XÔ, BUROCRACIA!
BENJAMIN STEINBRUCH
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/07/10
O custo anual da infernal burocracia brasileira é de R$ 46,3 bilhões, que equivalem a 1,47% do PIB
SEMPRE SE soube que entre os principais obstáculos ao crescimento da atividade produtiva no Brasil estavam a falta de capital e o elevado custo dos financiamentos. Esses dois problemas, porém, aparecem hoje em segundo e terceiro lugares na lista de obstáculos. Na opinião dos empresários brasileiros, neste momento há um problema ainda mais importante a inibir o crescimento econômico: a burocracia.
A constatação acima emerge de um trabalho robusto, finalizado em junho pelo Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp. A conclusão central desse documento, publicada na Folha (30/6/10, pág. B1), mostra, pela primeira vez, o tamanho do custo da infernal burocracia brasileira. São R$ 46,3 bilhões por ano, correspondentes a 1,47% do PIB.
Os critérios técnicos que permitiram ao Decomtec chegar a essas conclusões estão expostos no trabalho, de mais de 40 páginas. As comparações feitas entre outros países e o Brasil indicam que, quanto maior é o nível de burocracia, menor é o PIB per capita, a escolaridade e a competitividade do país. Além disso, a burocracia estimula o crescimento da economia informal.
Num momento em que o Brasil é internacionalmente festejado pelo seu desempenho econômico em plena crise global, tornam-se inaceitáveis alguns indicadores competitivos. Dois exemplos: em 2010, segundo o Banco Mundial, o Brasil ficou em 123º lugar na lista dos 183 países mais eficientes em matéria de burocracia; e ocupou o 82º lugar em eficiência alfandegária entre 155 países pesquisados.
Há outras comparações nas quais o Brasil perde de goleada. O trabalho feito pela Fiesp cotejou o Brasil com as nações da OCDE (ricas) em relação a indicadores de burocracia e registrou deficiências impressionantes. Enquanto no Brasil as empresas gastam 2.600 horas por ano para o pagamento de tributos, essa tarefa requer apenas 216 horas na área da OCDE.
Para abrir uma empresa são necessários 16 procedimentos no Brasil e apenas 6 na OCDE. O fechamento de uma empresa leva 4 anos no Brasil, em comparação com 1,8 ano nos países ricos. O custo da demissão de um empregado equivale a 45,89 semanas de salários aqui e a 29,62 na OCDE. Esses exemplos não deixam dúvidas de que, quanto maior é a burocracia, menor é a efetividade dos governos e o poder de competitividade dos países e de suas empresas.
A elevada burocracia também tem um efeito bastante danoso ao colaborar para a criação de um ambiente propício para a corrupção. O acúmulo de exigências formais e a complexidade de procedimentos levam a tentativas de pagamentos de subornos e propinas, como forma de desobstruir os negócios.
Além disso, essas complicações desestimulam a inserção das empresas na economia formal. A informalidade, por sua vez, tem impacto direto na arrecadação tributária, compromete investimentos públicos e retarda o crescimento do país. Chega-se, portanto, à conclusão de que é urgente desburocratizar o Brasil. E não haveria melhor hora do que agora para discutir esse assunto, diante do início das campanhas para a eleição presidencial.
Entre as reformas que o Brasil ainda não fez, há duas que poderão contribuir muito para a redução da burocracia: a tributária e a microeconômica. Na primeira, seria bem- -vinda, além do corte da carga tributária, a simplificação e a diminuição do número de tributos. Há 63 tributos federais, estaduais e municipais no país, com 3.200 normas, 56 mil artigos, 34 mil parágrafos, 24 mil incisos e 10 mil alíneas voltadas para a arrecadação. Há quem chame isso de "manicômio tributário".
Na segunda reforma, espera-se a extinção de uma parafernália de regras, de certidões, de controles cruzados, de registros em cartórios, de cadastros e de licenças que infernizam a vida dos brasileiros, empresários ou não, que se mantêm na legalidade e na formalidade. Seria muito útil que os partidos que pretendem governar o país se manifestassem sobre os pontos incluídos em seus programas a respeito dessas questões.
BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.