domingo, agosto 21, 2011

ETHEVALDO SIQUEIRA - TV POR ASSINATURA - Um passo adiante e dois atrás

TV POR ASSINATURA - Um passo adiante e dois atrás
ETHEVALDO SIQUEIRA
REVISTA VEJA

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR



MAÍLSON DA NÓBREGA - Somos todos especuladores

Somos todos especuladores
MAÍLSON DA NÓBREGA
REVISTA VEJA

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR


ROBERTO POMPEU DE TOLEDO - Desconcertante Dilma

Desconcertante Dilma
ROBERTO POMPEU DE TOLEDO
REVISTA VEJA

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR


CLAUDIO DE MOURA CASTRO - Coitadinho, tão estressado

Coitadinho, tão estressado
CLAUDIO DE MOURA CASTRO
REVISTA VEJA

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR


YOANI SÁNCHEZ - Sob as bênçãos do arco-íris


Sob as bênçãos do arco-íris 
YOANI SÁNCHEZ 
O GLOBO - 21/08/11


A união de um gay com uma transexual desafia o machismo da ilha, é acompanhado por milhares e ofusca o aniversário de Fidel

Era sábado, 13 de agosto, aniversário de Fidel Castro, mas naquele dia Havana pulsava ao ritmo de uma comemoração muito diferente. Um casal peculiar acabava de se casar. Ela, um transexual que havia se submetido a uma cirurgia para mudar de sexo; ele, um gay soropositivo, estigmatizado por sua posição dissidente. Wendy Iriepa e Ignacio Estrada jogaram as flores do seu casamento no mar, naquele trecho do Malecón onde os velhos ficam tentando fisgar algum peixe. Justamente no aniversário de um governante que durante décadas manteve uma política homofóbica, a cidade se vestiu com as cores da diversidade.
Em um país ainda oprimido por resquícios machistas, o acontecimento confirma que a comunidade LGBT está abrindo caminho - mais pelo atrevimento dos seus membros do que por uma política de Estado que os proteja. Há quase três anos, espera-se que a Assembleia Nacional discuta a legalização da união entre pessoas do mesmo gênero, mas nem sequer conseguiu incluir o tema na pauta dos deputados do nosso passivo Parlamento.
Entretanto, apesar da lentidão do Legislativo e do preconceito da população, Wendy e Ignacio conseguiram se aproveitar das brechas judiciais, saltando também por cima do estigma social. Wendy tinha obtido uma carteira de identidade na qual estava confirmado seu sexo feminino, graças a gestões do Centro Nacional de Educação Sexual (Cenesex), dirigido por Mariela Castro, filha do presidente cubano, Raúl Castro. Wendy foi um dos primeiros transexuais de Cuba operados por uma equipe médica belga que andou trabalhando na ilha. Seu rosto era visto frequentemente em eventos oficiais sobre a comunidade LGBT de Cuba, até que cometeu o "pecado" de se apaixonar por Ignacio, um gay contestador. Ignacio foi preso ainda muito jovem, por distribuir na rua panfletos com a declaração dos direitos humanos. Da cadeia, saiu com o HIV e uma visão mais dramática do país onde vivia. Quando os dois se conheceram, em maio, pareciam habitar mundos distantes que jamais poderiam aproximar-se.
De nada serviram as advertências que Mariela Castro fez à protegida sobre a relação amorosa que nascia. Um dia, no Cenesex,disseram a Wendy que ela já não era confiável, por ter um amante "contrarrevolucionário". Foi informada de que o único emprego que poderiam lhe oferecer era o de limpadora de chão. Wendy abandonou a comunidade, deixando para trás anos de trabalho numa instituição que se apresenta como promotora da tolerância. Ignacio a recebeu com a ternura de quem já passou por mil e uma exclusões. No dia seguinte marcaram a data do casamento, que coincidia com o aniversário do Comandante em Chefe. "Queremos presentear com a diversidade alguém que nunca soube aceitá-la", disseram, quando jornalistas e amigos quiseram saber por que haviam escolhido o 13 de agosto. Em suas declarações, eles destacaram também que, há apenas alguns meses, Fidel Castro reconheceu sua responsabilidade na criação das chamadas Unidades Militares de Ajuda à Produção (Umap), campos de trabalho forçado onde ficaram presos, do fim de 1964 até o início de 1967, testemunhas de Jeová, religiosos, homossexuais e pessoas com "desvios" ideológicos. Esse foi um dos capítulos mais sombrios da nossa história nas últimas cinco décadas e se constituiu também em motivo para a comunidade LGBT da ilha exigir reconhecimento. Apesar do mea-culpa de Fidel, o certo é que a imprensa oficial não abriu um debate sobre esse tema com a profundidade e a visão crítica necessárias.
Apesar dos limitados avanços conseguidos, não se pode negar que nos últimos anos houve algum progresso no que se refere à aceitação das preferências sexuais. Os motivos dessa flexibilização são vários. Um deles é que a abertura de Cuba ao turismo internacional permitiu a chegada à ilha de uma mentalidade mais moderna, mais desinibida, menos intolerante. O trabalho do Cenesex contribuiu também para pôr o tema no epicentro das discussões, mas, lamentavelmente, a instituição tem limites ideológicos muito rígidos. O discurso de Mariela Castro pedindo a aceitação da diversidade torna-se excludente quando se trata de matizes políticos. Enquanto os cubanos não puderem sair de todos os armários nos quais fomos confinados por culpa do fanatismo partidário, será muito difícil que a reivindicação de direitos por uma minoria consiga triunfar. Por exemplo, o Código Penal continua considerando ilegal a livre associação e a livre expressão, o que impede que grupos de gays, lésbicas, bissexuais e transexuais fundem a própria organização e convoquem uma manifestação pelas ruas do país. Por enquanto, terão de esperar que o poder governamental os oriente quanto ao que fazer ou lançar-se à clandestinidade de uma organização independente. Apesar desses obstáculos, no dia 28 de junho - dia do orgulho gay em todo o mundo - um reduzido grupo de ativistas LGBT conseguiu organizar uma passeata numa avenida central da capital. Cercados de todos os lados por membros da Segurança do Estado, e diante do olhar atônito dos cidadãos que passavam, eles estabeleceram um precedente que, esperamos, possa ir crescendo nos próximos anos.
Moinhos de vento. Já vão longe os tempos em que a polícia reprimia a cassetete os gays que se reuniam nas esquinas mais centrais de Havana e no Malecón. Mas a discriminação contra eles não cessou. Agora é menos evidente, com menos teatralidade, mas as denúncias de maus-tratos continuam chegando. Por isso foi criado um Observatório de Direitos LGBT, dirigido por Leannes Imbert, que procura reunir e levar perante os tribunais os abusos. Com poucos recursos e com a má vontade do próprio Cenesex, o grupo recém-criado tem um difícil caminho pela frente. Aliás, muitas das próprias vítimas da exclusão evitam aproximar-se desse observatório alternativo com medo de que, ao revelar seu caso, o castigo institucional seja ainda maior. Cautela, ceticismo e temor continuam sendo sentimentos inerentes a uma comunidade que tem sofrido demais. Daí a importância simbólica do casamento de Wendy e Ignacio, que enfrentaram verdadeiros moinhos de vento para chegar diante o registro no qual firmaram a união. Sua vitória em 13 de agosto foi interpretada por muitos como "um grande passo numa ilha pequena". Embora a imprensa oficial não tenha se manifestado, milhares de cubanos acompanharam os pormenores das bodas graças a antenas parabólicas ilegais e rádios de ondas curtas proibidos. Foi surpreendente ver como a notícia se espalhou com tamanha velocidade, e como as pessoas nas ruas reconheciam os rostos do casal.
Centenas de pessoas também rodearam o cartório de registro civil do bairro La Víbora, onde os noivos legalizaram sua união, numa tarde chuvosa que muitos interpretaram como sinal de sorte. Quando chegaram à festa de casamento, em torno deles havia mais expectativa popular e de jornalistas do que a levantada pelos 85 anos do outrora Líder Máximo. Apesar dos temores, tudo correu bem. Não houve nenhum grito de discriminação, nenhum insulto, ninguém os denegriu com esses termos homofóbicos que ouvimos todos os dias. Das sacadas, as pessoas atiraram punhados de arroz, sinal de boa sorte, e a escadaria para chegar ao salão do tabelião ficou cheia de convidados. Nem a polícia política ousou intervir violentamente, embora fosse evidente sua presença em toda parte. Moradores da região corriam, curiosos, ao lado do carro que levou a noiva e disparavam os flashes das suas câmeras, enquanto ela erguia uma bandeira com listas de sete cores.
Terminada a cerimônia, Wendy e Ignacio percorreram a cidade num conversível, com a mesma bandeira gay batendo sobre seus ombros. Ao chegar à baía, jogaram na água o buquê que pouco antes ela carregava no colo. "Por todos os homossexuais que morreram no mar fugindo desta ilha", disseram. E em frente daquelas fortalezas militares de uma virilidade antiquada, eles se beijaram.

/ TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

BARBARA GANCIA - Prateleiras em extinção

Prateleiras em extinção
BARBARA GANCIA 
FOLHA DE SP - 21/08/11

Era só o que faltava. Vem esse espertinho do Steve Jobs querer bagunçar o coreto bem no meio do "meu processo". Justo agora que a tia Sukita aqui está começando a entender a diferença entre upload e download chega esse pilhador do salário alheio e detona a bomba.

Por que eu decidiria guardar tudo o que é meu no seu armazém, sr. Jobs? Quem disse que uma consumista ao meu molde e feitio será capaz de abrir mão de seus quindins?

Não sabe que tenho xodó pelo meu CD com capinha metálica do Jacques Lu Cont ou que a vida não pode ser vivida em glória sem a companhia do DVD "Easy Rider-Special Edition", que acompanha livrete com fotos?

De onde o maluco da Apple tirou a ideia de que vou guardar os meus documentos, as fotos, os livros, enfim, meu mundinho idealizado do Zé Rodrix, numa nuvem que ele chama de iCloud (ai, Cláudio!) em algum canto virtual que alugarei no éter como se fosse vaga de estacionamento da Estapar?

Não sei se o nobre leitor percebeu o cenário que nos espera. Não bastasse dedicar a quase totalidade de minhas entradas mensais à compra de músicas e aplicativos, agora torrarei até o último centavo em giga ou google (ou jegue?), lá em uma dimensão que é manifesta, mas não táctil.

Minha mais recente despesa no iTunes foi uma trena digital, a "Easy Measure", que tem ajudado horrores na reforma da casa nova. Você aponta o telefone para o objeto e surge no visor uma régua com marcação. Certas coisas facilitam a vida, ainda que uma reforma seja uma reforma, seja uma reforma (Gertrude Stein), empreitada que mistura as emoções de um ataque terrorista com as de ser destroçado por um mandril faminto enquanto um tsunami destrói tudo.

E isso porque ainda não chegamos aos acabamentos. Aí você pode incluir no pacote a sensação de afogamento por enchente ao mesmo tempo em que é devorado por piranhas. Note que ainda tenho mais três meses (numa previsão otimista) até o fim da obra.

Nos últimos dias, estivemos às voltas com a estante da sala, um trabalho que eu compararia em dimensão a Angkor Wat, com prateleiras que ocuparão toda a parede da sala.

Ali eu planejava colocar livros e CDs, álbuns, a aparelhagem de som com woofer, subwoofer, tweeter e equalizador, meus dicionários de línguas, sinônimos, etimologia, expressões idiomáticas, o "Roget's Thesaurus", a "Encyclopedia Britannica", a "Barsa" e a italiana "Enciclopedia Treccani", tudo da maneira mais espartana possível para ir acomodando os livros que virão pela frente.

Mas daí chega a notícia de que, a partir de novembro, o hardware não só será externo como virtual. Muito bem. Já percebi que serei obrigada a operar algumas mudanças. E que não necessariamente devo começar por woofer, subwoofer e equalizador.

Pois então. Se nos próximos dias você vir um saco boiando no Tietê com uma pilha de dicionários colhidos pelo ácaro, CDs de caixinha rachada, DVDs de seriados que nunca mais serão vistos, mais um monte de fitas VHS e até uns floppy discs jogados no meio do embrulho, juro que não fui eu que atirei no rio.

CAETANO VELOSO - Entretenimento


 Entretenimento
CAETANO VELOSO
O GLOBO - 21/08/11

O filme do americano Malick é tão europeu em seu desprezo pelo aspecto entretenimento quanto um Resnais ou um Godard


Parece que não sei ver filmes. Sempre temo estar desatento para os detalhes cruciais que definem a trama. E isso acontece com frequência considerável. Mesmo assim fui crítico de cinema aos 18 anos. E agora me chamaram para ser diretor convidado do festival de Telluride, um evento de pura cinefilia. Não entendo direito os filmes. E mesmo de filmes que adoro se apagam dados do enredo. Gravo melhor os climas poéticos ou plásticos do que os fatos narrados. Qualquer amigo meu rirá ao ler isto aqui. É que tenho fama de ser um grande contador de filmes — alguns chegando a dizer que filmes são melhores contados por mim do que vistos. O que eles não sabem é que contar um filme em voz alta é um meio de eu tentar me ensinar algo sobre o que foi narrado pelas imagens. É parte do processo de percepção: narro sobretudo para mim mesmo. Por isso tudo foi um experimento e tanto assistir a “A árvore da vida”, com um amigo com quem pouco falei, e, no dia seguinte, ir sozinho ver “Melancolia”.

Eu tinha lido os artigos de Francisco Bosco e de Contardo Calligaris — e tinha gostado muito. Ambos reverberam o Nietzsche que me encantava no tempo em que Jorge Mautner era um neopagão em tudo oposto ao seguidor de Jesus de Nazareth que ele é hoje (embora fosse tão unicamente Mautner então quanto agora). Gosto de “Cinzas no paraíso”, de Malick, e detesto os filmes de Lars von Trier que vi. Mas gostei mais de “Melancolia” do que de “Árvore”. Na verdade, comecei por achar, vendo os trailers de ambos, que os dois filmes eram o mesmo. E ainda agora, tendo visto os dois por inteiro, me pergunto se não são ambos tão aparentados por serem sintomáticos do tempo que vivemos. São filmes bem diferentes, me entendam.
Quase opostos. O do americano Malick é tão europeu em seu desprezo pelo aspect entretenimento quanto um Resnais ou um Godard. Já Trier, europeu de fato, exibe o quanto aprendeu com Hollywood sobre suspense e diversão. Do “dogma” só restaram alguns jump-cuts.

Enquanto “ A árvore da vida” faz tudo para parecer “arte” mas chega a Discovery Channel e “Nosso lar”, “Melancolia” tem pedigree do mundo culto e fica à vontade para usar um subwoofer de “Transformers”
como som da presença do planeta matador.

Por que eu gostei? Bem, em primeiro lugar, Kirsten Dunst é e está irresistivelmente sexy — e é ótima atriz. E já que o filme é perfeito como entretenimento, me liguei logo na Dunst como em qualquer heroína. E, como eu não gosto de casamento, achei a Justine dela hiperlegal em seu desprezo sorridente e sincero pelos ritos. Essa menina com cara de estudante americana (e que já foi Maria Antonieta) foi escolhida por Trier para fazer uma depressiva que perdeu o medo de tudo (entendo bem isso: tive um episódio estranho de depressão há uns 14 anos e ao sair dele perdera o medo de avião que tinha tido a vida toda). Apesar do diagnóstico de Calligaris, tive raiva da mãe encarnada por Charlotte Rampling. Eu não queria que nada atrapalhasse algum prazer que aquele casalzinho pudesse ter. A cena de sexo com vestido de noiva me pareceu legitimar toda a celebração. A sequência inicial, com o jovem casal resolvendo a passagem de uma quilométrica limusine branca por uma estradinha de terra tortuosa, é extraordinariamente bem-feita e nos prende aos personagens de modo direto. Há suspense todo o tempo: as reações do cunhado, a irreverência do pai, as preocupações da irmã.

Aos poucos, os problemas anunciados pelo zelo desta vão se revelando. E Justine, que começara apresentando o noivo ao seu cavalo favorito, termina por dizer ao seu chefe da agência de publicidade que ele vale menos do que nada. Não pude deixar de ver Lars matando o espectador burguês sentado ao seu lado no curta de “Chacun son cinéma”. Nem de adivinhar que ela comeria o rapaz que lhe é apresentado pelo chefe como novo contratado da agência. É um típico filme de casamento em que os podres da vida burguesa fatalmente vão aparecer. Me contam que o “dogma” tem um exemplar paradigmático no seu DNA. Trier não fez por menos. Há uma fúria anticapitalista que não me agrada: faz pensar que a piada sobre Hitler tem mais a ver com o filme do que querem nos fazer crer. Quando Claire, a irmã que tem por que ter medo, tenta se agarrar aos restos de convenções para não admitir a morte do filho, Justine se mostra ácida quanto aos planos da irmã (tomar um vinho, sentar no terraço...). “Podemos pôr a Nona de Beethoven”, ela diz,
zombando . E quando a irmã concorda, ela a informa de que a ideia é uma merda (mas Trier põe aqueles clichês de Wagner). Em vez disso, ela fala diretamente com a criança e propõe uma proteção (que ele não sabe que é ilusória) contra a colisão do planeta com a Terra.

Pra mim, que amava ler Nietzsche contando o que disse Sileno (que a melhor coisa para o homem é inalcançável: não ter nascido), Justine, sábia por desprezar tudo, ofereceu ao menino, mas só a ele, a consolação equivalente à arte, aquela que não paga tributo à verdade (como quer o jovem Bosco).

Sinto é não estar no filme de Isa Ferraz sobre Marighella. Gosto de ler Gaspari saudando o gesto de Pedro Simon. É isso aí. Sardenberg explicando o texto de Roubini a que me referi na semana passada é instrutivo. Gosto mais de Mangabeira porque ele não é apocalíptico. Essas fantasias de fim de mundo que estão por trás dos filmes — e das nossas cabeças — não o desviam do sentido da tarefa.

ILIMAR FRANCO - A cartada do Rio


 A cartada do Rio 
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 21/08/11

O governador Sérgio Cabral apresentou nova proposta para a presidente Dilma sobre a divisão dos royalties do petróleo, quinta-feira, em São Paulo. A presidente disse que pediria à ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e ao secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, para fazerem projeções para calcular as perdas da União. Concebida pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ), ela valeria para os campos não explorados.

Dornelles: ‘União precisa ter grandeza’
No modelo atual, de concessão da exploração do petróleo, a União e os estados produtores têm uma receita de cerca de R$ 11, 6 bilhões a título de Participação Especial. Como essa fonte de receita acaba no regime de partilha, a parcela que ficava com os estados produtores irá para os cofres da União. Pela proposta de Dornelles, os R$ 5,8 bilhões que os produtores vão perder seriam divididos entre os estados não produtores. O senador sustenta que no regime de partilha a receita da União sofre grande incremento e, por isso, acredita que ela terá gordura para aumentar um pouco mais a fatia dos não produtores.

"O custo social da terra tem que ser compartilhado com o governo, não pode ser só do produtor” — Eduardo Braga, senador (PMDB-AM), ao defender incentivo fiscal para manter a reserva legal

COQUELUCHE. Os adversários vão ficar irritados. Pré-candidata à prefeitura de Porto Alegre, a deputada Manuela D‘Ávila (PCdoBRS)
gravou vídeos de exaltação para exibir em sua festa de aniversário. Na telinha: ministros Alexandre Padilha, José Eduardo Cardozo e Mendes Ribeiro; senadores Eduardo Suplicy (PT-SP), Lindbergh Farias (PT-RJ), Aécio Neves (PSDB-MG) e Ana Amélia (PP-RS); o deputado Gabriel Chalita (PMDB-SP) e o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS).

Reviravolta
Pessoas próximas a Marina Silva, como o senador Alfredo Sirkis (PV-RJ), ainda têm esperança de uma mudança radical no PV que possibilite sua volta ao partido. Os verdes não têm outro nome para disputar a Presidência em 2014.

Guerra do Paraguai
O senador Roberto Requião (PMDB-PR), com sua mania da fazer piadas, quase causou um incidente diplomático em reunião recente com o Paraguai, quando, de brincadeira, fez um discurso defendendo a anexação do país vizinho.

O ‘abençoado’ Rui Falcão
Ao deixar, um dia desses, o gabinete da presidente Dilma, o presidente do PT, Rui Falcão, levou um tapinha nas costas do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. O afago veio acompanhado da observação: “Você (Rui) é um cara abençoado. A presidente Dilma já te recebeu mais vezes, nesses oito meses de governo, do que todos os presidentes do PT juntos, durante os oito
anos de mandato do ex-presidente Lula”.

Lugar ao sol

Todos os partidos aliados que se reuniram com a presidente Dilma, na semana passada, defenderam a reintegração do PR. Como ele
não voltará a comandar o Dnit e a Valec, sugerem que outros postos importantes sejam oferecidos.

Padrinhos

O Planalto está indicando aos deputados de primeiro mandato, da base aliada, emendas individuais cujos recursos serão liberados. O governo quer que eles assumam nas suas bases a paternidade de emendas que são de não reeleitos.

 PSD. A ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) comemora: “Não há um gesto como esse nos Estados Unidos, a favor da Angela Merkel ou do Nicolas Sarkozy. O PSD veio dizer que vai apoiar todas as medidas para blindar o país contra a crise”.
 A EMBAIXATRIZ Lúcia Flecha de Lima está lotada, como assessora especial, no gabinete do senador Fernando Collor (PTB-AL), trabalhando na organização da conferência Rio+20.
● A ASSESSORIA da senadora Marta Suplicy informa que o encontro com o ex-presidente Lula será amanhã e que ela permanece pré-candidata.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA


Apertem o cinto
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SP - 21/08/11 

Ainda sob o impacto da dieta magra a que foram submetidos no Orçamento deste ano, ministros começam a receber do Planalto, algo incrédulos, sinais de que o enxugamento será ainda maior na peça de 2012. Pastas já lipoaspiradas poderão ver seus recursos reduzidos em torno de 10%. Do facão seriam preservadas apenas prioridades como as obras da Copa, do PAC e do Minha Casa, Minha Vida.
Os cortes na largada do governo geraram dor de cabeça política para Dilma Rousseff. Com crise internacional e tudo, a expectativa de ministros e congressistas para o ano eleitoral era oposta à que se desenha.

Marcado Cresce no PMDB o bloco dos defensores de um pedido de demissão de Pedro Novais, antes que as denúncias o obriguem a fazê-lo. A blindagem ao ministro do Turismo não é a mesma que tentou manter Wagner Rossi na Agricultura. O escasso apoio a Novais reflete a divisão do partido. Ele é patrocinado pelo líder Henrique Alves (RN), ora sob ataque especulativo de metade da bancada da Câmara.

Alvorada Mensagem matinal postada no Twitter: "Bom dia pra você que está mais derrubado do que ministro da Dilma!".

Emergência 1 Em linha direta com o comando estadual e nacional, o PT de Campinas recorreu ao PMDB e ao PSB para pavimentar a governabilidade de Demétrio Vilagra, que será empossado prefeito na terça, em substituição ao cassado Dr. Hélio (PDT). Petistas acreditam que, com as duas siglas, será possível vencer a articulação oposicionista para destituir o vice, também investigado no caso da Sanasa.

Emergência 2 Ontem, a preocupação dos petistas da gestão municipal era a garantia dos serviços essenciais, especialmente saúde e defesa civil (a cidade foi atingida por um temporal), no período de três dias em que a prefeitura ficará vaga.

Quem quer... De volta à lista de possíveis candidatos do PSDB à prefeitura paulistana, Aloysio Nunes continua a repetir que seu lugar é o Senado. Em privado, porém, discute o cenário e relativiza o potencial de Fernando Haddad (PT), adversário mais temido por outros tucanos no páreo. Para Aloysio, o ministro, além de desconhecido do eleitor, teria dificuldade em explicar os reveses de sua gestão na Educação.

...o quê O maior incentivador da opção Aloysio é José Serra, que vê no senador a única chance (excetuada sua própria candidatura) de amarrar no mesmo barco Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab (PSD). Alckmin tem outros planos, mas aceita discutir a hipótese. Kassab é o mais refratário. A despeito da boa relação com Aloysio, o prefeito está em outra.

Milésimo As sedes da Copa-2014 preparam megaeventos para celebrar, em 16 de setembro, a marca dos mil dias para o início da competição. Em Belo Horizonte, a data coincide com a micareta "UaiFolia". Salvador e Rio organizarão shows e queimas de fogos, com ruas ornamentadas e relógios gigantes exibindo a contagem regressiva. São Paulo também estuda programação festiva.

Romaria 
O governo paulista patrocinará circuito de trilhas a pé. A primeira será a de José de Anchieta, que dura sete dias e percorre Peruíbe, Bertioga e Ubatuba. As caminhadas serão monitoradas via internet -cada participante usará pulseira rastreável. As rotas dos bandeirantes Borba Gato e Fernão Dias serão contempladas na segunda fase.

Com LETÍCIA SANDER e FÁBIO ZAMBELI

tiroteio

"Ao rasgar tanta seda para os antecessores, os novos ministros indicam que não rasgarão os véus das malfeitorias. Em vez de faxina, panos quentes!"
DO DEPUTADO CHICO ALENCAR (PSOL-RJ) sobre Mendes Ribeiro, que minimizou as denúncias responsáveis pela demissão de Wagner Rossi da Agricultura.

contraponto

Lição número um

Em conversa de Dilma com representantes de partidos aliados na terça, o governador Eduardo Campos contou que, no início da gestão Lula, o PSB se sentia um peixe fora d'água no Congresso, acostumado que estava a ser oposição. O então deputado foi se aconselhar com o veterano Delfim Netto, que lhe explicou:
-Olha, vocês agora são da base do governo. Então é o seguinte: ocupem os corredores das comissões e não deixem aqueles deputados votarem nada! Porque deputado, se puder, quebra o Brasil num dia só...
Os presentes, Dilma incluída, caíram na gargalhada.

MARTHA MEDEIROS - E um dia você envelheceu

E um dia você envelheceu 
MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA - 21/08/11

Em que momento você se dá conta de que está mais perto do fim do que do começo? Se esta crônica fosse um teste de revista, poderia ajudá-lo a descobrir se está mesmo ficando velho. Basta que tenha dito as seguintes frases com alguma assiduidade nos últimos meses:

a) Não enxergo mais nada sem meus óculos.

b) Como é mesmo o nome daquele programa de tevê de que a gente gostava?

c) Eu jurei que tinha deixado a chave do carro aqui.

d) Vai ter lugar pra sentar?

e) Não tenho mais paciência para ler autores novos, agora só me dedico aos clássicos.

f) Nunca ouvi falar dessa banda. Dessa outra também não.

g) Com essa chuva, prefiro ficar em casa.

h) Com esse calor, prefiro ficar em casa.

i) Quem viu um, viu todos.

j) Dois cálices agora é o meu limite.

k) Tem escada rolante?

l) Com essa noite linda e estrelada, prefiro ficar em casa.

Você se reconhece em pelo menos metade dessas afirmações? Pegue sua bengala, coloque seu aparelho de surdez e ouça: bem-vindo ao clube. Eu disse BEM-VINDO AO CLUBE! Pois é. Ao Clube dos Matusaléns que não parecem ter mais do que 40 anos, mas é só aparência, por dentro a alma já está andando de graça nos ônibus e frequentando fila especial no banco.

Na verdade, os esquecimentos e a preguiça nunca abalaram a minha autoestima. Troco o nome das pessoas desde que me conheço por gente e nunca fui de noitada, ficar em casa já era meu programa preferido aos 17 anos.

Ainda assim, tenho a cara de pau de dizer que mantenho o espírito cada vez mais renovado. Só me sinto meio caquética quando, ao ler uma entrevista de um cineasta famoso, ou de um empresário famoso, ou de qualquer pessoa famosa, descubro o ano em que eles nasceram: 1978. 1981. 1989. O quê?? Só pode ser erro de revisão.

Em 1978 eu estava me preparando para o vestibular, em 1981 eu já ganhava salário, em 1989 eu tinha três livros publicados, enquanto que os notáveis de hoje estavam em um berçário fazendo gugu-dadá. E agora eles são capas de revista, profissionais respeitados, com família constituída e investindo em plano de aposentadoria. São adultos realizados que nasceram quando eu já era adulta. Humm. Então eu sou o que hoje?

A idade pesa quando descubro que quem nasceu bem depois de mim já está se queixando dos cabelos brancos. Só não me sinto totalmente humilhada porque quem estiver nascendo neste 21 de agosto logo vai estar dando entrevista e os fazendo enfrentar o mesmo estupor.

Como assim, nascido em 2011 e já presidente de empresa? Ninguém escapa desse susto.

TUTTY VASQUES - O famoso "quem"?



O famoso "quem"?
TUTTY VASQUES
O ESTADÃO - 21/08/11


Seja lá o que Wagner Rossi quis dizer em sua carta de demissão com "aos amigos tudo, menos a honra", esquece, vai! Daqui a pouco ninguém lembrará sequer que foi ele o tal ministro da Dilma que achava muito natural pegar carona em jatinho de empresa contratada por sua pasta. Quase sempre é assim: os 15 minutos de fama da maioria dos ministros são os piores de sua vida. De muitos deles, inclusive, você só ouve falar quando caem.

O Rossi, pelo menos, foi apresentado ao Brasil que só conhece Brasília pelo Jornal Nacional com umas duas semanas de antecedência. Hoje, todo brasileiro razoavelmente informado sabe que ele é filiado ao PMDB, apadrinhado de Michel Temer, desafeto do Jucazinho, pai de um filho chamado Baleia, e basta! Não há mais tempo a perder com o demitido, especialmente se você não faz a menor ideia de quem seja o novo ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro Filho - Mendezinho, para os íntimos.

Bobagem correr pro Google ou recorrer a um amigo gaúcho eleitor do deputado que virou ministro. Por melhor que sejam os currículos, ministros só se revelam no cargo. Quando menos se espera, surge no noticiário um sujeito que ninguém imaginava. Às vezes, nem o próprio se reconhece - parece que, quanto mais de perto, menos normal.

Será que um dia vamos sentir saudade do tempo em que Mendes Ribeiro era o "famoso quem" que chegava ao primeiro escalão? Lembra o Alfredo Nascimento? O ex-ministro dos Transportes nunca foi santo, mas nada se compara à reputação que o notabilizou em seus últimos dias no governo.

Cá pra nós, sinto uma certa nostalgia da época em que nunca tinha ouvido falar do Pedro Novais, que segue aproveitando seus 15 minutos de má fama no Ministério do Turismo. Tomara que passe rápido, né?





Cara a cara

Nicolas Sarkozy saiu de reunião com Angela Merkel em Paris achando que a coisa está feia.

A chanceler alemã, por sua vez, deixou o encontro achando que o problema não é tão grande assim.

Os dois estão, à primeira vista, absolutamente corretos na observação mútua.

Incansável

Quando a gente pensa que o Aloizio Mercadante vai, enfim, dar um tempo, vem ele com a ideia de mudar o nome do Ministério da Ciência e Tecnologia para Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Pode?

Quase louro

O pessoal que trabalha com Mario Sergio Conti na revista Piauí finge que não repara nada diferente no chefe, mas só se fala disso pelos cantos da redação: o jornalista está clareando gradativamente o cabelo para substituir Marilia Gabriela no programa Roda Viva, da TV Cultura.

Mundinho

O estilista John Galliano não está sozinho quando diz que "amava Hitler". Biografia lançada dia desses nos

EUA tenta provar que Coco Chanel foi agente secreta nazista durante
a 2ª Guerra. Pode ser uma tendência do mundo fashion.

Questão de ordem

Para suceder a Ricardo Teixeira na CBF depois que deixar a presidência do Corinthians - desejo que de vez em quando deixa escapar -, Andrés Sanchez precisa antes entrar para a família. Aquela neta do Havelange
é casada, tem filhos?

Eu, hein!

Não dá para entender por que o ex-ministro da Agricultura, Wagner Rossi, foi pegar carona logo no jatinho de uma empresa de agronegócio credenciada em sua pasta. Por que não pediu o avião do Eike Batista, caramba?! Ele empresta seu jatinho com o maior prazer quando o Sérgio Cabral pede.

Espanadinha

O perigo da tal "faxina contra a miséria" anunciada por Dilma Rousseff é, na pressa, varrer os pobres pra baixo do tapete.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Dedicação exclusiva a 2014



Dedicação exclusiva a 2014
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 21/08/11

Fazendo política 24 horas por dia, segundo suas próprias palavras, o ex-presidente Lula da Silva esteve na última quarta-feira em Belo Horizonte para um almoço com lideranças petistas onde, mais uma vez, deixou claro - não expressamente por palavras, mas pelas mesmas óbvias conclusões a que levam sempre texto e contexto de suas declarações - que é candidatíssimo à Presidência da República em 2014. Com seu habitual verbo solto, o chefão do PT classificou de "imbecilidade" as especulações sobre sucessão presidencial mais de três anos antes do pleito. E insistiu no chavão ardiloso: "Em 2014, eu não sei da oposição, mas o governo, o Brasil, já têm candidato, que é a Dilma Rousseff. Eu vou dizer pela última vez: a Dilma só não será candidata se ela não quiser".

Mandam as conveniências que Lula fique repetindo o chavão - e pouco se lhe dá se as pessoas acreditem ou não. Afinal, uma eventual candidatura de Dilma a um segundo mandato está, pelo menos por enquanto, muito longe de depender da vontade dela. E, apesar de todo o jogo de cena, é de uma clareza cristalina que a lógica do pragmático e ambicioso "Lula 24 horas" aponta na direção de sua recondução ao Palácio do Planalto a partir de 2015, para, quem sabe, mais oito anos de proezas nunca antes vistas na história deste país. E - dado fundamental - esta é também a lógica do PT&Associados, cujo projeto de desfrute do poder por longo prazo não permitirá arriscar com quem quer que seja numa eleição que, ao que tudo parece indicar hoje, seriam favas contadas para Lula. Em se tratando de política, tudo pode acontecer até o momento da definição da candidatura governista. Até mesmo Dilma conquistar uma popularidade que torne sua própria candidatura, além de natural, inevitável. Mas não é para isso que Lula está trabalhando.

Como explicar, por exemplo, a declaração do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, de que a candidatura do PT em 2014 será definida "em conversa entre Lula e a presidente Dilma Rousseff"? Quer dizer que até para um ministro do atual governo a candidatura da presidente à reeleição não é ponto pacífico? Com que propósito um político experiente como Paulo Bernardo teria fugido da declaração protocolar que dele se podia esperar para acenar com a possibilidade de Dilma não ser candidata outra vez? Interpelado em Belo Horizonte sobre essa declaração de Bernardo, Lula saiu pela tangente, partindo para o ataque a um de seus alvos preferenciais, que até então não tinha entrado na conversa: "Primeiro, é inaceitável um tucano como o Serra dizer que sou candidato em 2014". Depois, passou a elogiar Dilma, "que vai fazer um governo extraordinário" e "só não será candidata se não quiser".

Foi lá que disse que falar de sucessão agora, mais de três anos antes da eleição, é "imbecilidade", no que está absolutamente certo. Para qualquer cidadão comum, que não é político profissional, de fato é. Mas não para o ex-presidente, que jamais desceu do palanque, antes ou depois de ter sido eleito em 2002. Instalado no Palácio do Planalto, uma de suas primeiras providências foi transformar o projeto de campanha Fome Zero em Bolsa-Família, politizando e tornando a iniciativa muito mais eficiente em termos eleitorais, com a inclusão das prefeituras no processo de distribuição dos recursos aos necessitados, o que acabou lhe custando o afastamento de conhecidos colaboradores mais idealistas. Mas, na ocasião, o então ministro José Dirceu teria dito que o Bolsa-Família traria "milhões de votos" que garantiriam a reeleição de Lula, segundo testemunho do ex-fundador do PT Hélio Bicudo prestado à TV Estadão no ano passado. Foi um lance decisivo que permitiu a Lula superar, em 2005, os percalços do "mensalão" e reeleger-se um ano depois. Ainda na primeira metade de seu segundo mandato, em janeiro de 2007, quando lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Lula colocou sua então ministra-chefe da Casa Civil à frente da iniciativa, com a clara intenção de prepará-la como candidata a sua própria sucessão quase quatro anos depois.

Agora, a pouco mais de três anos do próximo pleito presidencial, Lula não quer nem ouvir falar, em público, das eleições de 2014. Por enquanto, é trabalhar nos bastidores, 24 horas por dia.

CELSO LAFER - Percepções do Brasil no mundo



Percepções do Brasil no mundo
CELSO LAFER
O Estado de S.Paulo - 21/08/11

"Política é nuvem, vai tomando novas formas." "Tão importante quanto o fato são as versões que assume." Essas frases apontam para o fato de que a palavra política designa ao mesmo tempo a realidade e a consciência que dela tomamos. Por isso, a percepção da realidade faz parte da própria realidade e o jogo da vida pública transita pela interação dos acontecimentos com múltiplos significados que lhes atribuímos ao conhecê-los.

Essa interação caracteriza as sociedades contemporâneas, que, por serem voltadas para o futuro, vivem impregnadas pela noção de risco, com as suas dimensões de probabilidade e incerteza. Por essa razão, hoje em dia as expectativas têm, num mundo interdependente, um papel decisivo, tanto na vida econômica quanto na política.

As agências de rating de crédito dos países impactam, positiva ou negativamente, as economias porque sinalizam expectativas dos riscos futuros da sua sustentabilidade. Também na vida política as percepções sobre a qualidade ou imperícia das lideranças no trato dos problemas, os méritos ou deméritos das instituições, a natureza dos conflitos vão tecendo os cenários de expectativas que cercam a dinâmica de funcionamento de um sistema político. Na elaboração das percepções políticas e econômicas atuam os meios de comunicação, as redes sociais e a instância dos analistas qualificados.

O mesmo ocorre na apreciação dos ativos e passivos de um país no plano internacional, a partir de duas vertentes de estimativa. A primeira diz respeito à configuração da ordem mundial. A segunda resulta das características do seu desenvolvimento interno. Um bom exemplo da dinâmica desse processo de ponderação das expectativas é o contraste entre a avaliação feita em fevereiro de 2001 por um grupo de trabalho do Council on Foreign Relations, coordenado por Kenneth Maxwell, e o recém-publicado relatório elaborado pelo grupo de trabalho conduzido por Julia Zweig. Ambos analisam o papel do Brasil no mundo e as relações entre o nosso país e os Estados Unidos, e provêm de uma reputada instituição norte-americana dedicada ao entendimento do mundo e das opções da política externa dos EUA. Os dois relatórios têm, para nós, o mérito de articular o significado da percepção do Outro, que é tão importante para a condução da política externa num mundo globalizado.

O relatório de 2001 é sucinto, em contraste com o de 2011, que é muito mais abrangente e analítico. O de 2001 foi elaborado numa época de primazia dos EUA no mundo. O de 2011 leva em conta que os EUA precisam adaptar-se às novas realidades de uma ordem multipolar. O relatório de 2001 tem como pano de fundo as crises financeiras da década de 1990, que afetaram o Brasil. Reconhece avanços positivos no plano interno e identifica o Brasil como um ator de inquestionável peso regional com interesses gerais no funcionamento do sistema internacional. O relatório de 2011 tem como horizonte a positiva maneira como o nosso país lidou com a crise financeira de 2008 e reconhece que o Brasil alcançou um novo patamar de presença no mundo multipolar da atualidade, tanto como ator global quanto como motor do crescimento da América do Sul. Daí, para os EUA e os países latino-americanos, a importância de ajustarem suas percepções ao significado da ascensão brasileira no mundo. Nesse contexto, o relatório recomenda ao governo norte-americano endossar o pleito brasileiro de um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU. No trato das relações Brasil-EUA, explora o espaço das convergências e lida, com sensibilidade diplomática, com as diferenças de perspectivas e interesses.

O relatório destaca o cumulativo impacto positivo dos últimos 16 anos, proveniente das Presidências FHC e Lula, realçando o significado da consolidação democrática, dos méritos das políticas econômicas que levaram ao controle da inflação e das políticas sociais de inclusão que propiciaram o declínio das desigualdades de renda e a emergência de uma nova classe média.

O relatório de 2011 aponta para os avanços positivos dos ativos brasileiros relevantes para a presença do nosso país no mundo (agricultura, mineração, energia, meio ambiente, etc.) e também indica a agenda de desafios para o futuro da sua sustentabilidade. Entre eles, o da melhoria da educação, o do necessário aprofundamento do que está sendo feito no campo da pesquisa e da inovação, da superação do significativo déficit de infraestrutura, que compromete a logística e a competitividade do País.

A temática da sustentabilidade do novo patamar da presença do Brasil no mundo comporta, como é natural, outras facetas internas e externas que não foram circunstanciadamente examinadas no relatório. Do ponto de vista político, quero, como cidadão, realçar o significado de um grande item para a democracia brasileira tão presente no debate nacional: o da corrupção.

A democracia baseia-se na confiança recíproca entre os cidadãos e na destes nas instituições. A corrupção (que vem do latim corrumpere e significa destruir) é um agente de decomposição da substância das instituições públicas. Tem um alcance que vai além das condutas transgressivas individuais, pois enseja o que Raymond Aron chama de corrupção do espírito público por conta do intercâmbio clandestino entre o mercado político e o econômico. No caso do nosso país, estamos presenciando o comprometimento do espírito público que norteou a redemocratização e a elaboração da Constituição de 1988 e que, ao propiciar uma cultura política de ampliação da cidadania, foi o grande ponto de partida das positivas transformações do Brasil. O episódio do "mensalão" foi o momento inaugural da negativa inflexão do espírito público.

Cabe lidar com esse desafio, levando em conta o que dizia Machado de Assis: "A corrupção escondida vale tanto como pública, a diferença é que não fede".

JOÃO UBALDO RIBEIRO - Isso não vai dar muito certo



Isso não vai dar muito certo
JOÃO UBALDO RIBEIRO
O Estado de S.Paulo - 2108/11

Os problemas brasileiros, como não podia deixar de ser, têm repercutido bastante em Itaparica. Bem verdade que nem sempre essa repercussão coincide com as vigentes em outras partes do País. Toninho Leso, por exemplo, ficou grandemente surpreendido, quando lhe informaram que chamar alguém de corrupto não é um elogio. Como, não é um elogio? Não se deve elogiar uma pessoa que nasceu pobre, teve pouco estudo e hoje é rica milionária, recebida em toda parte e chamada de doutora, ou senão Excelência? Quem não elogia é porque não chegou lá e tem inveja. Se o sujeito se elegeu é porque queria se fazer na vida, como todos os outros que também se elegeram. Agora que ele se fez, somente a inveja é que pode explicar essa raiva que têm deles.

Tentou-se esclarecer que o corrupto subiu na vida, sim, pelo menos em matéria de dinheiro, mas subiu roubando dinheiro público. Toninho, que tem esse apelido de Leso, mas de vez em quando surpreende pela agilidade de raciocínio, retrucou que, se o dinheiro era público, não tinha dono e, assim, nada mais justo que o primeiro que pudesse metesse a mão nesse dinheiro - e era assim desde que inventaram dinheiro, o resto é conversa. "Eu acho bonito quando vejo esses corruptos passeando aqui de lancha americana, cheios de mulheres, tomando o uísque deles e desfrutando da vida", disse ele. "Meus filhos, Deus ajudando, vão ser todos corruptos, vou querer pelo menos um, minha família vai melhorar. Quero ver meu filhão lá nos salões, um corrupto respeitado por todos, bem-sucedido, bonitão, cheio das mulheres, esse vidão de corrupto mesmo... O sujeito que não tem esse grande ideal não é bom pai de família."

Jorginho Leso, irmão de Toninho, também leso e raramente visto sem pelo menos umas duas ucas no juízo, aproveitou para dar sua opinião sobre uma conversa que ouvira, a respeito de algemarem corruptos presos. Contaram a ele que muita gente, até a presidenta, ficou chateada com as algemas. Ele concordou e observou que jogar ovos nas pessoas suja tudo e não adianta nada. Além disso, é um desperdício de ovo que podia muito bem estar alimentando o povo. Quando lhe disseram que algema não tinha nada a ver com gema de ovo e era um instrumento para acorrentar as mãos dos presos, ele não se deu por vencido. Pra quê, pra daí a pouco soltarem de novo? Só se for para treinar a polícia no uso da chave - fecha-abre, fecha-abre, fecha-abre, pra que tanto treinamento de chave? O verdadeiro corrupto nunca é preso e, se é, soltam logo, é uma pessoa de bem, normal, que não vai ser confundida com qualquer ladrão pé de chinelo.

Jacob Branco, que ainda não entrara em seu horário de discurso e ouvira tudo calado, sentiu-se na obrigação de manifestar-se. Os nobres amigos estavam muito enganados, a corrupção está deixando de ser uma atividade lucrativa no Brasil, os tempos estão mudando. Longe dele ser um governista, pois toda a ilha conhecia sua reputação de independência, mas a verdade era que a presidenta estava se revelando muito disposta na briga contra a corrupção. Era do conhecimento geral como ela vinha fazendo uma faxina no governo, faxina séria, de gente graúda. E a faxina ia continuar.

- A faxina vai o quê? - a voz roufenha e exaltada de Zecamunista se ouviu à entrada do bar.

- Vai continuar.

- Vai continuar coisa nenhuma, Toninho Leso é que tem razão, o certo é seguir a carreira de corrupto e é muito democrático, qualquer um pode procurar um jeito, que sempre vai achar, nem que seja desviando cestas básicas e outras mixarias. Ela acabou de passar a escova nuns dois ministérios. Depois tem que vir o pente normal. Depois o pente-fino e um dilúvio de piolhos. E depois a desinfecção, porque senão reinfecta tudo rapidamente. Isso em cada um dos não sei quantos ministérios que ela mesma não lembra de cor. Para não falar nas estatais e em outras áreas do governo. Nem que ela tivesse dezoito mandatos seguidos, ia dar. Mas esse não é o maior problema. O maior problema é a famosa base do governo. Já estão cansando de avisar a ela que vão jogar duro, se ela não parar com esse negócio de faxina e ameaçar os empregos e esquemas deles e dos apadrinhados. Você já ouviu vários dizendo "não faxina nada aí", não já?

- Mas também não é assim, eu também soube que houve senadores que formaram uma frente para apoiar as faxinas que ela fizer.

- Eu também já soube, os nove mosqueteiros não é? Nove contra mais de cinquenta. Isso é para compor o quadro, é como a folha de parreira de Eva.

- Mas pode ser que haja adesões.

- É, pode ser. Mais umas três. Meta na sua cabeça, nenhum desses partidos está no governo para cumprir programa nenhum ou seguir ideologia nenhuma, eles estão lá para defender o deles e o do pessoal deles. E aí o negócio é blindar a base aliada, como eles dizem, não pode pegar ninguém ligado à base. Ou blinda ou não consegue aprovação nem para requerimento, ela pode até ser valente, mas não é mágica. Mas tem uma novidade que eu acho mais importante do que todas essas. Você não leu nos jornais, não? Foi criado o Instituto Lula.

- Eu soube. E daí?

- É o que eu também pergunto. Pergunto muito.

- Ele disse que é a nova plataforma política dele.

- É aí que mora o perigo. Pode continuar com sua fé na faxina, mas vamos deixar o tempo correr e ver se quem vai mandar na faxina é a faxineira.

DANUZA LEÃO - Acelera, Dilma

Acelera, Dilma 
DANUZA LEÃO
FOLHA DE SP - 21/08/11

Em sua nova fase, Dilma deveria apontar seu dedo ameaçador aos políticos que só pensam em emenda


A PRESIDENTE está surpreendendo. Sua fama era de competente e durona, mas de não saber fazer política, ser incapaz de negociar.
Pois a "saída" do ministro da Agricultura foi uma surpresa.

Ela conseguiu o que queria -se livrar de Wagner Rossi-, na moral, sem precisar bater de frente com o PMDB. Palmas para ela, e vexame para sua "base de apoio"-aliás, apoio a eles mesmos-, cujos deputados sumiram quando souberam do desfecho.

Em seu discurso de posse, a presidente estendeu a mão à oposição, coisa que há oito anos não acontecia; agora, dez senadores (só dez!) -todos de reputação inatacável- fizeram um gesto em direção a Dilma, oferecendo a ela apoio, para que a faxina continue.

Aceite, presidente; é uma boa hora para fazer novas amizades e se firmar como grande brasileira.

Nos encontros que tem tido com Lula, em diversas bases aéreas do país, imagino os conselhos que Dilma recebe. A governabilidade acima de tudo etc. etc., e 2014, claro.

A presidente parece obediente, mas sabe muitíssimo bem o que é certo e o que é errado, seu mestre foi Brizola; será que algum dia sonhou que teria que se reunir com Michel Temer e José Sarney, para "sentir" se podia ou não demitir um ministro apadrinhado por eles?

Afinal, não foi para isso que Dilma abriu mão de sua juventude, que foi presa e torturada.

Seu dever de lealdade é, em primeiro lugar, para com os que a elegeram, e só depois a Lula, isso se achar que deve; afinal, a presidente é ela, eta herança mais maldita.

Ela não precisou dar um murro na mesa para se livrar dos dois ministros que já se foram; ainda faltam alguns, é verdade, mas ela é mineira, tem paciência para esperar a hora certa. Caindo o terceiro ministro desta leva, que está quase, Dilma podia aproveitar o embalo e diminuir o número de ministérios, começando pelo da Pesca, que não dá para entender.

Com os acontecimentos da semana, a próxima pesquisa deverá ser mais favorável, e em sua nova fase ela deveria apontar aquele seu dedo ameaçador diretamente aos políticos que só pensam nas emendas, as famosas emendas.

Depois do deslumbramento inicial, aliás compreensível, fantasio que às vezes Dilma pense "por que eu fui me meter nessa?"

Cercada pela sua falta de experiência política, e vigiada de perto por Gilberto Carvalho, que dá os recados de Lula, sua vida não deve ser fácil.

Aliás, o que teria feito Lula com essa crise nos ministérios? Faria um discurso bem popular, esbravejando, como sempre, e diria que a culpa era toda da imprensa. Aliás, é bom lembrar que, se não fosse a imprensa, Palocci ainda seria o ministro mais poderoso do governo.

Estou começando a confiar mais em Dilma, e adoraria poder elogiar coisas que ela faz mais vezes, muitas vezes. Mas vamos combinar: cada vez que ela fala, é um desastre; decididamente, nossa presidente não nasceu com o dom da palavra.

E nem precisa; basta fazer o que deve, o que é certo.

GILBERTO DIMENSTEIN - Pobreza emburrece?

Pobreza emburrece? 
GILBERTO DIMENSTEIN
FOLHA DE SP - 21/08/11

Einstein nascido miserável, sem apoio para aprender, até seria inteligente, mas dificilmente um gênio


PARA QUEM estuda o cérebro, a resposta da pergunta que está no título é sim: a pobreza emburrece.

Apenas metade da inteligência de um indivíduo pode ser explicada pela herança genética, segundo estudo divulgado neste mês pela Universidade de Edimburgo, que envolveu cientistas de diversos países. O restante da composição do QI vem do ambiente em que se vive e dos estímulos educacionais recebidos desde o berço.

Simplificando: um Einstein nascido na miséria, sem apoio para aprender, até seria inteligente, mas dificilmente um gênio. Alguém com potencial de ter uma alta inteligência torna-se apenas mediano. É como se um músculo deixasse de ser desenvolvido.

Chegou-se a essa conclusão depois de testes laboratoriais com 3.118 pessoas espalhadas pelo mundo. Imaginava-se que as forças externas seriam bem menores na formação do QI. Tradução: inteligência é uma habilidade que, em boa parte, se aprende, depende da família e das oportunidades na cidade.

É um ângulo interessante para ver a parceria, anunciada na quinta-feira, entre a presidente Dilma Rousseff e os governadores da região Sudeste de unificação de seus programas de complementação de renda para combater a pobreza, batizado de Brasil sem Miséria.

Menos miséria acarreta mais inteligência?

A pesquisa dos neurocientistas ajudou-me a ver por outro ângulo um dos projetos mais emocionantes que conheço (Ismart) no Brasil: jovens de baixa renda, a maioria deles vindos de comunidades pobres, são escolhidos e preparados para estudar em escolas de elite.

Quase todos eles costumam entusiasmar seus professores porque, apesar da adversidade extrema (muitos passam parte do dia no trajeto de ônibus até a escola), conseguem recuperar a cada ano o tempo perdido. Logo estão no mesmo nível de aprendizagem de seus colegas mais abastados e até os superam, entrando nas melhores faculdades.

Conheci vários desses jovens e tendia a atribuir sua performance à garra, a uma inteligência acima do normal, tudo isso, é claro, favorecido por escolas de qualidade.
O que impressiona a todos é a rapidez da evolução. O que aquela pesquisa da Universidade de Edimburgo traz é a suspeita de que, com tantos estímulos, desafios e apoio, a taxa de QI possa ter sofrido um upgrade -afinal, nessa fase o cérebro ainda está em formação.
É, por enquanto, apenas uma especulação.

O que não é uma especulação é o caminho inverso, mostrando a relação entre pobreza e aprendizagem. Com apoio do Unicef, o Cenpec analisou, desde o ano passado, 61 escolas de de São Miguel Paulista, região da periferia da cidade de São Paulo. Já sabemos que, em geral, quanto mais pobre um bairro, pior tende a ser a nota dos alunos.

Mas essa investigação foi mais longe. Analisou as escolas de uma mesma região, comparando alunos com semelhante posição socioeconômica. Detectou-se uma expressiva diferença segundo as peculiaridades de cada território, especialmente a oferta de serviços públicos em cada um deles.

Nos lugares com menos serviços públicos, as demandas sociais tendem a sobrecarregar mais as escolas e, com isso, afastam ainda mais os professores e as famílias que têm maior repertório cultural. Nesses locais, há menos oferta de creche e pré-escola, retardando o processo de aprendizagem.

Esses programas da renda mínima unificados (acertadamente) por Dilma e os governadores têm como contrapartida a permanência dos alunos nas escolas. Mas a subida da renda, a julgar pelas descobertas da pesquisa do Cenpec, será limitada à aprendizagem dos alunos se não houver um investimento e articulação nos territórios.

Nem será justo que se avaliem essas escolas com padrões semelhantes aos das demais, já que os professores, mesmo os mais capacitados, terão uma margem de manobra limitada.

Programas como o Bolsa Família são um bom exemplo de política para a redução da miséria. E, por isso, têm um efeito eleitoral, mas terão um baixo impacto educacional caso não se perceba o território como uma extensão da sala de aula.

Não pensar na educação como uma linha que passa pela família, pela escola e pela comunidade é falta de inteligência pública.

PS- Por falar em políticas públicas e territórios, será lançado no começo de setembro um aplicativo para celular por meio do qual as pessoas poderão, em tempo real, relatar suas impressões sobre a cidade. Gera-se, no final, um mapa das percepções de toda a cidade e seus problemas rua por rua. Desenvolvido pelo Movimento Mais Feliz, comandado pelo publicitário Mauro Montorin, o projeto deve ser encampado pelo Facebook para ter amplitude internacional.

CARLOS HEITOR CONY - Metástase

Metástase 
CARLOS HEITOR CONY
FOLHA DE SP - 21/08/11

RIO DE JANEIRO - A imagem é mais do que sovada: de tanta corrupção que funciona como um câncer no organismo da nação, penetramos naquele estágio quase terminal da metástase. Não é um órgão, o baço, o fígado, o pulmão, o seio ou a pele que contraíram o tumor maligno: ele se espalhou e sua cura é cada vez mais problemática -se é que há cura radical para isso.

Dona Dilma deu azar. Geralmente no período que é considerado como a lua de mel do governante sempre aparecem problemas, alguns graves, mas a corrupção só começa a fazer estragos letais da metade para o fim do mandato.

Bem preparada, movida por ótimas intenções e lubrificada por apoios consideráveis, Dilma possui todas as condições para executar o seu programa de governo, alguns dos quais estão se iniciando, mas de forma confusa.

Numa reunião com a cúpula do governo, propõe e recebe propostas para erradicar a miséria, mas o telefone toca: alguém a avisa que o secretário-executivo de tal ministério está sendo preso pela polícia por alta corrupção. A ela só compete, inicialmente, pedir que não usem algemas, até que tudo seja apurado

A erradicação da miséria no país se transforma na erradicação das algemas. A reunião acaba brutalmente, cada qual vai examinar a própria consciência para ver se poderá ser o próximo.

A mídia e a internet estão congestionadas de mensagens e protestos contra a calamidade. Mas é pouco. Pensando nisso, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) está propondo marchas populares nas principais cidades, fazendo a voz das ruas chegar aos escalões responsáveis. Foi assim no caso do impeachment de Collor.

E foi justamente a ABI, dirigida na época por Barbosa Lima Sobrinho, ao lado de Lavenère-Wanderley, então presidente da OAB, que botaram os caras-pintadas nas ruas. Todos sabemos o resultado.

JOSÉ SIMÃO - Ui! Lula mata Norma gramatical!

Ui! Lula mata Norma gramatical!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 21/08/11

E placa em Brasília: "Sai de baixo! Queda de ministros". Lá tem que andar com capacete de motoqueiro!

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta: "Pastor preso no Turismo paga fiança com cheque sem fundo". Como é o nome dele? Wladimir FURTADO! Rarará! É o famoso cheque-camisinha: só desenrola no pau! Pastor passa cheque-camisinha. E como disse o outro: "Cheque sem fundo é como mulher feia, EU PROTESTO!".
E a pergunta em Brasília: "Prenderam algum ministério hoje?". Não se prende mais ministro, prende-se logo o ministério. E esse é o único que toma prejuízo em Brasília: vendedor de loteira da CEF. Quando ele grita "Olha a Federal! Olha a Federal", sai todo mundo correndo!
E placa em Brasília: "Sai de baixo! Queda de ministros". Em Brasília tem que andar com capacete de motoqueiro! E sabe como se chama a demissão do ministro da Agricultura? Colheita Maldita! E o Éramos6 diz que a única coisa verdadeira no Ministério da Agricultura é o adubo! Os caras fizeram tanta merda que o adubo é verdadeiro! E até a Dilma já tem plantação! De pé de limão? De pé de mexerica? Não, de pé na bunda. Rarará!
E "Insensato Coração"? Insensato não é o coração, insensato é o autor! E aquele Casal Pastel: Pedro e Marina. Esse casal dá chulé em pé de mesa. Nunca vi nada mais chato. Por que um chato sempre gosta de outro chato? Ele tinha cara de pão Pullman. E ela mais sem graça que água de salsicha. Mas como diz um amigo meu: "Eu pegava a Marina". E eu pegava o saco do Pedro e apertava até ele esboçar alguma reação!
Cigano Igor 2! Até o meu cachorro trabalha melhor que ele, pelo menos franze a testa! Rarará!
Quem matou a Norma? Se for a Norma gramatical, foi o Lula! Rarará! Quem matou a Norma gramatical? O Lula! Quem matou a Norma? Uma tampa de bueiro! Quem matou a Norma? O Salomão Hayala! E mataram uns 20 na novela. Não foi uma novela, foi uma chacina! Mataram mais gente que o Gaddafi na Líbia! Insensato não é o coração. Insensato é o autor. Rarará!
E esta: "PMDB se rebela". Vai botar fogo no colchão? Bater caneca na grade? PMDB quer dizer Pomos a Mão no Dinheiro do Brasil!
E mais uma predestinada. É que em Curitiba tem uma técnica de enfermagem chamada Sara Pinto. Ainda bem que o meu já é sarado. Pinto de academia. Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

MERVAL PEREIRA - O papel de Dilma


O papel de Dilma 
MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 21/08/11

Por duas vezes semana passada ouvi referências sobre a teoria dos papéis, a primeira delas em palestra do antropólogo Roberto DaMatta que, partindo de seu trabalho sobre o espaço da casa e da rua na nossa realidade, analisou questões éticas da sociedade brasileira à luz dos papéis sociais que desempenhamos.

Do que me interessa para efeito do raciocínio que pretendo desenvolver sobre os dias atuais na nossa política, DaMatta mostrou que nem sempre escolhemos nosso papel na sociedade e, muitas vezes, ele é maior do que nós, os atores.

Em outras, é apenas uma questão de circunstâncias que nos levam, os atores, a momentos ou ações nunca pensados.

DaMatta arrancou aplausos da plateia quando destacou a disfuncionalidade de nosso sistema político.

Dias depois, foi a vez do vice-presidente Michel Temer falar do mesmo assunto, citando uma experiência pessoal.

Ao ser escolhido pelo então governador Franco Montoro para assumir a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, ele, que era professor de Direito, sentiu-se despreparado para a missão e só não desistiu por que viu uma entrevista na televisão do ator Gianfrancesco Guarnieri, que havia assumido a Secretaria de Cultura.

Perguntado sobre como se sentia na nova função, tendo que usar terno e gravata e se submeter a certos cerimoniais oficiais, Guarnieri foi explícito na citação de Shakespeare, que DaMatta também usara em sua palestra: a vida é um palco e nós somos atores a quem cabia desempenhar o papel que ela nos reservara.

DaMatta ainda sublinhara um detalhe perverso dessa metáfora shakesperiana, a de que, diferentemente do teatro, na vida nós não sabemos o momento em que a cortina vai descer, dando fim à nossa representação.

Mas o que importa aqui é justamente esse aspecto da representação do papel social. O vice Michel Temer disse que, a partir da declaração de Guarnieri, decidiu que poderia "representar" o papel de secretário de Segurança, e assumiu o cargo que o levaria a entrar na política partidária na Constituinte de 1988. Ele tem representado bem o papel de político, se olharmos apenas os cargos e funções que seguidamente vem galgando.

Neste momento, por exemplo, exerce o papel de moderador na crise da base aliada, especialmente dentro de seu partido, o PMDB, que está totalmente dividido em disputas internas e, principalmente, descontente com o comportamento da presidente Dilma Rousseff em relação às ambições de poder do partido.

Levada mais pelas dificuldades crescentes de relacionamento com sua base congressual do que pela afinidade com o vice-presidente, Dilma tem tido que recorrer mais e mais a seus conselhos e, a partir deles, tem se esforçado para se aproximar dos partidos que a apoiam, e não apenas do PMDB, representando papel que se recusava a assumir.

Neste ponto é que me interessa especular sobre o papel da presidente Dilma nesse processo tão rico quanto conturbado vivemos. A faxina ética que agora rejeita como objetivo de seu governo foi um papel que exerceu durante a crise do Ministério dos Transportes apenas com fins marqueteiros, para saciar a sede de justiça da sociedade sem colocar em risco seu apoio político, visto que o PR é um partido pequeno, que não tem como viver longe do poder?

Ou é um anseio verdadeiro que ela está sendo obrigada a relevar devido às pressões políticas internas, inclusive do próprio ex-presidente Lula?

O fato é que, assim como o combate à hiperinflação acabou dando resultado com o Plano Real porque a sociedade já estava esgotada por um processo histórico que prejudicava a todos, também o combate à hipercorrupção que assola historicamente o país parece estar chegando a um ponto de não retorno, mesmo que a presidente dê demonstrações de que está prestes recuar, ou, pelo menos, a dar uma parada estratégica no processo que desencadeou para tentar rearrumar sua base de apoio.



Chega a ser engraçado o comentário de Dilma sobre a reportagem da revista inglesa "The Economist", que elogia seu combate à corrupção, mas prevê que ela terá problema políticos ao mexer na verdadeira casa de marimbondos da política brasileira.

Dilma se dignou a responder à reportagem em uma declaração pública - o que fala muito de nosso provincianismo - dizendo que os estrangeiros não conhecem "nossos usos e costumes", e por isso acham que ela terá problemas com seus aliados.

Segundo sua versão, no papel de ingênua que não lhe cabe muito bem, mas que é obrigada a desempenhar, Dilma diz que seus aliados também não concordam com os malfeitos.

Ora, o que ela está combatendo, e a sociedade brasileira se mobiliza para apoiar, são justamente esses "usos e costumes", o que Roberto DaMatta chama de "ética dupla" brasileira, que trata questões éticas misturadas com o relacionamento pessoal, tentando fazer justiça, mas salvando a honra de todos os implicados, "a complexa e difícil dialética entre o princípio da compaixão (para "os nossos") e da justiça (para "os outros")".

É o que está acontecendo neste momento em que o governo, mesmo depois de retirar de seu convívio diversas autoridades e três ministros de Estado, por denúncias graves de corrupção, tenta reabilitá-los de diversas maneiras, seja pedindo formalmente que o PR retorne à base aliada, da qual se desligara "em protesto", seja tentando demonstrar que não existe nenhum projeto de limpeza ética, simplesmente porque todos da base aliada são éticos.

Tão éticos que indicam para comandar a comissão que estudará o novo Código de Processo Civil deputados que respondem a diversos processos no Supremo Tribunal Federal.

Além do mais, tanta sujeira para ser limpa significa que, anteriormente, houve quem deixasse sujar. E quem veio antes, e promete vir depois, é o ex-presidente Lula, seu líder e tutor.

Que papel Dilma escolherá para marcar sua passagem pela Presidência da República?

EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO - Ensaios na Previdência

Ensaios na Previdência
EDITORIAL
FOLHA DE SP - 21/08/11
O Planalto volta a acenar com mudanças nas regras de concessão de benefícios pela Previdência Social. É a quarta oportunidade desde o início do governo Dilma Rousseff. Espera-se que não seja só mais um balão de ensaio.
A necessidade de modificações para manter a viabilidade financeira da Previdência é evidente. Como o tema é espinhoso, procrastinar sua apreciação pelo Congresso é arriscado: quanto mais as eleições se aproximam, mais difícil fica mexer no vespeiro.
O Ministério da Previdência cogita agora substituir o fator previdenciário, mecanismo que reduz o valor do benefício de quem se aposenta jovem, para estimular o trabalhador a adiar a aposentadoria. O problema é que a maioria tem preferido receber uma aposentadoria significativamente menor a adiar o início dos proventos.
As opções em discussão são três: fixar idade mínima para a aposentadoria; elevar o prazo mínimo de contribuição; ou uma fórmula que reúna as duas variáveis.
As centrais sindicais se opõem à idade mínima. Argumentam que os pobres começam a contribuir mais cedo -mas a diferença está diminuindo, pois também eles têm ficado mais anos na escola. Combinar aumentos de idade mínima e de tempo de contribuição parece mais promissor.
O governo, de início, se inclinou pela fórmula 85/95 (em que o primeiro número é a soma de idade e tempo de contribuição para mulheres, e o segundo, para homens). Porém, por temer que implicasse maior gasto que a manutenção do fator previdenciário, já parece preferir a fórmula 95/105.
Cabe indagar se a diferenciação entre gêneros ainda se justifica. No passado, as mulheres acumulavam cuidados da casa e da prole com o trabalho, mas hoje já os dividem com os homens. Além disso, vivem mais. Em muitos países (como França, Alemanha, Espanha e Portugal) ela já foi revista.
Faltam, também, providências como a desoneração da folha salarial, que favoreçam a formalização de empregos e, com ela, as receitas da combalida Previdência.

VINÍCIUS TORRES FREIRE - Gritos e sussurros na economia

Gritos e sussurros na economia
VINÍCIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 21/08/11
"Políticos" e economistas do governo divergem sobre gastos; BC e mercado não se entendem sobre a inflação


A EQUIPE ECONÔMICA de Dilma Rousseff parece decidida a economizar em 2012 tanto como em 2011. Ou seja, fazer um superavit primário de uns 3% do PIB (diferença entre receita e despesa de 3% do PIB, descontados os gastos com juros).
É o que diz em público o ministro da Fazenda, Guido Mantega. É o que praticamente diz a ministra do Planejamento, Miriam Belchior. É o que pede o povo do Banco Central.
A gente ouve nos corredores dos ministérios que a intenção da equipe econômica é mesmo esta: manter o superavit em 2012. Isto é, excetuadas situações muito favoráveis ou catastróficas na economia brasileira e, em especial, na do mundo.
Além de manter a dívida pública em queda e apresentar contas em ordem, a intenção dos economistas de Dilma com o aperto fiscal é induzir queda mais rápida dos juros.
Mas o jornal "Valor Econômico" deu na sexta-feira passada que assessores próximos de Dilma Rousseff, ministro inclusive, acreditam que o aperto fiscal será menor no ano que vem, a fim de liberar mais dinheiro para investimentos. Ainda segundo o mesmo relato, a redução de juros seria muito cautelosa.
De fato, a gente ouve num corredor do Planalto que "o Brasil não pode parar". Mais, que a presidente tem "restos a pagar" para a sua coalizão, além de "demandas atrasadas da sociedade para atender".
A ideia de que a presidente precisa afrouxar o controle de gastos devido à política é transmitida de modo muito mais sutil e indireto do que sugere o parágrafo anterior, mas esse é o tom geral da conversa.
O governo apenas está cumprindo sua meta fiscal neste ano devido ao aumento real de mais de 12% da receita (descontadas aquelas extraordinárias) e também à contenção de investimentos, o que é ruim mas inevitável no curto prazo, dado o engessamento das despesas.
A receita vai crescer tanto assim em 2012? Note-se, além do mais, que muito "afrouxamento" de gasto já foi contratado para o ano que vem.
Em 2012, haverá o aumento do salário mínimo e da despesa social relacionada. Haverá a perda de receita com reduções de impostos da dita política industrial. Haverá, em tese, mais programas sociais.
O que quer enfim o governo?
O BC parece contar com o aperto fiscal e a crise em fogo médio no mundo rico para ver a meta de inflação chegar a 4,5% em 2012. O BC acha que a inflação baixaria a uns 4,8% em abril de 2012.
Para chegar aos tais 4,8% em abril, a inflação teria de ser de uns 0,37% em agosto e de 0,50% por mês até dezembro (por que tais números? São as previsões de economistas mais certeiros no setor privado). E, de janeiro a abril, teria de ser em média de 0,37% (aliás, taxa mensal compatível com a meta anual de 4,5%). Gente boa no mercado acha que, no primeiro quadrimestre de 2012, a inflação andará pela casa de 0,6% ao mês. Assim, o IPCA ainda estaria na casa de 5,7% em abril. Isso com juros, Selic, a 12,75%.
É tudo "chute informado"? É. Difícil saber o que será dos crescimentos mundial e brasileiro, do preço de commodities, dos reajustes de salários no final deste ano etc. O que se sabe é que tamanho descompasso entre "políticos" e economistas do governo e entre governo e mercado não vai ajudar a "coordenar as expectativas" de modo a estabilizar a economia. Ruído demais.

MARCELO GLEISER - Escolheremos a graça ou a natureza?


Escolheremos a graça ou a natureza?
MARCELO GLEISER
FOLHA DE SP - 21/08/11

O filme "A Árvore da Vida" nos coloca entre o caminho da graça e da natureza; não temos de fazer essa escolha

NA SEMANA passada assisti ao filme "A Árvore da Vida", de Terrence Malick. Se existe um gênero de cinema dito metafísico, esse filme é um exemplo perfeito. Algumas das questões mais profundas que foram (e são) feitas no decorrer da história reaparecem aqui, em meio à tribulada vida de uma família de classe média americana da década de 1950.
Malick nos lembra que o sublime e o trágico usam vários disfarces, alternando cenas de beleza numa rua comum com cenas pesadas.
O tema central do filme é a perda e nossa relação com ela. Malick contrasta a fragilidade humana com o esplendor dramático da natureza, inserindo uma narrativa da criação que começa com o Big Bang, mostra estrelas nascendo em gigantescas e coloridas explosões, a própria Terra surgindo, o desenvolvimento de criaturas e plantas multicelulares, a era dos dinossauros, até chegarmos ao nascimento de Jack, o filho mais velho da família O'Brien.
Com isso, Malick nos insere no épico da criação, mostrando que a história cósmica é a nossa história.
As imagens e a música evocativa (Mahler, Brahms, Couperin, Berlioz, e o tema original de Alexandre Desplat) nos induzem a ver o Universo, a vida e a humanidade como manifestação de um Deus Spinoziano, em tudo e em todos, transcendente.

No decorrer do filme, testemunhamos vários tipos de perda. O'Brien e sua esposa têm três filhos. Jack é o pivô dramático do enredo, sofrendo constantemente da ira do pai frustrado, que se mescla com um afeto violento. O'Brien queria ter sido músico, mas acaba numa fábrica, talvez como engenheiro.
Fora a fúria paterna, Jack tem de lidar com a superioridade do irmão mais novo, R. L., que toca violão e desenha muito bem, além de ser mais bonito. Nos ciúmes e adoração que Jack sente pelo irmão, vemos a luta que todos temos com nossas limitações. Lembrei-me da angústia de Salieri ao se deparar com o gênio de Mozart em "Amadeus".
Já a mãe é uma criatura em constante êxtase beatífico, uma mística que ama a natureza com fervor religioso: "Ame a todos e a tudo. Ame cada folha, cada raio de luz".
A paz (relativa) familiar é destruída quando R. L., o filho, é morto no Vietnã aos 19 anos -algo que vemos no início do filme.
A narrativa vai e volta no tempo, e vemos Jack adulto (Sean Penn), dentro de um prédio moderno em Dallas que parece um sarcófago, olhando para fora e perguntando "Onde você está?" ao seu irmão e a Deus. O filme usa muita narração sussurrada, como se fossem preces. Malick transforma a sala de projeção em templo: o cinema sacro.
O filme nos coloca entre "o caminho da graça e o caminho da natureza". Graça no sentido cristão de generosidade, humildade e bondade, de uma força interna imune a todo o tipo de barreira, ancorada na nossa humanidade. Sem nós, a graça não existe. Já a natureza é indiferente, avança resolutamente, criando e destruindo sem um objetivo final. Nós, frágeis humanos, estamos tentando compreender o significado de nossas vidas. Uma morte prematura é indesculpável.
Não precisamos escolher entre a graça e a natureza. Existe uma terceira via, em que encontramos graça na natureza, não apenas através de sua beleza e cada folha e raio de luz, mas por meio da nossa profunda conexão com ela.
O que matou o pai, figurativamente, mesmo antes da morte do filho, foi ter se distanciado do sentido de graça, da conexão profunda com o que nos cerca, vivo ou não.
Espero que, das várias mensagens do filme de Malick, uma que perdure seja que graça e natureza constituem um todo indissolúvel.
Afinal, aqui estamos, criações cósmicas que somos, capazes de inventar o conceito de graça e de viver inspirados por ele. Dedico esse texto à minha amiga Ciça Guimarães.

MÔNICA BERGAMO - O ARQUEIRO DA VILA


O ARQUEIRO DA VILA
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 21/08/11

O presidente do Santos diz que Neymar é melhor que Ganso e Ronaldo e afirma que o técnico Muricy Ramalho será liberado se for convidado para comandar a seleção

" [Neymar vive com] Muito menos [que R$ 50 mil]. Vai gastar com o quê? Se houvesse convite e o Muricy aceitasse, eu teria que respeitar. É serviço militar"

" Fizemos uma proposta igualzinha à do Neymar [para Ganso]. Está pronta. Garantiria um mínimo que é três vezes e meia o que ele ganha hoje: R$ 450 mil"


Quando estudava no colégio São Luís, em SP, Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro, 68, tinha um apelido: "Santista". Só ele e o colega Eduardo Suplicy torciam para o alvinegro na escola. Hoje presidente do Santos, mantém no gabinete um quadro do avô, Alvaro de Oliveira Ribeiro, que em 1916 comandou a compra do terreno da Vila Belmiro. À coluna, ele diz que Neymar é "champanhe" e Ganso, "um vinho Bordeaux". Abaixo, um resumo da conversa:

OS CRAQUES
É evidente que um dia o Neymar e o Paulo Henrique [Ganso] vão querer jogar lá fora. Em 13 de maio de 1888 acabou a escravidão no Brasil e não tem sentido você ter um jogador insatisfeito, mal humorado e se sentindo desvalorizado. Se quiser sair, respeitados os interesses do Santos, eles têm o direito. Só que eles querem disputar o Mundial em Tóquio, estar aqui na festa do centenário no ano que vem, disputar mais uma Libertadores.

NEYMAR
Ele está se transformando num fenômeno raro no Brasil. Ele é um fato midiático. Talvez depois do Ayrton Senna não tenha havido nenhum herói com a capacidade do Neymar de agradar em termos universais.

Folha - Nem o Ronaldo?
Não dá pra comparar! O Ronaldo desenvolveu a carreira dele lá fora, sempre muito distante. Quando jogava na seleção, era o ídolo. O Neymar foi jogar no campo do Vasco e, na saída do vestiário, tinha 300 adolescentes com a camisa do Vasco, pedindo para encostar um dedo nele, tirar fotografia, pegar um autógrafo. Ele é muito acessível. O sorriso dele é de adolescente. Treinado pela gente, ele fez curso de "media training", tem fonoaudióloga para se expressar melhor. Tem uma capacidade de comunicação rara, que o Ronaldo não tinha. E não fala mais bobagens. Dá entrevistas sensatas.

Joga mais que o Ronaldo?
Eu sou suspeito, porque sou, depois do pai, o fã número dois dele. O único melhor que o Neymar é o Pelé.

É melhor que o Ganso?
Eu acho. São diferentes. O Neymar é champanhe. Um espumante, borbulhante. O Ganso é um Bordeaux safrado, um vinho muito sólido para você tomar num momento certo. Não dá para você comparar uma Veuve Clicquot com um Château Margaux. Os dois são muito bons, cada um à sua hora.

NEYMAR PAI
O pai dele é bravo e estrito. Sou pai de seis filhas, tenho neto, sou mais liberal. Para mim, os jovens podem tudo. Quando o pai dá uma bronca, ele fala: "Vou ligar pro presidente".

E quando ele ficou "grávido"?
Assumiu com uma coragem e uma maturidade raras num menino de 19 anos. Você vê as histórias dos outros jogadores, que produzem filhos mundo afora e que só com exame de DNA é que eles assumem. Como o Ronaldo?
É. [Pensa e muda] Não sei [risos]. Mas o Neymar é um cara diferenciado. Tem aulas semanais de administração de portfólios. Em cinco anos, eu diria que ele pode ser um banqueiro. O Neymar, o pai e a irmã. A gente o assiste com alguns dos mais notáveis especialistas do mercado financeiro. E ele tem uma mesada restrita. Aplica o resto, com a nossa assistência para que ele não seja vítima de oportunistas, de caras que querem vender um bonde, uma passagem para a Lua.

Quanto é a mesada? R$ 50 mil?
Muito menos. Ele vai gastar com o quê? Tem cama, comida, carro.

AUMENTO PARA GANSO
Fizemos uma proposta igualzinha à do Neymar. Está em aberto, pronta. Eu garantiria a ele um mínimo que é três vezes e meia o que ele ganha hoje fixo: R$ 450 mil. Na carteira, seria o teto [R$ 180 mil]. Acho que o Paulo Henrique está vivendo um momento de decisão que não é fácil para um menino de 21 anos. O Santos é um porto seguro. De vez em quando a gente faz pato no tucupi para ele. Minha cozinheira é paraense. Eu compro pato no [mercado] Santa Luzia e o tucupi e o jambu, ela traz de Belém.

DIS (GRUPO DE EMPRESÁRIOS DE GANSO)
O futebol brasileiro precisa tentar se livrar desse tipo de empresário. Futebol é emoção, e o capital só vê cifrão. Torcedor não pode ser vítima dessa enganação.

MURICY NA SELEÇÃO
Se houvesse o convite e o Muricy aceitasse, eu teria que respeitar. Ele tem contrato com a gente, mas é como um contrato de locação. Se o Brasil entrar numa guerra e precisar de sua casa para um quartel-general, você tem que ceder. Se a CBF desapropriar o Muricy, vou lamentar, chiar. Tem multa, mas a seleção é uma cláusula de isenção natural. É convocação para o serviço militar. Mas o técnico da seleção é o Mano, vai ficar.

OS MENINOS NA SELEÇÃO
Não estão jogando bem. Ninguém brilhou na seleção, o que é perfeitamente compreensível. Tem que jogar junto para você saber o tempo de jogo do seu colega. A seleção do Uruguai vem junta há três anos, era natural que ganhasse a Copa América. Outra coisa ruim é a presunção de que você é melhor que o outro.
Eles [seleção] foram pra Copa América e diziam: "Finalmente Neymar e Ganso, finalmente o Pato na frente, namorado da filha do Berlusconi e tal". A gente achou que era mais do que os outros. Futebol não é isso, são 90 minutos em igualdade.

DENÚNCIAS CONTRA RICARDO TEIXEIRA
Eu não ponho a mão no fogo por absolutamente ninguém, nem por mim mesmo. Sou um ser humano passível de erro, como tudo mundo. Mas nunca me deu razão para dizer que foi desleal a mim nem ao Santos.

Acha que ele está há tempo demais no cargo?
Acho. E acho que o Fidel também está há muito tempo em Cuba, a rainha Elizabeth está há muito tempo na Inglaterra. É um assunto que não passa pela minha alçada. Eu não voto para presidente da CBF, eu voto para presidente da federação paulista. A federação, como a de Rondônia, é que vota pra presidente da CBF. Aqui no Santos nós estabelecemos um limite: você tem direito a uma reeleição. A rotatividade de poder é um oxigênio para uma empresa, uma entidade ou um órgão público. Na CBF, na minha empresa e no Santos Futebol Clube.

ESTÁDIO
O nosso [futuro estádio] custará zero. É uma decisão estratégica de não tirar um centavo de nosso negócio, que é disputar títulos, para investir em um ativo de rentabilidade duvidosa como campo de futebol. A conta não fecha.

O ESTÁDIO DA COPA
O Corinthians, com o Itaquerão, tem uma oportunidade de mercado. Mas você tem exigências da Fifa que são leoninas. Vi declaração do Andres [Sanchez, presidente do Corinthians] dizendo que o estádio custaria bem menos se não fossem as exigências para a Copa. Elas são de um elitismo absoluto, e rentabilizar isso será um desafio. O Corinthians vai ter dificuldades no futuro. Terá que pagar o empréstimo [do BNDES]. E eu quero ver! Bom, o Corinthians tem uma torcida grande, eles são bons administradores. Mas eu não tomaria esse risco. Não é o meu estilo.

GLOBO X CLUBE DOS 13
Direitos de televisão envolvem audiência, expertise e aceitabilidade por parte do patrocinador da nossa camisa, que é nossa segunda fonte de renda. Você prefere botar o seu anúncio no "Jornal Nacional" ou no "Jornal da Cultura"? É um problema aritmético.

Os patrocinadores não anunciariam em outra emissora?
Por uma verba menor, não tenho dúvida! A gente sentiu isso claramente quando conversou com nossos patrocinadores. Se eu estou com um problema no coração, vou fazer uma tomada de preço, sem levar em conta a especialização do médico? O recém-formado em Muzambinho [comparando com as concorrentes da Globo] certamente vai me pagar alguma coisa para depois poder botar no cartãozinho que operou o presidente do Santos. Se eu for ao [cardiologista Adib] Jatene, vou ter que pagar pela experiência.
(DIÓGENES CAMPANHA e MÔNICA BERGAMO)