terça-feira, setembro 21, 2010

RESISTÊNCIA DEMOCRÁTICA


RESISTÊNCIA DEMOCRÁTICA - Personalidades lançam manifesto em defesa da democracia, do estado de direito e da liberdade de imprensa

Brasileiros das mais diversas áreas lançam nesta quarta, às 12h, na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, um manifesto em defesa da democracia, do estado de direito, da liberdade de imprensa e dos direitos individuais. Trata-se de um movimento apartidário. Entre os signatários iniciais do documento estão o jurista Helio Bicudo, o historiador Marco Antonio Villa, o poeta Ferreira Gullar, os atores Carlos Vereza e Mauro Mendonça, os professores José Arthur Gianotti e Leôncio Martins Rodrigues e o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso.
Abaixo, segue a íntegra do documento. Um bom exercício é confrontar o seu conteúdo com o manifesto que o PT e sindicalistas estão divulgando contra a liberdade de imprensa. De um lado, a civilização democrática; de outro, o flerte bom a barbárie ditatorial.
Leiam e divulgue. Creio que o documento será tornado público para receber adesões:
MANIFESTO EM DEFESA DA DEMOCRACIA
Em uma democracia, nenhum dos Poderes é soberano.
Soberana é a Constituição, pois é ela quem dá corpo e alma à soberania do povo.
Acima dos políticos estão as instituições, pilares do regime democrático. Hoje, no Brasil, os inconformados com a democracia representativa se organizam no governo para solapar o regime democrático.
É intolerável assistir ao uso de órgãos do Estado como extensão de um partido político, máquina de violação de sigilos e de agressão a direitos individuais.
É inaceitável que a militância partidária tenha convertido os órgãos da administração direta, empresas estatais e fundos de pensão em centros de produção de dossiês contra adversários políticos.
É lamentável que o Presidente esconda no governo que vemos o governo que não vemos, no qual as relações de compadrio e da fisiologia, quando não escandalosamente familiares, arbitram os altos interesses do país, negando-se a qualquer controle.
É inconcebível que uma das mais importantes democracias do mundo seja assombrada por uma forma de autoritarismo hipócrita, que, na certeza da impunidade, já não se preocupa mais nem mesmo em fingir honestidade.
É constrangedor que o Presidente da República não entenda que o seu cargo deve ser exercido em sua plenitude nas vinte e quatro horas do dia. Não há “depois do expediente” para um Chefe de Estado. É constrangedor também que ele não tenha a compostura de separar o homem de Estado do homem de partido, pondo-se a aviltar os seus adversários políticos com linguagem inaceitável, incompatível com o decoro do cargo, numa manifestação escancarada de abuso de poder político e de uso da máquina oficial em favor de uma candidatura. Ele não vê no “outro” um adversário que deve ser vencido segundo regras da Democracia , mas um inimigo que tem de ser eliminado.
É aviltante que o governo estimule e financie a ação de grupos que pedem abertamente restrições à liberdade de imprensa, propondo mecanismos autoritários de submissão de jornalistas e empresas de comunicação às determinações de um partido político e de seus interesses.
É repugnante que essa mesma máquina oficial de publicidade tenha sido mobilizada para reescrever a História, procurando desmerecer o trabalho de brasileiros e brasileiras que construíram as bases da estabilidade econômica e política, com o fim da inflação, a democratização do crédito, a expansão da telefonia e outras transformações que tantos benefícios trouxeram ao nosso povo.
É um insulto à República que o Poder Legislativo seja tratado como mera extensão do Executivo, explicitando o intento de encabrestar o Senado. É um escárnio que o mesmo Presidente lamente publicamente o fato de ter de se submeter às decisões do Poder Judiciário.
Cumpre-nos, pois, combater essa visão regressiva do processo político, que supõe que o poder conquistado nas urnas ou a popularidade de um líder lhe conferem licença para rasgar a Constituição e as leis. Propomos uma firme mobilização em favor de sua preservação, repudiando a ação daqueles que hoje usam de subterfúgios para solapá-las. É preciso brecar essa marcha para o autoritarismo.
Brasileiros erguem sua voz em defesa da Constituição, das instituições e da legalidade.
Não precisamos de soberanos com pretensões paternas, mas de democratas convictos.
Por Reinaldo Azevedo



Personalidades que já são signatárias do manifesto em defesa da democracia

01. Hélio Bicudo
02. D. Paulo Evaristo Arns
03. Carlos Velloso
04. René Ariel Dotti
05. Therezinha de Jesus Zerbini
06. Celso Lafer
07. Adilson Dallari
08. Miguel Reali Jr.
09. Ricardo Dalla
10. José Carlos Dias
11. Maílson da Nóbrega
12. Ferreira Gullar
13. Carlos Vereza
14. Zelito Viana
15. Everardo Maciel
16. Marco Antonio Villa
17. Haroldo Costa
18. Terezinha Sodré
19. Mauro Mendonça
20. Rosamaria Murtinho
21. Marta Grostein
22. Marcelo Cerqueira
23. Boris Fausto
24. José Alvaro Moisés
25. Leôncio Martins Rodrigues
26. José A. Gianotti
27. Lurdes Solla
28. Gilda Portugal Gouvea
29. Regina Meyer
30. Jorge Hilário Gouvea Vieira
31. Omar Carneiro da Cunha
32. Rodrigo Paulo de Pádua Lopes
33. Leonel Kaz
34. Jacob Kligerman
35. Ana Maria Tornaghi
36. Alice Tamborindeguy
37. Tereza Mascarenhas
38. Carlos Leal
39. Maristela Kubitschek
40. Verônica Nieckele
41. Cláudio Botelho
42. Jorge Ramos
43. Fábio Cuiabano
44. Luiz Alberto Py
45. Gabriela Camarão
46. Romeu Cortes
47. Maria Amélia de Andrade Pinto
48. Geraldo Guimarães
49. Verônica Nieckele
50. Martha Maria Kubitschek
51. Gilza Maria Villela
52. Mary Costa
53. Silvia Maria Melo Franco Cristóvão
54. Glória de Castro
55. Risoleta Medrado Cruz
56. Gracinda Garcez
57. Josier Vilar
58. Jussarah Kubitschek
59. Luiz Eduardo da Costa Carvalho
60. Tereza Maria de Britto Pereira

ARNALDO JABOR

Lula é um fenômeno religioso
ARNALDO JABOR


O GLOBO - 21/09/10


Lula não é um político - é um fenômeno religioso. De fé. Como as igrejas que caem, matam os fiéis e os que sobram continuam acreditando. Com um povo de analfabetos manipuláveis, Lula está criando uma igreja para o PT dirigir, emparedando instituições democráticas e poderes moderadores.
Os fatos são desmontados, os escândalos, desidratados, para caber nos interesses políticos da igreja lulista e seus coroinhas. Lula nos roubou o assunto. Vejam os jornais; todos os assuntos são dele, tudo converge para a verdade oficial do poder. Lula muda os fatos em ficção. Só nos resta a humilhante esperança de que a democracia prevaleça.
Depois do derretimento do PSDB, o destino do país vai ser a maçaroca informe do PMDB agarrada aos soviéticos do PT, nossa direita contemporânea.
Os comentaristas ficam desorientados diante do nada que os petistas criaram com o apoio do povo analfabeto. Os conceitos críticos, como "razão, democracia, respeito à lei, ética", ficaram ridículos, insuficientes raciocínios diante do cinismo impune.
Como analisar com a razão essa insânia oficial? Como analisar o caso Erenice, por exemplo, com todas as provas na cara, com o Lula e seus áulicos dizendo que são mentiras inventadas pela mídia? Temos de criar novos instrumentos críticos para entender essa farsa. Novos termos. Estamos vendo o início de um "chavismo light", cordial, para que a "massa atrasada" seja comandada pela "massa adiantada" (Dilma et PT).
Os termos têm de ser mudados. Não há mais "propina"; agora o nome é "taxa de sucesso". A roubalheira se autonomeia "revolucionária" - assalto à coisa pública em nome do povo. O que se chamava "vítima" agora se chama "réu". Os escândalos agora são de governos inteiros roubando em cascata, como em Brasília, Rondônia e Amapá - são "girândolas de crimes". Os criminosos são culpados, mas sabem tramar a inocência. O "não" agora quer dizer "sim".
Antigamente, mentia se com bons álibis; hoje, as tramoias e as patranhas são deslavadas; não há mais respeito nem pela mentira. Está em andamento uma "revolução dentro da corrupção", invadindo o Estado em nossa cara, com o fito de nos acostumar ao horror. Gramsci foi transformado em chefe de quadrilha.

Nunca antes nossos vícios ficaram tão explícitos, nunca aprendemos tanto de cabeça para baixo. Já sabemos que a corrupção no país não é um "desvio" da norma, não é um pecado ou crime; é a norma mesmo, entranhada nos códigos e nas almas.
Nosso único consolo: estamos aprendemos muito sobre a dura verdade nacional neste rio sem foz, onde as fezes se acumulam sem escoamento. Por exemplo: ganhamos mais cultura política com a visão da figura da Erenice, a burocrata felliniana, a "mãe coragem" com seus filhos lobistas, com o corpinho barbudo do Tuminha (lembram?), com o "make-over" da clone Dilma (que ama a ex-Erenice, seu braço- direito há 15 anos), com o silêncio eufórico dos Sarneys, do Renan, do Jucá... Que delícia, que doutorado sobre nós mesmos!
Ao menos estamos mais alertas sobre a técnica do desgoverno corrupto que faz pontes para o nada, viadutos banguelas, estradas leprosas, hospitais cancerosos, esgotos à flor da pele, tudo proclamado como plano de aceleração do crescimento popular.
Nossa crise endêmica está em cima da mesa de dissecação, aberta ao meio como uma galinha. Meu Deus, que prodigiosa fartura de novidades imundas, mas fecundas como um adubo sagrado, belas como nossas matas, cachoeiras e flores.
Os canalhas são mais didáticos que os honestos. Temos assistido a um show de verdades mentirosas no chorrilho de negaças, de cínicos sorrisos e lágrimas de crocodilo.
Como é educativo vermos as falsas ostentações de pureza para encobrir a impudicícia, as mãos grandes nas cumbucas e os sombrios desejos das almas de rapina. Que emocionante este sarapatel entre o público e o privado: os súbitos aumentos de patrimônio, filhinhos ladrões, ditadura dos suplentes, cheques podres, piscinas em forma de vaginas, despachos de galinhas mortas na encruzilhada, o uísque caindo mal no Piantela, as flatulências fétidas no Senado, as negaças diante da evidência de crime, os gemidos proclamando "honradez" e "patriotismo".
Talvez essa vergonha seja boa para nos despertar da letargia de 400 anos. Através deste escracho, pode ser que entendamos a beleza do que poderíamos ser!
Já se nos entranhou na cabeça, confusamente ainda, que, enquanto houver 20 mil cargos de confiança no país, haverá canalhas, enquanto houver estatais com caixa preta, haverá canalhas, enquanto houver subsídios a fundo perdido, haverá canalhas. Com esse Código Penal, nunca haverá progresso.
Já sabemos que mais de 5 bilhões por ano são pilhados das escolas, hospitais, estradas, sem saneamento, com o Lula brilhando na TV, xingando a mídia e com todos os mensaleiros, sanguessugas e aloprados felizes em seus empregos e dentro do ex-partido dos trabalhadores.
E é espantoso que esse óbvio fenômeno político, caudilhista, subperonista, patrimonialista, aí, na cara da gente, seja ignorado por quase toda a "inteligentsia" do país, que antes vivia escrevendo manifestos abstratos e agora se cala diante desse perigo concreto que nos ronda. No Brasil, a palavra " esquerda" ainda é o ópio dos intelectuais.

A única oposição que teremos é a da imprensa livre, que será o inimigo principal dos soviéticos ascendentes.
O Brasil está evoluindo em marcha a ré! Só nos resta a praga: malditos sejais, ó mentirosos e embusteiros! Que a peste negra vos cubra de feridas, que vossas línguas mentirosas se transformem em cobras peçonhentas que se enrosquem em vossos pescoços e vos devorem a alma.
Os soviéticos que sobem já avisaram que revistas e jornais são o inimigo deles.
Por isso, "si vis pacem, para bellum", colegas jornalistas. Se quisermos a paz, preparemo-nos para a guerra.

DORA KRAMER

Uso exclusivo 
Dora Kramer 

O Estado de S.Paulo - 21/09/2010

Há uma expressão (chula) na política que os veteranos usam para definir o novato afoito prestes tropeçar nas próprias pernas. Diz assim: "Para cachorro novo, fulano está com muita pressa de entrar no mato."
É o que a memória de imediato seleciona diante da resposta da candidata Dilma Rousseff ao convite do senador Álvaro Dias para falar no Congresso sobre as andanças da ex-ministra Erenice Guerra, a respeito de quem a cada dia se descobre uma nova malfeitoria.
"Convite de Álvaro Dias, nem para cafezinho", disse ela. Se, como pareceu, está preocupada com o efeito eleitoral desse tipo de solicitação, Dilma teria várias maneiras de recusá-lo. Poderia, inclusive, ignorar a declaração do senador, dizer que esperaria a solicitação formal do Legislativo para então se pronunciar.


Mas, não. Dilma preferiu dizer o que lhe veio à cabeça e da forma mais arrogante, esquecida de como foi duro aquele curto período do início da campanha quando, na ausência do presidente Luiz Inácio da Silva, que andava pelo exterior, ela cometia uma impropriedade (às vezes até duas) por dia.

Por menor que fosse, era registrada como erro, comentada com constrangimento pelos aliados e celebrada pelos adversários.

A candidata já deve ter percebido, mas pelo jeito não compreendeu: determinadas barbaridades, manifestações de desrespeito e infrações só podem ser feitas ou ditas por Lula.

É o único com salvo-conduto para cometer disparates impunemente. Ou Dilma acha que teria ido longe se o presidente não reaparecesse logo transformando, em maio, o programa do PT em horário eleitoral? Ou pensa que desperta os mesmos sentimentos de gratidão, culpa ou intimidação?

Erenice Guerra cometeu o mesmo erro de que poderia ser arrogante numa nota oficial e perdeu o lugar.

Se de fato for eleita, é bom Dilma se acostumar: não sendo a operária nordestina que chegou à Presidência nem tendo o poder de controlar a massa, não poderá contar com a prerrogativa de desrespeitar a tudo e a todos impunemente, que é de uso exclusivo de Lula presidente.

Isso vale também para a modelagem "não sei de nada" em relação a escândalos de corrupção.

Currículo escolar. Lula disse na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) no fim da semana passada que "adoraria" ter curso superior e gostaria de voltar a estudar.

O que poderia parecer um tardio, mas bem-vindo, reconhecimento do presidente do valor do estudo era só um jeito de poder dizer que se considera pronto a "dar aulas sobre como governar o País".

Em outras palavras: falar todos os dias para registro dos meios de comunicação; dizer o que cada público gosta de ouvir sem compromisso com a coerência ou realidade; não enfrentar contenciosos; agradar malfeitores que poderiam ameaçá-lo; distribuir benesses sem pensar nas consequências; passar por cima de tudo, inclusive da lei; aniquilar o que ou quem lhe possa fazer sombra, nunca valorizar atributos que não sejam os próprios e jamais firmar pacto eterno com a verdade.

Vivendo e aprendendo. Em 1989 Fernando Collor foi eleito presidente praticamente sem críticas. Da imprensa, inclusive, que em sua maioria deslumbrava-se deixando em segundo plano seus atos como prefeito de Maceió e governador de Alagoas.

Na época havia o receio geral de criticar Collor e receber do burríssimo maniqueísmo nacional o carimbo de "sarneysista". Praticamente um insulto, dada a impopularidade do então presidente José Sarney.

Fato e ficção. A crucial e aterradora diferença entre o Tiririca de hoje e o cacareco de antigamente é que o voto neste não valia e os votos naquele valerão várias vagas na Câmara dos Deputados.

EDITORIAL - O GLOBO

Lula e a visão autoritária da imprensa
EDITORIAL
O GLOBO - 21/09/10

É nos improvisos que o presidente Lula se deixa levar, fala o que não seria conveniente do ponto de vista político, mas transmite o que lhe vai no fundo da alma. Inebriado por índices recordes de popularidade, nunca antes alcançados neste país, Lula tem radicalizado na autoindulgência, como se o apoio popular o colocasse acima de leis e limites institucionais.

São exemplos desse desvio as sucessivas vezes em que o presidente age como chefe de partido, numa deplorável mistura de papéis, porém bem ao estilo de um governo que, na ocupação da máquina burocrática, exercita ao extremo a confusão entre interesses privados e a esfera pública.

É nessa zona cinzenta que a grande família de Erenice Guerra se aboletou, e corporações sindicais sentam praça nos cofres do Tesouro, ao lado de movimentos ditos sociais que atuam em estado de semiclandestinidade, em parte financiados pelo contribuinte.

À medida que se envolvia no projeto de eleger a sua desconhecida ministra Dilma Rousseff, enquanto mantinha e até elevava a popularidade, o presidente foi jogando às favas o equilíbrio. Principal atração dos comícios de sua candidata, Lula radicaliza na insensatez. Pode-se dar desconto pelo inevitável aumento de temperatura característico das campanhas eleitorais, mas não é possível ser condescendente quando se invade de maneira desvairada o campo vital das liberdades democráticas.

Até porque o ataque feito por Lula à imprensa, num comício em Campinas, sábado, não é um acidente de rota, um fato isolado no seu governo de quase oito anos; tampouco no seu partido, onde se destilam propostas formais para a “democratização da mídia”, o “controle social dos meios de comunicação”, eufemismos para designar a destruição da independência da imprensa profissional, assim como fazem os governos de Cristina Kirchner e Hugo Chávez, aliados preferenciais da diplomacia companheira no continente.

No sábado, Lula, como se tomado pelo espírito do Rei Sol, um Luis XIV tropicalizado, bradou: “Nós somos a opinião pública.” Em meio a ataques a “alguns jornais e revistas que se comportam como se fossem um partido político(...)”, Lula, na verdade, externou toda a dificuldade que ele, auxiliares diretos e líderes petistas têm de entender o papel da imprensa numa sociedade aberta. Há tempos emana do Planalto a visão de que o governo Lula acabou com os “formadores de opinião”, e agora se sabe que eles foram substituídos, segundo este contorcionismo intelectual, pelo presidente e seu grupo no poder. Numa reedição de um “pai dos pobres” de figurino getulista, o presidente teria hipnotizado as massas, alimentadas por um assistencialismo bilionário, e por isso elas só reproduzirão a opinião do seu redentor.

Mais do que uma tosca engenharia de raciocínio, porém, esta percepção lulista da imprensa deriva de um entendimento autoritário da função dos meios de comunicação: segundo a vulgata ideológica dos intelectuais orgânicos do lulopetismo, a imprensa é um instrumento de manipulação da sociedade.

E, sendo assim, precisa estar subordinada ao partido e ao Estado, os quais, no imaginário desses militantes, se confundem. É inconcebível para esses que a imprensa profissional — que precisa ser rentável para se manter independente, e o mais distante possível de verbas administradas pelos poderosos do momento —cumpra uma função pública, e disto têm consciência profissionais e acionistas das empresas de comunicação.

A visão maniqueísta lulopetista da imprensa leva a que se procure intrincadas conspirações por trás de reportagens de denúncia, um truque que também serve para jogar uma cortina de fumaça à frente de desvios éticos cometidos pela companheirada. Foi assim que o mensalão se tornou produto de uma imprensa “golpista”, bem como a ação dos aloprados.

Denunciado por um aliado desgostoso, Roberto Jefferson, do PTB, o esquema de coleta e lavagem de dinheiro sujo para alimentar uma bancada parlamentar governista gerou um processo que tramita no Supremo Tribunal Federal, depois de aceita denúncia da Procuradoria Geral da República contra essa “organização criminosa”. No escândalo da tentativa de compra de um dossiê falso contra o tucano José Serra, na campanha de 2006 para o governo de São Paulo, petistas proeminentes — os “aloprados”, nas palavras do próprio Lula — foram apanhados em flagrante delito.

Nada porém abala o discurso petista contra manobras “golpistas” da imprensa independente.

Mas não houve qualquer crítica quando, no primeiro governo FH, reportagem do GLOBO derrubou o então presidente dos Correios, Henrique Hargreaves, ao revelar que ele tinha um contrato com o Sebrae, do qual recebia sem trabalhar.

Não se ouviu, também, qualquer reclamação petista quando a “Folha de S.Paulo” relatou histórias de compra de votos de deputados federais a favor da emenda constitucional que permitiria a reeleição de Fernando Henrique Cardoso. Ou na revelação feita pelo GLOBO de que o esquema do mensalão, antes de José Dirceu, Delúbio e Genoino, fora acionado pelo PSDB mineiro no financiamento da campanha frustrada de reeleição do governador Eduardo Azeredo, delito também a ser julgado no STF. E nenhuma admoestação à imprensa partiu do PT na divulgação de cenas pornográficas de corrupção patrocinadas pelo DEM de Brasília.

Imprensa boa é imprensa chapa-branca, deduzse.

Outra prova cabal de como o PT se equivoca sobre o jornalismo profissional foi dada por José Dirceu, cassado no escândalo do mensalão e considerado pelo Ministério Público o chefe da tal “organização criminosa”.

Considerado líder importante no partido, até visto como herói por ter se imolado pela causa petista, Dirceu demonstra continuar com bom trânsito em Brasília, e continua a pontificar.

Na semana passada, ao doutrinar sindicalistas petroleiros na Bahia, o ex-ministro da Casa Civil de Lula comemorou o fato de uma provável vitória da “companheira de armas” Dilma Rousseff facilitar a execução do “projeto político” do PT, difícil de ser aplicado com Lula, pois o presidente em contagem regressiva para voltar a São Bernardo é algumas vezes maior que o partido, explicou. Do projeto, consta o de sempre: “democratização dos meios de comunicação” etc.

Além de considerar que a imprensa brasileira abusa do direito de informar — uma pérola do pensamento da esquerda autoritária —, Dirceu reclamou de uma suposta tentativa das redações de interferir na formação do futuro governo Dilma, algo digno de ficção.

Ora, isto não é função da imprensa.

A não ser que se entendam os meios de comunicação pela ótica do PT: não passam de instrumentos de manipulação política e social.

É gigantesca também a dificuldade de Lula e companheiros entenderem que veículos de comunicação podem não defender partidos e candidatos, mas princípios, e, em função deles, criticar ou elogiar partidos e candidatos.

Trata-se de outro equívoco tentar comparar a postura da imprensa brasileira diante de governos, candidatos e legendas com a de países onde práticas democráticas são seguidas há séculos e existem partidos enraizados na sociedade por gerações.

Deturpar a realidade em razão de cacoetes ideológicos não chega a preocupar.

Costuma acontecer na política e mesmo no mundo acadêmico. O perigo está quando se chega ao poder com este tipo de percepção distorcida.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO

A elite que Lula não suporta

EDITORIAL
O ESTADO DE SÃO PAULO - 21/09/10

Nas encenações palanqueiras em que o presidente Lula invariavelmente se apresenta como o protagonista da obra de criação deste país maravilhoso em que hoje vivemos, o papel de antagonista está sempre reservado às "elites". Durante mais de 500 anos, as elites mantiveram o Brasil preso aos grilhões do subdesenvolvimento e da mais perversa injustiça social. Aí surgiu Lula, o intimorato, e em menos de oito anos tudo mudou. Simples assim.


Com essa retórica maniqueísta, sem o menor pudor Lula alimenta no eleitorado de baixa renda e pouca instrução - seu público-alvo prioritário - o sentimento difuso de que quem tem dinheiro e/ou estudo está do "outro lado", nas hostes inimigas. Mas a verdade é que o paladino dos desvalidos nutre hoje uma genuína ojeriza por uma, e apenas uma, categoria especial de elite: a intelectual, formada por pessoas que perdem tempo com leituras e que por isso se julgam no direito de avaliar criticamente o desempenho dos governantes. Por extensão, uma enorme ojeriza à imprensa. Com todas as demais elites Sua Excelência já resolveu seus problemas. Está com elas perfeitamente composto, afinado, associado, aliado e, pelo menos em outro caso específico, o das oligarquias dos grotões maranhenses, alagoenses, amapaenses e que tais, acumpliciado.
Até por mérito do próprio governo na condução da economia (nem sempre a imprensa ignora os acertos do poder público...), os ventos favoráveis que hoje, de modo geral, embalam o mundo dos negócios, muito especialmente os negócios financeiros, não permitem imaginar que o "poder econômico" considere Lula um inimigo ou uma ameaça e vice-versa. É claro que em público o jogo de cena é mantido, com ataques, sob medida para cada plateia, aos eternos inimigos do povo. Mas na intimidade o presidente se vangloria, em seus cada vez mais frequentes surtos apoteóticos, de que hoje o poder econômico, nacional e multinacional, está submisso à sua vontade. Não é, portanto, essa elite que tem em mente nas diatribes contra os malvados que conspiram contra sua obra redentora.
A revelação de seu verdadeiro alvo Lula oferece cada vez que abre a boca. Como no dia 18, em Juiz de Fora: "Essa gente não nos perdoa. Basta que você veja alguns órgãos e jornais do Brasil (...) Porque na verdade quem faz oposição neste país é determinado tipo de imprensa. Ah, como inventam coisa contra o Lula. Olha, se eu dependesse deles para ter 80% de aprovação neste país eu tinha zero. Porque 90% das coisas boas deste país não é mostrado (sic)."
Então é isto. Imprensa que fala mal do governo não presta, extrapola os limites da liberdade de informar. Não é mais do que um instrumento de dominação das elites.
Assim, movido por sua arraigada tendência ao autoritarismo messiânico que é a marca de sua trajetória na vida pública, Lula parece cada vez mais confortável na posição de dono de um esquema de poder que almeja perpetuar para alegria da companheirada. Um modelo populista, despolitizado, referendado pela aprovação popular a resultados econometricamente aferíveis, mas que despreza valores genuinamente democráticos de respeito à cidadania, coisa que só interessa à "zelite". Tudo isso convivendo com a prática mais deslavada do patrimonialismo, coronelismo, clientelismo, tráfico de influência, cartorialismo, aparelhamento e tudo o mais que Lula e seu PT combateram vigorosamente por pouco mais de 20 anos, para depois transformar em seu programa de governo. E em toda essa mistificação o repúdio às elites é a palavra de ordem e a imprensa, o grande bode expiatório.
O diagnóstico seguinte foi feito, com as habituais competência e sutileza, por um dos mais notórios fantasmas de Lula, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em entrevista publicada no Estado de domingo: "Achei que (Lula) fosse mais inovador, capaz de deixar uma herança política democrática, mostrando que o sentimento popular, a incorporação da massa à política e a incorporação social podem conviver com a democracia, não pensar que isso só pode ser feito por caudilhos como Perón, Chávez, etc. (...) Mas Lula está a todo instante desprezando o componente democrático para ficar na posição de caudilho." Falou e disse. 

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Encrenca contratada
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SÃO PAULO - 21/09/10
 
Quem acompanha o desenrolar da crise nos Correios, gênese do escândalo que derrubou Erenice Guerra da Casa Civil, avalia que as demissões até agora efetuadas estão longe de desarmar as bombas plantadas na empresa. Instalado na presidência há menos de dois meses por Erenice, David José de Matos tem um histórico de relações complicadas com a política do Distrito Federal. Também ligado à ex-ministra, o diretor comercial, Ronaldo Takahashi, já bateu de frente com Pedro Magalhães Bifano, diretor de Gestão de Pessoas afastado em julho, e com o próprio ministro das Comunicações, José Artur Filardi. 
Para entender 1 - Mais de um interlocutor afirma ter ouvido Erenice afirmar que pretendia acabar com o sistema de franquias dos Correios. A disputa em torno das licitações de 1.429 franquias cujos contratos vencem em novembro é tida como uma das causas das recentes demissões na empresa. 
Para entender 2 - Os franqueados estão descontentes com as condições impostas no edital para que continuem com as agências. O ex-presidente Carlos Henrique Custódio teria sinalizado disposição para rediscutir alguns termos, mas a iniciativa foi barrada por Erenice. 
Currículo - Vinícius Castro, primeiro a sair da Casa Civil no escândalo que acabou por derrubar Erenice, não trabalhou na liderança do PT no Senado. 
Verborragia 1 - No PT, a subida de tom de Lula divide opiniões. Uns acham que ela incentiva a oposição a replicar de modo mais forte. Outros acreditam que o problema é dar a impressão de que, diante das denúncias recentes, Dilma só não cai porque o presidente a segura. 
Verborragia 2 - José Eduardo Dutra ocupa a segunda posição, atrás apenas de Lula, no ranking dos mais exaltados no QG petista. 
Varejo - A 12 dias das eleições, o governo federal convidou 4.800 prefeitos de cidades com menos 50 mil habitantes para explicar como eles terão acesso aos projetos da segunda etapa do PAC-2. No portifó lio de obras propostas entre hoje e amanhã em Brasília estão unidades de saúde, creches, escolas e praças poliesportivas. 
Assombração - O medo de que a eleição em São Paulo vá para o segundo turno voltou a rondar a campanha de Geraldo Alckmin (PSDB). O QG tucano considera a possibilidade real, mas, ao mesmo tempo, avalia que ela está sendo turbinada no noticiário por aliados do prefeito Gilberto Kassab (DEM). 
Pit stop - Aloysio Nunes (PSDB-SP), que vinha em ascensão ininterrupta em pesquisas internas tanto tucanas quanto petistas para o Senado, parou de crescer desde o final da semana passada. Ainda que o movimento não seja definitivo, apoiadores receiam que falte tempo para o ex-chefe da Casa Civil de José Serra, quarto colocado na disputa, alcançar Marta Suplicy (PT) ou Netinho de Paula (PC do B).
Vou de Grana - Lula gravou depoimento em vídeo no qual declara voto em Carlos Grana (PT-SP), presidente licenciado da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, para deputado estadual. 
No páreo - A acusação de crime eleitoral feita ontem pelo Ministério Público contra o palhaço Tiririca (PR-SP) não ameaça, ao menos por ora, o registro de sua candidatura a deputado federal. A alegada omissão de dados patrimoniais à Justiça Eleitoral pode resultar em condenação, mas é insuficiente para tirá-lo da disputa.
Bem na foto - As primeiras sondagens eleitorais para a Câmara mostram que o ex-governador Newton Cardoso (PMDB) e o deputado ACM Neto (DEM) devem figurar no ranking de recordistas de votos em Minas Gerais e na Bahia, respectivamente. 
Tiroteio
O uso da TV oficial para filmar evento de campanha é um triste retrato dessa confusão que o PT faz diariamente entre assuntos de partido e assuntos de Estado. 
DO DEPUTADO JOÃO ALMEIDA (PSDB-BA), sobre o uso de funcionários e equipamentos da NBR para registrar comícios com Lula e Dil ma Rousseff 
Contraponto
Aprecie com moderação 
Uma charrete foi deixada a postos para que Marina Silva passeasse no sábado pelo Acampamento Farroupilha, evento anual em Porto Alegre. Ela, porém, recusou a oferta: 
- Melhor não, eu tenho labirintite... 
A candidata verde também evitou o chimarrão, porque a bebida contém cafeína, e, depois de visitar galpão onde dezenas de espetos de carne estalavam no fogo de chão, seguiu direto para um restaurante vegetariano.