segunda-feira, junho 11, 2012

Alicerces abalados - PAULO GUEDES

O GLOBO - 11/06


Agora quem pede água é a Espanha. As estimativas de socorro financeiro para evitar o colapso do sistema bancário espanhol estão em torno de cem bilhões de euros. O que não é muito, e deverá ser concedido, quando se considera que a Espanha é a quarta maior economia da Zona do Euro. A Irlanda tomou 85 bilhões de euros em 2010, Portugal recebeu 78 bilhões em 2011. E a Grécia levou 110 bilhões de euros em 2010, mais 130 bilhões em 2012. Além disso, enquanto a Espanha tem promovido austeridade e reformas, a esquerda radical grega ameaça deixar o euro se vencer as eleições no próximo domingo.

A Espanha é a crise contemporânea em todas as suas dimensões. Seus arquétipos são conhecidos. Os financistas quebraram os bancos com a farra do crédito, à base de alavancagem excessiva. E os políticos quebraram os governos e congelaram os mercados de trabalho com as práticas populistas, obsoletas e financeiramente irresponsáveis dos social-democratas. Até que a cobra engoliu o próprio rabo.

Os bancos não podem mais comprar títulos públicos para rolar dívidas dos governos nacionais porque os riscos soberanos em alta trazem pesadas perdas de capital ao sistema financeiro. E os governos nacionais não podem mais socorrer seus bancos porque fariam disparar ainda mais seus riscos soberanos e os custos de rolagem de suas dívidas públicas. Afinal, suas finanças já foram exauridas por décadas de demagogia social-democrata.

Só analistas ingênuos acreditam que a quebra do Lehman Brothers foi a causa da grande crise financeira que se abateu sobre a economia americana. É claro que o excesso de endividamento permeava todo o universo financeiro após anos de expansão abusiva do crédito. A quebra do Lehman Brothers foi apenas um dos inúmeros gatilhos que poderiam disparar a ameaça de contágio bancário. Qualquer fósforo riscado em um paiol de pólvora o faria explodir. Do outro lado do Atlântico, a emergência do euro como moeda continental estimulou a expansão excessiva do crédito e revelou também os abusos da classe política europeia contra os orçamentos públicos.

Mais e mais, percebe-se que a grande crise contemporânea reflete um atentado de financistas e políticos contra o regime de moeda fiduciária e a sustentabilidade financeira das redes de solidariedade social, pilares da modernidade na longa história evolucionária da civilização ocidental.

Não, não estou no Facebook - EUGÊNIO BUCCI

REVISTA ÉPOCA


"Quando a gente diz isso numa roda, num jantar ou num ponto de ônibus, a conversa silencia. Olhares incrédulos saltam sobre nossa figura tímida, como luzes de otorrinolaringologistas do futuro, tentando investigar nossas limitações ocultas. Analfabetismo digital? Conservadorismo? Alguém arrisca um"em que planeta você vive?". Outro sente pena e tenta ser simpático:"Até minha avó está no Face, é tão friendly". Aí, vem aquela voz categórica, que procura dar o sinal definitivo dos tempos: "Minha filha já nem usa mais e-mail. Com ela, é tudo pelo Facebook". É assim que os 46,3 milhões de brasileiros que mantêm um perfil pessoal na maior rede social do planeta tratam os outros, os que estão de fora. Fazem ar de espanto. Fazem chiste, Bullying, assédio moral.

E não obstante:

- Não, não estou no Facebook.

E acho que tenho razão. Errados estão os 845 milhões de viventes que, em todas as línguas, em todos os países, puseram lá suas fotografias (tem gente sem camisa!) ao lado de seus depoimentos confessionais. Viventes e morrentes, é bom saber. Há poucas semanas, o escritor Humberto Werneck, em sua coluna dominical no jornal O Estado de S. Paulo, registrou um dado um tanto mórbido. Quando um sujeito morre - isso acontece, o perfil do defunto fica lá, intacto. O perfil do morto não entra em putrefação, nem vai para debaixo da tela. Os outros usuários, estes vivos, mas desavisados, podem "curtir" até cansar. O perfil não se mexe nem sai de cena. Não há coveiros digitais no tempo real. De todo modo, como não frequento isso que Werneck chamou de "cemitério virtual", não posso saber como é. Apenas presumo que deva ser aflitivo. Também por isso, ali não entro nem morto.

A fonte da minha resistência, contudo, não está nessa situação terrível, não da morte em vida, mas da vida em morte a que a grande rede pode nos sentenciar. Também não está nas fotos de gente sem camisa. A evasão de intimidades em que estamos submersos é a regra totalitária. Até mesmo a fé - algo ainda mais íntimo que o sexo - ganhou estatuto de espetáculo nas telas eletrônicas, e a transcendência do espírito se converteu em explicitude obscena. Entre o lúbrico e o religioso, não é o festival abrasivo nauseante de intimidades que me mantém distante. Não é também a frivolidade.

O que mais me afasta desse tipo de rede social é o comércio. Nada contra as feiras livres, que, em qualquer lugar, em qualquer tempo, concentram as mais autênticas vibrações da cultura (a melhor porta de entrada para o viajante que quer conhecer uma cidade é a feira livre). Agora, o comercio no Facebook é outra história. Ele é ainda mais funéreo que a presença dos clientes mortos que não pagam nem arredam pé. Ali, a mercadoria é o freguês, o que vai ficando cada dia mais evidente, com denúncias crescentes sobre o uso de informações pessoais mercadejadas pelos administradores do site. Ali dentro, as mais exibicionistas intimidades adquirem um sinistro valor de troca para as mais intrincadas estratégias mercadológicas.

Já no tempo do Orkut - no qual também nunca pus os pés, ou os dedos, ou os dígitos - esse fantasma existia. Hoje, no Facebook, o velho fantasma é corpóreo, material, indisfarçável em seu jogo desigual. O usuário alimenta o usurário - com seu próprio trabalho, não remunerado. Clicando "curti" para lá e para cá, o freguês fabrica alegremente o "database marketing" que o vende sem que ele saiba. Estou fora. Muito obrigado.

Desconfio que esse padrão de relacionamento não é leal e não vai tão longe quanto promete. Não se mantiver o mesmo modelo. Mesmo como negócio, o Face dá sinais de ter batido no teto. A empresa menos de um mês e, desde então, as ações despencam. Já perderam mais de 24% de seu valor. Nesse período, o fundador e presidente executivo, Mark Zuckerberg, ficou USS 4,7 bilhões mais pobre. O Facebook precisa mudare, por enquanto, mudará sem minha ajuda, sem meu trabalho gratuito. Seguirei com meu cômodo bordão:

- Não, não tenho Facebook.

Dá para viver sem. Se me acusarem de dinossauro lamuriento, posso me defender. Tenho celular e sei operar controle remoto de televisão. Uso o Google, mas com um pé ressabiado bem atrás. Sabia fazer download de planilha Excel, mas esqueci. A tecnologia nos engolfa, eu bem sei, e não há como ficar de fora. Mas uma coisinha ou outra a gente ainda pode escolher. Um "não" ou outro, a gente ainda pode dizer.

- Não, não estou no Facebook.

As escolhas de Lula - EDITORIAL REVISTA ÉPOCA

REVISTA ÉPOCA




Ao optar por candidatos biônicos e ao tentar intervir no julgamento do mensalão. O ex-presidente cria mais problemas para si mesmo

NOS meios políticos, o ex­presidente Luiz Inácio Lula da Silva desfruta uma certa aura de feiticeiro. Consagrado pela transformação da ministra Dil­ma Rousseff na nova presidente da República, ele mostrou que consegue ler no terreno da polí­tica sinais que poucos enxergam. Mas os fatos recentes mostram que, apesar de seu talento, Lula não é infalível. Seus movimentos recentes têm gerado, para ele mesmo e para seu partido, mais problemas que soluções.

O mero fato de ele ter manti­do uma conversa reservada com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), às vésperas do julgamento do es­cândalo do mensalão - marcado para o dia 1 º de agosto - lança dúvida sobre sua motivação. No conflito de versões, talvez jamais seja possível saber o que foi dito no encontro. Mas uma figura do porte político de Lula não pode deixar dúvidas desse tipo pairar no ar. To­dos teriam a ganhar se ele evitasse contato com os ministros - e dei­xasse o STF trabalhar em paz.

Outro revés começa a se dese­nhar na tentativa de repetir, nas eleições municipais, a estratégia que levou Dilma à Presidência. Em ·São Paulo e no Recife, Lula escolheu candidatos de modo autocrático, com base exclusi­vamente em sua imensa popu­laridade, principal garantia do controle absoluto que mantém sobre as decisões do Partido dos Trabalhadores (PT).

A escolha de Dilma, em 2010, respondia a um desfalque no elen­co de estrelas do governo, atingi­das pelo mensalão e suas sequelas. Em 2012, a situação é outra. Há candidatos naturais no PT. Não é O caso do ex-ministro Fernando Haddad, em São Paulo, e do se­nador Humberto Costa, na capital pernambucana. Ambos enfrentam indiferença do eleitorado, rejeição de aliados tradicionais e forte re­sistência no próprio PT.

Alijada da disputa porque Lula está convencido de que não ven­ceria um eventual segundo turno, a ex-prefeita Marta Suplicy, com 30% das intenções de voto, não deu as caras na campanha do ex ­ministro Haddad, hoje com 3%. No Recife, o senador Humberto Costa foi indicado contra o atual prefeito, João da Costa, vitorioso numa prévia do partido.

Tanto Haddad como Humber­to Costa podem, até a votação em outubro. mostrar um desempe­nho melhor do que as pesquisas sugerem. A política gosta de pregar peças naqueles que pretendem co­nhecer seus segredos por antecipação. Qualquer que seja o veredicto do eleitorado, contudo, o compor­tamento de Lula revela um método lamentável No Recife, ignorou-se uma prévia porque não se apre­ciava o vitorioso. Em São Paulo, elas nem sequer foram realizadas, pois temia-se que Marta vencesse. Isso no PT, que, noutros tempos, ensinava que os bons partidos se fazem de baixo para cima.

Por enquanto, os resultados das ações recentes de Lula não parecem promissores. Seus candidatos não decolaram - e a sociedade espera que o julgamento do mensalão puna com rigor os culpados pelo maior escândalo de corrupção da história recente do país.

No país das armas - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 11/06

A CBF recebeu comunicadodos americanos em New Jersey que estava proibida de exibir no jogo Brasil x Messi (Argentina) uma faixa a favor do desarmamento. A inscrição “Por um mundo sem armas, drogas, violência e racismo” era em inglês. Foi feita pela Rede Desarma Brasil com apoio do Ministério da Justiça.

Aquele abraço

Pesquisa da MasterCard mostra que o Rio será a cidade com maior crescimento do número de visitantes em 2012. Na comparação com 2011, os cariocas saltarão para o primeiro lugar do ranking mundial, com a maior taxa de recepção de estrangeiros (28,6%), à frente de cidades como Tóquio (21,5%), Quito (18,8%), Abu Dahbi (17,9%) e Dubai (15,3%).

Aliás...

O estudo calcula que os visitantes vão gastar, acredite, US$ 1,1 bilhão na cidade.

Grande perda

Ivan Lessa, o grande intelectual que o Brasil perdeu aos 77 anos, foi na adolescência, veja só, ator de cinema. No YouTube ele aparece em “Maior que o ódio”, de 1951.

Tá chegando a hora

Dilma vem ao Rio nesta quarta inaugurar o Pavilhão Brasil da Rio+20 no Parque dos Atletas, na Barra.

Tudo sobre sexo
No Dia dos Namorados, amanhã, chega às livrarias “Tudo o que você não queria saber sobre sexo” (Editora Record). Trata-se de parceria entre Mirian Goldenberg, grande estudiosa da sexualidade brasileira, e o cartunista Adão Iturrusgarai.

CONFIRA NA FOTO.
O governo Cabral está restaurando esta bela casa na Rua Redentor, em Ipanema, fechada desde 2007, onde morou o saudoso Guilherme Araújo (1937-2007). O produtor musical, que, como empresário de Caetano e Gil, participou da Tropicália, doou o imóvel em testamento ao estado para que fosse transformado em local de celebração da música. A burocracia atrasou o projeto e, por muito tempo, a casa ficou abandonada e virou foco de ratos e mosquitos. A secretária Adriana Rattes vai, em breve, definir o plano de ocupação cultural do lugar. Melhor assim

País de São Jorge

Com o dólar ainda baratinho não são apenas Nova York e Paris que estão atraindo brasileiros. Há três anos, apenas 5 mil conterrâneos visitaram a Turquia. Mas, ano passado, foram, acredite, 91 mil.

Segue...

E a expectativa é que o turismo do povo de Dilma para a Turquia aumente com a novela “Salve Jorge”, que será rodada pela Globo na Capadócia, onde teria nascido São Jorge. Aliás, outras novelas de Glória Perez, como “O Clone” (2001) e “Caminho das Índias” (2009), aumentaram o turismo para Marrocos e Índia.

Óleo da fortuna

A Valora Gestão de Investimentos (VGI), criada por José Caetano Lacerda, Álvaro Novis e Álvaro Cunha, ex-executivos da Odebrecht, captou R$ 500 milhões para o fundo Brasil Óleo e Gás, em parceria com Banco do Brasil e a GaiaOil & Gas.

Crocodilo brasileiro
Na semana em que a Lacoste escolheu nosso Gustavo Kuerten como embaixador, a marca lançou esta camisa inspirada na bandeira brasileira. Na França custa o dobro de uma polo básica: duzentos euros.

Grande Zeca

No São João Carioca, patrocinado pela Antártica, sábado à noite, o brahmeiro Zeca Pagodinho bebericou... vinho. Aliás, impressiona a paixão carioca pela festa junina, mesmo com chuva. O evento deve entrar para o calendário.

Chamas

O incêndio no Edifício Swissar, na Rio Branco, atingiu parte do escritório de advocacia Garcia & Keener, um dos mais tradicionais do país e fundado em 59, que tem entre os sócios Carlos Eugenio Lopes.

Declínio dos motéis

Em tempo de liberdade sexual, pesquisa da Fecomércio- RJ revela que só 3,4% vão celebrar o Dia dos Namorados no motel. No meu tempo... deixa pra lá.

Discurso embaçado - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 11/06


O país corre o risco de seguir por um tempo precioso na contramão da sustentabilidade. A redução do IPI dos automóveis é um exemplo

Quando Dilma Rousseff assumiu a Presidência da República há um ano e meio, seus ministros trataram a Conferência de Desenvolvimento Sustentável da ONU, a Rio+20, como a hora de o governo brasileiro se colocar como senhor da economia verde, da energia limpa e renovável. Um cenário pronto para que Dilma, soberana, fosse aclamada como a portadora das boas notícias e dos maiores exemplos para o mundo. Um olhar mais atento indica que esse copo ficou pela metade.

Quanto às boas notícias, Dilma as tem para dar, especialmente, no que se refere ao desmatamento. Os últimos dados divulgados pelo governo indicam que, na Amazônia Legal, 81% das florestas estão preservadas. O paÍs está entre os 10 que mais investem em energia limpa. A matriz energética limpa do Brasil é uma das maiores do mundo. Quanto ao cenário atual, não estamos mal.

Por falar em cenários…
Mas, quanto à perspectiva de futuro, é hora de o país repensar parte de suas escolhas. Embora a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, seja hoje uma das mais fortes perante a presidente da República e esteja bem focada no seu trabalho, há uma gama de decisões em outras áreas que ameaçam embaçar o Brasil enquanto janela para o mundo do desenvolvimento sustentável.

Na área econômica, há exemplos visíveis a olho nu de que o país corre o risco de seguir por um tempo precioso na contramão da sustentabilidade. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros novos é o mais vistoso.

As montadoras de automóveis, de onde saíram muitos petistas históricos, estão em festa. Afinal, desde que o governo reduziu o IPI dos automóveis, as associações de concessionárias registram aumento de 150% nas vendas. O efeito positivo, entretanto, soa como um sinal de alerta quando combinado com a ideia de desenvolvimento sustentável.

O Brasil não possui uma infraestrutura para absorver essa frota. Tampouco há uma política de que privilegie o consumo de um combustível mais limpo para abastecer esses carros. Dados da Petrobras divulgados este ano indicam que 74% dos carros flex vão rodar com gasolina em 2012, porque sai mais barato e a oferta de combustível fossil é maior.

Por falar em etanol…
Em 2008, na reunião das Nações Unidas para Agricultura e Alimentos (FAO), o então presidente Lula propagou ao mundo que iria se tornar um mascate do etanol brasileiro. Lembrou em discurso que “os dedos apontados contra a energia limpa dos biocombustíveis estão sujos de óleo e de carvão”.

Um ano depois, comemorava a descoberta de óleo na camada pré-sal, hoje uma prioridade do governo brasileiro. Quanto ao etanol de cana, volta e meia há notícias da falta do produto nos postos e um preço nada competitivo quando comparado ao da gasolina. Ou seja, o discurso de 2008 parece ter ficado esquecido.

Por falar em discurso…
Para muitos especialistas, está cada vez mais claro que a Rio+20 se tornará mais uma reunião de balanço do discurso e da prática ao longo dos últimos 20 anos — o que, pelo andar da carruagem, mostrará a falta de compromisso dos governos com o que pregaram na Rio-92. Além disso, caminha para tornar mais rígidas as garantias de cumprimento de metas no futuro, e essa é a parte boa das discussões que tomarão conta do Rio de Janeiro a partir desta quarta-feira. Diante desse clima, a Angela Merkel, da Alemanha; David Cameron, da Inglaterra; e Barack Obama, dos Estados Unidos, preferem cuidar da própria vida em vez de vir ao Brasil levar um puxão de orelhas dos ambientalistas pelo não-cumprimento do que seus antecessores prometeram.

Obama, por exemplo, parece seguir à risca o que disse recentemente o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, sobre não ter um minuto a perder. Ocorre que Ban Ki-Moon se referia à economia sustentável. E tanto Obama quanto os europeus estão levando essa frase à risca em outras frentes. Dilma, a anfitriã, tem nas mãos um grande desafio. Dizer se continuará feliz com o copo pela metade ou se tratará de enchê-lo levando todas as políticas de governo ao rio do desenvolvimento sustentável. Até o momento, parece contentar-se com a primeira opção.

De volta às ruas - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 11/06


RIO DE JANEIRO - Em 1968, quando ainda morava no Rio, Paulo Francis disse casualmente numa roda em que se discutia certo programa de televisão: "Minha televisão fica no quarto da empregada. Sinto que estou envenenando a coitadinha". Gargalhadas gerais. E não era mais um esnobismo de Francis. Era a verdade. O surpreendente é que, com isso, ele admitia ter televisão em casa, mesmo que no quarto dos fundos.

Eu, por exemplo, garoto, boêmio e morador do Solar da Fossa, não tinha. Nem me passava pela cabeça. A rua era excitante demais para se ficar em casa, e a programação das emissoras, mesmo com os festivais da canção, não era páreo para a vida real.

Naquele ano, havia 4 milhões de aparelhos no Brasil. Hoje, são 200 milhões. Mas nada é eterno, e algo me diz que a televisão doméstica, entronizada na sala ou no quarto de dormir, chegou ao pico -muito mais gente logo estará ligada em telinhas na palma da mão do que nessas catedrais de 50 polegadas. E, para quem continuar a manter uma TV em casa, ela não terá mais status do que um liquidificador.

O que me parece ótimo. Com as telinhas de três polegadas, as pessoas estão voltando a sair às ruas, sem prejuízo da sua fome de informação. A televisão vai com elas. Não admira que os botequins vivam abarrotados -quando as pessoas querem se informar sobre alguma coisa, interrompem a fala ou a mastigação e tiram a maquininha do bolso.

Em 1971, Francis se mudou para Nova York. Pouco depois, fui visitá-lo lá. Estranhei quando vi uma enorme TV na sala de seu apartamento na Bleecker Street, no Village. E mais ainda quando ele me falou entusiasmado de um novo sistema de transmissão paga, em que cabos por baixo das ruas lhe permitiam assistir a 40 ou 50 canais. E o engraçado é que, como sua antiga empregada, Francis não se sentia envenenado.

O acesso à informação - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 11/06


Diante das dificuldades operacionais para cumprir as determinações da Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor em 16 de maio, o Executivo e o Judiciário estão adaptando sua rede de informática e criando Serviços de Informação ao Cidadão para responder a solicitações de informações. Pelas novas regras, os órgãos públicos têm o prazo de 20 dias - prorrogáveis por mais 10 - para apresentar uma resposta. Desde que a Lei entrou em vigor, no dia 16 de maio, o governo federal recebeu 7.794 pedidos, dos quais 56% foram respondidos, segundo a Controladoria-Geral da União.

Já o Legislativo federal ainda não tomou as providências para implantar a lei, que torna obrigatória a divulgação dos vencimentos de seus servidores. As Mesas do Senado e da Câmara deixaram claro que pretendem utilizar o prazo máximo - que vence no dia 31 de julho - para cumprir essa determinação. O presidente da Câmara, Marcos Maia, afirmou que só definirá as medidas a serem tomadas para divulgar os salários dos 7,3 mil servidores da Casa depois de voltar da China, na próxima semana. Por seu lado, o Senado - que tem 6,5 mil servidores - informou que negociará um padrão de divulgação com a Câmara e o TCU.

A ideia é que os salários sejam divulgados de forma individual, com o nome de cada funcionário, mas sem informações sobre rendimentos como férias, bonificações, pensões e verbas indenizatórias. Alegando que a divulgação dos salários estimulará a indústria do sequestro relâmpago em Brasília, o Sindicato dos Servidores do Legislativo (Sindilegis) anunciou que questionará a constitucionalidade da Lei de Acesso à Informação. "É uma questão de segurança do servidor e de seus familiares. A divulgação dos salários expõe toda a família a um risco desnecessário", diz o presidente da entidade, Nilton Paixão.

Esse recurso, contudo, tem pouca possibilidade de sucesso, pois a ministra Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, já colocou seu contracheque na internet e o presidente da Corte, ministro Ayres Britto, foi taxativo. "A divulgação dos salários do funcionalismo é o preço que se paga pela opção por uma carreira pública no seio de um Estado republicano", disse ele. Além disso, o temor do presidente do Sindilegis não se sustenta. Desde 2009, a Prefeitura de São Paulo divulga os vencimentos de seus 165 mil servidores, sem que se tenha notícia de aumento do número de vítimas de sequestro relâmpago.

Na realidade, o que Sindilegis teme é que a sociedade tome consciência das distorções salariais no Legislativo. Recente reportagem do Estado mostrou que garagistas da Câmara Municipal de São Paulo ganham mais do que o presidente da Casa. Na internet, circula a informação de que os ascensoristas da Câmara dos Deputados ganham mais do que os pilotos da Força Aérea Brasileira. Além disso, no Senado há 464 servidores com salários acima do teto estabelecido pela Constituição para a administração pública.

Viabilizada pela Lei de Acesso à Informação, a obrigatoriedade de divulgação dos salários do funcionalismo público é uma forma de coibir abusos e assegurar o respeito ao teto constitucional. Entre 2003 e 2010, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o funcionalismo público cresceu 30,2%. Atualmente, há 9,4 milhões de servidores públicos no País, dos quais 4,9 milhões estão nas prefeituras; 3,5 milhões, nos Estados; e o restante, na União. Segundo o site Contas Abertas, as despesas com pessoal nas três esferas de governo representam 14% do PIB. O montante previsto pelo Orçamento da União para 2012, na rubrica "pessoal e encargos", é de R$ 200 bilhões - valor cinco vezes maior do que os investimentos do PAC.

Cerca de 90 países já têm leis de acesso à informação. Quase todos enfrentaram problemas de informática, logística e de falta de recursos humanos para cumprir o que elas determinam. Com o tempo, porém, os problemas foram superados e elas passaram a gerar os efeitos desejados. É só uma questão de tempo para que o mesmo aconteça no Brasil.

Soluções para o lixo eletrônico - MARIA INÊS DOLCI

FOLHA DE SP - 11/06

Cada consumidor brasileiro descarta meio quilo de lixo eletrônico por ano; na China, é menos da metade



Olhem nas gavetas, nas prateleiras e nos armários: com certeza encontrarão pilhas, baterias, carregadores e telefones celulares. Sem contar partes e peças de computadores, de impressoras, de scanners e de outros equipamentos tecnológicos.

Não se trata de um problema somente seu, caro leitor.

O desenvolvimento tecnológico, que incorporou a mobilidade ao trabalho, ao estudo, ao lazer e às demais relações humanas, tem subprodutos como a redução da privacidade, a invasão da vida pessoal pelas atividades profissionais e os resíduos que se amontoam.

Segundo relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), cada consumidor brasileiro descarta meio quilo de lixo eletrônico por ano.

Somos os líderes na geração desses resíduos entre os países emergentes. Na China, por exemplo, o descarte por habitante é menos da metade do nosso.

Isso ocorre porque fabricantes e legisladores não se preocuparam em padronizar equipamentos, periféricos nem itens como os carregadores de celulares.

Em agosto, entrará em vigor a Política Nacional de Resíduos Sólidos, criada pela lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, e regulamentada pelo decreto nº 7.404, de 23 de dezembro do mesmo ano.

Houve avanços inegáveis na legislação, como a exigência da logística reversa, ou seja, o recolhimento, pelas empresas, de produtos descartados.

A lei estipula, no artigo 33, três tipos de instrumentos para funcionamento dessa logística: regulamento, acordo setorial e termos de compromisso.

Embora a regulamentação da lei vá completar dois anos em 2 de agosto próximo, somente no mês passado o Ministério do Meio Ambiente criou Grupos de Trabalho Temáticos (GTT), que subsidiarão acordos setoriais para a coleta dos descartáveis. Medida que, talvez, tenha em vista a conferência do ambiente Rio+20.

Os cinco GTT contemplam as cadeias produtivas de eletroeletrônicos e seus componentes, embalagens plásticas de óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista, embalagens em geral e medicamentos.

Os consumidores brasileiros não podem esperar, de braços cruzados, que o governo federal faça a sua parte. Sem pressão, grupos de trabalho costumam ser excelentes álibis para que as providências demorem muito, pois não há um cronograma rígido para a definição do funcionamento da logística reversa.

É necessário que as responsabilidades sejam definidas claramente. E que o consumidor não tenha de bancar o envio de um equipamento ou de uma máquina a locais distantes, às vezes em outras cidades, em razão da sede do fabricante.

Para isso, é necessário criar uma estrutura de recolhimento nos grandes centros, que concentram a maior população e, consequentemente, parte expressiva do mercado. E um sistema de coleta nas demais cidades ou o ressarcimento do custo de entrega dos produtos às fábricas.

É um problema sério, que só será solucionado ou minimizado com diretrizes muito bem estabelecidas, fruto de debates, em sintonia com parâmetros ambientais internacionais.

O consumo consciente seria outra maneira de os consumidores reduzirem a quantidade de resíduos tecnológicos.

A sociedade brasileira vai no sentido contrário da sustentabilidade, ao adquirir, por exemplo, aparelhos celulares compulsivamente, sempre que novos modelos são lançados.

Há cidadezinhas em que não há sinal consistente para conversas telefônicas, mas nas quais as pessoas têm aparelhos para ouvir música, fotografar e jogar.

Além disso, há que estimular as empresas a privilegiar, nos processos produtivos, produtos e componentes reutilizáveis, com matérias-primas sustentáveis.

Com consumo consciente, produção eficiente e o recolhimento desse lixo, poderemos efetivamente proteger o ambiente, em vez de falar muito, propagandear sustentabilidade e agir em descompasso com as necessidades do planeta.

Fora do ar - VERA MAGALHÃES -PAINEL


FOLHA DE SP - 11/06

Divulgada pelo TSE como uma das novidades da eleição de outubro, a transmissão de propaganda eleitoral em cidades que não possuem geradoras de TV e que recebem imagens do palanque eletrônico "vizinho" não deve sair do papel. Resolução que trata do tema está sob análise da presidente do tribunal, ministra Carmen Lúcia, que pediu vista, e dificilmente será votada em plenário antes da homologação das candidaturas.

A avaliação na corte é que a implantação da medida, além de enfrentar obstáculos técnicos já apresentados pelas emissoras, demandaria longo processo de organização no âmbito dos tribunais regionais eleitorais.

Parabólica O recuo frustra sobretudo candidatos de municípios com mais de 300 mil eleitores em regiões metropolitanas, submetidos à propaganda das capitais. Em São Paulo, Guarulhos, Osasco, Santo André e São Bernardo do Campo contavam com exibição de programas locais.

Largada O PMDB marcou para o dia 24, no Pátio do Colégio, centro de São Paulo, a convenção que homologará a candidatura de Gabriel Chalita à prefeitura. O local foi escolhido por simbolizar o "marco zero" da capital.

Overbooking Na última hora, a lista de postulantes a vice de José Serra ganhou mais um nome: Ricardo Patah, que se licenciou da presidência da UGT na sexta-feira. No PSD de Gilberto Kassab, no entanto, o nome mais forte é o do ex-secretário de Educação Alexandre Schneider.

Campo minado A despeito das manifestações hostis de partidários do prefeito João da Costa, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, desembarca em Recife no dia 29 para a convenção que deve homologar a candidatura de Humberto Costa à sucessão.

Devagar... A candidatura a prefeito do senador Inácio Arruda (PC do B) em Fortaleza dependerá da adesão do PMDB. Se o partido decidir acompanhar o governador Cid Gomes no apoio ao petista Elmano Freitas, Arruda deve desistir da disputa.

... com o andor O PT fez chegar a Arruda que, se tentar voo solo na sucessão de Luizianne Lins, o apoio à sua reeleição ao Senado em 2014, quando será preenchida só uma vaga, não é garantido.

Erosão Pesquisas encomendadas pelo governo de Goiás mostram queda na popularidade do tucano Marconi Perillo, que será um dos alvos da CPI do Cachoeira, com seu depoimento amanhã. A vacina de Perillo será martelar que a "campanha" contra ele se deve a preconceito contra o povo goiano.

Eleitoral O PT apresentou requerimento para ouvir na CPI o candidato a prefeito de São Paulo José Serra (PSDB), para que explique contratos da Delta firmados quando era prefeito. O partido quer convocar também o ex-diretor da Dersa Paulo Vieira, o Paulo Preto, figura incômoda para os tucanos.

Patuá Advogados que atuam no processo do mensalão pensam em mandar confeccionar becas novas para a sustentação oral que farão no STF. Eles custam a admitir, mas acham que as togas que usaram em 2007, quando foi acolhida a denúncia contra os réus, não trouxeram sorte a seus clientes.

Tese O advogado de Delúbio Soares, Arnaldo Malheiros, vai usar em sua defesa a jurisprudência do caso Collor. Na absolvição do ex-presidente no STF prevaleceu o entendimento segundo o qual para haver corrupção tem de haver ato de ofício de um agente público. Delúbio não era membro do governo.

Tiroteio

Nunca autorizei ninguém a falar em meu nome sobre 2014. Minha relação com Kassab dispensa intermediários. Quando precisar conversar com ele, faço isso pessoalmente.

DO SENADOR AÉCIO NEVES (PSDB-MG), sobre a informação de que teria procurado dirigentes estaduais do PSD, partido do prefeito de São Paulo, para negociar apoio prévio à sua pré-candidatura à Presidência daqui a dois anos.

Contraponto

Cadinho dos Pampas

O advogado Carlos Araújo, ex-marido de Dilma Rousseff, almoçava com a deputada Juliana Brizola (PDT-RS) em Porto Alegre no final de maio. Em meio ao entra e sai de políticos, ele desabafou:

-Em ano eleitoral, isso aqui é uma loucura. O telefone não para. Todo mundo querendo o meu apoio.

A pedetista, neta de Leonel Brizola, quis saber como Araújo respondia aos insistentes pedidos.

-Guria, eu só tenho compromisso com duas mulheres: com a Dilma e com você.

Arquivo vivo - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


O Estado de S. Paulo - 11/06

O arquivo de um jornal é o registro de várias dimensões da história. Marca não apenas a cronologia dos acontecimentos, mas grava as mudanças da língua, e, por tabela, plasma as transformações dos hábitos e interesses de quem a emprega. O arquivo registra quando uma expressão passa a fazer parte do cotidiano, e, atrás dessa palavra, mostra a evolução das ideias e dos conceitos que ela encerra.

Pesquisando-se o acervo digitalizado do Estado, percebe-se que poucas invenções tiveram impacto tão profundo quanto o advento da internet. Ela entrou para o léxico do jornal em março de 1990, através de reportagem traduzida do The New York Times. O jornalista John Markoff relatava um ataque hacker (também a primeira menção ao termo) que roubara senhas de usuários "das centenas de milhares de computadores" ligados à rede em todo o mundo.

Quatro meses depois, outra reportagem anunciava a futura ligação da Universidade Federal do Rio de Janeiro "à rede de pesquisas internet". Nenhuma palavra sobre o assunto em 1991 e apenas uma citação no ano seguinte. Mas em 1993 começaria a espetacular escalada do uso da palavra "internet" nas páginas do jornal.

Em 14 de fevereiro de 1993, outra reportagem de Markoff falava de uma internet visionária, que transportaria o conteúdo de enciclopédias "em segundos" através de "vidro e luz" (ou seja, de fibra ótica). Em agosto, diante da enxurrada de citações presentes no jornal, uma "Nota da Redação" explicava: "A Internet não tem representante no Brasil, mas pode ser acessada por meio do BBS Canal Vip".

Isso estava para mudar. Em 19 de dezembro de 1994, o caderno de Informática anunciava alto na página: "A Internet comercial chega ao País". Pela primeira vez, o termo foi usado em todos os meses do ano: 156 citações. Em pouco tempo a frequência de menções à internet seria diária. O volume multiplicou-se a cada ano. Foram 778 vezes em 1995, 1.593 no ano seguinte, depois 2.154, 3.910, 4.999 até bater o recorde em 2000:7.715 menções.

Outra revolução das comunicações, a televisão, nunca passou de 2.511 citações ao longo de um ano (no caso, em 2004) nas páginas do Estado. Em 22 anos, o termo "internet" foi usado 84.495 vezes no jornal, mais do que as 80.783 citações a "televisão", que aparece no acervo desde 1922. Se você acha que o Estado deu atenção demais ao assunto, saiba que a palavra "internet" foi empregada 485 mil vezes no The New York Times desde 1982.

Com o estouro da bolha especulativa das empresas ponto.com, as reportagens sobre a rede mundial de computadores se tornaram menos frequentes. No Estado, a internet perdeu a inicial maiúscula em 2003, virou mais um assunto e nunca mais mais teve tantas menções quanto em 2000 - embora ainda seja mais usada do que "democracia", "eleição" e "computador".

Não bastasse o alvoroço que causou e o espaço que ocupou, a internet deu crias lexicográficas. Até o final do século passado, "rede social" era uma forma de proteção comunitária: a rede social que protege os imigrantes de uma determinada região, por exemplo. Nos anos 2000, porém, virou aposto e, depois, sinônimo de Twitter, Facebook e Orkut. Somadas, essas quatro expressões já têm quase 3 mil citações por ano nas páginas do Estado.

E como a frequência do uso das palavras no jornal reflete a política? De maneira surpreendente. De todos os políticos, os mais citados nas páginas do Estado são presidentes, ex-presidentes e alguns candidatos derrotados à Presidência. O ranking presidencial é encabeçado por "Luiz Inácio Lula da Silva". São mais de 24 mil menções ao seu nome completo. Se forem somadas as menções a "Luiz Inácio da Silva", a conta passa de 26 mil.

Dois Josés disputam o segundo lugar de citações: Sarney e Serra. Com quase 18,5 mil aparições, o tucano está formalmente na segunda colocação - mas ele tem muitos homônimos, o que dificulta a contabilidade. Fernando Henrique Cardoso é o quarto colocado, com 16,4 mil citações. A seguir vêm, pela ordem, Paulo Maluf, Jânio Quadros, Dilma Rousseff, Getúlio Vargas, Itamar Franco, Fernando Collor e, bem atrás, os presidentes militares.

Lula aparece pela primeira vez em reportagem sobre o novo sindicalismo do ABC paulista, no final dos anos 70. Fernando Henrique é citado desde 1957, ainda como intelectual. A primeira menção a José Serra foi em 10 de março de 1960, numa propaganda do curso preparatório Anglo Latino. Ele é um dos aprovados no vestibular para a Escola Politécnica (USP): foi o 184.º colocado em 266 vagas.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 11/06

Depois da bolha, Primavera Árabe dá beneficio a Dubai

Emirado é visto como porto seguro para paises e fortunas da região, mas fase de aquisições no exterior passou

Três anos depois do estouro de uma bolha imobiliária, Dubai ainda ainda se ressente da crise.

Das quase 100 corretoras ativas em 2008, cerca de 40 suspenderam as operações. Os preços de imóveis caíram cerca de 60% desde o pico naquele ano, mas há quem cite casos de recuo de 80%.

"Aluguéis mais baixos reduziram o custo de vida em Dubai e estimularam a realocação de negócios e pessoas para Dubai", disse em seu escritório Nasser Saidi, economista-chefe do Dubai International Financial Centre, um parque empresarial isento de impostos, como é quase tudo nos Emirados Árabes Unidos e no Qatar.

O Itaú Unibanco e a Brasil Foods se instalaram lá, como inúmeras empresas e bancos estrangeiros. De Dubai, as companhias cobrem o Oriente Médio.

O emirado, que vinha crescendo dois dígitos por ano, acusou o golpe no Lehman Brothers e a crise financeira: os fluxos secaram, o comércio global e os preços de commodities caíram, sem contar as perdas em investimentos nos EUA e na Europa.

O governo e empresas estatais tinham embarcado em uma frenética construção de infraestrutura, "que, no entanto, requer financiamento de longo prazo, não dívida bancária de curto prazo", acrescentou Saidi, em entrevista à coluna em sua sala, no futurístico centro financeiro de Dubai, conversa completada depois por e-mail.

"Essa cidade, incrivelmente aberta, como Cingapura ou Hong-Kong, ficou exposta aos ventos gelados da recessão global."

Depois da exposição, que deixou uma dívida de cerca de US$ 110 bilhões, Dubai vem se recuperando.

Os Emirados Árabes Unidos _ que incluem Dubai _ cresceram 3,3% no ano passado. "Esperamos crescimento entre 4% e 4,5% neste ano, se não houver uma quebra maior na Eurozona e um choque no preço do petróleo."

O fluxo de pessoas e negócios foi reforçado pela estabilidade política e o status de porto seguro de Dubai na região pós - Primavera Árabe. "Estamos vendo uma demanda crescente de países afetados por problemas políticos, e de companhias que querem estabelecer escritórios em Dubai, ou se mudar para cá", disse o economista-chefe, que também foi ministro da Fazenda, do Comércio e da Indústria do Líbano, além de vice-presidente do Banco Central daquele país.

Executivos brasileiros e estrangeiros que vivem em Dubai confirmam o interesse pelo emirado.

"Dubai tem também lidado com a dívida pela redução de gastos do governo, focando em investimentos estratégicos e saindo de ativos, particularmente em economias e economias estrangeiros que não eram relacionados a objetivos estratégicos de desenvolvimento", afirmou.

O emirado tem o prédio mais alto do mundo com mais de 200 andares e ilhas artificiais em forma de palmeira e do mapa-mundi.

Foi feita uma reestruturação e reduzido o desenvolvimento de imóveis, com uma administração financeira mais centralizada.

"A volta do crescimento trouxe melhora de fluxo de caixa para empresas ligadas ao governo e empresas estatais, além de maior crescimento de receita para o governo", disse Saidi.

Aquisições no exterior

"Os dias de aquisições estrangeiras e private equity acabaram", afirmou à coluna Aaron Bielenberg, que também é do DIFC e atuou como consultor do governo de Dubai na crise financeira e na série de vezes em que fundos soberanos locais levantaram recursos.

"Acabou-se para Dubai, mas Qatar e Abu Dhabi ainda estão fazendo [compras de ativos no exterior], cada vez mais, um mais que o outro."

De acordo com Bielenberg, Dubai tem feito um notável esforço para voltar ao caminho do crescimento.

Seu grande negócio tem sido ser um "hub". Óleo sempre foi um pequeno e declinante contribuinte para o orçamento.

"O modelo de negócio de Dubai é o de ter taxas e aluguéis de sua posição de 'hub' para transporte de mercadorias e pessoas e de ser um centro tolerante para se fazer negócios. Permitiu estrangeiros trabalhar aqui, comprar imóveis e crescer", acrescentou.

Enquanto muito da infraestrutura foi feita através de alocação do orçamento, muito de aquisições estrangeiras e expansão foram com dívida de curto prazo para negócios de longo prazo.

Em novembro de 2009, Dubai não poderia refinanciar essa dívida dada a crise financeira e teve de reestruturar a sua maior companhia, a Dubai World, e uma série de outras obrigações de dívida.

"Uma vez iniciada a reestruturação, entretanto, houve rápido avanço, com credores internacionais tratados com justiça. Abu Dhabi deu grande apoio e Dubai foi em um ano capaz de voltar aos mercados financeiros surpreendentemente", de acordo com Bielenberg.

Foco em serviços

Agora Dubai está voltando às suas raízes como hub e está focado mais do que nunca em crescimento de seus serviços, logística, hotéis, em lazer e negócios.

"O emirado tem três Ts [em inglês], de transporte, turismo e comércio, que sustentam os 4 Ss, sol, shopping, mar e areia, que atraem turismo e negócios", disse Saidi. "Dubai sabe que está muito endividado, que não se desalavancou realmente e está criando políticas para crescer sem dívida, com expansão de shopping, de aeroporto, hotel e dando maior clareza a sua estrutura legal."

Primavera Árabe

Dubai sempre se beneficiou de turbulências na região e a Primavera Árabe tem causado um "boom" no emirado. Grande parte da fortuna regional está se mudando para Dubai com negócios e pessoas.

"É agora parte da Rota da Seda e o único refúgio seguro para Rússia, Ásia Central, África e China", disse Bielenberg.

"Os dias de aquisições estrangeiras e de ações de private equity acabaram. Mas Qatar e Abu Dhabi ainda estão fazendo, um mais que o outro"

AARON BIELENBERG

"Dubai sabe que está muito endividado, que não se desalavancou realmente, e está criando políticas para crescer sem dívida, com expansão de shopping, de aeroporto, hotel e dando maior clareza a sua estrutura legal"

BIELENBERG, DO DIFC, que foi consultor do governo de Dubai na crise financeira

"O fluxo de pessoas e negócios foi reforçado pela estabilidade política e o status de porto seguro de Dubai na região pós - Primavera Árabe. Estamos vendo uma demanda crescente de países afetados por problemas políticos, e de companhias que querem estabelecer escritórios em Dubai, ou se mudar para cá"

NASSER SAIDI

Casa nova

As vendas de imóveis novos residenciais na cidade de São Paulo superaram 7.400 unidades no primeiro quadrimestre deste ano, com alta de 12,5% em relação ao mesmo período do ano passado.

Os números são de pesquisa do Secovi-SP (sindicato da habitação), que também aponta que, de janeiro a abril, foram comercializados R$ 3,6 bilhões, aumento real de 6,9% entre os períodos.

As unidades com até seis meses de oferta, a partir do lançamento, representaram 78,7% das vendas em abril.

Predominam os negócios com imóveis de dois e de três dormitórios. A participação dos dois segmentos foi de 85,6% do total.

Surpresa: virei ativista! - ANA LUIZA ARCHER


O Globo - 11/06


Meses atrás, se alguém "profetizasse" que eu iria sair da minha vidinha em Ipanema no Rio de Janeiro para ir ao STF em Brasília, a fim de entregar, com outros representantes de movimentos anticorrupção, um abaixo assinado com 37 mil assinaturas pelo "julgamento do mensalão já!", e que ainda levaria uma cotovelada do segurança do ministro Gilmar Mendes, tudo isso cercada por dezenas de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas de vários veículos de imprensa, eu daria uma boa risada.

Pois é: aconteceu. A vida é cheia de surpresas.

Há tempos tenho estado envolvida em um singelo movimento de bairro, em Ipanema, debatendo com a comunidade e autoridades questões como a localização de uma estação do metrô e opções para um carnaval de rua harmonioso entre foliões e moradores. São causas "paroquiais", mas relevantes, pois afetam não só o bairro, mas toda a cidade - e todos os pontos de vista devem ser considerados, assim como seus respectivos ônus e bônus.

Mas dialogar não tem sido a prática usual das autoridades aqui no Rio. Por vezes, temos nos deparado com decisões tão autoritárias e incompreensíveis, que fica a impressão de alguma coisa não revelada. Foi quando surgiu o movimento anticorrupção na cidade, ao qual, num piscar de olhos, decidimos aderir - afinal, sentimos "malfeitos" na pele.

Essa experiência tem sido para mim especialmente enriquecedora, seja pela novidade, pelas conversas políticas, pelas pessoas éticas e encantadoras que tenho encontrado. Hoje, graças em grande medida à liberdade de imprensa - que felizmente desfrutamos no Brasil -, qualquer que seja o nível social e intelectual, todos, sem exceção, acompanham o noticiário e têm casos de corrupção a comentar. Motoristas de táxi são especialistas no assunto. Barbeiros e cabeleireiros? Dominam a conversa e apontam exemplos.

A liberdade de expressão é valiosa. A manifestação da opinião pública é legítima e desejável em qualquer democracia saudável e faz toda diferença - basta lembrar a aprovação recente da nossa Lei da Ficha Limpa.

O STF é o tribunal mais importante do país e, obviamente, ninguém discorda de que o julgamento do mensalão deva ser técnico e que a constituição tem que ser respeitada.

Por outro lado, mais informada, a sociedade brasileira entende o desenrolar dos acontecimentos, entende as jogada políticas e jurídicas desse processo e não aceita mais a impunidade.

Ninguém discute a idoneidade do Supremo. Lidar com interesses diversos, e especialmente tão poderosos como neste julgamento, é de imensa responsabilidade. Na história, na literatura e na bíblia, o ato de julgar é tão importante que é atribuição de reis, como vemos, por exemplo, em Ricardo II de Shakespeare e no rei Salomão.

Neste sentido, o abaixo-assinado que entregamos, com as 37 mil assinaturas, expressa, sobretudo, nossa confiança no STF e apoia os que estão empenhados no julgamento - breve e justo - do mensalão, processo já maduro, como afirmou o ministro Ayres Britto. Com 38 réus de peso, trata-se de um julgamento emblemático - além de uma oportunidade imperdível para provar à sociedade que réus poderosos também se submetem à Justiça, como qualquer um de nós. A essas alturas, postergações e pedidos de vista são inaceitáveis. A impunidade é inaceitável. Se não há punição, há estímulo. Confiamos no STF.

Outro dia, no cabeleireiro, estava comentando o noticiário político, quando minha vizinha de cadeira, uma senhora psicanalista, me indagou se eu era jornalista, pois para ela eu parecia entender tudo. Surpresa, respondi que não, que eu conhecia o assunto porque fazia parte de um movimento anticorrupção. Ao que ela concluiu sorrindo: "Ah, entendi. Então você é ativista." Pois é: não é que ela definiu bem? Virei ativista.

SUPLA A CAMINHO - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 11/06


A banda Brothers of Brazil, dos irmãos Supla e João Suplicy, lança o novo álbum, "On My Way", no dia 15, com "pocket show" na Fnac de Pinheiros. São 16 faixas, como "Puppet Zombies of Wall Street" e "O Rio".

Na sexta, Supla visitou a Folha para divulgar o trabalho. A coluna perguntou a ele sobre as eleições em SP. Sua mãe, Marta Suplicy, foi preterida pelo PT, que lançou Fernando Haddad.

"Infelizmente, eu não posso falar tudo o que eu penso de política", desconversou. Questionado se votaria em Haddad, brincou: "Haddad? Não conheço. Dá pra votar?"

Diante da ponderação de que seu pai, Eduardo Suplicy, apoia o candidato, Supla disse: "Ele segue muito o partido. Eu já teria mandado todo mundo para aquele lugar. É muita paciência". E finalizou: "Eu conheço esses caras desde pequeno. O único por quem eu boto a mão no fogo é o meu pai, que tem três ternos e dirige um Ford K".

Frase

"Haddad? Não conheço. Dá pra votar?"

REGRA SUPREMA
Com o STF (Supremo Tribunal Federal) conflagrado por conta do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, não recebeu até agora advogados nem emissários dos réus do caso. Numa única tentativa, avisou: conversaria com representantes da defesa -desde que o procurador-geral Roberto Gurgel, autor da denúncia, estivesse presente.

REGRA 2
A proposta de Barbosa não foi bem recebida e ele não foi mais procurado.

REGRA 3
Desde que adotou essa prática -em todos os processos, e não apenas no do mensalão -, os pedidos de audiência em seu gabinete diminuíram cerca de 90%.

AINDA O MENSALÃO
Caso o ministro Cezar Peluso se aposente antes do fim do julgamento do mensalão, a presidente Dilma Rousseff poderia indicar um substituto ainda em setembro. Se isso ocorrer, advogados dos réus entendem que as acusações e as alegações dos 38 advogados de defesa teriam que ser feitas novamente.

NUNCA ANTES
Um dos ministros mais antigos da corte e familiarizado com o regimento diz que a questão é aberta, inédita e sujeita a controvérsia. Diz acreditar que o mais provável é que, se um novo ministro for nomeado, ele só vote caso se declare habilitado -o que descarta a hipótese de precisar ouvir de novo o que já disseram os advogados em sessão pública.

NA REDE
Soninha Francine, pré-candidata do PPS à prefeitura, recebeu pesquisa que monitora redes sociais e que aponta o ator José de Abreu como seu maior crítico na internet. "Achava ele um barato na sua médio 'porra-louquice'... Aí, na campanha do José Serra, conheci o lado pitbull dele." Abreu diz que Soninha deveria "arrumar uma assessoria de imprensa para não publicar as bobagens que publica [na web]".

VOTO DE SILÊNCIO
E José de Abreu diz que, ao contrário de 2010, não vai comentar a eleição deste ano nas redes sociais. Vai se impor o veto por estar no ar na novela "Avenida Brasil".

ATÉ MAIS
Após a novela, "se não pintar nada", Abreu pretende passar temporada fora do Brasil. Está em dúvida entre Nova York, São Francisco, Tóquio e Los Angeles.

EM CONSTRUÇÃO
O diretor Rogério Zagallo, que realiza um filme sobre a construção do novo estádio do Palmeiras, vai lançar na internet uma série de curtas, chamada "Intervalo", sobre o período das obras. O primeiro, "Pontapé Inicial", traz o depoimento de Domingos dos Santos (pai do líbero Serginho), da seleção de vôlei, que trabalha nos vestiários da área social do clube.

AOS MESTRES
Gilberto Gil vai celebrar 70 anos no dia 26 disponibilizando no YouTube uma hora do show "Concerto de Cordas e Máquinas de Ritmo", que apresentou no mês passado com a orquestra sinfônica da Petrobras, no Rio. A partir de hoje, o Google solta na internet pílulas de trinta segundos do especial.

CÍRCULO
E Gil não fará megafesta na virada dos 70. Fica em casa com família e amigos.

REPERTÓRIO NACIONAL
Uma das músicas tocadas minutos antes de Madonna entrar no palco no show de sua turnê mundial, em Istambul, na quinta, foi "Balada Boa (Tchê Tchê Rere)", do brasileiro Gusttavo Lima.

TROPICALISTAS
O documentário "Futuro do Pretérito: Tropicalismo Now!", de Ninho Moraes, teve pré-estreia na Cinemateca. O músico André Abujamra, o diretor francês Florent de La Tullaye, a modelo Luisa Moraes, Aline Setton e Nadine Gonzalez estavam na sessão.

OS MENINOS DE MARISA
Os músicos Dengue, Lúcio Maia e Pupillo, da banda Nação Zumbi, foram convidados por Marisa Monte para sair em turnê com o novo show da cantora, "Verdade uma Ilusão". "Sonhava há um tempo em poder trazê-los para mais perto e acho que esse desejo foi se tornando recíproco; daí os 'peguei emprestados' da Nação, primeiro no disco e agora no show. Prometo que um dia os devolverei", diz Marisa. Ela se apresenta com o trio em SP a partir do dia 21.

CURTO-CIRCUITO

A cerimônia de entrega do prêmio Melhores do Ano da Gastronomia acontece hoje, às 20h, no Hyatt.

O curso Roupas e Ritos, do professor de história da moda João Braga, tem início hoje, às 15h, na Casa do Saber do shopping Cidade Jardim.

A cantora Eugénia Melo e Castro faz show para convidados, amanhã, no consulado de Portugal, durante a apresentação do novo cônsul português.

As obras-convite para a festa do Núcleo Contemporâneo do MAM-SP no dia 23 de agosto poderão ser escolhidas a partir de hoje no site do museu.

O Instituto MD Anderson Cancer Center (EUA) deu cinco bolsas de estudos para pesquisadores do Hospital de Câncer de Barretos.

com ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER, LÍGIA MESQUITA e OLÍVIA FLORÊNCIA

Vadi@ ou vadia? - LUIZ FELIPE PONDÉ


FOLHA DE SP - 11/06

Quem diz coisas como "sexo é saudável" escova os dentes depois de fazer sexo oral

Vadi@ ou vadia, eis que a questão. A primeira é de mentirinha, a segunda é pra valer.

Você me pergunta como pronunciar a palavra "vadi"? A resposta é: não se pronuncia. A intenção no uso de "" no lugar da vogal que designa o gênero de uma palavra é exatamente ser politicamente correto e emudecer a palavra. Coisa de fascista.

Pergunto-me: que mente brilhante teve tempo vazio o suficiente para pensar em algo tão sublimemente vazi@? Mas e "vadia"? Vadia, até ontem, era uma mulher fácil. Mas, agora, é um termo que designa um novo direito: aquele de vestir saia curta, mostrar os seios, e não ser objeto de violência sexual. Tem todo meu apoio. "Homem que é homem não bate."

No fundo, o novo uso da palavra "vadia" significa: "só gosto de apanhar de quem me dá tesão", como me disse, uma vez, mais ou menos assim, uma aluna, para definir o que era, para ela, uma mulher emancipada.

O movimento das vadias, nascido no Canadá, retoma a ideia de ser vadia de uma forma bem-humorada e, espero, sem incorrer no erro clássico do feminismo: deserotizar a mulher a fim de torná-la "cidadã".

Uma das coisas que me faz simpatizar com a "agenda das vadias" é sua estética, que a distancia da agenda careta e puritana do feminismo institucionalizado. O puritanismo feminista, que não entende nada de mulher, faz da mulher uma "camarada" vestida de homem em meio a um mundo brocha de tanta exigência de igualdade entre os sexos.

Pecado dá mais tesão do que a revolução sexual, esta brincadeirinha de menina de classe média.

Não existe "sexo correto", sexo é o lugar no qual nos perdemos, e por ser gostoso, sempre "metemos" os pés pelas mãos.

Aliás, o sentido ambíguo da palavra "metemos" nesta frase (num contexto sobre sexo) fala mais de sexo do que uma lei que diga que "sexo é dever do Estado e direito de todo cidadão" ou que "sexo é saudável e que devemos praticá-lo três vezes ao dia, segundo pesquisas em Harvard".

Como diria Freud, sendo irônico: "Penis normalis dosim repetatur" não resolve o problema da histérica. Veja, por exemplo, a literatura sadiana (do Marquês de Sade, autor do século 18, chamado de "divino" por quem provavelmente não faz sexo): existe coisa menos erótica do que sua histeria a favor do "sexo livre"? Sade cresce quando fala que a natureza é perversa e não quando fazem dele arauto da Revolução Francesa e sua breguice ideológica.

O risco maior é do movimento das vadias fazer da vadia uma vadi@ e com isso revelar nosso preconceito contra as verdadeiras vadias, mulheres que encantam o mundo com seu Eros intratável.

As verdadeiras vadias devoram homens porque em sendo promíscuas, entendem mais sobre a alma humana do que "padres, freiras e revolucionários", parentes muito próximos das feministas, e mais afins com a tendência de fazer do sexo um "direito de todo cidadão".

Quem diz coisas como "sexo é saudável" faz gargarejo e escova os dentes depois de fazer sexo oral.

Recomendo para quem quiser ser vadia pra valer e não vadi@, a trilogia de E.L. James, uma inglesa, "Fifty Shades", cujo primeiro volume, "Fifty Shades of Grey" (cinquenta tons de cinza) é best-seller absoluto no mundo de língua inglesa.

O livro narra o romance entre um homem de cerca de 30 anos, "macho alfa" (rico, bonito, seguro, inteligente) e uma mulher de cerca de 20 anos, também arrasadora. Surpresa: ele curte "sadomasô" light e ela se descobre apaixonada pela submissão sexual ao homem como jogo de prazer. Contra quem acusa seu livro de "machista", a autora diz que graças ao seu livro as mulheres estão conseguindo falar de sexo de novo depois de anos em silêncio devido à patrulha das "camaradas".

A diferença entre vadi@ e vadia é que enquanto a primeira geme de ressentimento porque é mulher, a segunda geme de tesão quando puxam seu cabelo. Depois, ela toma um banho e vai numa reunião de negócios sem que ninguém suspeite em qual secreta posição ela gosta de apanhar de quem lhe dá tesão.

Amanhã é Dia dos Namorados. Compre uma saia de vadia pra sua namorada. E não escove os dentes depois.

Encantou-se - VINICIUS MOTA


FOLHA DE SP - 11/06


SÃO PAULO - Fica mais burro o Brasil com a morte repentina de Flávio Pierucci, sociólogo da USP, na sexta passada nesta capital. Citações a seu respeito tratam-no de "especialista em religiões". É pouco.

Nascido em Altinópolis (cidadezinha do norte paulista), Pierucci tornou-se um intérprete das idas e vindas do racionalismo ocidental na periferia do capitalismo. Seja na religião, seja nas preferências do eleitor, seja nos descaminhos da esquerda.

Nos últimos 20 anos, enveredou pela vasta obra de Max Weber (1864-1920). O mergulho nos legou a melhor edição brasileira de "A Ética Protestante e o 'Espírito' do Capitalismo" (Companhia das Letras), texto crucial do sociólogo alemão.

Outro excelente produto desses anos de imersão é "O Desencantamento do Mundo" (ed. 34). Com minúcia, Pierucci mostra como Weber enxergava na evolução milenar das religiões ocidentais -em contraste com grandes denominações do Oriente- o enraizamento da racionalidade na vida cotidiana.

Desde os profetas do judaísmo, a divindade veio sendo expulsa do mundo sensível. Os deuses não estão mais entre nós. Tornaram-se, nas configurações mais radicais do protestantismo cristão, uma ideia abstrata, insondável, intangível.

No lugar dos rituais mágicos e místicos para lidar com o divino, instalou-se um metódico regramento da conduta cotidiana -baseado no cálculo, na repressão dos prazeres e na valorização do trabalho e da riqueza. Daí porque, no Ocidente, a religião favoreceu e potencializou o racionalismo e o próprio capitalismo.

Filiado, como Weber, à vertente iluminista, Pierucci fez-se crítico das novas plataformas da esquerda, que valorizam identidades de etnia, gênero e "raça". O pressuposto de que há diferenças culturais irredutíveis entre grupos conflita, na prática, com a ideia de que o ser humano possui um acervo de direitos universais -estes, sim, inegociáveis.

Escorregando na manteiga, ladeira acima - ALEXANDRE BARROS


O ESTADÃO - 11/06


A marolinha foi uma sacada política inteligente do então presidente Lula. Evitou o pânico que retrairia subitamente o consumo. Deu certo por um tempo. Agora as ondas aumentaram. A presidente Dilma Rousseff queixou-se de um tsunami. Algo havia que fazer, mas não muito a ser feito. Adotamos cobertor curto para cobrir santo grande.

O governo quer coisas contraditórias: aliviar alguns impostos e manter a arrecadação. Os escolhidos para ganhar são os que têm lobbies mais fortes, capazes de ameaçar com desastres maiores: mais desemprego, maior frustração ou instabilidade política. A predileta é a indústria automobilística. Nela é sensível a retração do consumo. A ameaça é forte e o lobby, pesado.

O que é melhor, proteger a indústria automobilística ou a de ar-condicionado? A de caminhões ou a de micro-ondas? Numa situação de mercado, todos os produtos são iguais. As preferências dos consumidores é que definirão os vencedores. Na escolha política do governo e das burocracias, alguém diz que é melhor que os carros sejam mais baratos e os refrigerantes e os aparelhos de ar-condicionado, mais caros. Cada um sabe onde lhe aperta o sapato, mas o governo optou por nos dar sapatos com pontos mais apertados e outros mais frouxos.

Voltamos à situação anterior a 1860, quando os pares de sapatos eram simétricos. Os pés direito e esquerdo dos sapatos eram iguais, só que nas pessoas um pé é diferente do outro. Cabia aos usuários deformar os sapatos para adaptá-los ao pé em que quisessem usá-los. Por isso tanta gente tinha bolhas e calos.

As recentes decisões do governo são parecidas. Ajustem seus pés, vocês, que gostam de refrigerantes, micro-ondas e ar-condicionado, porque os impostos desses produtos subirão. Preparem-se os que gostam de automóveis, porque será mais barato comprá-los. Tudo tem consequências que transbordam os limites da decisão. Em troca, uns sentirão mais calor, outros engarrafarão mais as ruas e estradas. Em economia tudo funciona assim: uma decisão tomada aqui repercute lá. Algumas vezes, meses depois.

Quando foi anunciada a decisão de aumentar os impostos dos refrigerantes, o burocrata entrevistado disse que os reajustes serão reavaliados anualmente, em 1.º de outubro, quando os novos valores devem ser anunciados. Sua ressalva foi tão idiota quanto inútil: disse que o fato de o governo elevar os impostos não significa, necessariamente, que produtores e comercializadores tenham de aumentar os preços para os consumidores. Idiota porque o que ele já adiantou é que o governo prevê a inflação em velocidade que demandará uma avaliação anual para aumentar os impostos. Inútil porque, se os produtores sabem que o governo lhes vai apertar o sapato dos impostos, eles repassarão o aperto aos clientes, nos preços. O aspecto mais sério da decisão foi anunciar, com 16 meses de antecedência, que em 1.º de outubro de 2013 o governo anunciará qual vai ser o aumento do imposto.

Foi dada a partida oficial para o vício da reindexação. Ela nunca foi totalmente abandonada, mas estava mais moderada e envergonhada. Escondia-se debaixo das diversas siglas dos índices de preços: IPCA, IGPM, IPA, INPC, ICC, Selic e outras. Não havia um índice de inflação mensal que passasse a mensagem de que todo mundo podia (podia ouvido como devia) aumentar o preço de seus tomates ou microscópios eletrônicos na mesma proporção.

Aumentar impostos para desestimular o consumo é uma política, em geral, fadada ao fracasso. Os produtos valem o que as pessoas querem pagar por eles. Se o imposto for alto, mas o desejo for maior, o consumidor compra mesmo. Já baixar os impostos funciona, porque as pessoas que desejam muito sabem que terão o prazer que querem por um preço mais baixo. A escolha não será entre consumir um ou outro, mas, sim, entre como e em quanto se endividar para comprar o que se quer.

A beleza do mercado é que milhões de pessoas mandam mensagens aos produtores dizendo o que querem comprar e a que preço; e o que não querem pelo preço que produtores estão cobrando. As consequências são inequívocas: sucesso para quem vende o que as pessoas querem pelo preço que elas estão dispostas a pagar e crise ou falência para os produtores ou vendedores que não se ajustam aos desejos dos consumidores.

Quando o governo passa a bulir com essas coisas, começam os desequilíbrios. Mutretas econômicas têm consequências de longo prazo, impossíveis de antecipar ou simular, mesmo nos computadores mais sofisticados.

É claro que os produtores já vão começar a equipar seus departamentos de compras e vendas para ajustar os preços de acordo com o fiat governamental, independentemente dos custos de produção ou dos desejos dos consumidores. Foi dada, de fato, a partida para a indexação. Daqui para a frente, outros setores dirão que querem a mesma coisa para que se possam planejar melhor. Recomeçaremos a ciranda de preços e reaparecerão as maquinetas remarcadoras de etiquetas, em versão mais moderna, para acompanhar a inflação que o governo já decretou que haverá e de quanto será, da perspectiva governamental.

Os preços têm, entretanto, uma capacidade fantástica: andam sempre mais rápido do que os calculadores da inflação. Entre mortos e feridos se salvarão todos, mas as escoriações generalizadas, as fraturas e os danos mais sérios não serão contabilizados. O nome do jogo, a partir dessa decisão, passa a ser outro: vamos escorregar na manteiga, ladeira acima.

Tomara que os historiadores mais inspirados não se esqueçam de chamar os anos vindouros, de consequências previsíveis, mas inevitáveis, de política econômica amanteigada. Só que não tão gostosa quanto os biscoitos homônimos de Petrópolis.

O insensato - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 11/06


— "Não faço nada que não seja de comum acordo e determinado por ele [Lula]". (José Dirceu, sobre o mensalão, em 13/6/2005)


O insensato
Se depender de José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil de parte do primeiro governo Lula, o bicho vai pegar antes, durante e, se necessário, depois do julgamento do processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Nunca antes na história recente do país convocou-se o povo para pressionar um tribunal. Pois bem: Dirceu começou a fazê-lo.

Rapaz ousado! 
Mais certo seria chamá-lo de temerário, imprudente, perigoso, tresloucado, atrevido, insolente,afoito, demente, precipitado, desaforado, petulante, desajuizado, incauto, arrogante, desvairado, impulsivo, arrebatado, insensato – e mais o quê? Pense. E acrescente aí.

Quem se diz
 democrata respeitaa independência do poderes da República. Pode discordar de decisões da Justiça? É claro que sim. E até criticá-las com indignação. Mas ao fim e ao cabo só lhe resta acatá-las. Diga-me: que democrata de verdade insufla o povo para que constranja a Justiça a decidir como ele deseja?

De passagem
 por Brasília, em conversa com um amigo há um mês, Dirceu pareceu abatido e certo de que será condenado por ter chefiado "uma sofisticada organização criminosa" que tentou se apoderar de uma fatia do aparelho do Estado, segundo denúncia do Procurador Geral da República aceita pelo STF.

Não revelou
 ao amigo que cogitara exilar-se em Cuba ou na Venezuela. Uma vez condenado, viajaria denunciando a injustiça de que fora vítima. Arquivou a ideia. Concluiu que seria difícil convencer os ouvintes de que era um perseguido político no país governado por seu próprio partido há quase dez anos.

Mas surpreendeu
 o amigo ao revelar que os chamados “movimentos sociais” não assistiriam inertes a sua eventual condenação. Dizse informado de que reagiriam por meio de manifestações de rua. Não descartou a hipótese de que tais manifestações acabassem antecipadas. Tudo dependeria da data do julgamento.

O STF marcou
 o julgamento para agosto e setembro próximos. Na tarde do último sábado, Dirceu aproveitou no Rio o 16º Congresso Nacionalda União da Juventude Socialista (UJS), ligada ao PCdoB, e pediu aos estudantes que saiam às ruas em sua
defesa. "Será a batalha final", proclamou com ar grave.

— Todos sabem
 que este julgamento é uma batalha política. E essa batalha deve ser travada nas ruas também porque senão a
gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas. É a voz do monopólio da mídia. Eu preciso do apoio de vocês — suplicou

A Procuradoria Geral
 da República considera que há provas suficientes para condenar os 38 réus do mensalão. Com ela concordou o STF ao acolher a denúncia. São 11 os juízes. Advogados com livre trânsito no STF apostam na condenação de Dirceu por dois a três votos de diferença.

Sabe de quem
 será um dos votos pela absolvição? Está sentado? Do ministro Gilmar Mendes. Por que tanto espanto? Se fosse menos mal agradecido, o PT reverenciaria Gilmar sempre que ele fosse citado. E não valorizaria nem um pouco as suas explosões de temperamento.

Quem evitou
 a inclusão de Gushiken na lista dos mensaleiros? E garantiu a Mercadante o direito de ser candidato ao Senado? E salvou Palocci da acusação de ter quebrado o sigilo bancário de Francenildo dos Santos, testemunha de suas visitas a um reduto de amor e de negócios em Brasília? Gilmar, ora.

Dirceu sabe disso
. Como sabe que a força da mídia é declinante, a se acreditar no que apregoa Lula. Como sabe que há provas de que o mensalão existiu. A propósito, uma vez ele observou em entrevista à Folha de S. Paulo: "Eu falei para não fazer". Falou para quem? Por que não foi atendido?

— Não podemos deixar
 que esse processo se transforme no julgamento da nossa geração. Não permitam julgamentos fora dos autos — apelou Dirceu. Os réus do mensalão são de várias gerações. Os estudantes que ouviram Dirceu não são da geração dele. Em nada ajudará Dirceu a suspeita de que o STF pode julgar fora dos autos.

Página virada - DAVID KUPFER


VALOR ECONÔMICO - 11/06
A reação dos analistas econômicos ao magro crescimento alcançado pelo Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, de somente 0,2% em relação ao trimestre anterior, trouxe uma sensação de consenso com relação aos novos contornos que estão conformando o modelo macroeconômico do país. É percepção geral que as políticas de dinamização da demanda dos últimos anos cumpriram um papel essencial na construção de um quadro geral favorável, mas já não estão mais se revelando suficientes para assegurar a almejada aceleração do crescimento.
Sempre é possível argumentar que, mesmo que uma determinada política não tenha proporcionado resultados suficientemente robustos, teria sido possível obtê-los com mais do mesmo. Assim como os defensores das reformas microeconômicas dos anos 1990 tentavam justificar a baixa efetividade dessas políticas com a ideia de que teria faltado abrangência, intensidade e persistência nessas reformas, é plausível sugerir que a atual inflexão da taxa de crescimento do PIB pode ser revertida com doses mais fortes de estímulos de demanda. Contudo, nas condições atuais da economia mundial, não se pode descartar a possibilidade de que esses estímulos de demanda vazem para o setor externo, reduzindo a sua contribuição para a expansão da produção. Conclusão: é necessário colocar o foco da política econômica também no lado da oferta, que precisa ser concomitantemente dinamizada para que os objetivos de crescimento sejam alcançados. Se esse raciocínio está correto, mais cedo ou mais tarde, a economia terá que ser puxada pelos investimentos, e não mais pelo consumo. E se é assim, que seja mais cedo!

Desatar o nó do investimento implica reconhecer, inicialmente, que uma parcela importante do portfólio de projetos em pipeline, em grande parte herdados do final da década passada, está postergada ou represada. A parcela postergada relaciona-se quase sempre aos projetos ligados a recursos naturais que dependem de mercados externos para a viabilização das grandes escalas requeridas. Nesses casos, pouco ou nada se pode fazer a não ser aguardar o reaquecimento desses mercados pois nas condições pós-crise da economia internacional, esses projetos deparam-se com excedentes generalizados de capacidade mundo afora. Já a parcela represada deve-se em grande parte a problemas administrativos enfrentados na execução de obras de infraestrutura contratadas ou concedidas pelo poder público. Evidentemente, cabe ao próprio governo retirar essas amarras para que o investimento represado volte a fluir. O bônus aqui é que, além dos efeitos diretos sobre a formação de capital, essas obras, na medida em que vão entrando na fase operacional, promovem impulso adicional à oferta, já que ampliam a rentabilidade de novos projetos de seus usuários.

Tributos, energia e qualificação da mão de obra são os vilões mais citados, mas há ainda o hiato tecnológico

No entanto, o jogo decisivo não é (apenas) esse. A universalização do padrão de consumo, que motivou a dinamização da economia a partir da inclusão de camadas crescentes da população ao mercado, não pode conviver com expansão da produção a custos crescentes, como vem ocorrendo nos últimos anos, sob pena de se abortar os fundamentos do próprio ciclo de crescimento. Esse paradigma de universalização do padrão de consumo cumpre hoje um papel disciplinador dos preços que, desse ponto de vista, é análogo ao desempenhado pela abertura comercial da década de 1990. Porém, diferentemente da abertura, ainda mais quando atabalhoada tal qual a que foi praticada no Brasil, a universalização do acesso ao consumo não desincentiva o investimento, não desarticula as cadeias produtivas nem tampouco desbarata o sistema nacional de inovação. Portanto, ao contrário de trazer impactos destrutivos e de constituir uma ameaça para a indústria brasileira, pode ser fonte de grandes oportunidades para o seu pleno desenvolvimento.

No entanto, essas oportunidades dificilmente se concretizarão se a mencionada pressão de custos sobre a produção nacional não for revertida por uma firme ação política, capaz de atacar na base os seus elementos geradores. Embora tributos, energia e qualificação do trabalho sejam os vilões mais citados, há razões para se acreditar que sem uma onda de investimentos voltados para reduzir o hiato tecnológico que voltou a distanciar a atividade industrial brasileira das melhores práticas internacionais, as chances de sucesso se verão muito reduzidas. E esses investimentos não fazem parte do pipeline herdado do período pré-crise internacional.

Nesse momento, o Brasil caminha para fechar 2012 com uma taxa de juros básica real próxima a 2% anuais. Embora ainda alta relativamente a outros países, o importante é que em valor absoluto esse patamar já não impõe os custos insuportáveis de servir a dívida pública ou carregar as reservas internacionais nem os efeitos indesejáveis da atração de capital externo especulativo sobre a apreciação cambial que eram provocados pela estratégia anterior da super-Selic.

O fato é que o país parece estar macroeconomicamente mais bem preparado agora do que antes para poder novamente conciliar as políticas de estabilização e de desenvolvimento, abandonando de vez a prática esquizofrênica que perdurou nos últimos vinte anos de privilegiar o primeiro sempre em detrimento do segundo. Mas para que essa página seja definitivamente virada, além de assegurar que o retorno a um mix juros-câmbio mais civilizado seja duradouro, políticas competentes de fomento ao investimento se fazem igualmente essenciais.