sábado, fevereiro 14, 2009
PARABÉNS PARA UMA IRMÃ
FARSA À BRASILEIRA
MUITO IMPORTANTE
DORA KRAMER
No início da semana os ministros Tarso Genro, da Justiça, e José Múcio Monteiro, das Relações Institucionais, fizeram aos presidentes da Câmara e do Senado a entrega solene de uma proposta de reforma política elaborada pelo Executivo.
É a mesma que os mesmos ministros haviam apresentado no dia 27 de agosto de 2008 aos antecessores do senador José Sarney e do deputado Michel Temer à guisa de colaboração para um debate ao qual se esperava o engajamento do Congresso e a apresentação de novas contribuições.
Seis meses depois não aconteceu nem uma coisa nem outra, conforme, aliás, já previam os então comandantes do Congresso. Arlindo Chinaglia, presidente da Câmara, avisou logo que a Casa tinha "outras prioridades".
Garibaldi Alves, presidente do Senado, deu uma volta maior, mas chegou ao mesmo lugar: "Nessa altura é uma discussão utópica, pretensiosa até. Fragilizados, os partidos não estão a serviço de um ideário e sim à disposição dos interesses de seus donatários que chegam a dominar três legendas em um Estado."
Ópera resumida por quem entende do riscado, cada um à sua maneira queria dizer que o governo estava chovendo no molhando, malhando em ferro frio, enxugando gelo e quantas forem as figuras de linguagem disponíveis no idioma para traduzir a absoluta inutilidade da proposta.
Ao menos nesse tipo de abordagem que não vai ao centro da questão, não mobiliza as energias necessárias, não se dispõe a enfrentar os obstáculos com instrumentos eficazes e insiste na mesma sistemática dos fracassos anteriores, aí incluídos os pontos escolhidos para serem "reformados".
Aos seis apresentados em agosto passado a Garibaldi e Chinaglia a título de ponto de partida e agora reapresentados a Sarney e Temer como a reta de chegada na reforma política, o Legislativo não acrescentou uma vírgula.
E, se a previsão feita na época pelo senador Garibaldi Alves estiver correta, o Parlamento tampouco dará votos para aprová-los. À exceção daquele ponto que flexibiliza a interpretação da Justiça sobre fidelidade partidária e permite a troca de partido sem justa causa por um período de 30 dias a cada quatro anos.
"Esse passa fácil", dizia. Os outros morrem de inanição ou de inadequação ao que a sociedade considere aceitável.
Listas fechadas de candidatos sem outras mudanças estruturais, apontava o senador, só aumentarão o poder de manipulação das cúpulas partidárias. Sobre financiamento público: "Será que a população confiará na distribuição correta de um dinheiro que vem do orçamento a fundo perdido?"
A essa avaliação acrescentem-se dúvidas sobre o destino da cláusula de barreira, já declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal e a restrição ao registro de candidatos processados.
Esta última, além de ter sido derrubada na Justiça, não mereceu dos políticos um pingo da atenção pretendida pela campanha contra a eleição de "fichas sujas" patrocinada pela Associação dos Magistrados do Brasil. Logo, não é de se esperar que o veto ganhe votos para virar lei.
Fio da navalha
O deputado ACM Neto, novo corregedor da Câmara, acha mesmo que a tarefa é espinhosa, tem consciência de que caminhará numa corda bamba entre a pressão da opinião pública e as demandas da corporação, mas acha que saberá encontrar o ponto de equilíbrio.
A receita do êxito, na opinião dele, requer sobriedade antes de qualquer coisa. "Quando o corregedor quer aparecer, quer fazer carnaval, dificilmente consegue resultados", diz.
O deputado não vê desconforto especial na primeira missão: o exame do caso de Edmar Moreira, alvo de um pedido de investigação apresentado pelo PSOL em virtude da suspeita de que possa ter usado indevidamente a verba extra de R$ 15 mil mensais.
Moreira foi desligado do DEM, partido do corregedor, que não vê nisso qualquer impedimento à isenção de seu trabalho. "A corregedoria não julga, ela instrui uma investigação sobre um fato específico, no caso o do uso da verba indenizatória. Já o partido faz um juízo político, envolvendo os mais variados aspectos da conduta do parlamentar. São dois critérios distintos."
O cancelamento da filiação partidária deu-se pelo conjunto da obra, enquanto o acatamento, ou não, do pedido de investigação pelo Conselho de Ética, segundo ele, vai se basear apenas nas provas sobre o fato específico. "Se o deputado não serve para ficar no partido não é por isso que deve ser cassado."
ACM Neto por ora adota a tática da boca fechada. Recusa pedidos de entrevistas, evitar até falar em tese sobre questões de natureza ética, não diz o que pensa sobre a conveniência da divulgação de notas fiscais dos gastos da verba extra e antecipa apenas que está formulando "umas ideias" para apresentar na sua primeira reunião da Mesa Diretora.
"Se der um passo em falso, posso ser acusado de parcialidade e prejudicar os processos."
CLÓVIS ROSSI
SÃO PAULO - Aí, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva leva sua candidata do coração a um passeio pelo sertão nordestino. A horas tantas, apresenta: "Dilma, este é o sertanejo, veja como é diferente".
Dilma deslumbra-se e produz uma frase que nunca ninguém antes havia dito neste país (ou em qualquer outro país): "Nós sabemos que aqui no Nordeste há um imenso potencial de homens e mulheres trabalhadores, que muitas vezes, com seu braço, sustentaram o desenvolvimento de outras regiões".
Se a eleição presidencial fosse um torneio do lugar-comum, Dilma passaria facilmente à frente nas pesquisas. E olhe que é um torneio muito disputado, o mais disputado deste país entre políticos. Depois ainda tem gente que se espanta com o fato de que cada vez menos brasileiros se interessam por política.
Até eu, que sou obrigado a fazê-lo por motivos profissionais, só aguento porque a Folha me dá a oportunidade de, vez ou outra, fugir para o exterior, respirar outros ares, ver outros debates, às vezes até piores, conhecer outros políticos, ter ao menos uma chance de entender o que está acontecendo com o mundo nesta quadra confusa, complexa, delicada.
A 22 meses e meio da posse do novo presidente, você aí tem a mais remota ideia do que Aécio Neves, Ciro Gomes, Dilma Rousseff ou José Serra, os principais "presidenciáveis", ou mesmo qualquer outro político relevante, pensa da crise, dos seus desdobramentos, do mundo e do país que emergirão dela, dos novos desafios que surgirão?
Para não falar dos velhos desafios, como a imensa pobreza (o trabalhador brasileiro ganhava, ao final de 2008, menos do que ao final de 2002, apesar do crescimento dos cinco anos mais recentes), a obscena desigualdade, a educação esculhambada, a saúde sempre em frangalhos, a violência e todo o imenso etc. que todos conhecem.
FERNANDO RODRIGUES
BRASÍLIA - É cedo para saber se o PT permanecerá no Planalto com Dilma Rousseff a partir de 1º de janeiro de 2011. Mas já está claro que os petistas hoje estão muito mais parecidos com aqueles do período pré-Lulinha paz e amor. A crise econômica mundial açulou os instintos mais básicos e históricos dos dirigentes do PT. "Teses como a da independência do Banco Central foram para o espaço", resume de forma direta o presidente nacional da legenda, o deputado Ricardo Berzoini (SP).
A companheirada andava macambúzia havia seis anos. Lula havia vencido, mas eles não tinham levado. Agora, rasgaram a fantasia. Ninguém mais fala na "Carta ao Povo Brasileiro", de 2002, o documento usado pelo PT quando flertou com o liberalismo, namorou a banca e bajulou o establishment. A novilíngua petista está na pouco noticiada "resolução política" aprovada pelo Diretório Nacional na última terça-feira -a íntegra está em www.pt.org.br. Acabaram-se as concessões. A hora é de uma "ofensiva contra a ideologia dos senhores do capitalismo neoliberal".
Em meio à crise, os petistas pretendem "encarar os políticos do PSDB e do DEM, seus ideólogos e propagandistas, mostrar que eles não têm condições de dirigir o país". Como será esse embate?
O PT de raiz surfa na crise financeira e nos 84% de popularidade de Lula. Com o discurso antiliberal ressuscitado, muitos no partido já enxergam "Dilma lá".
PANORAMA
REVISTA VEJA
Panorama
Holofote
Felipe Patury
Só no sapatinho
Helio Motta |
Em agosto passado, uma pesquisa encomendada pela Azaléia apontou Grazi Massafera como a celebridade com maior potencial de influenciar as consumidoras na compra de sapatos. O estudo levou a empresa a fechar um contrato com a atriz e lançar a coleção Grazi Azaléia há três semanas. A propaganda desses produtos na TV só começa neste domingo, mas, mesmo sem ela, já foram vendidos 250 000 pares da nova linha. A expectativa da Azaléia é chegar a 2 milhões neste ano.
Tiraram a sorte grande
José Cruz/ABR |
A cúpula do PMDB na Câmara passará o Carnaval em Las Vegas. Comandada pelo líder do partido, Henrique Eduardo Alves (RN), a trupe inclui os deputados Eunício Oliveira (CE) e Alexandre Santos (RJ). O presidente da Câmara, Michel Temer (SP), não confirmou presença. Convidados, Eduardo Cunha (RJ) e o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, preferiram outros destinos. O objetivo da excursão à capital mundial da jogatina é comemorar a vitória de Temer na eleição da Câmara e a volta de seu grupo ao centro do poder. Entre uma cartada e outra, eles traçarão uma estratégia para manter Temer também na presidência do partido. A viagem já foi até apelidada de "Despedida em Las Vegas". Despedida de quê? Das vacas magras, ora.
Barraco na Fiesp
Canella/Folha Imagem |
Em março, a Fiesp expulsará, pela primeira vez, uma associação de seus quadros. Será o Sindicato da Micro e Pequena Indústria de São Paulo (Simpi), presidido porJoseph Couri. A expulsão significa o desenlace de uma disputa travada desde 2005, quando o Simpi foi reconhecido pelo Ministério do Trabalho. Naquele ano, trinta sindicatos pediram que a associação fosse desligada da Fiesp, sob a alegação de que ela aliciara empresas representadas por outras entidades. O Simpi revidou, movendo 200 ações contra a Fiesp. A diretoria da federação decidiu pela expulsão em novembro. A decisão deve ser ratificada pelo conselho.
A volta dos mensaleiros
Cristina Gallo/BG Press |
Acusados de organizar o mensalão no PP, os ex-deputados José Janene e Pedro Corrêa não desistem de retomar o controle do partido. Um dos remanescentes dessa turma que ainda tem mandato, o deputado João Pizzolatti, de Santa Catarina, tenta emplacar seu colega mineiro Luiz Fernando Faria na presidência do partido. Hoje, o cargo pertence ao senador fluminense Francisco Dornelles, que não faz menção de cedê-lo. A eleição ocorre no próximo mês.
O Inbursa brasileiro
Jason Decrow/AP |
Dono da Claro e da Embratel, o mexicano Carlos Slimcogita investir no setor bancário brasileiro. Em janeiro, pediu informações sobre o sistema financeiro nacional ao banqueiro Joseph Safra, seu amigo. A tarefa de analisar as oportunidades do mercado local está a cargo de seu filho, Marco Slim, que preside o banco Inbursa.
A estreia de Ronaldo no Timão
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INFORME JB
Juras de fidelidade no bunker do blocão
Jornal do Brasil - 14/02/09
O blocão da Câmara – que reúne os 14 partidos apoiadores da vitória do deputado Michel Temer (PMDB-SP) à presidência da Casa – fez a festa da conquista, quarta-feira à noite, no restaurante La Torreta, na Asa Sul de Brasília. A turma foi parar na seleta adega subterrânea da casa, um espaço exclusivo onde uns 30 deputados – entre eles os líderes dos partidos – comemoraram a ascensão. Quem estava lá relata que o jantar foi um festival de juras de fidelidade a Temer, de deixar constrangido qualquer ministro do TSE que julga traição partidária. Temer aproveitou o encontro e discursou: "Independentemente das diferenças partidárias, espero que haja respeito e união". E, para alegria de todos, o presidente da Casa terminou com um "quero construir um Parlamento forte".
Panelinha Mea-culpa
Estavam lá, e se esbaldaram nos bons vinhos, entre outros, os deputados: José Aníbal (PSDB-SP), Júlio Delgado (PSB-MG), Cândido Vacarezza (PT-SP), Albano Franco (PSDB-SE), Ronaldo Caiado (DEM-GO), ACM Neto (DEM-BA), o carioca Miro Teixeira (PDT) e o paulistano Jilmar Tatto (PT).
O ex-presidente Arlindo Chinaglia (PT-SP), um dos promoters do jantar, exaltou avanços da gestão. E fez, digamos, um mea-culpa sobre o que faltou. Mas nem assim deixou de ser aplaudido.
Que notas?
No encontrão da adega-bunker, diante de preocupação geral, surgiu o consentimento entre os líderes: nada de polêmica ou CPI sobre notas fiscais de prestações de contas. Claro, todo mundo tem rabo preso.
Maldição do Edmar
É que o DEM e o PSOL cobram do ex-corregedor-relâmpago Edmar Moreira, deputado do DEM-MG, as notas de prestações de contas. A polêmica vai parar nisso.
Roriz, o retorno
O ex-senador Joaquim Roriz (PTB-DF), que renunciou para escapar da degola, inaugura dia 8 de março escritório político no Setor de Indústrias Gráficas de Brasília. Para atender aliados e líderes comunitários.
Corpo docente
O governo federal criou grupo de trabalho interministerial para propor soluções para o aprimoramento do ensino superior. A medida atende a determinação do TCU, depois de auditoria em 16 universidades federais.
Rosinha reloaded
Depois da campanha pela instalação de refinaria no estado do Rio, a ex-governadora Rosinha Garotinho, prefeita de Campos (RJ), promete entrar na luta contra a redistribuição dos royalties.
Pajelança
A ex-governadora ainda tem bom trânsito no PMDB, ao contrário do marido, Anthony Garotinho. Foi recebida em Brasília pelos presidentes da Câmara e do Senado, Michel Temer e José Sarney. Que prometeram apoio.
Cofrinho
Rosinha voltou para Campos com dinheiro no cofre: R$ 30 milhões do Ministério da Integração Nacional para a recuperação dos canais da Baixada Campista e outros R$ 50 milhões da Secretaria Nacional dos Portos para a dragagem do Canal das Flechas
Reciclagem
De 2007 para o ano passado, a Tetra Pak reciclou cerca de 5 mil toneladas mais de embalagens pós-consumo – aumento de 7%. Ao todo, 52 mil toneladas de embalagens voltaram a ser matéria-prima para outros produtos como telhas, canetas, parafina para indústria de cosméticos.
Água municipal
O prefeito de Duque de Caxias, Zito (PSDB), tem um levantamento técnico dos bens da Cedae na cidade, inclusive redes de tubulação instaladas e histórico de ligações de água. Promessa de campanha, quer municipalizar a água.
Lentão
O Sedex normal, cujos Correios prometem entregar no dia seguinte em qualquer lugar, está chegando ao destino em algumas cidades com até três dias de atraso. E de capital para capital.
PARA...HIHIHIHI
- Deve ser enterrado em Garanhuns. Afinal, é sua cidade natal.
Então um bêbado, que não se sabe como entrou na reunião, disse com aquela entonação típica dos bebuns:
- Em Garanhuns pode... Só não pode em Jerusalém!
Como estava de fogo, ninguém deu bola para o que ele disse.
Um segundo ministro disse:
- Acho que deve ser em São Bernardo, onde ele viveu e fez sua carreira sindical e política.
O bêbado mais uma vez interveio:
- Em São Bernardo pode... Só não pode em Jerusalém!
Novamente, ninguém deu ouvido a ele.
Um terceiro ministro finalmente sugeriu:
- Nem em Garanhuns nem em São Bernardo. Deve ser enterrado em Brasília pois era Presidente da Republica e todos os Presidentes devem ser enterrados na Capital Federal.
E o bêbado novamente:
- Em Brasília pode... Só não pode em Jerusalém!
Aí, perderam a paciência com o cara:
- Ô meu, por que este medo que o Lula seja enterrado em Jerusalém?
E o bêbado respondeu na bucha:
- Porque uma vez enterraram um cara lá e ele RESSUSCITOU!...
VILLAS-BÔAS CORRÊA
Coisas da Política - A lição que se aprende em casa
Jornal do brasil -14/02/09
O presidente Lula conseguiu dar a volta por cima de uma das mais complicadas enrascadas em que se envolveu por precipitação e com a dose excessiva de empáfia, na crise de nervos, muito parecida com o chilique, da sua irritada reação à cobertura da imprensa à festa de arromba, que reuniu em Brasília cerca de 5 mil prefeitos, acompanhados das respectivas esposas e familiares, além de secretários, convidados, amigos e penetras, a pretexto do lançamento do programa federal, ensopado de demagogia, de socorro às prefeituras endividadas.
Durante os dois dias do magno espetáculo, Brasília viveu o sonho da capital projetada por Lúcio Costa enriquecida pelo gênio de Oscar Niemeyer. E, no pódio, ao lado do presidente Lula, a presença da ministra Dilma Rousseff, candidata da sua escolha pessoal, que o PT engoliu disfarçando a careta e já agora com o sorriso aberto pela esperança de mais um ou dois mandatos na folia do poder.
Ninguém neste país, por mais desatento ou desligado, deixou de reconhecer o evidente sentido eleitoreiro, com o duplo objetivo de apresentar a candidata aos prefeitos, que controlam as bases municipais e do oba-oba sobre as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), entregue de bandeja à gerência da ministra-candidata.
Ora, o que tanto irritou o presidente nas reclamações à cobertura da imprensa obtusa, que ainda não percebeu que "acabou o tempo em que alguém achava que podia interferir numa eleição porque é formador de opinião"?
Passa pelo mau humor presidencial a vaidade de quem se considera – e com boas razões – o dono do eleitorado, com 86% de aprovação nas últimas pesquisas, capaz de inventar uma candidata, impor ao PT a sua aceitação e confiar, com a certeza dos iluminados, na sua eleição em 5 de outubro de 2010. Já é ir longe demais especular sobre o sonho de mais um mandato, lá para 2014 ou 2018, se a reeleição resistir à adiada reforma política. A vaidade, misturada com orgulho e presunção, subiu à cabeça presidencial na festa de arromba de dois dias de badalação em torno da ministra-candidata e do pacote de generosidade aos prefeitos. E, francamente, passou dos limites do bom senso. Ora, para anunciar não apenas aos prefeitos e suas famílias as obras do PAC, com a ministra-candidata a tiracolo mas, ao país, seria mais simples, muito mais econômico, utilizar a poderosa rede pública de emissoras de rádio e televisão ou apelar para a rede nacional. E com a vantagem nada desprezível da audiência em todo o país.
Certamente, ao presidente ou a seus atentos assessores ocorreu a solução óbvia. Mas Lula sonhou o espetáculo da reunião em Brasília de todos os prefeitos, suas famílias, secretários e cupinchas. E ficou indignado quando a mídia registrou o óbvio.
Ao abrir a guarda, Lula colheu agrados e petelecos em doses variadas. Do presidente nominal do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), com engulhos, a rosa murcha da rendição incondicional: "Certamente que a ministra Dilma vai estar liderando a luta do nosso projeto democrático e popular no próximo ano". Mas o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não perdeu a oportunidade de encaixar a reprimenda: Lula está antecipando o processo eleitoral. E em recado direto: "Se Lula continuar forçando a campanha antecipada, o PSDB pode ir ao TSE pedir autorização para fazer campanha também".
A sugestão de FHC não pode ser levada ao pé da letra, pois nenhum partido se exporia ao ridículo de bater às portas do Tribunal Superior Eleitoral para pleitear o descumprimento de um dispositivo constitucional. Os dois dias da milionária festança eleitoral do Encontro Nacional dos Prefeitos em Brasília prometem render ao presidente mais aborrecimentos do que benefícios. A candidatura da ministra Dilma já estava lançada há vários meses e reafirmada em inúmeras declarações do seu patrono. Dilma assumiu a prenda com natural deslumbramento e algum exagero, com a exposição das correções plásticas, a reforma do vestuário e a mudança do temperamento seco para a euforia de quem vive o sonho das mil e uma noites. E ninguém segura a ministra repaginada e inteiramente à vontade no novo desafio. Se a oposição continuar no chove-não-molha das picuinhas entre os governadores José Serra e Aécio Neves, sozinha no palco, Dilma pode disparar nas pesquisas e virar o jogo.
DIOGO MAINARDI
Diogo Mainardi
Preconceito ai funghi
"A paz no Oriente Médio depende, antes de tudo,
do reconhecimento de Israel. Os palestinos precisam
rejeitar a ideia mais monstruosa de todos os tempos:
a de que um judeu é um cogumelo venenoso.
Um cogumelo venenoso que tem de ser erradicado"
Avigdor Lieberman. É o cogumelo venenoso da semana. O cogumelo venenoso é o tema de um conto infantil publicado na Alemanha nazista.
A mulher pergunta:
– Quem é o cogumelo venenoso da humanidade?
O jovem Franz responde:
– Os judeus.
A mulher completa:
– Sim, meu filho. Assim como um único cogumelo venenoso pode matar uma família inteira, um judeu sozinho pode destruir uma aldeia inteira, ou uma cidade inteira, ou um povo inteiro.
Avigdor Lieberman foi um dos maiores vencedores da disputa eleitoral em Israel. Ele comanda o partido ultranacionalista Yisrael Beiteinu. De um dia para o outro, a imprensa o identificou como o cogumelo venenoso do Oriente Médio, ainda mais daninho do que o cogumelo nuclear iraniano. Aparentemente, ele, sozinho, conseguiu destruir qualquer possibilidade de paz com os palestinos. O jovem Franz sabe perfeitamente: se alguém destruiu qualquer possibilidade de paz com os palestinos, só pode ter sido um judeu.
Um dos planos de Avigdor Lieberman é cassar a cidadania dos árabes israelenses que se recusarem a jurar lealdade ao estado. O sucesso de seu partido foi amplamente interpretado como um sinal de apoio do eleitorado às ideias mais medonhas. Isso é um erro. Um erro que só tem o efeito de criminalizar o eleitorado de Israel. O eleitorado judeu. Primeiro: o crescimento do Yisrael Beiteinu, o partido de Avigdor Lieberman, tem de ser corretamente dimensionado. Em 2006, ele recebeu 9% dos votos. Agora recebeu 11,6%. Cresceu? Cresceu. Mas o resultado é praticamente igual ao de outros partidos ultranacionalistas da Europa, como o de Jean-Marie Le Pen. Mais um dado: em 2006, o Yisrael Beiteinu ganhou onze cadeiras no Parlamento israelense. Na semana passada, ganhou quinze. Nesse mesmo período, os principais partidos religiosos de Israel, compostos por fundamentalistas que prometem governar com a Torá, perderam quatro cadeiras. No fim das contas, um radicalismo acabou canibalizando o outro: quatro cadeiras para cá, quatro cadeiras para lá. Saldo: zero.
A paz no Oriente Médio, na realidade, está mais perto do que antes. Apesar de Avigdor Lieberman. Apesar do jovem Franz. A paz no Oriente Médio está mais perto do que antes porque Israel bombardeou Gaza e desbaratou o Hamas. Poderia ter sido melhor? Sim. Poderia ter sido melhor. Bem melhor. O comandante da artilharia israelense declarou que Israel perdeu a oportunidade histórica de esmagar o poder militar do Hamas, retirando suas tropas precipitadamente, quando os terroristas pareciam à beira do colapso. Mesmo assim, o Hamas está desmoralizado. O Hamas e suas fantasias genocidas. A paz no Oriente Médio depende, antes de tudo, do reconhecimento de Israel. Os palestinos precisam rejeitar a ideia mais monstruosa de todos os tempos: a de que um judeu é um cogumelo venenoso. Um cogumelo venenoso que tem de ser erradicado.
GUSTAVO IOSCHPE
REVISTA VEJA
Artigo Gustavo Ioschpe
Falência educacional:
complô ou lógica?
"Quem coloca seus filhos em escolas particulares (12% do total das matrículas da educação básica) comete um grave equívoco: acredita que essas escolas são boas apenas porque são melhores do que as escolas públicas. Assim, despreocupa-se da educação dos filhos e da qualidade da escola pública"
Quando se fala em educação no Brasil, algo não faz sentido. Todos exaltam o benefício da educação e apontam-na como a solução de nossos problemas. Todos parecem engajados em sua melhoria. Apesar desse consenso e da boa vontade, nossas escolas patinam, e sua qualidade só tem decaído. Para explicar essa curiosa dissonância, era comum ouvir, dez anos atrás, a ideia de que nosso fracasso na área se devia à falta de "vontade política" de nossos governantes, ou ainda ao complô das elites pela alienação do proletariado, ou, finalmente, às imposições do Fundo Monetário Internacional (FMI), que supostamente exigia o corte de gastos na educação em seus acordos com o país.
De lá para cá, os dotados de "vontade política" chegaram ao poder, as elites de antanho deram lugar à república dos sindicalistas e o Brasil já não precisa mais da tutela do FMI, ao qual não deve nada. Mas a melhora esperada não veio. O resultado do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2005 é mais baixo que o de 1995. Apesar disso, o discurso da área educacional continua o mesmo. Será que eles estão certos, e que há um complô tão poderoso a favor da nossa ignorância que nem os próprios atores da nossa tragédia percebem a sua insignificância? Estariam as "forças ocultas" de Jânio Quadros rondando novamente os palácios, de onde talvez jamais tenham saído? Ou será que nosso atraso é mais compreensível à luz de uma análise racional dos envolvidos na área, presumindo-se que eles agem de maneira lógica e maldosa? Creio que a segunda hipótese é a mais provável: nossa inércia é compreensível se entendemos a economia política dos grupos envolvidos.
Comecemos pelos alunos. Eles aprendem muito pouco, e são os maiores interessados em seu próprio sucesso acadêmico. Por que não protestam? Há, em primeiro lugar, a questão etária: não é possível imaginar que crianças de 10 ou 12 anos se mobilizem em passeata pública por um ensino de melhor qualidade. Quando os alunos se dão conta das deficiências do seu ensino, costuma já ser tarde demais, e a própria carência educacional dificulta a reclamação: é improvável que um semiletrado escreva um artigo cativante ou uma carta pungente ao seu congressista. Em segundo lugar, os alunos são condicionados pelo seu sistema de ensino a acreditar que o culpado pelo insucesso do aluno é ele mesmo. Nessa missão, seus mestres são extremamente efetivos: em pesquisa recente da Unesco, 82% dos alunos ouvidos dizem que, se o aluno não passa de ano, a culpa é sua, muito mais que da escola (mencionada por apenas 5%) ou dos professores (3,7%). Para piorar, os próprios pais culpam o filho pelo insucesso na escola: pesquisa publicada no livro A Escola Vista por Dentro indica que 63% dos pais da escola municipal e 54% dos da estadual culpam o filho por sua repetência. Cercados por esse mar de desconfiança e assolados pelo próprio desconhecimento, os alunos protestam mais com os pés que com a cabeça: quando entendem que a escola lhes consome muito tempo sem dar muito em troca, abandonam-na.
Juca Varella/Folha Imagem |
O FMI SE FOI |
O próximo grupo de interessados pela educação é o dos pais dos alunos. Por que eles aceitam bovinamente uma péssima educação para seus filhos? Aqui devemos dividir esse universo em dois: há o grupo de classe média e alta, que coloca os filhos em escola particular, e o restante da população, que usa a escola pública.
Quem coloca seus filhos em escolas particulares (12% do total das matrículas da educação básica) comete um grave equívoco: acredita que essas escolas são boas apenas porque são melhores que as escolas públicas. Assim, despreocupa-se da educação dos filhos e da qualidade da escola pública. O problema é que a escola particular é também muito ruim – basta ver os resultados dos alunos de alto nível socioeconômico em testes internacionais como o Pisa, em que nossos alunos ricos têm desempenho pior que o dos alunos mais pobres dos países desenvolvidos. E o segundo problema é que, como a escola pública forma, via de regra, os professores da escola particular, enquanto não melhorarmos todo o sistema, não teremos educação de qualidade para ninguém. Mas os pais das escolas particulares não entendem isso; afastam-se da questão educacional por acreditar que essa problemática não os afeta.
Esperar-se-ia, porém, que os pais de alunos da escola pública (os outros 88% das matrículas) estivessem profundamente descontentes com a educação dos filhos e bradando por sua melhoria. Mas não estão: as pesquisas apontam que, pelo contrário, estão satisfeitos com a escola das crianças. Essa visão não é causada por preguiça ou desinteresse, mas por despreparo. Pesquisa do Inep mostrou que quase 60% dos pais do ensino público não completaram nem o ensino fundamental, 73% têm renda inferior a três salários mínimos, três quartos nunca ou raramente leem jornal. Pesquisas qualitativas mostram que esse pai compara a escola da sua época – em que faltava vaga, não havia merenda nem transporte – com a escola do filho. Vendo todas as benesses materiais que o filho recebe, associa-as a uma educação de boa qualidade. Reclama quando o professor falta à aula, mas é só. Se o pai acha a escola boa e o filho vai mal, então é natural que o pai culpe o filho e exima a escola, perpetuando o sistema roto.
Depois dos pais, temos os diretores escolares. Destes, segundo o MEC, 60% são indicados pelo Poder Executivo de sua cidade ou estado. Menos de 10% são concursados, outros 19,5% são eleitos. É provável que a maioria, indicada por políticos, não esteja disposta a bancar grandes revoluções em suas escolas, que poderiam levar à sua destituição – especialmente se prescrevessem aos seus professores as medidas impopulares que estão associadas ao melhor desempenho acadêmico, como uso constante de dever de casa, avaliação de alunos, redução do absenteísmo docente, uso intensivo de material didático e utilização do tempo de aula para tarefas expositivas, e não cópia do quadro-negro ou realização de exercícios. A maioria dos diretores é composta de ex-professores, o que reforça o corporativismo, e não há no Brasil instituições de ensino que preparem uma pessoa para o ofício de diretor escolar, de forma que mesmo os diretores bem-intencionados são frequentemente despreparados.
Vejamos o professor. Por que ele não produz uma educação de melhor qualidade? Em primeiro lugar, porque não consegue. O professor brasileiro tem uma péssima formação e não é preparado para encarar uma sala de aula do Brasil real, especialmente em áreas de vulnerabilidade social. Em segundo lugar, porque é tomado por um viés ideológico que torna o sucesso acadêmico insignificante. Em pesquisa da Unesco, só 8,9% dos professores indicaram "proporcionar conhecimentos básicos" como uma das finalidades importantes da educação. "Formar cidadãos conscientes" ficou com 72,2% das preferências. Confrontados com o seu fracasso, então, nossos professores têm duas respostas-padrão: ou culpam o aluno e seus pais, ou culpam a visão neoliberal e reducionista de quem reclama da escola que forma analfabetos, porque a educação "é muito mais do que isso".
Finalmente, chegamos à última peça dessa engrenagem, aquela que é paga e eleita para administrar o sistema e zelar pelo bem comum: os políticos. Se o político for desonesto, a educação será um ótimo lugar para tirar dinheiro: não só concentra uma parte grande do orçamento (no mínimo 25%) como ainda é cheia de transferências do governo federal. Tem uma grande vantagem: se o sujeito rouba da saúde e faltam remédios ou médicos, a população chia; se rouba dos transportes e faltam ônibus, os eleitores reclamam; se rouba da educação e os alunos não aprendem, ninguém se importa. Mas, mesmo que o político seja honesto e comprometido com o progresso da sua região, é confrontado com uma decisão indigesta: se ele quiser mesmo reformar seu sistema educacional, terá de parar de investir em merenda ou em prédios e investir na formação de diretores e professores, terá de cobrar o seu desempenho, terá de mobilizar pais e alunos, terá de remanejar professores e funcionários incompetentes. Tudo isso causa des-conforto. Se a experiência de estados reformistas na área, como São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais ou Sergipe, servir de exemplo, o descontentamento descambará em greve. Os professores são uma das categorias profissionais mais numerosas e vocais em suas reclamações. Os beneficiários dessas reformas mal sabem que têm um problema e, portanto, não reconhecerão a melhoria. Se tiverem de deixar de trabalhar para cuidar dos filhos sem aula por causa da greve, perigam ser contrários às reformas. O lógico, nesse caso, para os políticos, é fazer o quê? Exatamente: nada. Assim vamos ficando, ano a ano, mais ignorantes e despreparados.
CLAUDIO DE MOURA CASTRO
Claudio de Moura Castro
Vamos de mal a pior?
"Como disse lorde Rees de Ludlow, ‘para a maior
parte das pessoas, na maior parte das nações,
nunca houve um momento melhor para viver’"
Alguns só conseguem enxergar o lado feio do mundo. E, como só notícias ruins dão manchete, deleitam-se em ver confirmados seus piores enredos. Mas, no que se pode medir ou contar, a história é outra. O mundo hoje está pior? Vamos compará-lo com o de um século atrás. Jamais houve tanta liberdade e o crescimento das democracias foi extraordinário. Entre elas já não há guerras. Nos conflitos recentes, pelo menos um lado é ditatorial. Na última década, reduziram-se em 40% as guerras. Houve também dramática redução das mortes violentas, que, no passado, ceifavam 25% da população masculina. Hoje são só 2%. Nas praças públicas, o povo via os acusados de heresia, bruxaria e magia negra serem assados em fogueiras. A razão e a ciência ajudaram a lançar luzes nessas áreas. Além disso, a ciência hoje é capaz de captar, entender e resolver boa parte dos problemas materiais que afligem a humanidade – incluindo os desastres do meio ambiente.
Ilustração Atômica Studio |
Antes da Revolução Industrial, um operário só possuía a roupa do corpo. Sua maior riqueza eram os pregos de sua casa. Há menos de dois séculos, um europeu trabalhava sessenta horas por semana, dos 10 anos de idade até a sua morte, por volta dos 50 anos. Educação, cultura e lazer chegaram também aos pobres. Acabou-se a fome causada por calamidades naturais, como a que matou metade da população da Irlanda, no século XIX. Luís XIV não tinha a variedade nem a qualidade do cardápio de um reles membro da classe média de hoje. O povo francês consumia 2 000 calorias por dia. Hoje, nos países pobres, consomem-se 2.700.
Haverá algum país que estava pior que o Brasil em 1900 e hoje lhe passous à frente? Não encontrei nenhum. A maioria dos países latino-americanos, incluindo o Peru, era bem mais rica do que o Brasil. A renda per capita da Argentina foi cinco vezes maior (hoje é quase igual). Em 1950, o Brasil era como a Bolívia de hoje. Em 1958, Cuba era o segundo país mais rico da América Latina. Desde então, não fez senão retroceder. E a Coreia? Na década de 50, vítima de uma medonha guerra fratricida, até os pauzinhos de comer passaram a ser de metal, pois não havia mais árvores. Mas a Coreia é uma civilização milenar, com sólida tradição de ciência e educação. Portanto, é uma comparação discutível. O Brasil avançou, do último século para cá? Quem duvida do atraso do Brasil no passado que leia as tenebrosas narrativas dos muitos visitantes que por aqui viajaram. O século XX transformou espetacularmente o país. Entre 1870 e 1987 o PIB brasileiro cresceu 157 vezes, o japonês 87 e o americano 53. Brasil, campeão do mundo!
Por volta de 1900, a esperança de vida era inferior a 30 anos. Hoje já ultrapassou 70. A desnutrição grave é residual e acabaram-se as fomes catastróficas. Quase todos têm hoje acesso a serviços médicos (não tão bons, mas antes não havia nada). Nos confortos materiais, houve avanços espetaculares. Mais de 90% têm água encanada, eletricidade, televisão, geladeira e dezenas de outros confortos. Meus colegas do primário iam descalços para a escola. Como entendeu Schumpeter, foram os pobres que mais ganharam qualidade de vida com o crescimento. Em 1900, 95% das crianças (entre 7 e 14 anos) não frequentavam escolas. Hoje, apenas 2% ficam de fora. E, contrariando as fantasias saudosistas, os poucos que iam encontravam uma escola medíocre. Hoje, continua medíocre, mas é para todos e há ilhas de excelência. Crescendo junto com a educação, nossa democracia nunca esteve tão robusta. Nem tudo são rosas. Há áreas em que somos péssimos, como a distribuição de renda. Em matéria de segurança, há oscilações. Contudo, as mortes violentas encolheram muito. Em corrupção, faltam dados confiáveis. Mas, em praticamente tudo o que podemos contar ou medir, pior não estamos. Essa é a tese do ensaio. Como disse lorde Rees de Ludlow, "para a maior parte das pessoas, na maior parte das nações, nunca houve um momento melhor para viver".
Os pessimistas que fiquem com seus resmungos, pois os avanços em praticamente todas as direções estão bem medidos. Os fatos não lhes dão razão (e, segundo o Gallup, nossa juventude é campeã mundial de otimismo). Porém, não podemos festejar a situação presente, pois para o progresso futuro precisamos ser obstinadamente inconformistas.
J. R. GUZZO
J.R. Guzzo
Fecho de ouro
"Uma pesquisa realizada algum tempo atrás
revelou que o bicho que os brasileiros achavam
mais parecido com os políticos era o rato"
Michel Temer? José Sarney? Quem são? Todo mundo deveria estar muito impressionado com os dois, pois são os novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal; trata-se, segundo garantem os cientistas políticos, de figuras importantíssimas para o presente e o futuro do Brasil. Mas não é nem de um nem de outro que o público está falando. O grande nome do momento no Congresso Nacional é o deputado Edmar Moreira. Normalmente esse Edmar, cuja base eleitoral está no interior de Minas Gerais, não deveria chamar maior atenção – não há muito, no fundo, que o torne diferente de boa parte dos deputados e senadores brasileiros. Ele responde a inquérito no Supremo Tribunal Federal, acusado de embolsar as contribuições feitas ao INSS por funcionários de suas empresas. Não declarou, nem à Justiça Eleitoral nem ao imposto de renda, um espantoso castelo de 7 500 metros quadrados construído perto de São João Nepomuceno, em Minas, e que tenta vender por 25 milhões de reais. Está sendo processado em São Paulo, numa vara cível, pelo não pagamento de uma dívida de 1,9 milhão de reais ao Banco do Brasil; numa vara penal, é acusado de cometer crimes contra a ordem tributária. Responde a 2 000 ações trabalhistas, é suspeito de desviar verbas funcionais e retira seus salários de deputado em dinheiro vivo, na boca do caixa, o que impede a Justiça de bloqueá-los em favor dos credores. Em resumo: o deputado Edmar Moreira é um retrato perfeito do parlamentar brasileiro de hoje.
Tanto é assim que ele foi eleito segundo-vice-presidente da Mesa da Câmara, na mesma eleição que mobilizou, durante meses, os gigantes da nossa política. Foi eleito, na verdade, de caso pensado: outro traço notável na carreira do deputado, além dos listados acima, é que ele se destacou nos últimos anos como um dos campeões na defesa de colegas ameaçados de punição. Votou contra sete pedidos de cassação de deputados envolvidos no mensalão – e agora, com o seu cargo na Mesa, teria a função de corregedor, ou seja, caberia justo a ele vigiar a moralidade dos colegas. A história toda, como se sabe, acabou em lágrimas. A chave do sucesso, para políticos como Edmar, é falar pouco, fazer menos ainda e aparecer o mínimo possível; não pode ser, numa palavra, o que o povo chama de exibido. Mas o deputado resolveu anunciar que dali por diante, sendo ele o corregedor, a Câmara não iria julgar mais ninguém – e não se recomenda dizer esse tipo de coisa em voz alta.
O Congresso Nacional, de tempos em tempos, funciona por vias misteriosas; uma delas é o seu instinto para cheirar casos perdidos. Nessas horas, como se viu mais uma vez, larga os feridos sangrando na beira da estrada e segue viagem sem olhar para trás. O novo presidente da Câmara chegou a esboçar um "acordo" para o deputado ficar na vice-presidência mas não exercer a função de corregedor, um disparate que não durou mais do que algumas horas, da mesma forma como foram rapidamente a pique outras moles tentativas de salvá-lo. Já no começo da semana passada Edmar demitiu-se da corregedoria, renunciou à vice-presidência e pediu desligamento do seu partido; trata, agora, de segurar o mandato. Os mesmos deputados que tinham acabado de votar nele porque era um defensor da impunidade o abandonaram quando disse em público que continuaria agindo assim mesmo, uma vez instalado na Mesa. Seu partido, o DEM, que há anos acha tudo perfeitamente normal com Edmar, descobriu de repente que sua conduta era intolerável, e iniciou procedimentos para a sua expulsão. O líder do PT, partido que tanto ficou devendo ao deputado na época do mensalão, iniciou o episódio como um dos seus principais advogados; depois sumiu de cena e não foi mais encontrado. Um fecho de ouro, sem dúvida, para uma eleição na qual a palavra mais utilizada durante a campanha foi "traição".
Uma pesquisa realizada algum tempo atrás revelou que o bicho que os brasileiros achavam mais parecido com os políticos era o rato – um duro golpe para os ratos, animais que já têm sérios problemas de imagem junto à opinião pública e realmente não precisavam de mais essa. Não há mudanças à vista. Na semana passada o governo entregou ao Congresso sete projetos de reforma política; nenhum deles muda um milímetro nas causas que produzem espetáculos como o do deputado Edmar, ou que permitem a volta ao status de grandes estrelas do Senado, sob a presidência de José Sarney, dos portadores de alguns dos mais tenebrosos prontuários da casa. O Congresso fica apenas cada vez mais parecido consigo mesmo.
SÁBADO NOS JORNAIS
- Globo: Bancos dão trégua a Obama e suspendem despejos nos EUA
- Folha: Recessão se aprofunda na Europa
- Estadão: Para Lula, empresas demitem em excesso
- JB: Olimpíada trará ao Rio mais R$ 12,8 bi
- Correio: Classe média reage
- Valor: Tesouro deve pôr capital no BB para aumentar crédito
- Gazeta Mercantil: Pacote paulista garante R$ 20 bi para o estado
- Estado de Minas: Juvenil Alves é cassado
- Jornal do Commercio: Polícia da Suíça desmente advogada