O GLOBO - 20/04
A perda de valor de mercado das empresas do grupo X era previsível. O empresário Eike Batista tem uma forma discutível de fazer negócios. Exagera nos anúncios de possibilidades das empresas. Assim, elevava as ações. Antes que uma empresa se tornasse realidade, ele criava outra que dependia da primeira, ainda embrionária. Ele se alavancou basicamente com dinheiro alheio.
Agora o movimento é para ele ser salvo dos apuros com mais dinheiro público. BNDES e Caixa já estão muito expostos ao risco Eike Batista.
Desde 2005, o BNDES aprovou R$ 9,1 bilhões em operações com o grupo e esta semana foi divulgado mais R$ 935 milhões. Mesmo com o derretimento das ações, a transfusão de empréstimos continua. As conversas com a Petrobras já começaram, para que parcerias entre ela e a OGX sejam feitas. Os investidores fogem, mas a estatal se aproxima.
As ações das empresas despencaram. Quando subiram, foi por força do exagero dos anúncios. O empresário sempre usou isso. Embrulhava vento e vendia. Os investidores compraram, os bancos emprestaram. Assim ele fez seu império e alimentou uma obsessão menor: a de ser o homem mais rico do mundo.
Em menos de três anos, a principal empresa do grupo, a OGX, de petróleo e gás, perdeu 94% do valor. Chegou a valer R$ 74 bilhões, em 2010. Mesmo com a alta de 9% das ações, ontem, vale agora R$ 4 bi. A empresa fechou 2012 com prejuízo de R$1,2 bilhão e US$1,6 bilhão em caixa. As ações da MMX, de mineração, caíram 87%. A companhia chegou a valer R$ 18 bi, em 2008, e hoje vale R$1,7 bi. Quando entrou na bolsa, disse que ia produzir 37 milhões de toneladas de minério de ferro em 2011. Em 2012, produziu 7,4 milhões. A fuga de investidores é por esse baixo desempenho. O prejuízo do grupo em 2012 foi de R$ 2,5 bilhões.
As vozes dos críticos, que mostravam o açodamento e erros, não foram consideradas. Outro ponto fraco foi
criar uma empresa derivada da outra. Já que haveria tanto gás e petróleo, ele criou a empresa de estaleiro OSX, que chegou a valer R$ 9 bilhões e hoje vale R$1 bilhão. Eike tem o mérito de elaborar projetos, tem o defeito de não esperar que maturem.
Vende entusiasmo e não aguarda a realidade. Pensa a economia do futuro com lógica do passado. A euforia enganou muita gente. Algumas empresas são boas, mas não tanto quanto a percepção do mercado. Alguns investidores estiveram com ele para serem parceiros de longo prazo, como a Ontario Teachers, o fundo de pensão dos professores de Ontário. Outros, só de passagem.
Ele se cercou de bons profissionais, que deixaram a empresa por vários motivos: falta de sustentação de alguns projetos, o descuido com riscos, o descaso ambiental. O Porto do Açu é um bom projeto, mas é caro, segundo especialistas, por ser em mar aberto e exigir muito investimento em quebra-mar.
O BNDES comprou ações e concedeu bilhões em empréstimos de prazos longos e juros baixos. A mesma coisa fez a Caixa e bancos privados. As ofertas públicas de ações atraíram investidores institucionais, e a venda de lotes menores trouxe os pequenos investidores. Mas as empresas não tinham experiência operacional, algumas eram ainda projetos.
O grupo fez dívidas em dólar e tem um cronograma pesado de investimentos. O endividamento triplicou em 2012. Além dos R$10 bilhões de operações aprovadas, o BNDES é dono de 10,3% da MPX e de 11,7% da CCX. O BNDESPar chegou a ter 12% da LLX e quando comprou as ações pagou mais caro por elas que o valor de mercado. Quando vendeu, vendeu por menos do que valia. A operação fez com que um pedaço do lucro do banco ficasse com o empresário. A Caixa tem R$1,4 bilhão de empréstimos concedidos à OSX e à MPX.
A crise de 2008 atingiu as empresas de Eike Batista, mas esse não foi o ponto principal. Ele errou na condução dos negócios.
sábado, abril 20, 2013
FLÁVIA OLIVEIRA - NEGÓCIOS & CIA
O GLOBO - 20/04
BRASILEIROS JÁ PARCELAM COMIDA
Pesquisa mostra que 11% dos endividados financiaram compra de alimentos
Para enfrentar a escalada nos preços dos alimentos, os brasileiros estão parcelando compras nos supermercados. É o que mostram resultados do 1º trimestre da pesquisa de orçamento e inadimplência da Fecomércio-RJ. A entidade visitou mil residências no país, na 2ª quinzena de março. De cada cem lares, 44 estão pagando financiamentos, nível recorde para o 1º trimestre desde 2010.
Entre os que têm compras financiadas,11% estão pagando a prazo por alimentos. São quatro pontos percentuais acima do 1º tri de 2012 (7%) e dois pontos a mais que nos três últimos meses do ano passado (9%). A explicação, diz Christian Travassos, economista da Fecomércio-RJ, é a inflação: “Dos devedores, 39% têm parcelamentos no cartão de crédito, o que combina com o uso nos supermercados”.
É local
O Rio é o estado onde a Renault tem a maior fatia de mercado no país. A francesa tem 11,9% de share no território fluminense. É quase o dobro da média nacional, de 6,6%, informa Olivier Murguet, presidente da montadora no Brasil.
Na moda
Carlos Tufvesson, presidente do recém-criado Conselho da Moda do Rio, vai propor ao grupo um plano de capacitação de mão de obra em comunidades de UPPs. Integraria ações sociais da prefeitura. A falta de pessoal capacitado é entrave à expansão do setor, diz. Outro são os custos de produção.
NA INFLAÇÃO DE ALIMENTOS No IPCA-15, do IBGE, a alimentação no domicílio ficou 6,64% mais cara de janeiro a abril deste ano. No Rio, chegou a 7,45%. Em Belém, Fortaleza, Salvador e DF, os preços subiram mais de 8% no período.
Cooperação 1
O Sescoop investirá, até 2014, R$ 2,5 milhões em programa para capacitar cooperativas. A Fundação Nacional de Qualidade criou ferramenta on-line que fará diagnóstico de gestão. Em um ano, 658
empresas devem participar do projeto. Em cinco, serão 6.587.
Cooperação 2
“As cooperativas também precisam de competitividade e profissionalização”, defende Márcio Lopes de Freitas, presidente do Sescoop.
Centésima
A Accor, rede hoteleira, chegou a cem cidades na América Latina, com a abertura do ibis Feira de Santana (BA), este mês. Até 2016, quer estar em mais 53. Hoje, tem 215 unidades.
Mais um
O restaurante Pobre Juan, de parrillas, inaugura, na 2ª, filial no Fashion Mall. Aporte de R$ 3 milhões, é a segunda do Rio. A rede paulista prevê alta de 15% no faturamento.
No Recreio
A rede de academias Fórmula chega ao Recreio em 2014. Investirá R$ 3,5 milhões em filial no Américas Shopping.
BRASILEIROS JÁ PARCELAM COMIDA
Pesquisa mostra que 11% dos endividados financiaram compra de alimentos
Para enfrentar a escalada nos preços dos alimentos, os brasileiros estão parcelando compras nos supermercados. É o que mostram resultados do 1º trimestre da pesquisa de orçamento e inadimplência da Fecomércio-RJ. A entidade visitou mil residências no país, na 2ª quinzena de março. De cada cem lares, 44 estão pagando financiamentos, nível recorde para o 1º trimestre desde 2010.
Entre os que têm compras financiadas,11% estão pagando a prazo por alimentos. São quatro pontos percentuais acima do 1º tri de 2012 (7%) e dois pontos a mais que nos três últimos meses do ano passado (9%). A explicação, diz Christian Travassos, economista da Fecomércio-RJ, é a inflação: “Dos devedores, 39% têm parcelamentos no cartão de crédito, o que combina com o uso nos supermercados”.
É local
O Rio é o estado onde a Renault tem a maior fatia de mercado no país. A francesa tem 11,9% de share no território fluminense. É quase o dobro da média nacional, de 6,6%, informa Olivier Murguet, presidente da montadora no Brasil.
Na moda
Carlos Tufvesson, presidente do recém-criado Conselho da Moda do Rio, vai propor ao grupo um plano de capacitação de mão de obra em comunidades de UPPs. Integraria ações sociais da prefeitura. A falta de pessoal capacitado é entrave à expansão do setor, diz. Outro são os custos de produção.
NA INFLAÇÃO DE ALIMENTOS No IPCA-15, do IBGE, a alimentação no domicílio ficou 6,64% mais cara de janeiro a abril deste ano. No Rio, chegou a 7,45%. Em Belém, Fortaleza, Salvador e DF, os preços subiram mais de 8% no período.
Cooperação 1
O Sescoop investirá, até 2014, R$ 2,5 milhões em programa para capacitar cooperativas. A Fundação Nacional de Qualidade criou ferramenta on-line que fará diagnóstico de gestão. Em um ano, 658
empresas devem participar do projeto. Em cinco, serão 6.587.
Cooperação 2
“As cooperativas também precisam de competitividade e profissionalização”, defende Márcio Lopes de Freitas, presidente do Sescoop.
Centésima
A Accor, rede hoteleira, chegou a cem cidades na América Latina, com a abertura do ibis Feira de Santana (BA), este mês. Até 2016, quer estar em mais 53. Hoje, tem 215 unidades.
Mais um
O restaurante Pobre Juan, de parrillas, inaugura, na 2ª, filial no Fashion Mall. Aporte de R$ 3 milhões, é a segunda do Rio. A rede paulista prevê alta de 15% no faturamento.
No Recreio
A rede de academias Fórmula chega ao Recreio em 2014. Investirá R$ 3,5 milhões em filial no Américas Shopping.
Para crescer é preciso ser competitivo - PAULO PAIVA
O ESTADÃO - 20/04
Críticas ao pífio desempenho da economia brasileira não são recentes e tão pouco são reservadas ao governo Dilma. Antes da eclosão da crise financeira global em 2008, o crescimento brasileiro já era mais lento do que o de outras economias emergentes, como China e Índia e de economias latino-americanas. A recuperação a partir de 2010 foi estimulada, principalmente, pela expansão do consumo interno e não alterou o quadro anterior, exceto pelo ritmo mais lento ainda do crescimento. Crescer apenas pela expansão do mercado interno levará à volta do protecionismo, ao aumento da intervenção do governo no mercado e, em consequência, à maior ineficiência da economia. Tudo pago pelo consumidor e pelo contribuinte.
O País está perdendo a oportunidade de ampliar sua participação na economia mundial, que vem sendo impulsionada pelas economias emergentes. A principal razão para o fraco desempenho é a baixa competitividade da economia brasileira, como tem mostrado sua posição no índice do World Economic Forum, embora tenha subido da 72.ª posição para a 48.ª, de 2006 a 2012. Os fatores críticos que emperram a competitividade da nossa economia estão, direta ou indiretamente, relacionados ao setor público. Vale a pena mencioná-los.
No que se refere às instituições, destaca-se o peso da complexa e ampla regulamentação, em que o País ostenta a pior posição, e dos desperdícios dos gastos públicos. É a ineficiência do governo. Como já observei em artigo anterior neste espaço (3/11/2012), a organização política também não contribui para a eficiência da gestão pública. Dada a combinação de alto grau de regulação com as atribuições quase parlamentaristas do Legislativo e com um sistema pluripartidário amplo, os custos de negociação com o Congresso são muito excessivos. Em consequência, reformas, mesmo as mais simples, são demoradas e dependem de longas e custosas negociações. Soma-se, ainda, que a administração pública carrega uma cultura de burocratismo cujas origens vêm da tradição portuguesa e do Estado Novo. O serviço público no País, em geral, está preparado para "não deixar fazer", quer para defender o Estado de sua privatização, quer para proteger a própria burocracia.
No que se refere à legislação e tributos, o fator inibidor da competitividade é a alta e ineficiente carga tributária, acompanhada pelos custos associados aos procedimentos alfandegários e pelo longo período necessário para a abertura de uma empresa.
Em relação à infraestrutura, o principal fator negativo à competitividade é a situação lastimável do sistema de logística e transportes no País, que encarece os custos do frete e gera incertezas quanto ao tempo de acesso aos portos. Acresce a isso o custo de energia e a legislação ambiental.
Educação básica, em que pesem os avanços no acesso das crianças à escola, é outro grande obstáculo à competitividade. O desempenho do País nos testes internacionais, como o Pisa, tem sido muito fraco comparativamente aos outros países, principalmente em capacidade de leitura e Matemática.
Essas questões exigem um plano estratégico para melhorar a competitividade, incluindo uma agenda própria que identifique reformas e mudanças de atitude, de política pública e de gestão, e que possa mobilizar os mais diferentes setores da sociedade, agentes públicos e partidos políticos, visando ao estabelecimento e execução de projetos com objetivos, metas e prazos a serem alcançados. Mas o calendário eleitoral impõe outra agenda aos governantes, priorizando resultados de curto prazo. Iniciativas apenas da sociedade civil tenderão a não alcançar os resultados necessários que dependem de ação dos poderes públicos. A campanha eleitoral já foi antecipada, atraindo o foco do governo e politizando partidariamente o debate sobre políticas públicas. Perde-se, assim, a oportunidade de preparar o País para um ciclo mais longo de crescimento. A menos que a sociedade consiga se mobilizar por um projeto "competitividade já", o pífio crescimento poderá continuar sendo a sina do Brasil.
Críticas ao pífio desempenho da economia brasileira não são recentes e tão pouco são reservadas ao governo Dilma. Antes da eclosão da crise financeira global em 2008, o crescimento brasileiro já era mais lento do que o de outras economias emergentes, como China e Índia e de economias latino-americanas. A recuperação a partir de 2010 foi estimulada, principalmente, pela expansão do consumo interno e não alterou o quadro anterior, exceto pelo ritmo mais lento ainda do crescimento. Crescer apenas pela expansão do mercado interno levará à volta do protecionismo, ao aumento da intervenção do governo no mercado e, em consequência, à maior ineficiência da economia. Tudo pago pelo consumidor e pelo contribuinte.
O País está perdendo a oportunidade de ampliar sua participação na economia mundial, que vem sendo impulsionada pelas economias emergentes. A principal razão para o fraco desempenho é a baixa competitividade da economia brasileira, como tem mostrado sua posição no índice do World Economic Forum, embora tenha subido da 72.ª posição para a 48.ª, de 2006 a 2012. Os fatores críticos que emperram a competitividade da nossa economia estão, direta ou indiretamente, relacionados ao setor público. Vale a pena mencioná-los.
No que se refere às instituições, destaca-se o peso da complexa e ampla regulamentação, em que o País ostenta a pior posição, e dos desperdícios dos gastos públicos. É a ineficiência do governo. Como já observei em artigo anterior neste espaço (3/11/2012), a organização política também não contribui para a eficiência da gestão pública. Dada a combinação de alto grau de regulação com as atribuições quase parlamentaristas do Legislativo e com um sistema pluripartidário amplo, os custos de negociação com o Congresso são muito excessivos. Em consequência, reformas, mesmo as mais simples, são demoradas e dependem de longas e custosas negociações. Soma-se, ainda, que a administração pública carrega uma cultura de burocratismo cujas origens vêm da tradição portuguesa e do Estado Novo. O serviço público no País, em geral, está preparado para "não deixar fazer", quer para defender o Estado de sua privatização, quer para proteger a própria burocracia.
No que se refere à legislação e tributos, o fator inibidor da competitividade é a alta e ineficiente carga tributária, acompanhada pelos custos associados aos procedimentos alfandegários e pelo longo período necessário para a abertura de uma empresa.
Em relação à infraestrutura, o principal fator negativo à competitividade é a situação lastimável do sistema de logística e transportes no País, que encarece os custos do frete e gera incertezas quanto ao tempo de acesso aos portos. Acresce a isso o custo de energia e a legislação ambiental.
Educação básica, em que pesem os avanços no acesso das crianças à escola, é outro grande obstáculo à competitividade. O desempenho do País nos testes internacionais, como o Pisa, tem sido muito fraco comparativamente aos outros países, principalmente em capacidade de leitura e Matemática.
Essas questões exigem um plano estratégico para melhorar a competitividade, incluindo uma agenda própria que identifique reformas e mudanças de atitude, de política pública e de gestão, e que possa mobilizar os mais diferentes setores da sociedade, agentes públicos e partidos políticos, visando ao estabelecimento e execução de projetos com objetivos, metas e prazos a serem alcançados. Mas o calendário eleitoral impõe outra agenda aos governantes, priorizando resultados de curto prazo. Iniciativas apenas da sociedade civil tenderão a não alcançar os resultados necessários que dependem de ação dos poderes públicos. A campanha eleitoral já foi antecipada, atraindo o foco do governo e politizando partidariamente o debate sobre políticas públicas. Perde-se, assim, a oportunidade de preparar o País para um ciclo mais longo de crescimento. A menos que a sociedade consiga se mobilizar por um projeto "competitividade já", o pífio crescimento poderá continuar sendo a sina do Brasil.
Remédio errado pode matar o paciente - JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
O ESTADÃO - 20/04
O biênio 2011 e 2012 não foi bom para a economia brasileira. Em 2011, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 2,7% e a taxa de inflação (IPCA) atingiu 6,5%. Em 2012 o crescimento do PIB foi de 0,9% e o IPCA, de 5,84%. Já em 2013 estamos prevendo crescimento de 2,5% e inflação em 5,9%.
Se o PIB cresce pouco, a indústria de transformação está em forte contração. Enquanto os setores de serviços (2,7% e 1,7%), comércio (3,4% e 1%) e construção civil (3,6% e 1,4%) mostraram crescimento em 2011 e 2012 - ainda que a taxas decrescentes -, a indústria de transformação encolheu 2,5% em 2012, cresceu apenas 0,1% em 2011 e continuou encolhendo no início de 2013 (-3,2% nos 12 meses encerrados em fevereiro). Esses dados mostram que o País entrou em processo de estagflação e está se desindustrializando.
Estagflação é um fenômeno cuja origem é a incapacidade de a oferta de bens e serviços responder de forma adequada aos aumentos de demanda. Como a oferta não cresce, os aumentos de demanda se transformam em aumentos de custos, de preços e de importação.
Por que a oferta não responde ao crescimento da demanda? Se as máquinas, equipamentos, infraestrutura (estradas, comunicações, etc.) e trabalhadores já estiverem totalmente empregados, para que a produção cresça é necessário aumentar a quantidade e a qualidade (produtividade) desses fatores. Isso exige investimento em capital físico e em capital humano, que leva um tempo maior para maturar do que os estímulos à demanda. Enquanto isso não ocorre, mais demanda se transforma em aumento de custos, inflação e mais importações, com pouco crescimento.
Os bens gerados pelos setores de serviços, comércio e construção civil (corte de cabelos, serviços bancários e de transporte, residências, shoppings, estradas, etc.) são, em grande parte, vendidos no próprio local onde são produzidos, enquanto aqueles bens gerados pela indústria de transformação podem ser vendidos em qualquer lugar do mundo, independentemente de onde são produzidos.
Existe uma importante diferença entre a reação destes dois grupos de produtos a uma situação de excesso de demanda. O primeiro grupo, como não sofre a concorrência de empresas de outros países, quando ocorre excesso de demanda e seus custos de produção aumentam, repassa esses aumentos de custos para os preços, gerando inflação. Para o segundo grupo, esse repasse é impossível, porque ele tem de competir com produtos similares que são importados. A inflação desses bens dentro do País tem de ser similar à inflação no resto do mundo, corrigida pela taxa de câmbio. O excesso de demanda e o aumento de custos significam redução das margens de lucros e da capacidade de competir com os importados e, portanto, menos investimento. Quanto maior o excesso de demanda, menos competitivo será o setor.
Dados os elevados níveis de utilização dos fatores, principalmente do trabalho, "acelerar o corte de juros pode ser um tiro no pé. (...) O problema da indústria não é falta de demanda. (...) O problema da indústria é oferta, falta de competitividade. E isso não se resolve com redução de juros. (...) A redução dos juros tem o efeito de aumentar a demanda na economia, inclusive a demanda por serviços, cuja taxa de inflação está em 9,5% ao ano. (...) Se você reduz juros, a demanda aumenta, o desemprego cai e o salário aumenta. Tudo isso prejudica a competitividade do setor industrial, que não consegue aumentar seus preços por causa dos importados" (José Márcio Camargo, Estado, 8/3/2012, página B4).
O desempenho da economia brasileira em 2012 mostra que esse diagnóstico estava correto. As políticas de incentivo à demanda, redução de juros, desonerações tributárias, expansionismo fiscal, etc., aceleraram a inflação de serviços, os aumentos dos salários acima dos ganhos de produtividade e, portanto, o custo unitário do trabalho e a redução da competitividade da indústria. Persistir nesse caminho só agrava o problema. A indústria de transformação definha, enquanto os setores produtores de bens não comerciáveis crescem a taxas cada vez menores.
Está na hora de reconhecer que o diagnóstico e, portanto, o remédio estão errados e este precisa ser mudado. Antes que ele mate o paciente.
O biênio 2011 e 2012 não foi bom para a economia brasileira. Em 2011, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 2,7% e a taxa de inflação (IPCA) atingiu 6,5%. Em 2012 o crescimento do PIB foi de 0,9% e o IPCA, de 5,84%. Já em 2013 estamos prevendo crescimento de 2,5% e inflação em 5,9%.
Se o PIB cresce pouco, a indústria de transformação está em forte contração. Enquanto os setores de serviços (2,7% e 1,7%), comércio (3,4% e 1%) e construção civil (3,6% e 1,4%) mostraram crescimento em 2011 e 2012 - ainda que a taxas decrescentes -, a indústria de transformação encolheu 2,5% em 2012, cresceu apenas 0,1% em 2011 e continuou encolhendo no início de 2013 (-3,2% nos 12 meses encerrados em fevereiro). Esses dados mostram que o País entrou em processo de estagflação e está se desindustrializando.
Estagflação é um fenômeno cuja origem é a incapacidade de a oferta de bens e serviços responder de forma adequada aos aumentos de demanda. Como a oferta não cresce, os aumentos de demanda se transformam em aumentos de custos, de preços e de importação.
Por que a oferta não responde ao crescimento da demanda? Se as máquinas, equipamentos, infraestrutura (estradas, comunicações, etc.) e trabalhadores já estiverem totalmente empregados, para que a produção cresça é necessário aumentar a quantidade e a qualidade (produtividade) desses fatores. Isso exige investimento em capital físico e em capital humano, que leva um tempo maior para maturar do que os estímulos à demanda. Enquanto isso não ocorre, mais demanda se transforma em aumento de custos, inflação e mais importações, com pouco crescimento.
Os bens gerados pelos setores de serviços, comércio e construção civil (corte de cabelos, serviços bancários e de transporte, residências, shoppings, estradas, etc.) são, em grande parte, vendidos no próprio local onde são produzidos, enquanto aqueles bens gerados pela indústria de transformação podem ser vendidos em qualquer lugar do mundo, independentemente de onde são produzidos.
Existe uma importante diferença entre a reação destes dois grupos de produtos a uma situação de excesso de demanda. O primeiro grupo, como não sofre a concorrência de empresas de outros países, quando ocorre excesso de demanda e seus custos de produção aumentam, repassa esses aumentos de custos para os preços, gerando inflação. Para o segundo grupo, esse repasse é impossível, porque ele tem de competir com produtos similares que são importados. A inflação desses bens dentro do País tem de ser similar à inflação no resto do mundo, corrigida pela taxa de câmbio. O excesso de demanda e o aumento de custos significam redução das margens de lucros e da capacidade de competir com os importados e, portanto, menos investimento. Quanto maior o excesso de demanda, menos competitivo será o setor.
Dados os elevados níveis de utilização dos fatores, principalmente do trabalho, "acelerar o corte de juros pode ser um tiro no pé. (...) O problema da indústria não é falta de demanda. (...) O problema da indústria é oferta, falta de competitividade. E isso não se resolve com redução de juros. (...) A redução dos juros tem o efeito de aumentar a demanda na economia, inclusive a demanda por serviços, cuja taxa de inflação está em 9,5% ao ano. (...) Se você reduz juros, a demanda aumenta, o desemprego cai e o salário aumenta. Tudo isso prejudica a competitividade do setor industrial, que não consegue aumentar seus preços por causa dos importados" (José Márcio Camargo, Estado, 8/3/2012, página B4).
O desempenho da economia brasileira em 2012 mostra que esse diagnóstico estava correto. As políticas de incentivo à demanda, redução de juros, desonerações tributárias, expansionismo fiscal, etc., aceleraram a inflação de serviços, os aumentos dos salários acima dos ganhos de produtividade e, portanto, o custo unitário do trabalho e a redução da competitividade da indústria. Persistir nesse caminho só agrava o problema. A indústria de transformação definha, enquanto os setores produtores de bens não comerciáveis crescem a taxas cada vez menores.
Está na hora de reconhecer que o diagnóstico e, portanto, o remédio estão errados e este precisa ser mudado. Antes que ele mate o paciente.
Campanha antecipada - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 20/04
Em jantar na noite de anteontem, a bancada do PT na Assembleia paulista declarou apoio à candidatura de Alexandre Padilha a governador em 2014. Mesmo ouvindo do ministro da Saúde que tal manifestação seria "precoce", 18 dos 22 deputados do partido prometeram levar ao ex-presidente Lula o desejo do bloco. Foi o primeiro movimento interno em favor de Padilha, que disputa com Aloizio Mercadante (Educação) a indicação petista para concorrer ao Bandeirantes.
Eleições...
Rui Falcão, que é deputado estadual e presidente nacional do PT, não endossou o manifesto. Ele esteve no jantar apenas para saudar o ministro e seguiu para Santa Catarina. Ana Perugini, Adriano Diogo e Ana do Carmo faltaram.
... à mesa
Falcão e Mercadante foram a outro jantar nesta semana, promovido pelo vice-presidente Michel Temer no Jaburu. Mapearam a aliança PT-PMDB nos Estados e formas de evitar que disputas locais ameacem a reeleição de Dilma Rousseff.
Prevenção
Padilha e Geraldo Alckmin se encontrarão hoje no Instituto Butantã para lançar campanha de vacinação contra a gripe. "Será um teste de imunização para 2014", brinca um petista.
Juntos 1
Aécio Neves e Marina Silva tiveram longa conversa telefônica ontem. Combinaram a estratégia para tentar mudar no Senado o projeto que restringe acesso de novas siglas, como a Rede da ex-ministra, a fundo partidário e tempo de TV.
Juntos 2
A fórmula escolhida será tentar adiar a restrição para 2015. "Sou contra a criação indiscriminada de partidos, mas pior é o casuísmo'', diz o senador tucano.
Aceno
O senador convidou Andrea Matarazzo, derrotado na disputa pelo comando do PSDB paulistano, a integrar a Executiva nacional, num gesto para tentar evitar que ele deixe o partido.
Pesos...
A defesa de Simone Vasconcelos vai questionar o que considera "fragilidade de acusação'', alegando que a ex-funcionária de Marcos Valério foi condenada a uma pena (12 anos e 7 meses) maior que a de José Dirceu (10 anos e 10 meses), apontando como chefe de quadrilha no mensalão.
... e medidas
"Tem pena maior que homicídio", diz o advogado Leonardo Isaac, que aposta na revista da pena para os crimes imputados.
Terreno...
Dilma disse ao governador Renato Casagrande (PSB) que irá ao Espírito Santo em maio. Será a primeira visita da presidente ao Estado, onde foi derrotada na eleição de 2010, desde que assumiu. Ela vai inaugurar as obras de ampliação e dragagem do Porto de Vitória.
... hostil
O Estado coleciona notícias ruins em negociações recentes em Brasília, como a redução do ICMS de produtos importados em transações interestaduais, a mudança na distribuição de royalties de petróleo e a ampliação do aeroporto de Vitória, parada desde 2009.
Eu não
O senador Ciro Nogueira (PI) nega que tenha se queixado a Dilma do espaço do PP no governo, como relataram parlamentares do partido. Segundo o presidente da sigla, a conversa foi sobre palanques regionais.
Visitas à Folha
Ersin Erçin, embaixador da Turquia no Brasil, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Mehmet Özgün Arman, cônsul-geral em São Paulo.
Carlos Wizard Martins, sócio do grupo Multi, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Alexandre Max, diretor de marketing e comunicação, e Raul Fagundes Neto, assessor de imprensa.
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"A Constituição é contraditória sobre o tema. Sendo assim, cabe a interpretação mais benéfica ao imputado, que é a Câmara decidir."
DO ADVOGADO LUIZ FERNANDO PACHECO, que defende José Genoino, sobre o acórdão do mensalão delegar ao STF a decisão sobre o mandato dos condenados.
contraponto
Pior do que está não fica
O deputado Tiririca (PR-SP) fazia parte da comitiva de parlamentares que vistoriou as obras do estádio Mané Garrincha, em Brasília. Na saída, fez várias críticas ao andamento da construção.
--Está faltando quase tudo!
Diante da avaliação, os jornalistas presentes quiseram saber a opinião de Tiririca sobre a compra superfaturada do prédio da nova sede da CBF, no Rio de Janeiro. Mas a indignação de minutos antes desapareceu:
--Vou estudar o caso. Me liga mais tarde --disse o deputado, fechando o vidro do carro e indo embora.
Adeus às ilusões - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 20/04
A despeito de suas declarações, José Serra é candidato à Presidência. Aliados contam que ele se movimenta para que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) desista de concorrer ao Planalto. Ameaça sair do PSDB com esse objetivo. E pode se filiar ao Mobilização Democrática com essa expectativa, apostando que, ao arrancar com mais força nas primeiras pesquisas, Aécio desistirá.
'É a economia...'
A oposição acusa o governo Dilma de adotar uma posição ideológica sobre a Venezuela. Mas a diplomacia brasileira diz que não é bem assim. As exportações do Brasil para o vizinho pularam de US$ 536 milhões, no primeiro ano de Hugo Chávez no poder (1999), para US$ 6 bilhões (2012). O saldo comercial a nosso favor, que era de US$ 165 milhões (2002), passou para US$ 4 bilhões (2012). A Venezuela entrou no Mercosul.
Atuam lá: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Odebrecht. Investem lá: Grupo Ultra, Brasken e Gerdau, entre outros. O governo brasileiro tem razões para crer que a oposição promoveria uma reaproximação com os EUA.
"Chegamos aqui, tomamos as terras dos índios, pegamos suas mulheres. O que eles fizeram (invadir o plenário) não foi nada perto do que fizemos com eles"
A despeito de suas declarações, José Serra é candidato à Presidência. Aliados contam que ele se movimenta para que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) desista de concorrer ao Planalto. Ameaça sair do PSDB com esse objetivo. E pode se filiar ao Mobilização Democrática com essa expectativa, apostando que, ao arrancar com mais força nas primeiras pesquisas, Aécio desistirá.
'É a economia...'
A oposição acusa o governo Dilma de adotar uma posição ideológica sobre a Venezuela. Mas a diplomacia brasileira diz que não é bem assim. As exportações do Brasil para o vizinho pularam de US$ 536 milhões, no primeiro ano de Hugo Chávez no poder (1999), para US$ 6 bilhões (2012). O saldo comercial a nosso favor, que era de US$ 165 milhões (2002), passou para US$ 4 bilhões (2012). A Venezuela entrou no Mercosul.
Atuam lá: Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Odebrecht. Investem lá: Grupo Ultra, Brasken e Gerdau, entre outros. O governo brasileiro tem razões para crer que a oposição promoveria uma reaproximação com os EUA.
"Chegamos aqui, tomamos as terras dos índios, pegamos suas mulheres. O que eles fizeram (invadir o plenário) não foi nada perto do que fizemos com eles"
Lincoln Portela Deputado federal (PR-MG)
Lado A e lado B
O PMDB do Senado não reza pela mesma cartilha. De um lado estão o presidente da Casa, Renan Calheiros, José Sarney e Romero Jucá. Do outro, o presidente da CCJ, Vital do Rêgo, e os líderes Eduardo Braga e Eunício Oliveira.
Caça ao voto
Todos os ministros que têm reunião internacional nos próximos dias foram orientados a pedir votos para a eleição do embaixador Roberto Azevêdo (foto) a diretor-geral da OMC. O ministro Antonio Patriota (Relações Internacionais) está à frente da campanha.
Nos próximos dias, o grupo de cinco candidatos se reduzirá a dois nomes.
Reação corporativa
O Ministério da Saúde foi surpreendido com dezenas de pedidos de aposentadoria de médicos dos seis hospitais federais do Rio. A leitura é que isso se deve à instalação do ponto eletrônico, que faz o controle de horas efetivamente trabalhadas.
Apertando o passo
O governador Cid Gomes (PSB-CE) defende internamente reunião do Diretório Nacional para discutir a candidatura de Eduardo Campos (PSB-PE) à Presidência. Cid quer que o partido defina seu rumo antes de setembro, o que lhe garantiria tempo para trocar de partido. Campos busca adiar ao máximo a reunião porque sabe que dela terá de sair uma decisão formal.
Pente-fino
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mandou rever todos os contratos da Casa. Suspendeu convênio com empresa terceirizada de manutenção de computadores que cobrava R$ 12 mil pela visita de um técnico.
Referência internacional
Uma delegação oficial da Indonésia chega segunda-feira a Belo Horizonte. A comitiva, organizada pelo Banco Mundial, vai conhecer o choque de gestão promovido pelo ex-governador Aécio Neves (PSDB) e que completa dez anos.
NOVO COMANDO. A senadora Ana Amélia (RS) assumirá nos próximos dias a presidência da Fundação Milton Campos, do PP.
Lado A e lado B
O PMDB do Senado não reza pela mesma cartilha. De um lado estão o presidente da Casa, Renan Calheiros, José Sarney e Romero Jucá. Do outro, o presidente da CCJ, Vital do Rêgo, e os líderes Eduardo Braga e Eunício Oliveira.
Caça ao voto
Todos os ministros que têm reunião internacional nos próximos dias foram orientados a pedir votos para a eleição do embaixador Roberto Azevêdo (foto) a diretor-geral da OMC. O ministro Antonio Patriota (Relações Internacionais) está à frente da campanha.
Nos próximos dias, o grupo de cinco candidatos se reduzirá a dois nomes.
Reação corporativa
O Ministério da Saúde foi surpreendido com dezenas de pedidos de aposentadoria de médicos dos seis hospitais federais do Rio. A leitura é que isso se deve à instalação do ponto eletrônico, que faz o controle de horas efetivamente trabalhadas.
Apertando o passo
O governador Cid Gomes (PSB-CE) defende internamente reunião do Diretório Nacional para discutir a candidatura de Eduardo Campos (PSB-PE) à Presidência. Cid quer que o partido defina seu rumo antes de setembro, o que lhe garantiria tempo para trocar de partido. Campos busca adiar ao máximo a reunião porque sabe que dela terá de sair uma decisão formal.
Pente-fino
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mandou rever todos os contratos da Casa. Suspendeu convênio com empresa terceirizada de manutenção de computadores que cobrava R$ 12 mil pela visita de um técnico.
Referência internacional
Uma delegação oficial da Indonésia chega segunda-feira a Belo Horizonte. A comitiva, organizada pelo Banco Mundial, vai conhecer o choque de gestão promovido pelo ex-governador Aécio Neves (PSDB) e que completa dez anos.
NOVO COMANDO. A senadora Ana Amélia (RS) assumirá nos próximos dias a presidência da Fundação Milton Campos, do PP.
Dois mil e quartoze - CACÁ DIEGUES
O GLOBO - 20/04
Não sou supersticioso, prefiro confiar no acaso. Mas também só entro em avião com o pé direito, procuro não passar por baixo de escada e, quando adolescente, só ia aos jogos com a mesma camisa número seis do Botafogo (a de Nilton Santos). Embora evite a superstição que nos imobiliza, gosto de brincar com números e, num desses jogos, me ocorreu uma certa magia no ano que vem.
Em 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil, completaremos 50 anos do golpe militar que resultou na mais longa e cruel ditadura de nossa história nacional, iniciada em 64. E 64 anos do golpe cruel da Copa de 50, quando os uruguaios nos venceram, naquela histórica final no Maracanã que resultou em longa depressão nacional, iniciada com o gol de Ghiggia.
São 64 anos de 50 e 50 de 64. Datas e números que dizem provavelmente pouco aos nossos jovens, mas que têm significado profundo para aqueles que viveram grande parte de suas vidas durante a segunda metade do século 20.
No maracanazo de 50, iniciamos a exposição pública de nosso complexo coletivo de vira-lata, num sofrimento nacional do qual não consigo me lembrar de outro igual (talvez por ser tão criança na época). Obdúlio Varela, o valente capitão uruguaio, cuspira no rosto de Bigode, nosso lateral mulato, sem que esse reagisse, e levara seu time à vitória aos gritos, contra brasileiros acovardados em campo e conformados em silêncio nas arquibancadas. Era assim que nós mesmos descrevíamos a tragédia.
Desde ali, os brasileiros se tornaram um povo sem flama, incapaz de reagir à desgraça à qual estava destinado. Por mais que tivéssemos nacionais virtuosos, como Zizinho e Ademir, jamais seríamos uma coletividade vitoriosa. O sucesso nos escaparia sempre nos últimos minutos, por decreto do destino e impotência nossa. O Brasil estava condenado a adormecer eternamente em berço esplêndido, incapaz de se erguer para existir.
No golpe de 64, o vira-lata foi convencido de que era mesmo ignorante e estúpido, na melhor das hipóteses ingênuo. Nem mesmo sabia votar, não merecia portanto o luxo da democracia e da liberdade. Militares insuflados pelos sábios que cuidavam de nossa incompetência e se substituíam à nossa incapacidade de gerir o país, tomavam às mãos a condução de nossas vidas, à revelia do que pensássemos disso. Haviam-nos roubado o direito de ganhar, agora nos levavam o de ser.
A partir do golpe, a tragédia se tornara cotidiana, o inaceitável passara a ser normalidade. Vivemos exilados em nosso próprio país, neutralizados pelo medo e pela conveniência. Passamos vinte e um anos com nossa vontade alienada, em nome da luta contra o monstro comunista que nos havia de devorar e que acabou ruindo sem muito ruído.
Quando eu era estudante, países como o nosso eram chamados simplesmente de “subdesenvolvidos”. Ao longo dos anos 1960, esses países passaram a ter uma certa importância estratégica nos embates da Guerra Fria. A inteligência francesa deu-lhes então uma identidade política própria, chamando-os de Tiers Monde (Terceiro Mundo), nos presenteando com o orgulho da singularidade.
Hoje, quando o Brasil e outros países semelhantes começam a ter certo peso na economia globalizada, sendo capazes de provocar crises ou de bem suportá-las na bagunça do capitalismo financeiro contemporâneo, somos elevados à categoria de países “emergentes”. Não sei dizer se essa evolução etimológica é parte de algum capítulo das ciências humanas modernas ou se é pura habilidade político-diplomática. Mas pode também ser a tradução do inconsciente coletivo da humanidade a nos conduzir a uma nova identidade.
Desde a redemocratização do país, começamos a nos libertar dos fantasmas e carmas derrotistas. Seja qual for a opinião politica de cada um de nós, é evidente que viemos, ao longo dessas duas últimas décadas, aprendendo a confiar em nós mesmos. Nossos jovens não acham mais que estamos condenados ao fracasso e querem exercer sua justa vontade sobre o concerto da nação. Temos que acreditar sempre que isso seja possível.
Tomara que 2014 celebre, sem superstições positivas ou negativas, o enterro definitivo do vira-lata. Compreenderemos então que a mágica da realidade começa pelo exercício da vontade.
x x x x x x x x x x x x
Uma correção. Em meu artigo anterior, cometi um injusto equívoco para o qual fui alertado pelo deputado Chico Alencar, a quem respeito e admiro. Não foi apenas Jean Willys o único congressista a se manifestar, logo que o pastor Marco Feliciano foi indicado para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Segundo ele, outros sete parlamentares se manifestaram logo contra a aberração: Luiza Erundina, Érica Kokai, Domingos Dutra, Arnaldo Jordi, Nilmário Miranda, Ivan Valente e o próprio Chico Alencar.
Enquanto isso, o deputado Marco Feliciano continua responsável pela Comissão, mesmo que a cada dia nos surpreenda com novas e mais delirantes profissões de fé, como essa que incentiva o assassinato de nossos mais queridos artistas, em nome de não sei que deus, com o auxilio de anjos que pilotam aviões. Não se trata mais de conflito ideológico, mas de pura insanidade.
Não sou supersticioso, prefiro confiar no acaso. Mas também só entro em avião com o pé direito, procuro não passar por baixo de escada e, quando adolescente, só ia aos jogos com a mesma camisa número seis do Botafogo (a de Nilton Santos). Embora evite a superstição que nos imobiliza, gosto de brincar com números e, num desses jogos, me ocorreu uma certa magia no ano que vem.
Em 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil, completaremos 50 anos do golpe militar que resultou na mais longa e cruel ditadura de nossa história nacional, iniciada em 64. E 64 anos do golpe cruel da Copa de 50, quando os uruguaios nos venceram, naquela histórica final no Maracanã que resultou em longa depressão nacional, iniciada com o gol de Ghiggia.
São 64 anos de 50 e 50 de 64. Datas e números que dizem provavelmente pouco aos nossos jovens, mas que têm significado profundo para aqueles que viveram grande parte de suas vidas durante a segunda metade do século 20.
No maracanazo de 50, iniciamos a exposição pública de nosso complexo coletivo de vira-lata, num sofrimento nacional do qual não consigo me lembrar de outro igual (talvez por ser tão criança na época). Obdúlio Varela, o valente capitão uruguaio, cuspira no rosto de Bigode, nosso lateral mulato, sem que esse reagisse, e levara seu time à vitória aos gritos, contra brasileiros acovardados em campo e conformados em silêncio nas arquibancadas. Era assim que nós mesmos descrevíamos a tragédia.
Desde ali, os brasileiros se tornaram um povo sem flama, incapaz de reagir à desgraça à qual estava destinado. Por mais que tivéssemos nacionais virtuosos, como Zizinho e Ademir, jamais seríamos uma coletividade vitoriosa. O sucesso nos escaparia sempre nos últimos minutos, por decreto do destino e impotência nossa. O Brasil estava condenado a adormecer eternamente em berço esplêndido, incapaz de se erguer para existir.
No golpe de 64, o vira-lata foi convencido de que era mesmo ignorante e estúpido, na melhor das hipóteses ingênuo. Nem mesmo sabia votar, não merecia portanto o luxo da democracia e da liberdade. Militares insuflados pelos sábios que cuidavam de nossa incompetência e se substituíam à nossa incapacidade de gerir o país, tomavam às mãos a condução de nossas vidas, à revelia do que pensássemos disso. Haviam-nos roubado o direito de ganhar, agora nos levavam o de ser.
A partir do golpe, a tragédia se tornara cotidiana, o inaceitável passara a ser normalidade. Vivemos exilados em nosso próprio país, neutralizados pelo medo e pela conveniência. Passamos vinte e um anos com nossa vontade alienada, em nome da luta contra o monstro comunista que nos havia de devorar e que acabou ruindo sem muito ruído.
Quando eu era estudante, países como o nosso eram chamados simplesmente de “subdesenvolvidos”. Ao longo dos anos 1960, esses países passaram a ter uma certa importância estratégica nos embates da Guerra Fria. A inteligência francesa deu-lhes então uma identidade política própria, chamando-os de Tiers Monde (Terceiro Mundo), nos presenteando com o orgulho da singularidade.
Hoje, quando o Brasil e outros países semelhantes começam a ter certo peso na economia globalizada, sendo capazes de provocar crises ou de bem suportá-las na bagunça do capitalismo financeiro contemporâneo, somos elevados à categoria de países “emergentes”. Não sei dizer se essa evolução etimológica é parte de algum capítulo das ciências humanas modernas ou se é pura habilidade político-diplomática. Mas pode também ser a tradução do inconsciente coletivo da humanidade a nos conduzir a uma nova identidade.
Desde a redemocratização do país, começamos a nos libertar dos fantasmas e carmas derrotistas. Seja qual for a opinião politica de cada um de nós, é evidente que viemos, ao longo dessas duas últimas décadas, aprendendo a confiar em nós mesmos. Nossos jovens não acham mais que estamos condenados ao fracasso e querem exercer sua justa vontade sobre o concerto da nação. Temos que acreditar sempre que isso seja possível.
Tomara que 2014 celebre, sem superstições positivas ou negativas, o enterro definitivo do vira-lata. Compreenderemos então que a mágica da realidade começa pelo exercício da vontade.
x x x x x x x x x x x x
Uma correção. Em meu artigo anterior, cometi um injusto equívoco para o qual fui alertado pelo deputado Chico Alencar, a quem respeito e admiro. Não foi apenas Jean Willys o único congressista a se manifestar, logo que o pastor Marco Feliciano foi indicado para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Segundo ele, outros sete parlamentares se manifestaram logo contra a aberração: Luiza Erundina, Érica Kokai, Domingos Dutra, Arnaldo Jordi, Nilmário Miranda, Ivan Valente e o próprio Chico Alencar.
Enquanto isso, o deputado Marco Feliciano continua responsável pela Comissão, mesmo que a cada dia nos surpreenda com novas e mais delirantes profissões de fé, como essa que incentiva o assassinato de nossos mais queridos artistas, em nome de não sei que deus, com o auxilio de anjos que pilotam aviões. Não se trata mais de conflito ideológico, mas de pura insanidade.
Índice de cálculo - RUY CASTRO
FOLHA DE S. PAULO - 20/04
RIO DE JANEIRO - Daniel Craig, o atual James Bond, foi contratado há dias para abrilhantar o coquetel de lançamento de um carro em Nova York. Chegou, ficou sete minutos no recinto, murmurou passar bem e foi embora. Não deu entrevistas. O locutor do evento mal pôde anunciar sua presença. Cachê: US$ 1 milhão.
É um bom índice para se calcular a desvalorização da moeda. Na primeira vez que um ator recebeu US$ 1 milhão por um trabalho, houve um estupor --era dinheiro demais, ninguém podia valer tanto. Aconteceu há 50 anos, e a contemplada foi Elizabeth Taylor, para fazer o papel-título em "Cleópatra", que estava sendo filmado em Roma.
Por causa daquele milhão, Elizabeth conheceu Richard Burton e eles se entregaram a um romance incendiário. Os dois eram casados. Sua paixão dividiu o mundo, metade contra, metade a favor, e todos os dias explodia uma novidade. Os "paparazzi" tomaram Roma de assalto. Enquanto Taylor e Burton se beijavam na frente e atrás das câmeras, seus cônjuges --o cantor Eddie Fisher, em Los Angeles, e a atriz Sybil Christopher, em Londres-- despertavam a piedade universal.
Também por causa de Liz, que acordava "indisposta" --de ressaca--, chegava tarde ou não ia filmar, "Cleópatra" atrasou barbaramente. A Fox ameaçou quebrar. Incapaz de bancar as despesas nas duas frentes, Roma e Hollywood, o estúdio demitiu a atriz complicada que estava lhe criando problemas em outro filme: Marilyn Monroe. Que morreu um mês depois. "Cleópatra" ainda levou um ano para ser concluído. E, com suas quatro horas de projeção, nunca se pagou.
Liz e Burton livraram-se de seus ex e partiram para um casamento que, no futuro, seria comparado à Terceira Guerra. Burton teve de pagar US$ 1 milhão a Sybil por sua liberdade. Mas, aí, já estávamos em 1964, e US$ 1 milhão começava a se desvalorizar.
RIO DE JANEIRO - Daniel Craig, o atual James Bond, foi contratado há dias para abrilhantar o coquetel de lançamento de um carro em Nova York. Chegou, ficou sete minutos no recinto, murmurou passar bem e foi embora. Não deu entrevistas. O locutor do evento mal pôde anunciar sua presença. Cachê: US$ 1 milhão.
É um bom índice para se calcular a desvalorização da moeda. Na primeira vez que um ator recebeu US$ 1 milhão por um trabalho, houve um estupor --era dinheiro demais, ninguém podia valer tanto. Aconteceu há 50 anos, e a contemplada foi Elizabeth Taylor, para fazer o papel-título em "Cleópatra", que estava sendo filmado em Roma.
Por causa daquele milhão, Elizabeth conheceu Richard Burton e eles se entregaram a um romance incendiário. Os dois eram casados. Sua paixão dividiu o mundo, metade contra, metade a favor, e todos os dias explodia uma novidade. Os "paparazzi" tomaram Roma de assalto. Enquanto Taylor e Burton se beijavam na frente e atrás das câmeras, seus cônjuges --o cantor Eddie Fisher, em Los Angeles, e a atriz Sybil Christopher, em Londres-- despertavam a piedade universal.
Também por causa de Liz, que acordava "indisposta" --de ressaca--, chegava tarde ou não ia filmar, "Cleópatra" atrasou barbaramente. A Fox ameaçou quebrar. Incapaz de bancar as despesas nas duas frentes, Roma e Hollywood, o estúdio demitiu a atriz complicada que estava lhe criando problemas em outro filme: Marilyn Monroe. Que morreu um mês depois. "Cleópatra" ainda levou um ano para ser concluído. E, com suas quatro horas de projeção, nunca se pagou.
Liz e Burton livraram-se de seus ex e partiram para um casamento que, no futuro, seria comparado à Terceira Guerra. Burton teve de pagar US$ 1 milhão a Sybil por sua liberdade. Mas, aí, já estávamos em 1964, e US$ 1 milhão começava a se desvalorizar.
Da favela para Boston - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 20/04
Logo que soube dos atentados de Boston, meu primeiro pensamento foi para o sociólogo Caio Ferraz, personagem de meu livro "Cidade partida", que em 1996 foi levado pela Anistia Internacional para os EUA por estar ameaçado de morte pelos policiais da banda podre que executaram 21 inocentes na tristemente famosa "chacina de Vigário Geral". A foto dos caixões alinhados na entrada da favela correu o mundo como um anticartão-postal, e Caio, que liderou a reação da comunidade, foi considerado o primeiro exilado político da redemocratização. Partiu com a mulher e duas filhas pequenas, estudou, trabalhou como entregador de pizza e acabou se dando bem com uma empresa especializada em reforma de casas e apartamentos.
Testemunha de batalhas entre traficantes, Caio escapou por pouco dos atentados de agora, pois estava no lugar onde 15 minutos depois explodiu a primeira bomba. Só se salvou porque resolveu avançar 100 metros para ter uma visão melhor da chegada da maratona. Houve o estrondo e, em meio à fumaça, à correria e ao caos, ninguém entendia direito o que estava ocorrendo. "Tarimbado com as guerras insanas que vivi na minha infância na favela, não tive dúvidas de que a explosão era de bomba. O barulho parecia o de granada que eu ouvira várias vezes nos confrontos entre bandidos de Vigário Geral e Parada de Lucas pelo controle do tráfico local."
Caio confessa que o momento de maior desespero foi quando se lembrou que a filha mais velha, Maíra, trabalha numa cafeteria a cerca de 300 metros das explosões. "Tentei ligar, mas nenhum telefone funcionava. Até que ela respondeu por SMS informando que estava bem. Pedi que não saísse de lá, que eu furaria o bloqueio da polícia e iria buscá-la pra irmos juntos e em segurança para casa."
Embora acostumado a situações que o "deixaram sem chão" - tiroteios, invasão policial, chacina, ameaças de morte -, Caio continua traumatizado com o que presenciou: "Que sofrimento ver uma senhora ensanguentada abraçada ao filho adolescente sem saber o que fazer. Que estranho não poder ser útil numa hora dessas. Nunca havia me sentido assim em toda minha vida e essa experiência espero não repetir."
Para agravar, tudo isso aconteceu quando ele se prepara para voltar ao Brasil. "Não sei o que fazer, porque minhas filhas continuarão aqui com a mãe. Logo eu, que tive que sair do Brasil por motivo de segurança pessoal, encontro-me agora numa enorme insegurança existencial."
Testemunha de batalhas entre traficantes, Caio escapou por pouco dos atentados de agora, pois estava no lugar onde 15 minutos depois explodiu a primeira bomba. Só se salvou porque resolveu avançar 100 metros para ter uma visão melhor da chegada da maratona. Houve o estrondo e, em meio à fumaça, à correria e ao caos, ninguém entendia direito o que estava ocorrendo. "Tarimbado com as guerras insanas que vivi na minha infância na favela, não tive dúvidas de que a explosão era de bomba. O barulho parecia o de granada que eu ouvira várias vezes nos confrontos entre bandidos de Vigário Geral e Parada de Lucas pelo controle do tráfico local."
Caio confessa que o momento de maior desespero foi quando se lembrou que a filha mais velha, Maíra, trabalha numa cafeteria a cerca de 300 metros das explosões. "Tentei ligar, mas nenhum telefone funcionava. Até que ela respondeu por SMS informando que estava bem. Pedi que não saísse de lá, que eu furaria o bloqueio da polícia e iria buscá-la pra irmos juntos e em segurança para casa."
Embora acostumado a situações que o "deixaram sem chão" - tiroteios, invasão policial, chacina, ameaças de morte -, Caio continua traumatizado com o que presenciou: "Que sofrimento ver uma senhora ensanguentada abraçada ao filho adolescente sem saber o que fazer. Que estranho não poder ser útil numa hora dessas. Nunca havia me sentido assim em toda minha vida e essa experiência espero não repetir."
Para agravar, tudo isso aconteceu quando ele se prepara para voltar ao Brasil. "Não sei o que fazer, porque minhas filhas continuarão aqui com a mãe. Logo eu, que tive que sair do Brasil por motivo de segurança pessoal, encontro-me agora numa enorme insegurança existencial."
Ueba! Gol desce na banguela! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 20/04
E eu não tenho medo de andar de avião. Eu tenho medo do preço da passagem de avião!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta: "Coordenadora do Procon de Cianorte presa com dinheiro falso". Rarará!
E esta: "Ex-gay, pastor e deputado do PSB revela: Não posso ficar perto de homem porque a carne é fraca'". Então não é ex-gay. A cura saiu pela culatra. Rarará!
E não sei como ainda não apareceu nenhuma Mulher Tomate! Rarará! E como diz o Laerte: "O pior da inflação é a volta das charges com dragãozinho". Rarará!
E adorei a charge do Duke: "Qual camiseta vestirei hoje? Fora Renan, Fora Pastor Feliciano ou Fora Marin?". Veste a camiseta do Timão mesmo! Rarará!
E por que todo presidente da CBF é múmia? O Marin tem cara de múmia que acabaram de desenfaixar! Múmia amanhecida. Múmia de ontem! E a CBF devia mudar de nome pra CBM, Confederação Brasileira de Múmias. Ou então RBF, Roubação Brasileira de Futebol!
E esta : "Acuado, Marin chora e diz que só deixa a CBF morto". Vai ter velório de múmia? Velório de múmia vai ser o máximo. Imperdível!
E esta: "Gol oferece bônus a pilotos que economizarem gasolina". Já sei, a gente vai ter que empurrar, é isso? Ou eles vão descer na banguela? Piloto da Gol desce na banguela! Rarará!
E o Tom Cavalcante: "Gol pede para pilotos economizarem gasolina. Aí os pilotos foram trabalhar de bicicleta". Rarará!
E o Sensacionalista: "Gol planeja comprar avião sem asas porque é mais barato". E sabe o que quer dizer Gol? Grande Ônibus Lotado.
E eu não tenho medo de andar de avião. Eu tenho medo do preço da passagem de avião!
E eu estava indo pro Nordeste quando um piloto estressado gritou: "Segura aí atrás que o avião vai balançar".
E sabe como se chama turbulência em Portugal? Zona de abano! Segura aí atrás que o avião vai abanar! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E a manchete do Piauí Herald: "Hugo Chávez aparece em sonho para dizer que eleições foram legítimas".
Diz que ele apareceu pro Maduro em forma de lhama e cuspindo na cara do Capriles! Rarará! E gritando: "Yankes de mierda". Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
E eu não tenho medo de andar de avião. Eu tenho medo do preço da passagem de avião!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta: "Coordenadora do Procon de Cianorte presa com dinheiro falso". Rarará!
E esta: "Ex-gay, pastor e deputado do PSB revela: Não posso ficar perto de homem porque a carne é fraca'". Então não é ex-gay. A cura saiu pela culatra. Rarará!
E não sei como ainda não apareceu nenhuma Mulher Tomate! Rarará! E como diz o Laerte: "O pior da inflação é a volta das charges com dragãozinho". Rarará!
E adorei a charge do Duke: "Qual camiseta vestirei hoje? Fora Renan, Fora Pastor Feliciano ou Fora Marin?". Veste a camiseta do Timão mesmo! Rarará!
E por que todo presidente da CBF é múmia? O Marin tem cara de múmia que acabaram de desenfaixar! Múmia amanhecida. Múmia de ontem! E a CBF devia mudar de nome pra CBM, Confederação Brasileira de Múmias. Ou então RBF, Roubação Brasileira de Futebol!
E esta : "Acuado, Marin chora e diz que só deixa a CBF morto". Vai ter velório de múmia? Velório de múmia vai ser o máximo. Imperdível!
E esta: "Gol oferece bônus a pilotos que economizarem gasolina". Já sei, a gente vai ter que empurrar, é isso? Ou eles vão descer na banguela? Piloto da Gol desce na banguela! Rarará!
E o Tom Cavalcante: "Gol pede para pilotos economizarem gasolina. Aí os pilotos foram trabalhar de bicicleta". Rarará!
E o Sensacionalista: "Gol planeja comprar avião sem asas porque é mais barato". E sabe o que quer dizer Gol? Grande Ônibus Lotado.
E eu não tenho medo de andar de avião. Eu tenho medo do preço da passagem de avião!
E eu estava indo pro Nordeste quando um piloto estressado gritou: "Segura aí atrás que o avião vai balançar".
E sabe como se chama turbulência em Portugal? Zona de abano! Segura aí atrás que o avião vai abanar! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E a manchete do Piauí Herald: "Hugo Chávez aparece em sonho para dizer que eleições foram legítimas".
Diz que ele apareceu pro Maduro em forma de lhama e cuspindo na cara do Capriles! Rarará! E gritando: "Yankes de mierda". Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
À deriva - MARIO KOSSATZ
O GLOBO - 20/04
Em um ambiente regulatório e legal de desnecessária complexidade, somos forçados a conviver com um vasto número de leis e de regulamentações ruins, inúteis, anacrônicas, socialmente injustas e em boa parte das vezes desconhecidas ou de difícil compreensão para a maioria daqueles que devem cumpri-las. Este é o solo fértil para que se desenvolva a burocracia e no qual prolifera a corrupção em nosso país. No indescritível emaranhado de leis e regras que atravanca indistintamente a vida de todos os brasileiros, cria-se o balcão de dificuldades onde se vendem as facilidades; e, na profusão de exigências, tira-se o foco do que é realmente importante, e o essencial acaba soterrado pelo supérfluo.
O Estado de direito se fundamenta na existência e na observância das leis e regras indispensáveis para regular e melhorar o processo social. Não há justiça no seu sentido universal sem boas leis. Boas regras são seguidas e se traduzem em benefício para a sociedade. Regras ruins acabam sendo descumpridas e enfraquecem o processo social, criando um quadro de indisciplina, instabilidade e insegurança nos relacionamentos sociais.
O gosto atávico pela burocracia, além de envenenar e prostituir as relações entre o Estado e a sociedade civil, atua para reduzir ainda mais a baixa eficácia operacional da máquina estatal. Modelando praticamente todos os seus processos operacionais sob a ótica do ritualismo e sem foco em resultados, o Estado brasileiro criou, para ele próprio, um tortuoso e imensamente caro caminho para realizar as mais simples tarefas.
Este é o contexto que gera um enorme custo de conformidade e estimula a busca de soluções na ilegalidade e na informalidade, favorecendo a corrupção. O "Custo Brasil" apresenta, assim, não só um componente de custo de conformidade, mas também um componente importante de custo da não conformidade. O problema não é só econômico, mas também ético e social. Pelo ralo burocrático, acabamos perdendo não só dinheiro, tempo e esforço, mas também o respeito pelas instituições públicas, o ânimo e a esperança. Ficamos com a sensação de que pouco ou nada podemos fazer para mudar a situação em sua essência. Todos conhecem algum "caminho das pedras" e é mais cômodo deixar tudo do jeito que está. "O país funciona assim", e anda para trás.
Somente uma efetiva mobilização da sociedade civil organizada será capaz de induzir mudanças paradigmáticas em nosso país. Precisamos de um corpo de leis e de uma regulamentação administrativa de melhor qualidade no seu conjunto, elaborados com mais inteligência e mais pertinentes a questões fundamentais.
O Estado de direito se fundamenta na existência e na observância das leis e regras indispensáveis para regular e melhorar o processo social. Não há justiça no seu sentido universal sem boas leis. Boas regras são seguidas e se traduzem em benefício para a sociedade. Regras ruins acabam sendo descumpridas e enfraquecem o processo social, criando um quadro de indisciplina, instabilidade e insegurança nos relacionamentos sociais.
O gosto atávico pela burocracia, além de envenenar e prostituir as relações entre o Estado e a sociedade civil, atua para reduzir ainda mais a baixa eficácia operacional da máquina estatal. Modelando praticamente todos os seus processos operacionais sob a ótica do ritualismo e sem foco em resultados, o Estado brasileiro criou, para ele próprio, um tortuoso e imensamente caro caminho para realizar as mais simples tarefas.
Este é o contexto que gera um enorme custo de conformidade e estimula a busca de soluções na ilegalidade e na informalidade, favorecendo a corrupção. O "Custo Brasil" apresenta, assim, não só um componente de custo de conformidade, mas também um componente importante de custo da não conformidade. O problema não é só econômico, mas também ético e social. Pelo ralo burocrático, acabamos perdendo não só dinheiro, tempo e esforço, mas também o respeito pelas instituições públicas, o ânimo e a esperança. Ficamos com a sensação de que pouco ou nada podemos fazer para mudar a situação em sua essência. Todos conhecem algum "caminho das pedras" e é mais cômodo deixar tudo do jeito que está. "O país funciona assim", e anda para trás.
Somente uma efetiva mobilização da sociedade civil organizada será capaz de induzir mudanças paradigmáticas em nosso país. Precisamos de um corpo de leis e de uma regulamentação administrativa de melhor qualidade no seu conjunto, elaborados com mais inteligência e mais pertinentes a questões fundamentais.
Vingança dos paranoicos - PATRÍCIA CAMPOS MELLO
FOLHA DE SP - 20/04
Algumas horas depois de o FBI revelar que os autores do atentado da maratona de Boston tinham ligações tchetchenas, o Tea Party começou a disparar e-mails sobre a "Conexão Muçulmana". "Três das cinco páginas destacadas por Dzhokhar A. Tsarnaev no Facebook são islâmicas. Vai ser interessante ver como a mídia e o presidente vão distorcer mais esse ataque muçulmano contra os Estados Unidos."
Faz quase 50 anos que o historiador americano Richard Hofstadter publicou o ensaio "O estilo paranoico da política americana", na revista "Harper's". Mas o texto é cada vez mais atual.
O estilo paranoico, segundo Hofstadter, é um fenômeno antigo e recorrente. O "exagero acalorado, a suspeita, e as fantasias conspiratórias" costumam prosperar na direita, mas não são privilégio dos conservadores. Maçons, católicos, o governo, comunistas e agora muçulmanos já foram os vilões por trás de todas as conspirações imaginadas pelos paranoicos de plantão.
Quando ocorreu o massacre de Newtown, com a morte de 20 crianças, os conspiracionistas se apressaram em dizer que não passava de uma armação do governo para conseguir aprovar leis de desarmamento. Os atentados do 11/9 foram uma trama de Bush e companhia para justificar a invasão do Iraque (ou do Mossad, segundo outras fontes delirantes). E John F. Kennedy foi vítima de um assassinato encomendado pela máfia.
Nesta semana, contudo, há que se dar algum crédito aos paranoicos.
Em uma única semana acontece o seguinte: um imitador de Elvis envia cartas com rícino para um senador e para o presidente Barack Obama. Dois irmãos com ligações tchetchenas explodem bombas de panela de pressão na maratona de Boston e matam três pessoas --em pleno Patriot's Day, que celebra batalhas que desencadearam a guerra da independência dos EUA. E uma fábrica de fertilizantes perto de Waco, Texas, explode e deixa 15 mortos.
Foi nessa mesma época do ano que o extremista antigoverno Tim McVeigh matou 168 pessoas em um atentado a bomba em Oklahoma, em 19 de abril de 1995, e que a polícia invadiu a sede do Ramo Davidiano em Waco, no Texas, em 19 de abril de 1993.
Como pano de fundo, na quarta-feira, o Senado rejeitou um projeto de lei de restrição à venda de armas no país.
E, para completar, esta é a semana em que os americanos precisam entregar a declaração do Imposto de Renda.
Não é para ficar paranoico?
Como dizem nos Estados Unidos, "ninguém conseguiria ter inventado essa porcaria toda".
Eu, se fosse adepta das teorias da conspiração, iria me sentir vingada.
Algumas horas depois de o FBI revelar que os autores do atentado da maratona de Boston tinham ligações tchetchenas, o Tea Party começou a disparar e-mails sobre a "Conexão Muçulmana". "Três das cinco páginas destacadas por Dzhokhar A. Tsarnaev no Facebook são islâmicas. Vai ser interessante ver como a mídia e o presidente vão distorcer mais esse ataque muçulmano contra os Estados Unidos."
Faz quase 50 anos que o historiador americano Richard Hofstadter publicou o ensaio "O estilo paranoico da política americana", na revista "Harper's". Mas o texto é cada vez mais atual.
O estilo paranoico, segundo Hofstadter, é um fenômeno antigo e recorrente. O "exagero acalorado, a suspeita, e as fantasias conspiratórias" costumam prosperar na direita, mas não são privilégio dos conservadores. Maçons, católicos, o governo, comunistas e agora muçulmanos já foram os vilões por trás de todas as conspirações imaginadas pelos paranoicos de plantão.
Quando ocorreu o massacre de Newtown, com a morte de 20 crianças, os conspiracionistas se apressaram em dizer que não passava de uma armação do governo para conseguir aprovar leis de desarmamento. Os atentados do 11/9 foram uma trama de Bush e companhia para justificar a invasão do Iraque (ou do Mossad, segundo outras fontes delirantes). E John F. Kennedy foi vítima de um assassinato encomendado pela máfia.
Nesta semana, contudo, há que se dar algum crédito aos paranoicos.
Em uma única semana acontece o seguinte: um imitador de Elvis envia cartas com rícino para um senador e para o presidente Barack Obama. Dois irmãos com ligações tchetchenas explodem bombas de panela de pressão na maratona de Boston e matam três pessoas --em pleno Patriot's Day, que celebra batalhas que desencadearam a guerra da independência dos EUA. E uma fábrica de fertilizantes perto de Waco, Texas, explode e deixa 15 mortos.
Foi nessa mesma época do ano que o extremista antigoverno Tim McVeigh matou 168 pessoas em um atentado a bomba em Oklahoma, em 19 de abril de 1995, e que a polícia invadiu a sede do Ramo Davidiano em Waco, no Texas, em 19 de abril de 1993.
Como pano de fundo, na quarta-feira, o Senado rejeitou um projeto de lei de restrição à venda de armas no país.
E, para completar, esta é a semana em que os americanos precisam entregar a declaração do Imposto de Renda.
Não é para ficar paranoico?
Como dizem nos Estados Unidos, "ninguém conseguiria ter inventado essa porcaria toda".
Eu, se fosse adepta das teorias da conspiração, iria me sentir vingada.
Entre o tempo, a lei e os 93% - WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SP - 20/04
O caminho da simples redução da idade penal não tem fim; continuando os crimes, cairá para 14 ou dez?
Muitos seres humanos acreditam que tudo tem começo e fim. As religiões atribuem o começo a Deus. Lavoisier, o pai da química moderna (1743-1794), ficou firme no polo oposto. Afirmou que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Acontece, porém, que o ser humano reconhece a fatalidade na ida do nascimento à morte. As leis apontam nesse sentido.
Das frações de um segundo ao encadeamento dos séculos, firmou-se o liame da existência e de sua duração. Dele nasceu o calendário, em variedades que vão do chinês ao árabe e ao romano, do judaico ao cristão, entre outros.
Pesquisa Datafolha desta semana confirmou a relação entre tempo e variáveis jurídicas.
Indicou que 93% das pessoas ouvidas se manifestaram favoráveis à redução da idade mínima de 18 para 16 anos em que punição criminal pode ser imposta.
O início da aplicação da norma, a contar da duração da vida, existe em todo o planeta, com critérios variados. A consulta não cuidou da duração da pena, mas da idade do agente em que ela será aplicável.
Os consultados estão convencidos de que, reduzido o momento inicial da punibilidade, o combate ao crime será mais eficaz. Não mais nem menos. Ocorre que o caminho da simples redução não tem fim. Continuando os crimes, a idade será reduzida para 14? Dez?
É certo que o direito não encontrou dado melhor que o tempo para relacionar condutas ou fatos ilícitos, incluída a idade do acusado.
A Constituição brasileira faz 50 referências ao tempo ou a seus derivados para aplicação aos atos que menciona, criminosos ou não. Dá o prazo ao indicar os termos inicial e final da duração da vida ou de seus espaços, conforme a idade da pessoa envolvida.
Prazo, assim, é espaço de tempo que passou da simples convenção para ser base de leis, que aceita ou nega a legalidade de ações humanas, mesmo para sua apuração.
No processo, a duração dos fatos (isto é, o espaço entre o início e o fim) é fundamental. Situa as referências formais e as define em face do direito. No Código Penal, a idade (tempo de duração da vida) admite o enquadramento do autor do delito no processo condenatório ou o exclui integralmente ou em parte, com limites de idade.
A duração convencional ou legal é o tempo. Chega à realidade concreta quando atinge a hora de a transpor para o processo judicial.
Quando se veem reiteradas propostas de diminuição da idade do agente para punir uma ou mais de uma conduta delituosa de jovens (18 anos? 16 ou menos?), fala-se muito na consciência do acusado quanto à criminalidade dos atos. Consciência da criminalidade é, porém, incompatível com a fixação uniforme para todos os possíveis agentes.
Certamente não é remédio promover a contenção dos delitos. Nesse perfil, a diminuição da idade é limitadíssima, sobretudo quando se pensa nas diferenças socioeconômicas dos possíveis envolvidos.
Plenitude de consciência coincide com duração da vida, em senso estrito. O tempo (a duração) é critério para determinar a legalidade ou a ilegalidade de condutas e penas.
Usar o tempo para ligar punição criminal e duração variável da existência do acusado é o fracasso antecipado, até pelo ridículo que seria falar em mais redução, se a resposta vitoriosa fosse aceita.
O caminho da simples redução da idade penal não tem fim; continuando os crimes, cairá para 14 ou dez?
Muitos seres humanos acreditam que tudo tem começo e fim. As religiões atribuem o começo a Deus. Lavoisier, o pai da química moderna (1743-1794), ficou firme no polo oposto. Afirmou que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Acontece, porém, que o ser humano reconhece a fatalidade na ida do nascimento à morte. As leis apontam nesse sentido.
Das frações de um segundo ao encadeamento dos séculos, firmou-se o liame da existência e de sua duração. Dele nasceu o calendário, em variedades que vão do chinês ao árabe e ao romano, do judaico ao cristão, entre outros.
Pesquisa Datafolha desta semana confirmou a relação entre tempo e variáveis jurídicas.
Indicou que 93% das pessoas ouvidas se manifestaram favoráveis à redução da idade mínima de 18 para 16 anos em que punição criminal pode ser imposta.
O início da aplicação da norma, a contar da duração da vida, existe em todo o planeta, com critérios variados. A consulta não cuidou da duração da pena, mas da idade do agente em que ela será aplicável.
Os consultados estão convencidos de que, reduzido o momento inicial da punibilidade, o combate ao crime será mais eficaz. Não mais nem menos. Ocorre que o caminho da simples redução não tem fim. Continuando os crimes, a idade será reduzida para 14? Dez?
É certo que o direito não encontrou dado melhor que o tempo para relacionar condutas ou fatos ilícitos, incluída a idade do acusado.
A Constituição brasileira faz 50 referências ao tempo ou a seus derivados para aplicação aos atos que menciona, criminosos ou não. Dá o prazo ao indicar os termos inicial e final da duração da vida ou de seus espaços, conforme a idade da pessoa envolvida.
Prazo, assim, é espaço de tempo que passou da simples convenção para ser base de leis, que aceita ou nega a legalidade de ações humanas, mesmo para sua apuração.
No processo, a duração dos fatos (isto é, o espaço entre o início e o fim) é fundamental. Situa as referências formais e as define em face do direito. No Código Penal, a idade (tempo de duração da vida) admite o enquadramento do autor do delito no processo condenatório ou o exclui integralmente ou em parte, com limites de idade.
A duração convencional ou legal é o tempo. Chega à realidade concreta quando atinge a hora de a transpor para o processo judicial.
Quando se veem reiteradas propostas de diminuição da idade do agente para punir uma ou mais de uma conduta delituosa de jovens (18 anos? 16 ou menos?), fala-se muito na consciência do acusado quanto à criminalidade dos atos. Consciência da criminalidade é, porém, incompatível com a fixação uniforme para todos os possíveis agentes.
Certamente não é remédio promover a contenção dos delitos. Nesse perfil, a diminuição da idade é limitadíssima, sobretudo quando se pensa nas diferenças socioeconômicas dos possíveis envolvidos.
Plenitude de consciência coincide com duração da vida, em senso estrito. O tempo (a duração) é critério para determinar a legalidade ou a ilegalidade de condutas e penas.
Usar o tempo para ligar punição criminal e duração variável da existência do acusado é o fracasso antecipado, até pelo ridículo que seria falar em mais redução, se a resposta vitoriosa fosse aceita.
CAPA DA REVISTA VEJA - A PUTA DE LULA
A PUTA DE LULA
Limpeza no gabinete
Em 2012, descobriu-se que Rosemary Noronha usava a influência que desfrutava com o ex-presidente Lula para se locupletar do poder. Exonerada do cargo de chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo, ela foi alvo de uma sindicância. VEJA teve acesso às 120 páginas resultantes da investigação oficial, mantida em segredo pelo governo. Elas mostram a extensão das traficâncias de Rose – que está magoada e ameaça revidar
Tomates, pepinos e juros - GUSTAVO FRANCO
O ESTADO DE S. PAULO - 20/04
Há uma síndrome que costuma acometer as autoridades brasileiras quando se trata de inflação: a dificuldade em perceber que se trata de um esporte coletivo.
A inflação não é fruto de jogadas individuais que encantam ou irritam torcedores e dirigentes, de vilões ou heróis facilmente identificáveis, mas do trabalho de uma equipe muito grande manobrando atabalhoadamente um transatlântico.
A confusão parece se ampliar em tempos recentes por outra síndrome, esta de natureza pós-moderna, a do "protagonismo". Não há dois parágrafos seguidos de qualquer texto sobre a diplomacia brasileira sem ao menos uma incidência de "protagonismo". Assim como o Banco Central se encantou com "resiliência", que usava como uma espécie de autoelogio, e agora, desafortunadamente, parece se aplicar muito mais à inflação que ao PIB.
O fato é que "protagonismo", em oposição à delegação e representação, tem sido um dos mantras do novo ativismo social do qual o movimento "Occupy" é um dos maiores exemplos. É a democracia direta, a linguagem horizontal, a fala das ruas e das redes sociais. O ativista é o sujeito da ação emancipatória, a história resumida à sua própria conduta. È a "performance" que se esgota em si mesma, visando a mídia e não a ação legislativa conseqüente. Essa é inspiração dos nossos diplomatas, o protagonismo do Brasil. Já o do tomate, que já foi capa de revista, pode ser efêmero ou não, dependendo do que vier a seguir.
Claro que há um erro basilar nesse raciocínio que associa a inflação às hortaliças: sempre vai haver o feijão carioca, a batata inglesa e o chuchu crescendo muito mais que a média dos outros preços, enquanto outras coisas registrarão variações negativas. O próprio tomate esteve a 40 centavos o quilo não faz tanto tempo.
Uma vicissitude das médias é a de reunir em torno de si diversas observações formando um gráfico em forma de sino. A designação técnica para os extremos da distribuição de frequência é "cauda", o que serve também para descrever a origem dos tomates vendidos no Brasil acima de R$ 12: eles vêm de Urumqi, na China, a localidade que ostenta. o recorde de maior distância de qualquer porto marítimo. É desse lugar que o país dotado de mais área agricultável do mundo importa seus tomates. Algo deve estar errado, não?
Mas não vamos nos perder no detalhe pitoresco. O essencial é que a inflação é um esporte de massa, um processo coletivo, que envolve o todo, que em matéria econômica, costuma ser amplamente maior que as partes. É exatamente nesse sentido que se diz que a inflação é uma doença caracterizada pelo aumento generalizado dos preços. A palavra- chave aqui é justamente o "generalizado", que expressa a natureza social do processo. Os fenômenos sociais, no dizer, de um dos protagonistas (oops) da sociologia, Emile Durkheim, são exteriores às consciências individuais e sua natureza tem a ver com o coletivo, cuja identidade é singular e diversa daquela de suas partes componentes.
Essa é a explicação "sociológica" para o fato de a inflação permanecer imune aos truques como o controle de alguns ou mesmo de todos os preços, e também às manipulações estatísticas: a tentativa de encobrir manifestações individuais, ou a evidência amostrai, não interfere com o fenômeno social.
As causas da inflação são tão conhecidas que até os apóstolos não aguentam mais repetir. Quem quer ouvir sobre o "rombo"nas contas públicas? Isso sim é um pepino, o principal item da cesta básica de qualquer autoridade, lidar com gastos excessivos. Faz lembrar uma ótima frase de Giro Gomes ao deixar o Ministério da Fazenda: "Convencer governadores a reduzir despesa é como explicar o significado do Natal ao peru."
A heterodoxia está prevalecendo, entre outras razões, em face do tédio à controvérsia, ou ao cansaço em rebater a pseudociência. A contabilidade criativa, o voluntarismo e o "corpo a corpo" reconquistaram o protagonismo (não resisto) de outrora, vejam quem são os interlocutores da presidente, os especialistas consultados. Por isso, talvez se diga que estamos revivendo o governo Geisel, inclusive com alguns personagens em comum.
Noutra época, as teses ortodoxas sobre a inflação eram acusadas de "fundamentalismo", uma designação pejorativa para o truísmo segundo a qual as febres derivam das infecções. A ideia pode parecer óbvia, e é, mas alguém precisa dizê-lo à presidente. Pergunte- se ao nosso campeão Bernardinho sobre a receita para o sucesso em esportes coletivos: domínio dos fundamentos (sic), perícia técnica e trabalho de equipe (grifos meus). Era com ele que a presidente deveria estar conversando, em vez de flertar com a medicina alternativa e com a experiência pregressa em lidar com hortaliças indisciplinadas.
É preciso esclarecer, todavia, que o aumento nos juros não é o exercício do "fundamentalismo". A política monetária é uma espécie de antitérmico, e não funciona como antibiótico. É o recurso que sobra quando o governo se abstém de tratar das coisas fundamentais ou as conduz de forma equivocada, como tem feito com a nossa política fiscal. A ideia que o problema do crescimento se resolve assinando cheques, ou pedaços de papel pintado, é tão tosca como dizer que o problema social é um problema de polícia.
Diante desse quadro, entretanto, não há alternativa: o Banco Central assumirá o ônus de reduzir a febre causada pela gastança e atrairá para si a zanga do "setor produtivo", quando os verdadeiros culpados estão bem escondidos no emaranhado opaco em que se tornaram as nossas contas públicas.
Há uma síndrome que costuma acometer as autoridades brasileiras quando se trata de inflação: a dificuldade em perceber que se trata de um esporte coletivo.
A inflação não é fruto de jogadas individuais que encantam ou irritam torcedores e dirigentes, de vilões ou heróis facilmente identificáveis, mas do trabalho de uma equipe muito grande manobrando atabalhoadamente um transatlântico.
A confusão parece se ampliar em tempos recentes por outra síndrome, esta de natureza pós-moderna, a do "protagonismo". Não há dois parágrafos seguidos de qualquer texto sobre a diplomacia brasileira sem ao menos uma incidência de "protagonismo". Assim como o Banco Central se encantou com "resiliência", que usava como uma espécie de autoelogio, e agora, desafortunadamente, parece se aplicar muito mais à inflação que ao PIB.
O fato é que "protagonismo", em oposição à delegação e representação, tem sido um dos mantras do novo ativismo social do qual o movimento "Occupy" é um dos maiores exemplos. É a democracia direta, a linguagem horizontal, a fala das ruas e das redes sociais. O ativista é o sujeito da ação emancipatória, a história resumida à sua própria conduta. È a "performance" que se esgota em si mesma, visando a mídia e não a ação legislativa conseqüente. Essa é inspiração dos nossos diplomatas, o protagonismo do Brasil. Já o do tomate, que já foi capa de revista, pode ser efêmero ou não, dependendo do que vier a seguir.
Claro que há um erro basilar nesse raciocínio que associa a inflação às hortaliças: sempre vai haver o feijão carioca, a batata inglesa e o chuchu crescendo muito mais que a média dos outros preços, enquanto outras coisas registrarão variações negativas. O próprio tomate esteve a 40 centavos o quilo não faz tanto tempo.
Uma vicissitude das médias é a de reunir em torno de si diversas observações formando um gráfico em forma de sino. A designação técnica para os extremos da distribuição de frequência é "cauda", o que serve também para descrever a origem dos tomates vendidos no Brasil acima de R$ 12: eles vêm de Urumqi, na China, a localidade que ostenta. o recorde de maior distância de qualquer porto marítimo. É desse lugar que o país dotado de mais área agricultável do mundo importa seus tomates. Algo deve estar errado, não?
Mas não vamos nos perder no detalhe pitoresco. O essencial é que a inflação é um esporte de massa, um processo coletivo, que envolve o todo, que em matéria econômica, costuma ser amplamente maior que as partes. É exatamente nesse sentido que se diz que a inflação é uma doença caracterizada pelo aumento generalizado dos preços. A palavra- chave aqui é justamente o "generalizado", que expressa a natureza social do processo. Os fenômenos sociais, no dizer, de um dos protagonistas (oops) da sociologia, Emile Durkheim, são exteriores às consciências individuais e sua natureza tem a ver com o coletivo, cuja identidade é singular e diversa daquela de suas partes componentes.
Essa é a explicação "sociológica" para o fato de a inflação permanecer imune aos truques como o controle de alguns ou mesmo de todos os preços, e também às manipulações estatísticas: a tentativa de encobrir manifestações individuais, ou a evidência amostrai, não interfere com o fenômeno social.
As causas da inflação são tão conhecidas que até os apóstolos não aguentam mais repetir. Quem quer ouvir sobre o "rombo"nas contas públicas? Isso sim é um pepino, o principal item da cesta básica de qualquer autoridade, lidar com gastos excessivos. Faz lembrar uma ótima frase de Giro Gomes ao deixar o Ministério da Fazenda: "Convencer governadores a reduzir despesa é como explicar o significado do Natal ao peru."
A heterodoxia está prevalecendo, entre outras razões, em face do tédio à controvérsia, ou ao cansaço em rebater a pseudociência. A contabilidade criativa, o voluntarismo e o "corpo a corpo" reconquistaram o protagonismo (não resisto) de outrora, vejam quem são os interlocutores da presidente, os especialistas consultados. Por isso, talvez se diga que estamos revivendo o governo Geisel, inclusive com alguns personagens em comum.
Noutra época, as teses ortodoxas sobre a inflação eram acusadas de "fundamentalismo", uma designação pejorativa para o truísmo segundo a qual as febres derivam das infecções. A ideia pode parecer óbvia, e é, mas alguém precisa dizê-lo à presidente. Pergunte- se ao nosso campeão Bernardinho sobre a receita para o sucesso em esportes coletivos: domínio dos fundamentos (sic), perícia técnica e trabalho de equipe (grifos meus). Era com ele que a presidente deveria estar conversando, em vez de flertar com a medicina alternativa e com a experiência pregressa em lidar com hortaliças indisciplinadas.
É preciso esclarecer, todavia, que o aumento nos juros não é o exercício do "fundamentalismo". A política monetária é uma espécie de antitérmico, e não funciona como antibiótico. É o recurso que sobra quando o governo se abstém de tratar das coisas fundamentais ou as conduz de forma equivocada, como tem feito com a nossa política fiscal. A ideia que o problema do crescimento se resolve assinando cheques, ou pedaços de papel pintado, é tão tosca como dizer que o problema social é um problema de polícia.
Diante desse quadro, entretanto, não há alternativa: o Banco Central assumirá o ônus de reduzir a febre causada pela gastança e atrairá para si a zanga do "setor produtivo", quando os verdadeiros culpados estão bem escondidos no emaranhado opaco em que se tornaram as nossas contas públicas.
Amigos do monopólio - KÁTIA ABREU
FOLHA DE SP - 20/04
Eliminar os pequenos só atende aos interesses do monopólio de meia dúzia de grandes frigoríficos
A ONG Amigos da Terra divulgou pesquisa inédita que se propõe a traçar uma radiografia da carne consumida no país. O relatório denuncia que um terço da carne que chega à mesa do brasileiro não passa por nenhum tipo de inspeção. E contabiliza "quase mil" estabelecimentos que atuam Brasil afora, "sem nenhuma fiscalização efetiva" de órgãos federais.
Problemas existem, é verdade, mas números divulgados pela ONG divergem dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Trimestral do Abate de Animais do IBGE atesta que existem 1.345 abatedouros bovinos em operação no país e diz que apenas 25% da carne que saiu desses estabelecimentos em 2012 passou por inspeção estadual e municipal. Os 75% restantes foram inspecionados pelo governo federal.
Desde que a Constituinte de 1988 descentralizou a fiscalização das condições sanitárias e tecnológicas de matadouros e frigoríficos, Estados e municípios passaram a ter serviços de inspeção. A partir daí, diz a ONG, o objetivo de agilizar e melhorar a fiscalização se perdeu, cedendo lugar ao não cumprimento das regras sanitárias.
A precariedade da inspeção municipal é fato em parte substantiva dos abatedouros, onde veterinários deveriam ter presença efetiva permanente e só aparecem de forma esporádica. O que repudio é a solução proposta publicamente por Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra.
A pretexto de defender a fiscalização federal como única capaz de assegurar carne de qualidade, a ONG desconhece a realidade e ignora os municípios, onde a vida e a produção efetivamente acontecem.
Em defesa da extinção dos pequenos frigoríficos, a Amigos da Terra assegura que, mesmo sem eles, não faltará carne no mercado porque grandes estabelecimentos trabalham abaixo da capacidade.
"Ante um abate de 21 milhões de cabeças nos frigoríficos com inspeção federal, temos uma capacidade instalada estimada pelas empresas do setor em pelo menos 52 milhões de cabeças", diz a ONG.
De acordo com o IBGE, porém, foram abatidos 23,33 milhões de cabeças em 209 frigoríficos inspecionados pelo Ministério da Agricultura em 2012.
Os 713 estabelecimentos pequenos, que criam centenas de empregos no interior, foram responsá- veis por apenas 8% do abate total (2,37 milhões de cabeças), e não por um terço, como sugere pesquisa da ONG.
Em vez de exterminá-los, precisamos instalar nesses frigoríficos as normas higiênicas sanitárias que a inspeção federal preconiza para proteger a saúde do consumidor.
Até hoje, a lei 1.283/1950, que dispõe sobre prévia fiscalização de indústrias que processam produtos de origem animal, não foi regulamentada, fixando regras para todos os níveis. Regulamentaram-se apenas as normas para estabelecimentos sob inspeção federal.
Falar em fechar os pequenos é absurdo inaceitável. Equivale a sugerir a açougues do interior que comprem bovinos vivos de produtores para que sejam abatidos debaixo de árvores, criando uma espécie de rede clandestina de "frigoárvores".
Afinal, não podemos desconhecer que 90% das propriedades rurais brasileiras possuem um rebanho médio de 33 cabeças. Sem escala de produção para completar uma carga de caminhão e levá-la a um grande centro, estes necessitam dos pequenos frigoríficos.
Entendo necessária a criação de normas que sejam obrigatórias para todos os níveis, com apoio técnico e financeiro aos Estados e aos municípios para que estruturem seus serviços a serem monitorados pelo sistema brasileiro de inspeção.
Esse é o caminho que deve ser acompanhado do fortalecimento da Vigilância Sanitária, com a devida fiscalização do comércio e a conscientização da população.
O poder público tem que estar presente nos três níveis da Federação, e os abates clandestinos --estes, sim-- têm que deixar de existir.
Eliminar simplesmente os pequenos é solução que só atende aos interesses do monopólio de meia dúzia de grandes frigoríficos, que vivem no conforto dos empréstimos com dinheiro público e juros subsidiados.
Eliminar os pequenos só atende aos interesses do monopólio de meia dúzia de grandes frigoríficos
A ONG Amigos da Terra divulgou pesquisa inédita que se propõe a traçar uma radiografia da carne consumida no país. O relatório denuncia que um terço da carne que chega à mesa do brasileiro não passa por nenhum tipo de inspeção. E contabiliza "quase mil" estabelecimentos que atuam Brasil afora, "sem nenhuma fiscalização efetiva" de órgãos federais.
Problemas existem, é verdade, mas números divulgados pela ONG divergem dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Trimestral do Abate de Animais do IBGE atesta que existem 1.345 abatedouros bovinos em operação no país e diz que apenas 25% da carne que saiu desses estabelecimentos em 2012 passou por inspeção estadual e municipal. Os 75% restantes foram inspecionados pelo governo federal.
Desde que a Constituinte de 1988 descentralizou a fiscalização das condições sanitárias e tecnológicas de matadouros e frigoríficos, Estados e municípios passaram a ter serviços de inspeção. A partir daí, diz a ONG, o objetivo de agilizar e melhorar a fiscalização se perdeu, cedendo lugar ao não cumprimento das regras sanitárias.
A precariedade da inspeção municipal é fato em parte substantiva dos abatedouros, onde veterinários deveriam ter presença efetiva permanente e só aparecem de forma esporádica. O que repudio é a solução proposta publicamente por Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra.
A pretexto de defender a fiscalização federal como única capaz de assegurar carne de qualidade, a ONG desconhece a realidade e ignora os municípios, onde a vida e a produção efetivamente acontecem.
Em defesa da extinção dos pequenos frigoríficos, a Amigos da Terra assegura que, mesmo sem eles, não faltará carne no mercado porque grandes estabelecimentos trabalham abaixo da capacidade.
"Ante um abate de 21 milhões de cabeças nos frigoríficos com inspeção federal, temos uma capacidade instalada estimada pelas empresas do setor em pelo menos 52 milhões de cabeças", diz a ONG.
De acordo com o IBGE, porém, foram abatidos 23,33 milhões de cabeças em 209 frigoríficos inspecionados pelo Ministério da Agricultura em 2012.
Os 713 estabelecimentos pequenos, que criam centenas de empregos no interior, foram responsá- veis por apenas 8% do abate total (2,37 milhões de cabeças), e não por um terço, como sugere pesquisa da ONG.
Em vez de exterminá-los, precisamos instalar nesses frigoríficos as normas higiênicas sanitárias que a inspeção federal preconiza para proteger a saúde do consumidor.
Até hoje, a lei 1.283/1950, que dispõe sobre prévia fiscalização de indústrias que processam produtos de origem animal, não foi regulamentada, fixando regras para todos os níveis. Regulamentaram-se apenas as normas para estabelecimentos sob inspeção federal.
Falar em fechar os pequenos é absurdo inaceitável. Equivale a sugerir a açougues do interior que comprem bovinos vivos de produtores para que sejam abatidos debaixo de árvores, criando uma espécie de rede clandestina de "frigoárvores".
Afinal, não podemos desconhecer que 90% das propriedades rurais brasileiras possuem um rebanho médio de 33 cabeças. Sem escala de produção para completar uma carga de caminhão e levá-la a um grande centro, estes necessitam dos pequenos frigoríficos.
Entendo necessária a criação de normas que sejam obrigatórias para todos os níveis, com apoio técnico e financeiro aos Estados e aos municípios para que estruturem seus serviços a serem monitorados pelo sistema brasileiro de inspeção.
Esse é o caminho que deve ser acompanhado do fortalecimento da Vigilância Sanitária, com a devida fiscalização do comércio e a conscientização da população.
O poder público tem que estar presente nos três níveis da Federação, e os abates clandestinos --estes, sim-- têm que deixar de existir.
Eliminar simplesmente os pequenos é solução que só atende aos interesses do monopólio de meia dúzia de grandes frigoríficos, que vivem no conforto dos empréstimos com dinheiro público e juros subsidiados.
A nova agenda dos Brics - MARCOS CARAMURU DE PAIVA
FOLHA DE SP - 20/04
Os pontos principais do encontro dos presidentes do grupo envolvem muito trabalho e dificuldades
A última reunião dos Brics, no final de março, mostrou que o grupo pouco a pouco vai montando um enredo próprio. Se, num primeiro momento da concertação Brics o único objetivo comum parecia ser a ampliação da voz do grupo nos organismos multilaterais e nas decisões econômicas mundiais, objetivo, aliás, plenamente justificado, agora a agenda está mais clara.
Os três pontos principais do encontro presidencial --criar um "business council", formalizar um arranjo de "swap" de moedas para situações de crise financeira e endossar a criação de banco para financiar infraestrutura-- envolvem muito trabalho adiante. E todos encerram elevado grau de dificuldade.
Um "business council" poderá render frutos se os líderes envolvidos tiverem capacidade de penetração nos seus países e puderem efetivamente mobilizar o meio empresarial. Não é simples. Não há história de cooperação entre os empresários dos Brics. Além disso, a sinergia entre os segmentos produtivos dos cinco países é baixa. Na verdade, há mais competição.
Os chineses obviamente terão vantagens, em razão dos recursos disponíveis para financiar suas iniciativas. Mas eles já reinam no comércio. E sua estratégia para formar joint-ventures neste momento volta-se para a Europa, onde empresas de alta tecnologia podem ser adquiridas por preços acessíveis.
O mecanismo de "swap" pode ser uma alternativa. Nas crises, escasseiam-se as linhas comerciais, e é preciso fazer grande esforço para garanti-las.
A questão é que, se a crise vier e for necessário recorrer ao mecanismo para financiar o comércio, mais uma vez a China sairá favorecida. Primeiro, porque a possibilidade de que a própria China se valha do "swap" é zero. Além disso, sua capacidade de suprimento de bens pagos em renminbis é consideravelmente superior à de todas as demais economias cujas moedas estarão envolvidas.
Finalmente, a proposta de montagem de um banco para financiar a infraestrutura parece, à primeira vista, um esforço grande demais.
Os Tesouros dos Brics não deveriam, em tese, ter dificuldade de se financiar nos mercados internacionais a custos acessíveis. Se tiverem, não merecem o otimismo que justificou a criação do acrônimo.
O setor privado e os governos locais, sobretudo de Brasil, Índia e África do Sul, podem, sim, ter problemas de financiamento. E para eles, é verdade, não há janelas adequadas de acesso a recursos. A janela mais óbvia, os bancos internacionais de desenvolvimento, está meio fechada. Os bancos voltam-se mais para projetos sociais do que para a infraestrutura. E sua burocracia é incompatível com o grau de eficiência e rapidez requerido nos desembolsos de grandes projetos.
É cedo para conclusões definitivas. A capacidade de achar soluções para os problemas --e, eventualmente, dar um passo atrás se a implementação dos objetivos ficar difícil demais-- deverá estar lá.
Num cenário ideal, o que se poderia esperar dos Brics seria um esforço maior de abertura em matéria de comércio. Mas nenhum dos cinco países parece minimamente preparado para falar do assunto.
Os pontos principais do encontro dos presidentes do grupo envolvem muito trabalho e dificuldades
A última reunião dos Brics, no final de março, mostrou que o grupo pouco a pouco vai montando um enredo próprio. Se, num primeiro momento da concertação Brics o único objetivo comum parecia ser a ampliação da voz do grupo nos organismos multilaterais e nas decisões econômicas mundiais, objetivo, aliás, plenamente justificado, agora a agenda está mais clara.
Os três pontos principais do encontro presidencial --criar um "business council", formalizar um arranjo de "swap" de moedas para situações de crise financeira e endossar a criação de banco para financiar infraestrutura-- envolvem muito trabalho adiante. E todos encerram elevado grau de dificuldade.
Um "business council" poderá render frutos se os líderes envolvidos tiverem capacidade de penetração nos seus países e puderem efetivamente mobilizar o meio empresarial. Não é simples. Não há história de cooperação entre os empresários dos Brics. Além disso, a sinergia entre os segmentos produtivos dos cinco países é baixa. Na verdade, há mais competição.
Os chineses obviamente terão vantagens, em razão dos recursos disponíveis para financiar suas iniciativas. Mas eles já reinam no comércio. E sua estratégia para formar joint-ventures neste momento volta-se para a Europa, onde empresas de alta tecnologia podem ser adquiridas por preços acessíveis.
O mecanismo de "swap" pode ser uma alternativa. Nas crises, escasseiam-se as linhas comerciais, e é preciso fazer grande esforço para garanti-las.
A questão é que, se a crise vier e for necessário recorrer ao mecanismo para financiar o comércio, mais uma vez a China sairá favorecida. Primeiro, porque a possibilidade de que a própria China se valha do "swap" é zero. Além disso, sua capacidade de suprimento de bens pagos em renminbis é consideravelmente superior à de todas as demais economias cujas moedas estarão envolvidas.
Finalmente, a proposta de montagem de um banco para financiar a infraestrutura parece, à primeira vista, um esforço grande demais.
Os Tesouros dos Brics não deveriam, em tese, ter dificuldade de se financiar nos mercados internacionais a custos acessíveis. Se tiverem, não merecem o otimismo que justificou a criação do acrônimo.
O setor privado e os governos locais, sobretudo de Brasil, Índia e África do Sul, podem, sim, ter problemas de financiamento. E para eles, é verdade, não há janelas adequadas de acesso a recursos. A janela mais óbvia, os bancos internacionais de desenvolvimento, está meio fechada. Os bancos voltam-se mais para projetos sociais do que para a infraestrutura. E sua burocracia é incompatível com o grau de eficiência e rapidez requerido nos desembolsos de grandes projetos.
É cedo para conclusões definitivas. A capacidade de achar soluções para os problemas --e, eventualmente, dar um passo atrás se a implementação dos objetivos ficar difícil demais-- deverá estar lá.
Num cenário ideal, o que se poderia esperar dos Brics seria um esforço maior de abertura em matéria de comércio. Mas nenhum dos cinco países parece minimamente preparado para falar do assunto.
Um país fora do ritmo - ROLF KUNTZ
O ESTADO DE S. PAULO - 20/04
O Brasil manterá o passo errado nos próximos cinco anos e -avançará bem menos que outros emergentes até 2018, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Sua inflação continuará mais alta e suas contas externas deverão piorar nesse período, com o déficit em transações correntes passando de 2,4% para 3,4% do produto interno bruto (PIB). Projeções de prazo longo aparecem no fim do Panorama Econômico Mundial publicado em abril e setembro pelo Fundo, num apêndice pouco visitado e pouco citado pela maior parte da imprensa. Estimativas desse tipo são sujeitas a erros importantes. Não são, no entanto, arbitrárias, nem inúteis. Ajudam a ver como poderá ser o futuro, se as tendências dos últimos anos persistirem, se as políticas forem mantidas e se as reformas necessárias forem levadas adiante ou negligenciadas. No caso do Brasil, os autores do estudo obviamente esperam poucas mudanças com potencial para tornar a economia mais dinâmica e mais sólida em seus fundamentos.
Segundo as projeções, a economia mundial crescerá 3,3% neste ano, 4% no próximo e 4,5% em 2018, puxada, como tem sido há alguns anos, pelos países emergentes e em desenvolvimento. A convalescença europeia será lenta e penosa. Os Estados Unidos continuarão avançando com firmeza. Seu PIB crescerá apenas 1,2% em 2013, por causa do arrocho fiscal, mas aumentará 2,2% em 2014 e em 2018 terá atingido um ritmo de expansão 2,5%. A média dos emergentes e em desenvolvimento ficará em 5,3%, 5,7% e 6,2% em cada um desses três pontos de referência. Para a Ásia em desenvolvimento, incluída a China, os números estimados são 7,1%, 7,3% e 7,7%. Há uma aposta, portanto, no êxito dos programas de ajuste e de renovação dos modelos já iniciados em algumas dessas economias.
Nesse quadro, o avanço brasileiro continuará mais lento que o de vários países latino-americanos. Segundo o Panorama, o PIB do Brasil aumentará 3% em 2013,4% no próximo ano e 4,2% em 2018. Se a projeção para este ano for confirmada, o resultado será bem melhor que o de 2012, quando o crescimento ficou em apenas 0,9%, apesar dos estímulos criados pelo governo. Alguns incentivos ao investimento privado poderão finalmente produzir algum efeito neste ano, de acordo com a análise apresentada no capítulo 2 do relatório.
Mas "restrições de oferta podem limitar o ritmo de crescimento a curto prazo", advertem os autores do trabalho. Em outras palavras: os entraves observados nos últimos anos poderão ainda atrapalhar a economia brasileira em 2013. Sem examinar em detalhes a política seguida no Brasil depois da crise de 2008 e especialmente a partir i de 2011, os economistas do FMI apontaram, no entanto, o grande problema negligenciado por muito tempo pelo governo brasileiro. Durante dois anos a equipe da presidente Dilma Rousseff insistiu em estimular a demanda, principalmente de consumo, sem dar a atenção necessária ao lado da produção e, portanto, da oferta.
O crescimento de 3% estimado para 2013 ficará muito abaixo do necessário para compensar o baixo desempenho dos dois anos anteriores. É preciso levar também isso em conta ao confrontar os números do Brasil com os de outros países do Hemisfério. Chile, Colômbia, Equador, Peru e México também foram afetados pela crise internacional, mas em pouco tempo voltaram a crescer em ritmo parecido com o dos anos anteriores à recessão no mundo rico. Todos bateram o Brasil com muita folga desde 2010.
Para 2013,2014 e 2018 as projeções do Fundo indicam as seguintes taxas de expansão para esses países: Chile, 4,9%, 4,6% e 4,6%; Colômbia, 4,1%, 4,5% e 4,5%; Equador, 4,4%, 3,9% e 3,5%; Peru, 6,3%, 6,1% e 6%; México, 3,4%, 3,4% e 3,3%. Entre 2010 e 2012 a economia equatoriana acumulou expansão de 17,14%; a mexicana, de 13,67%; a brasileira, de apenas 11,40%. Em todos esses países a inflação foi menor que a brasileira e assim deverá continuar neste e no próximo ano.
Os economistas do FMI estimam para o Brasil inflação de 5,5% em 2013 e 4,5% em 2014. Para o Chile, a projeção é de 3% em cada um dos dois anos. Para a Colômbia, de 2,4% e 3%. Para o Peru, de 2,1% e 2%. Para o México, de 3,6% e 3,3%. A presidente Dilma Rousseff deveria desconhecer esses números quando falou sobre crescimento e inflação em Durban, na África do Sul. Naquele pronunciamento, ela rejeitou uma ação mais forte contra a alta de preços como se fosse incompatível com a expansão do PIB. Parece ter esquecido, ou talvez ignorasse, a experiência internacional. Inflação alta e resistente, como a brasileira, dificulta o planejamento empresarial e corrói o poder de compra dos consumidores. Tende a tornar-se, portanto, um obstáculo ao crescimento da economia.
Além disso, inflação mais elevada que a dos outros países desajusta o câmbio e afeta o poder de competição dos produtores nacionais. No entanto, empresários e ilustres economistas brasileiros muito raramente reclamam da inflação, embora esbravejem continuamente contra a valorização cambial. Devem ter esquecido tanto a experiência internacional quanto a nacional.
Durante muito tempo o Brasil se deu mal com o câmbio fixo. O câmbio flexível e ajustado periodicamente pela inflação, adotado em 1968, foi um avanço, mas muito imperfeito. Sem estabilidade monetária, o regime cambial tornou-se uma corrida permanente em busca de ajustes de curta duração. A inflação desarranjava o câmbio e em seguida a correção cambial desarrumava os preços. O sistema passou a funcionar como um cão correndo atrás do próprio rabo. Parece estranho, mas alguns economistas e industriais falam como se tivessem saudade desse tempo.
Os países com melhor desempenho têm combinado controle da inflação, contas públicas em condições razoáveis e integração nos mercados globais. O resto é teimosia, mera insistência em pajelanças bem conhecidas, testadas e desacreditadas.
O avanço brasileiro deve continuar mais lento que o de vários países latino-americanos.
O Brasil manterá o passo errado nos próximos cinco anos e -avançará bem menos que outros emergentes até 2018, segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Sua inflação continuará mais alta e suas contas externas deverão piorar nesse período, com o déficit em transações correntes passando de 2,4% para 3,4% do produto interno bruto (PIB). Projeções de prazo longo aparecem no fim do Panorama Econômico Mundial publicado em abril e setembro pelo Fundo, num apêndice pouco visitado e pouco citado pela maior parte da imprensa. Estimativas desse tipo são sujeitas a erros importantes. Não são, no entanto, arbitrárias, nem inúteis. Ajudam a ver como poderá ser o futuro, se as tendências dos últimos anos persistirem, se as políticas forem mantidas e se as reformas necessárias forem levadas adiante ou negligenciadas. No caso do Brasil, os autores do estudo obviamente esperam poucas mudanças com potencial para tornar a economia mais dinâmica e mais sólida em seus fundamentos.
Segundo as projeções, a economia mundial crescerá 3,3% neste ano, 4% no próximo e 4,5% em 2018, puxada, como tem sido há alguns anos, pelos países emergentes e em desenvolvimento. A convalescença europeia será lenta e penosa. Os Estados Unidos continuarão avançando com firmeza. Seu PIB crescerá apenas 1,2% em 2013, por causa do arrocho fiscal, mas aumentará 2,2% em 2014 e em 2018 terá atingido um ritmo de expansão 2,5%. A média dos emergentes e em desenvolvimento ficará em 5,3%, 5,7% e 6,2% em cada um desses três pontos de referência. Para a Ásia em desenvolvimento, incluída a China, os números estimados são 7,1%, 7,3% e 7,7%. Há uma aposta, portanto, no êxito dos programas de ajuste e de renovação dos modelos já iniciados em algumas dessas economias.
Nesse quadro, o avanço brasileiro continuará mais lento que o de vários países latino-americanos. Segundo o Panorama, o PIB do Brasil aumentará 3% em 2013,4% no próximo ano e 4,2% em 2018. Se a projeção para este ano for confirmada, o resultado será bem melhor que o de 2012, quando o crescimento ficou em apenas 0,9%, apesar dos estímulos criados pelo governo. Alguns incentivos ao investimento privado poderão finalmente produzir algum efeito neste ano, de acordo com a análise apresentada no capítulo 2 do relatório.
Mas "restrições de oferta podem limitar o ritmo de crescimento a curto prazo", advertem os autores do trabalho. Em outras palavras: os entraves observados nos últimos anos poderão ainda atrapalhar a economia brasileira em 2013. Sem examinar em detalhes a política seguida no Brasil depois da crise de 2008 e especialmente a partir i de 2011, os economistas do FMI apontaram, no entanto, o grande problema negligenciado por muito tempo pelo governo brasileiro. Durante dois anos a equipe da presidente Dilma Rousseff insistiu em estimular a demanda, principalmente de consumo, sem dar a atenção necessária ao lado da produção e, portanto, da oferta.
O crescimento de 3% estimado para 2013 ficará muito abaixo do necessário para compensar o baixo desempenho dos dois anos anteriores. É preciso levar também isso em conta ao confrontar os números do Brasil com os de outros países do Hemisfério. Chile, Colômbia, Equador, Peru e México também foram afetados pela crise internacional, mas em pouco tempo voltaram a crescer em ritmo parecido com o dos anos anteriores à recessão no mundo rico. Todos bateram o Brasil com muita folga desde 2010.
Para 2013,2014 e 2018 as projeções do Fundo indicam as seguintes taxas de expansão para esses países: Chile, 4,9%, 4,6% e 4,6%; Colômbia, 4,1%, 4,5% e 4,5%; Equador, 4,4%, 3,9% e 3,5%; Peru, 6,3%, 6,1% e 6%; México, 3,4%, 3,4% e 3,3%. Entre 2010 e 2012 a economia equatoriana acumulou expansão de 17,14%; a mexicana, de 13,67%; a brasileira, de apenas 11,40%. Em todos esses países a inflação foi menor que a brasileira e assim deverá continuar neste e no próximo ano.
Os economistas do FMI estimam para o Brasil inflação de 5,5% em 2013 e 4,5% em 2014. Para o Chile, a projeção é de 3% em cada um dos dois anos. Para a Colômbia, de 2,4% e 3%. Para o Peru, de 2,1% e 2%. Para o México, de 3,6% e 3,3%. A presidente Dilma Rousseff deveria desconhecer esses números quando falou sobre crescimento e inflação em Durban, na África do Sul. Naquele pronunciamento, ela rejeitou uma ação mais forte contra a alta de preços como se fosse incompatível com a expansão do PIB. Parece ter esquecido, ou talvez ignorasse, a experiência internacional. Inflação alta e resistente, como a brasileira, dificulta o planejamento empresarial e corrói o poder de compra dos consumidores. Tende a tornar-se, portanto, um obstáculo ao crescimento da economia.
Além disso, inflação mais elevada que a dos outros países desajusta o câmbio e afeta o poder de competição dos produtores nacionais. No entanto, empresários e ilustres economistas brasileiros muito raramente reclamam da inflação, embora esbravejem continuamente contra a valorização cambial. Devem ter esquecido tanto a experiência internacional quanto a nacional.
Durante muito tempo o Brasil se deu mal com o câmbio fixo. O câmbio flexível e ajustado periodicamente pela inflação, adotado em 1968, foi um avanço, mas muito imperfeito. Sem estabilidade monetária, o regime cambial tornou-se uma corrida permanente em busca de ajustes de curta duração. A inflação desarranjava o câmbio e em seguida a correção cambial desarrumava os preços. O sistema passou a funcionar como um cão correndo atrás do próprio rabo. Parece estranho, mas alguns economistas e industriais falam como se tivessem saudade desse tempo.
Os países com melhor desempenho têm combinado controle da inflação, contas públicas em condições razoáveis e integração nos mercados globais. O resto é teimosia, mera insistência em pajelanças bem conhecidas, testadas e desacreditadas.
O avanço brasileiro deve continuar mais lento que o de vários países latino-americanos.
Contraordem chavista - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 20/04
Autoridade eleitoral da Venezuela cede e admite recontagem dos votos, em rara concessão na escalada autoritária do regime
O regime chavista na Venezuela se sustentou na neutralização paulatina dos dispositivos de controle e crítica do poder presidencial, no gasto social maciço com recursos abundantes do petróleo e na realização periódica de votações plebiscitárias para emprestar ao caudilho um verniz democrático.
A morte de Hugo Chávez e a eleição contestada de seu sucessor evidenciam a corrosão desses três pilares. O recurso à força bruta, ao peso dos militares e ao silenciamento explícito da oposição, que antes parecia desnecessário, agora se insinua de modo um tanto preocupante.
Enquanto Nicolás Maduro, o herdeiro declarado eleito, alude às mais inverossímeis tramas conspiratórias, Diosdado Cabello, presidente do Congresso, flerta com a linha dura. Cassou a palavra e destituiu de comissões os parlamentares da oposição, que ocupa 46% das cadeiras, enquanto não reconhecerem a vitória de Maduro.
Cabello é o governista mais próximo dos militares, mas foi preterido na disputa interna para suceder a Chávez. É cedo para saber se aproveita a situação para se tornar a eminência parda de um Maduro enfraquecido, ou se almeja emergir como alternativa numa eventual, e arriscada, guinada cesarista.
Uma decisão alentadora, contudo, surgiu da autoridade eleitoral da Venezuela. Ainda que dominado por chavistas, o órgão voltou atrás e decidiu recontar os 46% de votos ainda não auditados da eleição de domingo. Atende, assim, a uma justa demanda do oposicionista derrotado por 1,8 ponto percentual, Henrique Capriles.
Tenha ou não havido fraude --e essa dúvida é um ônus de todo regime autoritário--, parece improvável que a auditoria altere o resultado. Mas a observância de ritos minimamente aceitáveis de respeito ao contraditório é importante para a Venezuela, bem como para a estabilidade política regional.
Mais uma vez, os presidentes sul-americanos amigos do chavismo se precipitaram no socorro a um membro do clube em apuros. Reunião de emergência no Peru reconheceu prontamente a legitimidade de Maduro e defendeu o óbvio --que toda contestação deveria ser resolvida dentro do ordenamento institucional venezuelano.
É um posicionamento aceitável, embora o reconhecimento pleno devesse aguardar a decantação dos fatos. Salta aos olhos que remédio totalmente oposto foi ministrado ao Paraguai, onde um presidente foi destituído pela via constitucional (ainda que se possa criticar o açodamento com que se restringiu o direito de defesa).
Explica-se o casuísmo: em Assunção se cassou um líder próximo do chavismo, Fernando Lugo.
Que a presidente Dilma Rousseff tenha participado desses episódios --e o Brasil, sob seu governo, tenha posto de lado uma tradição ponderada de diplomacia regional--, eis um fato a lamentar.
Autoridade eleitoral da Venezuela cede e admite recontagem dos votos, em rara concessão na escalada autoritária do regime
O regime chavista na Venezuela se sustentou na neutralização paulatina dos dispositivos de controle e crítica do poder presidencial, no gasto social maciço com recursos abundantes do petróleo e na realização periódica de votações plebiscitárias para emprestar ao caudilho um verniz democrático.
A morte de Hugo Chávez e a eleição contestada de seu sucessor evidenciam a corrosão desses três pilares. O recurso à força bruta, ao peso dos militares e ao silenciamento explícito da oposição, que antes parecia desnecessário, agora se insinua de modo um tanto preocupante.
Enquanto Nicolás Maduro, o herdeiro declarado eleito, alude às mais inverossímeis tramas conspiratórias, Diosdado Cabello, presidente do Congresso, flerta com a linha dura. Cassou a palavra e destituiu de comissões os parlamentares da oposição, que ocupa 46% das cadeiras, enquanto não reconhecerem a vitória de Maduro.
Cabello é o governista mais próximo dos militares, mas foi preterido na disputa interna para suceder a Chávez. É cedo para saber se aproveita a situação para se tornar a eminência parda de um Maduro enfraquecido, ou se almeja emergir como alternativa numa eventual, e arriscada, guinada cesarista.
Uma decisão alentadora, contudo, surgiu da autoridade eleitoral da Venezuela. Ainda que dominado por chavistas, o órgão voltou atrás e decidiu recontar os 46% de votos ainda não auditados da eleição de domingo. Atende, assim, a uma justa demanda do oposicionista derrotado por 1,8 ponto percentual, Henrique Capriles.
Tenha ou não havido fraude --e essa dúvida é um ônus de todo regime autoritário--, parece improvável que a auditoria altere o resultado. Mas a observância de ritos minimamente aceitáveis de respeito ao contraditório é importante para a Venezuela, bem como para a estabilidade política regional.
Mais uma vez, os presidentes sul-americanos amigos do chavismo se precipitaram no socorro a um membro do clube em apuros. Reunião de emergência no Peru reconheceu prontamente a legitimidade de Maduro e defendeu o óbvio --que toda contestação deveria ser resolvida dentro do ordenamento institucional venezuelano.
É um posicionamento aceitável, embora o reconhecimento pleno devesse aguardar a decantação dos fatos. Salta aos olhos que remédio totalmente oposto foi ministrado ao Paraguai, onde um presidente foi destituído pela via constitucional (ainda que se possa criticar o açodamento com que se restringiu o direito de defesa).
Explica-se o casuísmo: em Assunção se cassou um líder próximo do chavismo, Fernando Lugo.
Que a presidente Dilma Rousseff tenha participado desses episódios --e o Brasil, sob seu governo, tenha posto de lado uma tradição ponderada de diplomacia regional--, eis um fato a lamentar.
Meia-entrada para todos - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 20/04
SÃO PAULO - Produtores culturais, artistas e donos de cinema estão aplaudindo a aprovação, pelo Senado, de dispositivo que limita a 40% a cota de meias-entradas a ser vendida em cada evento. Se ratificada pela Câmara, a medida dará mais previsibilidade ao setor (não haverá mais shows com 70% de pagantes de meia), o que possibilita uma política mais racional de preços.
Não há dúvida de que a aprovação representará um avanço. Já há quem fale em redução de 35% no valor dos ingressos. Continuo, porém, achando que o instituto da meia-entrada é uma das coisas mais estúpidas já inventadas pelos nossos legisladores.
Para começar, ele é desnecessário. A economia de mercado está longe de ser perfeita, mas, se há uma área em que ela funciona bem, é a do lazer. Nenhum consumidor depende de ir ao cinema para sobreviver, e os empresários do setor, mais do que ninguém, têm interesse em manter a casa cheia. Desde que submetidos a concorrência, tendem a oferecer ingressos tão baratos quanto possível.
Também não sou contra qualquer tipo de subsídio, mas não vejo nenhuma razão social nem mesmo metafísica para o adulto "normal" financiar parte da entrada de uma outra pessoa apenas pelo fato de ela frequentar a escola ou ter mais de 60 anos. É não apenas possível como até frequente que o subsidiado tenha renda superior ao subsidiante.
Para arrematar o desfile de barbaridades, as coisas parecem estar se arranjando de modo a que entidades estudantis como UNE e UEEs sigam faturando alto com a emissão das carteirinhas que dão direito ao benefício. Houve tempos em que tal prática seria classificada de exploração.
Minha proposta para resolver de vez o problema é que os parlamentares generosamente estendam a meia-entrada a todos os brasileiros. Os que acreditam em mágica vão ver aí uma relevante ampliação de direitos e, no mundo real, o bom-senso econômico terá uma chance de prevalecer.
SÃO PAULO - Produtores culturais, artistas e donos de cinema estão aplaudindo a aprovação, pelo Senado, de dispositivo que limita a 40% a cota de meias-entradas a ser vendida em cada evento. Se ratificada pela Câmara, a medida dará mais previsibilidade ao setor (não haverá mais shows com 70% de pagantes de meia), o que possibilita uma política mais racional de preços.
Não há dúvida de que a aprovação representará um avanço. Já há quem fale em redução de 35% no valor dos ingressos. Continuo, porém, achando que o instituto da meia-entrada é uma das coisas mais estúpidas já inventadas pelos nossos legisladores.
Para começar, ele é desnecessário. A economia de mercado está longe de ser perfeita, mas, se há uma área em que ela funciona bem, é a do lazer. Nenhum consumidor depende de ir ao cinema para sobreviver, e os empresários do setor, mais do que ninguém, têm interesse em manter a casa cheia. Desde que submetidos a concorrência, tendem a oferecer ingressos tão baratos quanto possível.
Também não sou contra qualquer tipo de subsídio, mas não vejo nenhuma razão social nem mesmo metafísica para o adulto "normal" financiar parte da entrada de uma outra pessoa apenas pelo fato de ela frequentar a escola ou ter mais de 60 anos. É não apenas possível como até frequente que o subsidiado tenha renda superior ao subsidiante.
Para arrematar o desfile de barbaridades, as coisas parecem estar se arranjando de modo a que entidades estudantis como UNE e UEEs sigam faturando alto com a emissão das carteirinhas que dão direito ao benefício. Houve tempos em que tal prática seria classificada de exploração.
Minha proposta para resolver de vez o problema é que os parlamentares generosamente estendam a meia-entrada a todos os brasileiros. Os que acreditam em mágica vão ver aí uma relevante ampliação de direitos e, no mundo real, o bom-senso econômico terá uma chance de prevalecer.
Prêmio em boa hora - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 30/04
Foi uma coincidência providencial para o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, ter sido apontado pela revista "Time" como uma das cem pessoas mais influentes do mundo na mesma semana em que o acórdão do julgamento do mensalão está sendo afinal publicado, dando partida para a contagem do prazo para a apresentação dos recursos pelas defesas dos condenados.
Para a revista, Barbosa "simboliza a promessa de um novo Brasil comprometido com a diversidade cultural e com a igualdade". O julgamento do mensalão é citado como demonstração de que o presidente do STF é um juiz independente, pois, tendo sido nomeado pelo ex-presidente Lula, "mesmo assim participou da condenação de políticos próximos ao ex-presidente no ano passado". Em dezembro de 2012, o presidente do STF já entrara para a lista de líderes ibero-americanos do jornal espanhol "El País" também pela atuação como relator no julgamento do mensalão.
A distinção a que Barbosa fez jus reafirma a importância de seu trabalho como relator da Ação Penal 470 e o ajuda a enfrentar as críticas de setores petistas especialmente ligados ao ex-ministro José Dirceu, por questões ideológicas ou até pecuniárias. Aliás, o resumo do acórdão do julgamento do mensalão divulgado ontem pelo STF aponta o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu como o responsável pela "organização" e pelo "controle" do esquema ilícito de compra de apoio político do Congresso no primeiro mandato do governo Lula.
Esse respaldo internacional à atuação de Barbosa, fortalecendo sua imagem internacional, serve também para neutralizar a ameaça de que os réus procurarão instâncias internacionais para denunciar a "injustiça" que estariam sofrendo. A busca de reparação na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, por exemplo, que José Dirceu anuncia agora, já havia sido prevista por outro condenado de menor importância na hierarquia no crime julgado, o ex-deputado do PL, hoje no PR, Valdemar Costa Neto e provocou comentários do presidente da Corte, Diego García-Sayán.
Em visita recente ao país, o jurista explicou que a Corte de San José não é uma"instância revisora" das Cortes Supremas de outros países. "A Corte Interamericana não é um tribunal penal, no qual se modificam as penas", declarou.
Algumas das críticas a Barbosa, porém, são fruto da sua intransigência injustificável, ele mesmo dando pretexto para que adversários o acusem, e ao Supremo como um todo, de estar promovendo julgamento político. Por isso, foi bom que o plenário do STF tenha aumentado o prazo de cinco para dez dias para os recursos da defesa, em analogia ao que o Código de Processo Civil prevê para julgamentos com mais de um réu, caso do mensalão.
Com essa atitude, o STF como instituição reafirma que se preocupa em garantir a todos os condenados as condições plenas de defesa. O rigor de Barbosa, se é elogiável como procedimento em um magistrado, pode dar ensejo a acusações de parcialidade quando excessivo, como nesse caso. É típico exemplo de como o temperamento de uma pessoa pode interferir negativamente nas suas ações, situações que já haviam surgido no próprio julgamento do mensalão.
Da mesma maneira, na reunião que fizera dias antes com os representantes das associações de magistrados, embora defendesse posição correta, contra a criação de novos tribunais no país, Barbosa os submeteu a um constrangimento desnecessário ao chamar a imprensa para presenciar a carraspana que passaria neles.
A partir de 2 de maio, quando o STF estiver analisando os recursos das defesas, haverá provavelmente novo debate, agora para definir se ainda há os "embargos infringentes", que permitem a condenados com pelo menos quatro votos pela absolvição a tentativa de rever a pena. Essa forma de recurso, mais consequente que os "embargos de declaração", que só pedem explicações de eventuais dúvidas nos votos dos ministros, só é prevista no regimento interno do STF. A Constituinte de 1988 não se refere a ela, e nem a Lei 8.038, que depois regulamentou os procedimentos dos processos no STF.
Mas é provável que, para não dar margem a reclamações de que não houve duplo grau de jurisdição, a maioria do STF aceite analisar os "embargos infringentes", contra a posição do seu presidente, Joaquim Barbosa.
Para a revista, Barbosa "simboliza a promessa de um novo Brasil comprometido com a diversidade cultural e com a igualdade". O julgamento do mensalão é citado como demonstração de que o presidente do STF é um juiz independente, pois, tendo sido nomeado pelo ex-presidente Lula, "mesmo assim participou da condenação de políticos próximos ao ex-presidente no ano passado". Em dezembro de 2012, o presidente do STF já entrara para a lista de líderes ibero-americanos do jornal espanhol "El País" também pela atuação como relator no julgamento do mensalão.
A distinção a que Barbosa fez jus reafirma a importância de seu trabalho como relator da Ação Penal 470 e o ajuda a enfrentar as críticas de setores petistas especialmente ligados ao ex-ministro José Dirceu, por questões ideológicas ou até pecuniárias. Aliás, o resumo do acórdão do julgamento do mensalão divulgado ontem pelo STF aponta o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu como o responsável pela "organização" e pelo "controle" do esquema ilícito de compra de apoio político do Congresso no primeiro mandato do governo Lula.
Esse respaldo internacional à atuação de Barbosa, fortalecendo sua imagem internacional, serve também para neutralizar a ameaça de que os réus procurarão instâncias internacionais para denunciar a "injustiça" que estariam sofrendo. A busca de reparação na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, por exemplo, que José Dirceu anuncia agora, já havia sido prevista por outro condenado de menor importância na hierarquia no crime julgado, o ex-deputado do PL, hoje no PR, Valdemar Costa Neto e provocou comentários do presidente da Corte, Diego García-Sayán.
Em visita recente ao país, o jurista explicou que a Corte de San José não é uma"instância revisora" das Cortes Supremas de outros países. "A Corte Interamericana não é um tribunal penal, no qual se modificam as penas", declarou.
Algumas das críticas a Barbosa, porém, são fruto da sua intransigência injustificável, ele mesmo dando pretexto para que adversários o acusem, e ao Supremo como um todo, de estar promovendo julgamento político. Por isso, foi bom que o plenário do STF tenha aumentado o prazo de cinco para dez dias para os recursos da defesa, em analogia ao que o Código de Processo Civil prevê para julgamentos com mais de um réu, caso do mensalão.
Com essa atitude, o STF como instituição reafirma que se preocupa em garantir a todos os condenados as condições plenas de defesa. O rigor de Barbosa, se é elogiável como procedimento em um magistrado, pode dar ensejo a acusações de parcialidade quando excessivo, como nesse caso. É típico exemplo de como o temperamento de uma pessoa pode interferir negativamente nas suas ações, situações que já haviam surgido no próprio julgamento do mensalão.
Da mesma maneira, na reunião que fizera dias antes com os representantes das associações de magistrados, embora defendesse posição correta, contra a criação de novos tribunais no país, Barbosa os submeteu a um constrangimento desnecessário ao chamar a imprensa para presenciar a carraspana que passaria neles.
A partir de 2 de maio, quando o STF estiver analisando os recursos das defesas, haverá provavelmente novo debate, agora para definir se ainda há os "embargos infringentes", que permitem a condenados com pelo menos quatro votos pela absolvição a tentativa de rever a pena. Essa forma de recurso, mais consequente que os "embargos de declaração", que só pedem explicações de eventuais dúvidas nos votos dos ministros, só é prevista no regimento interno do STF. A Constituinte de 1988 não se refere a ela, e nem a Lei 8.038, que depois regulamentou os procedimentos dos processos no STF.
Mas é provável que, para não dar margem a reclamações de que não houve duplo grau de jurisdição, a maioria do STF aceite analisar os "embargos infringentes", contra a posição do seu presidente, Joaquim Barbosa.
Maldição da ilusão - CRISTOVAM BUARQUE
O GLOBO - 20/04
Foi Celso Furtado quem primeiro chamou atenção para a ideia da “maldição do petróleo”, a fim de explicar o atraso de países, um deles a Venezuela, cuja riqueza natural fez abandonar sua capacidade tecnológica e produtiva. O Brasil, mesmo sem ser exportador de petróleo, tem sofrido desta maldição ao longo de nossa história. Acostumamo-nos com orgulho a sermos uma terra onde “em se plantando tudo nela dá”, sem a necessidade de inventar produtos, tecnologias, aumentar produtividade, nem competitividade industrial.
Para crescer, bastava ampliar a fronteira agrícola, substituindo florestas por plantações de cana, algodão, café e soja, ou explorar ouro e prata. Não havia necessidade de inovação tecnológica e de poupança porque podíamos explorar a terra, como outros países faziam com o petróleo.
Esta é a principal razão que explica por que somos a sexta economia mundial, mesmo sendo um país tão atrasado em educação, ciência e tecnologia. Por quase 400 anos de nossa história bastava colocar enxadas nas mãos dos escravos, depois bastava treinar operários no manuseio de máquinas. Não precisávamos criar nem inventar máquinas e produtos de nossa indústria porque eles eram inventados e criados no exterior. Não foi necessário gastar dinheiro em educação, usávamos a educação dos países que por falta de recursos naturais eram obrigados a desenvolver conhecimento.
Chegado o século XXI, quando a grande riqueza já não é a terra, mas os cérebros, percebemos o desastre dessa opção de nossa história. Temos uma sociedade violenta, ineficiente, dependente como nunca antes, sobretudo por falta do capital conhecimento. Mas em vez de despertarmos para a necessidade de assegurarmos educação de qualidade, e qualidade igual para todos, estamos caindo na ideia de que faremos isto quando o petróleo do pré-sal nos oferecer os recursos necessários.
Para reservar cem por cento dos royalties do petróleo para a educação de base, sou autor, junto com o ex-senador Tasso Jereissati, do primeiro projeto de lei com esta ideia. O projeto foi arquivado e agora reapresentado com o senador Aloysio Nunes. Mas esta alternativa acomoda a opinião pública e as lideranças à espera de uma renda futura, insuficiente para provocar o salto educacional de que precisamos.
A revolução científica e tecnológica que ocorre no mundo exige que o Brasil rompa com a ideia do “em se plantando tudo nela dá” para a ideia de que “em se aprendendo nela tudo se cria”. Isto exige iniciar, desde já, a necessária revolução educacional de que o país precisa.
Mesmo assim, ouve-se o acomodamento geral de que é preciso esperar pelo pré-sal. Pior do que outros países, que caíram na maldição do petróleo. Estamos caindo na maldição da ilusão de um petróleo ainda escondido nas profundezas do mar como a solução para a nossa crítica e vergonhosa situação educacional. Até aqui fomos vítimas da maldição dos recursos abundantes; agora estamos sendo vítimas da maldição de uma ilusão.
Foi Celso Furtado quem primeiro chamou atenção para a ideia da “maldição do petróleo”, a fim de explicar o atraso de países, um deles a Venezuela, cuja riqueza natural fez abandonar sua capacidade tecnológica e produtiva. O Brasil, mesmo sem ser exportador de petróleo, tem sofrido desta maldição ao longo de nossa história. Acostumamo-nos com orgulho a sermos uma terra onde “em se plantando tudo nela dá”, sem a necessidade de inventar produtos, tecnologias, aumentar produtividade, nem competitividade industrial.
Para crescer, bastava ampliar a fronteira agrícola, substituindo florestas por plantações de cana, algodão, café e soja, ou explorar ouro e prata. Não havia necessidade de inovação tecnológica e de poupança porque podíamos explorar a terra, como outros países faziam com o petróleo.
Esta é a principal razão que explica por que somos a sexta economia mundial, mesmo sendo um país tão atrasado em educação, ciência e tecnologia. Por quase 400 anos de nossa história bastava colocar enxadas nas mãos dos escravos, depois bastava treinar operários no manuseio de máquinas. Não precisávamos criar nem inventar máquinas e produtos de nossa indústria porque eles eram inventados e criados no exterior. Não foi necessário gastar dinheiro em educação, usávamos a educação dos países que por falta de recursos naturais eram obrigados a desenvolver conhecimento.
Chegado o século XXI, quando a grande riqueza já não é a terra, mas os cérebros, percebemos o desastre dessa opção de nossa história. Temos uma sociedade violenta, ineficiente, dependente como nunca antes, sobretudo por falta do capital conhecimento. Mas em vez de despertarmos para a necessidade de assegurarmos educação de qualidade, e qualidade igual para todos, estamos caindo na ideia de que faremos isto quando o petróleo do pré-sal nos oferecer os recursos necessários.
Para reservar cem por cento dos royalties do petróleo para a educação de base, sou autor, junto com o ex-senador Tasso Jereissati, do primeiro projeto de lei com esta ideia. O projeto foi arquivado e agora reapresentado com o senador Aloysio Nunes. Mas esta alternativa acomoda a opinião pública e as lideranças à espera de uma renda futura, insuficiente para provocar o salto educacional de que precisamos.
A revolução científica e tecnológica que ocorre no mundo exige que o Brasil rompa com a ideia do “em se plantando tudo nela dá” para a ideia de que “em se aprendendo nela tudo se cria”. Isto exige iniciar, desde já, a necessária revolução educacional de que o país precisa.
Mesmo assim, ouve-se o acomodamento geral de que é preciso esperar pelo pré-sal. Pior do que outros países, que caíram na maldição do petróleo. Estamos caindo na maldição da ilusão de um petróleo ainda escondido nas profundezas do mar como a solução para a nossa crítica e vergonhosa situação educacional. Até aqui fomos vítimas da maldição dos recursos abundantes; agora estamos sendo vítimas da maldição de uma ilusão.
Política disfuncional - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 20/04
BRASÍLIA - Não faltam qualificações pejorativas para a política brasileira, mas a melhor forma de descrevê-la é pela sua alta incongruência e falta de funcionalidade.
Na mesma semana em que a Câmara votou um projeto de lei para dificultar a criação de novos partidos --sobretudo a Rede, de Marina Silva--, o nanico PRTB apareceu no rádio e na TV fazendo sua propaganda semestral de cinco minutos.
O dono do PRTB é Levy Fidelix. Sua proposta para o Brasil é o aerotrem. O partido elegeu dois deputados em 2010. É uma sigla quase sem votos. Às vezes, está a favor do governo. Às vezes, contra. É fácil intuir a razão dessa ideologia volátil.
A cada seis meses, Fidelix e seu bigodão ao estilo de Dupond e Dupont (a dupla atrapalhada de detetives das histórias de Tintin) estão em rede nacional de rádio e TV. Tudo pago com dinheiro público. As emissoras são ressarcidas (em grande parte) por cederem o horário.
Por que a Câmara e o Senado não acabam com essa situação que flerta com o surrealismo? Simples. Preferem o caminho mais ameno: barrar novos partidos, pois ninguém sabe o que pode vir por aí.
A democracia fica manca quando o Estado oferece dinheiro público e acesso ao rádio e à TV para partidos sem votos. Esse democratismo só será eliminado com uma cláusula de desempenho que dê a cada sigla o que de fato receber de apoio nas urnas.
Tal regra depende de emenda constitucional. Não é fácil. Tampouco é conveniente a quem está no poder. Os grandes partidos se aproveitam à larga dessa chusma amorfa e sem ideologia que aparece na TV a cada seis meses. Como a farra se sustenta no dinheiro dos nossos impostos, é prudente não esperar uma profilaxia no curto prazo.
Brasília faz 53 anos amanhã. É um epítome das mazelas do país.
BRASÍLIA - Não faltam qualificações pejorativas para a política brasileira, mas a melhor forma de descrevê-la é pela sua alta incongruência e falta de funcionalidade.
Na mesma semana em que a Câmara votou um projeto de lei para dificultar a criação de novos partidos --sobretudo a Rede, de Marina Silva--, o nanico PRTB apareceu no rádio e na TV fazendo sua propaganda semestral de cinco minutos.
O dono do PRTB é Levy Fidelix. Sua proposta para o Brasil é o aerotrem. O partido elegeu dois deputados em 2010. É uma sigla quase sem votos. Às vezes, está a favor do governo. Às vezes, contra. É fácil intuir a razão dessa ideologia volátil.
A cada seis meses, Fidelix e seu bigodão ao estilo de Dupond e Dupont (a dupla atrapalhada de detetives das histórias de Tintin) estão em rede nacional de rádio e TV. Tudo pago com dinheiro público. As emissoras são ressarcidas (em grande parte) por cederem o horário.
Por que a Câmara e o Senado não acabam com essa situação que flerta com o surrealismo? Simples. Preferem o caminho mais ameno: barrar novos partidos, pois ninguém sabe o que pode vir por aí.
A democracia fica manca quando o Estado oferece dinheiro público e acesso ao rádio e à TV para partidos sem votos. Esse democratismo só será eliminado com uma cláusula de desempenho que dê a cada sigla o que de fato receber de apoio nas urnas.
Tal regra depende de emenda constitucional. Não é fácil. Tampouco é conveniente a quem está no poder. Os grandes partidos se aproveitam à larga dessa chusma amorfa e sem ideologia que aparece na TV a cada seis meses. Como a farra se sustenta no dinheiro dos nossos impostos, é prudente não esperar uma profilaxia no curto prazo.
Brasília faz 53 anos amanhã. É um epítome das mazelas do país.
Nas asas da FAB - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADO DE S. PAULO - 20/04
Os cada vez mais numerosos ministros da presidente Dilma Rousseff estão transformando a Força Aérea Brasileira (FAB) em empresa de táxi aéreo. A prerrogativa do uso de jatinhos da FAB para transporte de autoridades, instituída prioritariamente para casos excepcionais, parece que se tornou regra, e a um custo bastante pesado para os cofres públicos. Em muitos casos, conforme noticiou o Estado (15/4), a agenda dos ministros é maquiada para se enquadrar nas exigências legais e, ao mesmo tempo, encobrir atividades privadas ou eventos partidários.
A regulamentação do uso de jatinhos da FAB pelos ministros, conforme o decreto presidencial 4.244, de maio de 2002, prevê que as aeronaves da FAB devem ser solicitadas, em primeiro lugar, "por motivo de segurança e emergência médica".
Pela ordem de prioridade, só depois é que aparecem "viagens a serviço" e "deslocamentos para o local de residência permanente".
Além disso, o artigo 2.º diz que, "sempre que possível, a aeronave deverá ser compartilhada por mais de uma das autoridades", e o artigo 4.º autoriza os ministros a "optar por transporte comercial" nos casos de emergência e de deslocamento para a residência, com despesas pagas pelos Ministérios.
Em resumo, o decreto trata de situações que deveriam ser incomuns. No entanto, as 5,8 mil viagens dos ministros de Dilma, em pouco mais de dois anos de governo, mostram que o uso dos jatinhos da FAB está incorporado ao cotidiano da Esplanada dos Ministérios. A situação é tão constrangedora que, em janeiro de 2011, a presidente pediu a seus ministros que recorressem menos aos serviços da FAB e que usassem, sempre que possível, as companhias aéreas.
Não se trata somente de pôr termo a um abuso rotineiro, mas de reduzir os gastos públicos, pois viajar em avião de carreira é muito mais barato. O apelo de Dilma, porém, caiu em ouvidos moucos: o número de voos com os jatinhos da FAB subiu 5% entre 2011 e 2012.
O ministro-chefe da Advocacia- Geral da União, Luís Inácio Adams, por exemplo, requisitou um Embraer ERJ 145, com capacidade para 36 passageiros, para uma viagem a São Paulo em agosto de 2011, ocasião em que visitou o ex-presidente Lula.
Em valores atualizados, estima-se que esse voo tenha custado R$ 6,6 mil. Se Adams optasse por um voo de carreira, a despesa teria sido de R$ 700. Está entre as atribuições do advogado geral cuidar de casos de ex-presidentes, mas a agenda de Adams não registrou o encontro com Lula - logo, ele não estava oficialmente "a serviço".
Em janeiro passado, o vice-presidente Michel Temer usou um jatinho da FAB para ir a São Paulo, onde passou o dia em encontros de seu partido, o PMDB. De acordo com sua agenda, naquele dia ele não teve nenhum compromisso como vice. Em outubro de 2012, Temer se encontrou com Fernando Haddad, também em São Paulo, para conversar com o petista sobre o apoio do PMDB na disputa pela Prefeitura.
Do mesmo modo, a agenda de Temer não registrou atividades relativas a seu cargo no governo naquela data.
Casos como esses são comuns.
Em grande parte deles, os ministros marcam compromissos irrelevantes às sextas e às segundas-feiras nas cidades onde moram, para ter o conforto dos jatinhos no fim de semana.
Quando informam qual serviço precisam prestar, os ministros descrevem situações genéricas.
A agenda do ministro da Fazenda, Guido Mantega, assíduo cliente da Aeronáutica, justificou uma recente viagem a São Paulo, numa sexta-feira, dizendo que ele tinha "reuniões internas" no Banco do Brasil.
É evidente que os ministros não querem se juntar aos brasileiros comuns que se apinham nos balcões de check-in dos aeroportos, preferindo a mordomia oferecida pela FAB. Ao explicar o privilégio, porém, os ministros alegam que sua atitude nada tem de ilegal ou de imoral. O ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, chegou a dizer que, ao usar os jatinhos da FAB, estava colaborando para a manutenção das aeronaves, pois elas "necessitam voar determinadas horas". Talvez Cardozo ache que, em vez de criticá-lo, devíamos lhe ser gratos.
Os cada vez mais numerosos ministros da presidente Dilma Rousseff estão transformando a Força Aérea Brasileira (FAB) em empresa de táxi aéreo. A prerrogativa do uso de jatinhos da FAB para transporte de autoridades, instituída prioritariamente para casos excepcionais, parece que se tornou regra, e a um custo bastante pesado para os cofres públicos. Em muitos casos, conforme noticiou o Estado (15/4), a agenda dos ministros é maquiada para se enquadrar nas exigências legais e, ao mesmo tempo, encobrir atividades privadas ou eventos partidários.
A regulamentação do uso de jatinhos da FAB pelos ministros, conforme o decreto presidencial 4.244, de maio de 2002, prevê que as aeronaves da FAB devem ser solicitadas, em primeiro lugar, "por motivo de segurança e emergência médica".
Pela ordem de prioridade, só depois é que aparecem "viagens a serviço" e "deslocamentos para o local de residência permanente".
Além disso, o artigo 2.º diz que, "sempre que possível, a aeronave deverá ser compartilhada por mais de uma das autoridades", e o artigo 4.º autoriza os ministros a "optar por transporte comercial" nos casos de emergência e de deslocamento para a residência, com despesas pagas pelos Ministérios.
Em resumo, o decreto trata de situações que deveriam ser incomuns. No entanto, as 5,8 mil viagens dos ministros de Dilma, em pouco mais de dois anos de governo, mostram que o uso dos jatinhos da FAB está incorporado ao cotidiano da Esplanada dos Ministérios. A situação é tão constrangedora que, em janeiro de 2011, a presidente pediu a seus ministros que recorressem menos aos serviços da FAB e que usassem, sempre que possível, as companhias aéreas.
Não se trata somente de pôr termo a um abuso rotineiro, mas de reduzir os gastos públicos, pois viajar em avião de carreira é muito mais barato. O apelo de Dilma, porém, caiu em ouvidos moucos: o número de voos com os jatinhos da FAB subiu 5% entre 2011 e 2012.
O ministro-chefe da Advocacia- Geral da União, Luís Inácio Adams, por exemplo, requisitou um Embraer ERJ 145, com capacidade para 36 passageiros, para uma viagem a São Paulo em agosto de 2011, ocasião em que visitou o ex-presidente Lula.
Em valores atualizados, estima-se que esse voo tenha custado R$ 6,6 mil. Se Adams optasse por um voo de carreira, a despesa teria sido de R$ 700. Está entre as atribuições do advogado geral cuidar de casos de ex-presidentes, mas a agenda de Adams não registrou o encontro com Lula - logo, ele não estava oficialmente "a serviço".
Em janeiro passado, o vice-presidente Michel Temer usou um jatinho da FAB para ir a São Paulo, onde passou o dia em encontros de seu partido, o PMDB. De acordo com sua agenda, naquele dia ele não teve nenhum compromisso como vice. Em outubro de 2012, Temer se encontrou com Fernando Haddad, também em São Paulo, para conversar com o petista sobre o apoio do PMDB na disputa pela Prefeitura.
Do mesmo modo, a agenda de Temer não registrou atividades relativas a seu cargo no governo naquela data.
Casos como esses são comuns.
Em grande parte deles, os ministros marcam compromissos irrelevantes às sextas e às segundas-feiras nas cidades onde moram, para ter o conforto dos jatinhos no fim de semana.
Quando informam qual serviço precisam prestar, os ministros descrevem situações genéricas.
A agenda do ministro da Fazenda, Guido Mantega, assíduo cliente da Aeronáutica, justificou uma recente viagem a São Paulo, numa sexta-feira, dizendo que ele tinha "reuniões internas" no Banco do Brasil.
É evidente que os ministros não querem se juntar aos brasileiros comuns que se apinham nos balcões de check-in dos aeroportos, preferindo a mordomia oferecida pela FAB. Ao explicar o privilégio, porém, os ministros alegam que sua atitude nada tem de ilegal ou de imoral. O ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, chegou a dizer que, ao usar os jatinhos da FAB, estava colaborando para a manutenção das aeronaves, pois elas "necessitam voar determinadas horas". Talvez Cardozo ache que, em vez de criticá-lo, devíamos lhe ser gratos.
Sociedade e instituições argentinas reagem - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 20/04
Os argentinos fizeram, na noite de quinta-feira, o maior protesto contra o governo Cristina Kirchner. Centenas de milhares se manifestaram em Buenos Aires e outras cidades do país com o típico bater de panelas, ocacerolazo. É o terceiro evento desse tipo em pouco mais de sete meses — os outros ocorreram em setembro e novembro do ano passado.
O foco do último protesto foi a reforma judiciária que o kirchnerismo faz aprovar, a toque de caixa, no Congresso, onde tem maioria. Mas também estiveram presentes outros aspectos da vida argentina que causam imenso desgaste ao governo K, como a inflação, a violência nas ruas, a corrupção e o projeto de emendar a Constituição para permitir um terceiro mandato a Cristina.
A reforma judiciária impulsionada pela Casa Rosada, sob o argumento de “democratizar” a Justiça, foi alvo de intensa crítica da maioria dos setores nacionais e da oposição, que nela veem uma tentativa de ampliar o controle do Executivo sobre as outras instituições do Estado. O projeto adota a eleição direta para o Conselho da Magistratura, o que se refletirá na politização das decisões. Impõe, também, um limite de seis meses para a vigência de liminares, o que, inclusive, já passou no Congresso.
A mobilização kirchnerista decorre do fato de a Justiça ter travado dispositivos da autoritária cLei de Meios, criada sob o argumento de “desconcentrar” os grupos de mídia, mas claramente visando a esfacelar o Grupo Clarín, crítico do governo. Outras empresas, como a que edita o jornal “La Nación”, são também alvos da iniciativa. Enfureceu a Casa Rosada a recente decisão da Câmara Federal Civil e Comercial de considerar inconstitucionais dois artigos da Lei de Meios que atingem mais duramente o “Clarín”.
O protesto de quinta-feira mostra que a sociedade argentina reage para conter o avanço kirchnerista. As decisões da Justiça evidenciam que pelo menos um dos poderes da República não se rendeu ao autoritarismo do governo K. A reforma proposta pela Casa Rosada é mais um caso de aplicação na Argentina do “kit chavista”, que submete as instituições a um Executivo forte e a um chefe de Estado capaz de criar regras para se eternizar no poder.
A progressiva “chavização“ do país se dá ao mesmo tempo em que o movimento, contrário ao ideário democrático, entra em crise no nascedouro, a Venezuela, com a morte de Chávez e a inexpressiva vitória eleitoral de seu discípulo, Nicolás Maduro, sobre Henrique Capriles, símbolo da oposição cada vez mais forte ao autoritarismo de Estado. Na Argentina, a sociedade e algumas instituições tentam resistir à avalanche kirchnerista.
Mas como numa democracia o poder deve ser obtido nas urnas, a oposição argentina precisa unir-se em torno de um projeto viável que atraia os eleitores descontentes, a maioria.
Os argentinos fizeram, na noite de quinta-feira, o maior protesto contra o governo Cristina Kirchner. Centenas de milhares se manifestaram em Buenos Aires e outras cidades do país com o típico bater de panelas, ocacerolazo. É o terceiro evento desse tipo em pouco mais de sete meses — os outros ocorreram em setembro e novembro do ano passado.
O foco do último protesto foi a reforma judiciária que o kirchnerismo faz aprovar, a toque de caixa, no Congresso, onde tem maioria. Mas também estiveram presentes outros aspectos da vida argentina que causam imenso desgaste ao governo K, como a inflação, a violência nas ruas, a corrupção e o projeto de emendar a Constituição para permitir um terceiro mandato a Cristina.
A reforma judiciária impulsionada pela Casa Rosada, sob o argumento de “democratizar” a Justiça, foi alvo de intensa crítica da maioria dos setores nacionais e da oposição, que nela veem uma tentativa de ampliar o controle do Executivo sobre as outras instituições do Estado. O projeto adota a eleição direta para o Conselho da Magistratura, o que se refletirá na politização das decisões. Impõe, também, um limite de seis meses para a vigência de liminares, o que, inclusive, já passou no Congresso.
A mobilização kirchnerista decorre do fato de a Justiça ter travado dispositivos da autoritária cLei de Meios, criada sob o argumento de “desconcentrar” os grupos de mídia, mas claramente visando a esfacelar o Grupo Clarín, crítico do governo. Outras empresas, como a que edita o jornal “La Nación”, são também alvos da iniciativa. Enfureceu a Casa Rosada a recente decisão da Câmara Federal Civil e Comercial de considerar inconstitucionais dois artigos da Lei de Meios que atingem mais duramente o “Clarín”.
O protesto de quinta-feira mostra que a sociedade argentina reage para conter o avanço kirchnerista. As decisões da Justiça evidenciam que pelo menos um dos poderes da República não se rendeu ao autoritarismo do governo K. A reforma proposta pela Casa Rosada é mais um caso de aplicação na Argentina do “kit chavista”, que submete as instituições a um Executivo forte e a um chefe de Estado capaz de criar regras para se eternizar no poder.
A progressiva “chavização“ do país se dá ao mesmo tempo em que o movimento, contrário ao ideário democrático, entra em crise no nascedouro, a Venezuela, com a morte de Chávez e a inexpressiva vitória eleitoral de seu discípulo, Nicolás Maduro, sobre Henrique Capriles, símbolo da oposição cada vez mais forte ao autoritarismo de Estado. Na Argentina, a sociedade e algumas instituições tentam resistir à avalanche kirchnerista.
Mas como numa democracia o poder deve ser obtido nas urnas, a oposição argentina precisa unir-se em torno de um projeto viável que atraia os eleitores descontentes, a maioria.