHA DE SP - 01/06

Insatisfação com governantes mostra que PT perdeu capacidade de se descolar da "política tradicional"


Na semana passada sugeri que o solo das insatisfações que desfilam pelas ruas do país seria sobretudo o mal-estar urbano --e as respostas, portanto, deveriam partir mais do âmbito local do que da política central. Está claro, entretanto, que a insatisfação difusa catalisada pelo aumento da tarifa e pela violência policial também se dirigiu violentamente contra governos e políticos, como demonstram as pesquisas Datafolha.

A dúvida é se temos, nesse plano, uma rejeição mais de forma ou de conteúdo. O que se rechaça são partidos e mediações da democracia representativa ou o modo como atuam? Ou ambos?

A "Economist" dedicou capa na semana passada aos protestos que pipocaram pelo mundo. Para a revista, as manifestações de 2011 guardam entre si muito em comum, da mesma forma que nos anos insurrecionais de 1848, 1968 e 1989.

Num clima descrito pela reportagem como de "festa e raiva", manifestantes de São Paulo, Istambul ou Sofia estariam juntos no repúdio à corrupção, à ineficiência e à arrogância das autoridades no poder --e isso diz respeito a democracias.

Como os protestos acontecem em países que adotam diferentes sistemas, o problema parece ser menos de reforma política e mais de fundo: seja qual for o modelo representativo, políticos e partidos perdem identidade, se dissociam das demandas da sociedade e se aferram ao poder.

No Brasil, o PT surgiu como promessa de mudar o padrão. Mesmo que se discordasse da coloração esquerdista das propostas da sigla, havia no início uma impressão geral de que o discurso contra a "política tradicional" era uma novidade para valer.

Mas, com a conquista do poder, também o PT esqueceu o que tinha escrito. A "realpolitik" passou a reinar, justificada pela urgência de implementar uma pauta de desenvolvimento e combate à pobreza. E de fato isso ocorreu. O país aproveitou o ciclo mundial favorável, soltou o crédito e cresceu. A oferta de emprego disparou e houve um notável processo de inclusão --menos pela cidadania e mais pelo consumo.

Ocorre que nesse processo o PT perdeu justamente sua capacidade de se diferenciar da "política tradicional". O partido comprou o apoio dos "picaretas com anel de doutor", andou para lá e para cá com dinheiro na cueca, aliou-se a antigos inimigos e transformou o Estado num assentamento onde lobões, sarneys, collors e calheiros não têm o que temer --e podem continuar tomando conta do galinheiro.

Falar contra a corrupção tornou-se "udenismo", categoria do tempo do Simca Chambord, e Lula nos explicou que na nossa política "até Jesus teria que se aliar a Judas". Palmas! "O que importa é que somos uma nova potência global", justificavam os militantes.

Será?

O tempo passou, os ventos mudaram, a economia esfriou e aumentou a percepção de que ainda estamos muito longe de chegar lá em matéria de educação, saúde, transporte, segurança. As coisas, sim, melhoraram, mas o discurso oficial criou um bônus artificial, aquilo que o sociólogo Fernando Henrique Cardoso chamou de "camada virtual de bem-estar". Como assinalou com humor o editorial de ontem desta Folha, parece que éramos infelizes e não sabíamos.

Nesse cenário de descrédito e indiferenciação, prevalece o sentimento que se manifesta no famoso slogan: "Que se vayan todos!"

Sobre o plebiscito - PAULO BROSSARD

ZERO HORA - 01/07

Mais uma semana terá decorrido quando for publicado o artigo que começo a escrever, como de costume, na sexta-feira. E o que posso dizer é que pouco se clarificou na matéria iniciada com a vaia ocorrida no Estádio Mané Garrincha com endereço à senhora presidente da República. Ainda bem que se tornou pública a origem da fórmula jogada ao espaço vazio do governo que a endossou.
Sabe o leitor quantas emendas à Constituição de 1988 foram promulgadas sem necessidade de nenhum plebiscito? Sem falar nas seis emendas de revisão, foram 72 as emendas aprovadas e para tanto bastou obedecer a própria Constituição em seu art. 66. Ora, a senhora presidente da República e seu marqueteiro ao que parece, trouxeram de São Paulo a fórmula sonhadora, deixar de lado a Constituição e recorrer a meios estranhos à tradição nacional, com a "vantagem" de ser até agora imprevista e obviamente mais demorada. Graças ao expediente a discussão está entre constituinte e plebiscito e referendum... Mas da reforma política que todo o mundo diz ser necessária e a ela favorável, não se diz o necessário para sequer situá-la no plano das ideias; o plebiscito tomou conta de tudo ainda que o PIB não cresça, a indústria patine no pior resultado no ano passado, e "Sob críticas, Dilma recua e desiste da Constituinte" _ "Sem apoio Dilma desiste da Constituinte para reforma política" _ Esta decisão revela a leviandade com que problema dessa importância é tratado. Cancelada a "Constituinte exclusiva" como se fosse de somenos é mantido o plebiscito inexigido pela Constituição. Destarte, ignorando a Constituição, o plebiscito, ocupa o espaço que deveria ser o plenário das questões nacionais a serem debatidas e analisadas, segundo sua importância, atualidade ou necessidade.
Mas chegou o momento de indagar de que laboratório saiu o plebiscito e as demais postulações lançadas pela senhora presidente. Sabe-se que foi depois dela, acompanhada de seu marqueteiro, ir a São Paulo entrevistar-se com seu protagonista e antecessor. Foi depois que o prefeito de São Paulo anunciara a decisão de não reduzir a tarifa dos transportes coletivos, e para salvar o governo federal revogou a decisão anterior. Como divulgado, não se trata de nenhuma concepção elaborada no calor da crise; mas a tábua redentora resultou de um congresso do PT de 2006 ou 2007, que indicava as medidas agora apontadas como salvadoras e que ficaram postergadas para as calendas gregas, permanecendo dormentes durante seis ou sete anos. Esse dado deve ser apreciado ao lado do recuo da senhora presidente no tocante à Constituinte negociada, "com líderes do Congresso e do Judiciário", (sic) segundo as manchetes das primeiras páginas dos maiores jornais do país.
Mas nesta altura se percebe a armação cavilosa relativa à "corrupção que passará a ser crime hediondo", como leio na manchete de primeira página de Zero Hora da semana finda; o leitor se agradará do alvitre porque a tisna da corrupção é repelente à imensa maioria da população brasileira. É de salientar-se que só agora a senhora presidente ficou a saber de que existe "corrupção" em seu reino? E não me causará surpresa se metade do Código Penal venha a ser de delitos hediondos.
Seria bom parar com essas tolices, antes que as licenças oficiais venham a ser consideradas crime hediondo e, assim, o feiticeiro morrer de seu próprio feitiço.