sábado, janeiro 31, 2009

PANORAMA

REVISTA VEJA

Panorama
Holofote

Felipe Patury

 

Os inimigos da Vale

Germano Luders


No front nacional, uma das maiores preocupações da Vale é com dois sindicatos de Minas Gerais: os Metabase de Itabira e de Ouro Preto. Eles nem sequer responderam à proposta da empresa de reduzir salários para evitar demissões. Ambos são ligados ao PSTU e à central sindical Conlutas, que reza pela cartilha do MST. O presidente da Vale, Roger Agnelli, teme que a empresa seja apresentada pelo PSTU como vilã da crise econômica ou que sofra em Minas problemas como os que já teve no Pará, onde suas propriedades foram invadidas.

 

Por Serra, até licença

Mario Rodrigues


É o que basta para dirimir qualquer dúvida que ainda reste sobre o grau de envolvimento do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, no projeto de eleger o governador José Serra à Presidência da República em 2010. Para coordenar a campanha do padrinho, Kassab não descarta pedir licença do cargo. Ressalte-se: o prefeito não pretende deixar o posto. Apenas avisa que está disposto a fazê-lo caso seja necessário. Se isso ocorrer, fará um agrado extra ao PMDB, partido de sua vice, Alda Marco Antonio.

 

Meu querido paiol

Marcello Casal Jr/ ABR


A maioria dos funcionários do Ibama em Brasília não sabe, mas dá expediente sobre 2 toneladas de armas e munições. O arsenal é destinado à defesa dos fiscais, que têm porte de armas e se envolvem em operações perigosas. Até aí, tudo bem. O problema é que o paiol foi acondicionado em uma das salas do instituto, sem nenhuma segurança, e cresce a cada dia. Em dezembro, recebeu 85 000 cartuchos. Assustado, um grupo de servidores resolveu pedir ao presidente do instituto, Roberto Messias, que transfira o material para um lugar adequado, com vigilância e sem risco de explosão acidental.

 

Cheio de energia

A geradora Tractebel acredita que pode passar incólume pela crise. Neste ano, pretende manter os seus investimentos no mesmo nível do ano passado: 1,1 bilhão de reais. O presidente da empresa de eletricidade, Manoel Zaroni, prevê desembolsos ainda superiores em 2010, quando a empresa estará envolvida na construção da hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia. Na contramão do mercado, Zaroni planeja ainda fazer novas contratações neste ano.

 

Com os dentes em Dentinho

Fernando Pilatos/AE


A Traffic, empresa de agenciamento de jogadores parceira do Palmeiras, aposta, agora, no rival Corinthians. Já comprou 25% dos direitos econômicos do meia Lulinha e está prestes a fechar a aquisição de 50% do passe do atacante Dentinho, o preferido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Traffic já pegou a estrela da equipe de juniores do Timão, o atacante Marcelinho, e promete levar três outros jogadores do clube para fazer um estágio no poderoso Manchester United.

 

Pedida a falência da afilhada de Lula

Filipe Redondo/Folha Imagem


Tramita na 2ª Vara de Falências de São Paulo um pedido de falência das advogadas Larissa eValeska Teixeira, filhas do advogado Roberto Teixeira, o compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Larissa e Valeska, afilhada de Lula, são proprietárias formais de uma empreiteira chamada Triza. Essa empresa estaria envolvida na falência fraudulenta de outra construtora, a FGS. Segundo o advogado Marcelo Delmanto, os bens da FGS foram transferidos para a Triza sem nenhum pagamento. O responsável pela operação, Roberto Teixeira, era advogado das duas construtoras. A relação de Teixeira com a Triza é um tanto confusa. Há um ano, o advogado disse a VEJA que considerava a empresa "uma extensão da sua pessoa física".

INFORME JB

Brasília e o dia depois de amanhã

Leandro Mazzini

JORNAL DO BRASIL 31/01/09

Seja qual for o resultado das urnas no Senado, o novo presidente da Casa terá como primeiro passo na segunda-feira, ou passos, atravessar a Praça dos Três Poderes em Brasília e ir encontrar-se com os chefes do Executivo e do Judiciário, respectivamente Luiz Inácio Lula da Silva e ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal. A influência desses dois poderes no Congresso chegou a tal ponto que virou bandeira, tanto de Tião Viana (PT-AC) quanto de José Sarney (PMDB-AP), barrar excesso de medidas provisórias de Lula e a pauta legislativa do Supremo. "O Congresso está no chão", confidenciou um senador à coluna. É preciso recuperar a sua imagem. E os dois candidatos têm competência para isso, avaliou. Aos votos!

A volta... ...dos que não foram

A Controladoria-Geral da União tem destacado o número crescente de servidores federais demitidos a bem do serviço público, por práticas irregulares. Convenhamos, é um bom trabalho. Mas esquece de dizer que é grande a quantidade de reintegrações desses demitidos na Justiça.

Frequentemente, o Diário Oficial publica ordens judiciais determinando o retorno desses servidores. Na prática, eles passam meses ou anos afastados e, quando retornam, recebem por todo o período, mesmo sem trabalhar.

Por nada

Há suspeitas de que a má avaliação das comissões de inquérito estejam dando brechas para a virada de jogo na Justiça.

TV Brasil lá

Com audiência próxima de um traço, a TV Brasil resolveu concorrer na cobertura internacional. Mandou repórteres e cinegrafistas para o Fórum Econômico de Davos, na Suíça.

BBB União

A emissora vai mandar também uma equipe para acompanhar missões internacionais de ministros, como o caso de Miguel Jorge, do Desenvolvimento, em viagem pela Argélia e Líbia.

Quase lá

Tudo indica que José Anibal será reconduzido à liderança na Câmara. Se assim for, será outra vitória do grupo de Aécio Neves (MG) contra José Serra (SP).

Unger reloaded

Mangabeira Unger deve ir a Washington antes de Lula encontrar-se com Barack Obama.

Caixa dos prefeitos

O presidente Lula convocou a Caixa Econômica Federal para ser o banco oficial dias 10 e 11 no Encontro Nacional com Novos Prefeitos, em Brasília, organizado pelo governo.

Cidades & Fortes

O Ministério das Cidades, aliado principal da Caixa, entrará no encontro com o ministro Márcio Fortes. Lula quer ampliar parcerias entre o ministério e o banco com as prefeituras para o PAC.

O retorno

Em tempo de escolhas, outro nome volta às listas para tribunais superiores. É do secretário executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Telles, que também foi rejeitado em disputa anterior para o Superior Tribunal Militar, por não ter 10 anos de exercício.

Holofote nele

O gaúcho Germano Rigotto ganha destaque no Conselho de Desenvolvimento e Econômico Social no Palácio do Planalto. O ex-governador está abrindo caminho para disputar o governo ou o Senado. E com uma madrinha de peso: Dilma Rousseff.

Golpe

A Gol deu um golpe em dois passageiros no Aeroporto JK ontem em Brasília. Fechou o check in para o voo Brasília–Rio, das 7h, três minutos antes do programado. A dupla, que já estava na fila, teve que remarcar o voo e pagar R$ 161 de diferença.

Centenário

No dia 7 de fevereiro os Correios lançam selo comemorativo do centenário do nascimento de dom Hélder Câmara, com desenho de Silvania Branco, que ganhou o concurso de ilustração.

DORA KRAMER

Uma conta de chegar

 O ESTADO DE S.PAULO 31/01/09


Nada como o risco da desmoralização no início de uma empreitada da envergadura da eleição presidencial para forçar o PSDB a descer do muro de onde observava a disputa entre PT e PMDB pela presidência do Senado.
Não foi propriamente uma decisão referida no melhor para o partido - tendo em vista a eleição de 2010 no horizonte -, muito menos baseada na alegada aceitação do convite feito pelo senador Tião Viana para que os tucanos fossem parceiros do PT numa operação de "limpeza" do Senado.

O PSDB surpreendeu ao tomar uma posição na noite de quinta-feira, quando todos esperavam e o próprio partido dava indicações de que liberaria os votos em tese e, na prática, orientaria a bancada em favor da candidatura de José Sarney.
Isso, segundo constou das versões correntes, na esperança de que Sarney esquecesse antigas rusgas e levasse seus aliados no PMDB ao projeto tucano para 2010.
O raciocínio que prevaleceu, porém, parece ter sido outro: se apoiassem Sarney, poderiam ser responsabilizados por tudo de mal que porventura pudesse acontecer à candidatura de Michel Temer na Câmara e, aí perder dos dois lados.
Temer é um aliado tradicional do PSDB, assim como todo o grupo que aderiu a Lula depois da reeleição. Sarney é um desafeto antigo que, na hora agá, dificilmente desembarcaria da canoa governista para embarcar na oposicionista. Mais não seja, para manter as aparências e não deixar o atual presidente terminar o mandato em feitio de abandono.
Sendo assim, para o tucanato melhor não arriscar o certo pelo altamente duvidoso. Inclusive porque o problema não é nem o apoio em 2010, mas o controle do PMDB daqui até lá. A derrota de Temer teria como consequência a perda da presidência e a mais que provável entrega do comando do partido ao senador Renan Calheiros.
Os 13 votos do PSDB alteram o quadro, abalam o favoritismo de Sarney? Abalam, embora talvez não sejam suficientes para mudar a situação, pois na contrabalança há 14 votos do DEM a favor do ex-presidente.

O lance tucano põe os dois em posição de disputa real e, sobretudo, dá oportunidade ao PSDB de recuperar poder de influência na eleição, perdida quando o partido tendia para Sarney, contribuindo para o desenho de uma vitória antecipada.
Agora, daí a dizer que Tião Viana chamou os tucanos para juntos patrocinarem uma "limpeza" no Senado e por isso levará os votos é abusar da boa vontade alheia. Primeiro, porque obrigaria suas excelências a nominarem a lista das "sujeiras", dado que a preliminar de que admitem a existência delas está posta.
Segundo, obrigaria o respeitável público a acreditar numa mudança repentina de atitude dos partidos que aceitam a convivência com gente de vida pregressa duvidosa, com um terço de senadores suplentes sem voto e indicados pela vontade unilateral do titular da vaga, com acertos para salvar mandatos ao arrepio das evidências de quebra de decoro, com troca-troca de votos por cargos na Mesa e por aí afora.
Se tanto PT como PSDB foram cúmplices das imposturas cometidas no Senado, com que autoridade moral falarão a seus pares em limpeza? Levarão o troco na hora sendo instados a denunciar com riqueza de detalhes, e provas, as sujeiras a que se referem. Como participaram de várias delas, tal operação equivaleria a um tiro na testa.

Negócios

A bancada do PT contabiliza a eleição do ex-senador José Jorge para o Tribunal de Contas da União entre evidências de que vem de longe a negociação entre o PMDB e o DEM, em prol da candidatura de José Sarney para a presidência do Senado.
O PMDB tinha candidato, mas deixou Leomar Quintanilha no ora veja e deu votos a José Jorge em troca - acredita o PT - do apoio do Democratas a Sarney.

Contradição em termos

Quanto mais o ministro da Justiça, Tarso Genro, explica sua decisão de conceder refúgio político ao ativista italiano Cesare Battisti, mais se desentende com seus próprios atos e opiniões.
Primeiro, havia alegado que sua decisão era coerente com a "generosidade" brasileira no tocante ao abrigo de estrangeiros com problemas políticos em seus países de origem. Posição desmentida pela devolução sumária dos atletas Guilhermo Rigondeaux e Erislandy Lara à ditadura cubana.
Agora, Tarso Genro argumenta que a Itália vive no passado, referida nos "anos de chumbo", enquanto o Brasil promoveu sua "pacificação política".
Isso, sendo ele um dos principais defensores da revisão dos termos do contrato firmado entre as forças políticas no Brasil na década dos 80, pelo qual o ponto de partida para a redemocratização seria a anistia para todos os crimes - da ditadura e da resistência ao regime.
O ministro diz que não pretende a revisão da anistia, mas, na prática, é o que significaria a punição aos torturadores defendida por ele.

DIOGO MAINARDI

REVISTA VEJA

Diogo Mainardi
Questão de tradição

"O refúgio concedido por Lula ao terrorista
italiano Cesare Battisti é perfeitamente 
coerente com nosso passado. Nós sempre
soubemos acolher os estrangeiros. 
Em particular, os criminosos"

Inhame.

Inhame? Inhame é o protagonista de Brazil, o romance que o americano John Updike ambientou no Rio de Janeiro. O tubérculo representa os atributos viris de um trombadinha negro que seduz uma adolescente branca. O romance só tem isso: inhame para cá, inhame para lá. É John Updike parodiando Agamenon Mendes Pedreira, a maior autoridade brasileira em matéria de vegetais de duplo sentido.

John Updike morreu na semana passada. Eu me lembrei da singela hospitalidade com a qual ele foi recebido durante sua passagem pelo Brasil. Nós herdamos o espírito acolhedor dos tupinambás. Aos estrangeiros ilustres que desembarcam em nossas praias, vamos logo oferecendo as melhores mulheres da tribo e uns espetinhos tostados de carne humana. John Updike – o Caramuru da Pensilvânia – se impressionou com nosso caráter generoso e, dois anos depois de vir para cá, dedicou-nos seu romance mais desastrado, Brazil.

O refúgio concedido por Lula ao terrorista italiano Cesare Battisti, condenado por participar de quatro assassinatos em nome dos "Proletários Armados pelo Comunismo", é perfeitamente coerente com nosso passado. Nós sempre soubemos acolher os estrangeiros. Em particular, os criminosos. Fazemos isso desde a época do descobrimento. Antes de voltar para Portugal, Pedro Álvares Cabral abandonou dois degredados portugueses entre os índios. Os primeiros europeus residentes no Brasil foram dois bandidos. Cesare Battisti, acomode-se. Cesare Battisti, posso apresentar-lhe minha filha?

Há outros casos como o dele. O médico nazista Josef Mengele, depois de torturar milhares de prisioneiros em Auschwitz – amputando seus membros, injetando tinta em seus olhos, esterilizando-os com raios X e costurando-os uns aos outros a fim de torná-los siameses –, refugiou-se na Praia de Bertioga. O chefe mafioso Tommaso Buscetta, acusado de tráfico de drogas e assassinatos na Itália e nos Estados Unidos, escondeu-se no Rio de Janeiro.

Nosso costume de abrigar criminosos de todas as espécies alimentou também as tramas de uma infinidade de filmes estrangeiros. ComoInterlúdio, de Alfred Hitchcock (Ingrid Bergman infiltra-se num bando de cientistas nazistas que opera no Rio de Janeiro). Ou O Mistério da Torre, de Charles Crichton (Alec Guinness rouba um carregamento de ouro de um banco e foge para o Brasil, onde encontra Audrey Hepburn, no papel de Chiquita). O resto dos filmes ambientados aqui é desoladoramente ruim. O Brasil tem este efeito: nunca consegue inspirar algo que preste. Como aconteceu com John Updike e seu inhame. O Brasil só é bom mesmo para assassinos. Cesare Battisti, aceita mais um espetinho?

ANDRÉ PETRY

REVISTA VEJA

André Petry colunadopetry@abril.com.br
Lembra-te de Darwin

"É inaceitável dar criacionismo em aula de biologia. Embrutece porque ensina o aluno, desde cedo, a confundir crença e superstição com razão e ciência."

É assustador que, às vésperas do bicentenário do nascimento de Charles Darwin, pai da teoria da evolução, escolas brasileiras estejam ensinando criacionismo nas aulas de ciências. Já se sabia que as escolas adventistas fazem isso. A novidade é que o negócio está se propagando. Em instituições tradicionais de São Paulo, como o Mackenzie, inventou-se até um método próprio para o ensino. "Antes, usávamos o material que havia disponível no mercado", explica um dos diretores da escola, Francisco Solano Portela Neto. 
O criacionismo é ensinado como ciência da pré-escola à 4ª série.

Não há problema em que o criacionismo seja dado nas aulas de religião, mas ensiná-lo em aulas de ciências é deseducador. Criacionismo é a explicação bíblica para a origem da vida. Diz que Deus criou tudo: o homem, a mulher, os animais, as plantas, há 6 000 anos. Quem estuda religião precisa saber disso. É uma fábula encantadora, mas não é ciência. É inaceitável que o criacionismo seja ensinado em biologia para explicar a origem das espécies. Em biologia, vale o evolucionismo de Darwin, segundo o qual todos viemos de um ancestral comum, há bilhões de anos, e chegamos até aqui porque passamos no teste da seleção natural. É a melhor (e por acaso a mais bela) explicação que a ciência encontrou sobre a aventura humana na Terra.

Quem contrabandeia o criacionismo para as aulas de biologia diz que, em respeito à "liberdade de pensamento", está "mostrando os dois lados" aos alunos. Afinal, são escolas religiosas, confessionais, e os pais podem ter escolhido matricular seus filhos ali exatamente porque o criacionismo é visto como ciência. Pode ser, errar é livre, mas que embrutece não há dúvida. Embrutece porque ensina o aluno, desde cedo, a confundir crença e superstição com razão e ciência. É desnecessário. Que cientistas saem de escolas que embrulham o racional com o místico? Também é cascata, porque, fosse verdade, a turma estaria ensinando numerologia em matemática. Ensinaria alquimia em química, dizendo, em nome da "liberdade de pensamento", que é possível transformar zinco em ouro e encontrar o elixir da longa vida...

Há pouco, na Inglaterra, um reverendo anglicano defendeu o estudo do criacionismo na educação básica. Era diretor de educação da Royal Society. Queria colocar Deus no laboratório da escola. Cortaram-lhe o pescoço. A Suprema Corte americana já examinou o assunto. Mandou o criacionismo de volta às aulas de religião. No Brasil, terra do paradoxo, o atraso avança.

Darwin foi um gênio. Em seu tempo, não se sabia como as características hereditárias eram transmitidas de pai para filho. Nem que a Terra tem 4,5 bilhões de anos e que os continentes flutuam sobre o magma. No entanto, a teoria da evolução se encaixa à perfeição nas descobertas da genética, da datação radioativa, da geologia moderna. Só um cérebro poderosamente equipado, conjugado com muito estudo, pode ir tão longe. Confundido com criacionismo, Darwin parece um macaco tolo. É assustador.

J.R. GUZZO

REVISTA VEJA

J.R. Guzzo 
O preço a pagar

"Nada comprova melhor os efeitos da opção de 
governar sem trabalho do que o desastre crescente
em que se vai transformando o caso Cesare Battisti"

Sempre é possível para presidentes da República, sobretudo para os que vivem com altos índices de popularidade como Luiz Inácio Lula da Silva, governar seu país sem os incômodos, as responsabilidades e os riscos de ter posições de verdade sobre questões complicadas. Dá muito bem para Lula, apenas nos anos de 2007 e 2008, ficar 148 dias no exterior e ausente do local de trabalho, em viagens que não têm nenhum propósito – na última das suas visitas à Venezuela, pelo que se viu, foi levado a uma horta e apresentado a uma caixa de tomates. Dá para governar sem ler nada; se a leitura da imprensa lhe provoca azia, imagine-se então em que estado iria ficar lendo um relatório estratégico do ministro Mangabeira Unger. Quando surgem problemas aborrecidos, pode largar a solução, e está sempre largando, para algum subordinado; afinal, ele tem 38 ministros diferentes, secretários com "status de ministro", assessores com "status de secretário" e só Deus sabe quanta gente mais. É perfeitamente possível, em resumo, governar sem trabalhar, quando se dá à palavra "trabalho" o significado que ela tem para as pessoas comuns. Esse é o lado bom do emprego de presidente da República – mas, infelizmente, quase tudo na vida tem dois lados e, pior ainda, acaba tendo alguma consequência concreta. No caso, a consequência de levar um governo nessa toada é que a liderança do chefe simplesmente vai para o espaço – e assim que ela some o ecossistema do palácio presidencial se transforma numa usina de produzir tumultos. É o preço a pagar.

Nada comprova melhor os efeitos da opção de governar sem trabalho do que o desastre crescente em que se vai transformando o caso Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua na Itália pela prática de quatro homicídios e presenteado pelo governo brasileiro com "refúgio político". Na semana passada, enquanto a Itália chamava de volta o seu embaixador no Brasil, o presidente Lula tinha diante de si um problema que nunca quis criar e com o qual nem ele nem o Brasil vão ganhar nada, seja lá qual for a solução final. Não aconteceria o que está acontecendo se Lula, logo no começo, tivesse prestado mais atenção no que fez. Num episódio envolvendo um país com que o Brasil jamais teve interesse algum em brigar, e no qual havia pelo menos quatro pareceres dentro do governo, três contra o refúgio e um a favor, ele abandonou a decisão só para o ministro da Justiça, Tarso Genro – que resolveu tomar o partido de Battisti. O presidente não pode, é claro, ficar se metendo em tudo. Mas, se acha que a responsabilidade de resolver um caso desses não faz parte da sua lista de obrigações, o que teria de acontecer, então, para ele agir? Aí já não é delegar autoridade; fica parecendo abandono de serviço.

O próximo passo está a cargo do Supremo Tribunal Federal, que vai julgar se o ministro tinha ou não o direito de tomar a decisão que tomou; não vai julgar se ela está certa ou errada. Esta é a questão que não irá embora – e, qualquer que seja a última palavra, o jogo dos sete erros armado desde o começo pelo governo promete ficar do mesmo tamanho. Não há "crime político" a ser considerado; a Itália está pedindo a extradição de Battisti não porque ele falava mal do governo ou fazia oposição, mas sim porque foi processado, julgado e condenado por sua participação no assassinato de quatro pessoas, o que é proibido tanto pelas leis italianas como pelas leis brasileiras. Não há nenhuma prova de que o Poder Judiciário da Itália tenha feito uma "condenação política", nem de que tenha cerceado os direitos de defesa do réu; quem alega essas duas coisas, sem provar nenhuma delas, são os seus advogados. Não há motivo algum para o governo ficar falando em "soberania"; a Itália não pede que o Brasil seja menos soberano, e sim que lhe devolva um homicida condenado por violação ao Código Penal. O restante da argumentação do ministro Genro é da mesma qualidade.

O presidente da República não quis esquentar a cabeça com esses detalhes, e se chegou a pensar que algo poderia dar errado apostou que o problema, como de costume, acabaria sumindo em alguns dias. É um critério, sem dúvida. A rigor, tudo acaba realmente esquecido com o passar do tempo, mesmo as piores malfeitorias. Ninguém continua falando mal do imperador Nero, por exemplo – e olhem que o homem mandou matar a própria mãe, botou fogo em Roma e crucificou São Pedro de cabeça para baixo. Mas o esquecimento futuro não faz o errado virar certo no presente. Mais ainda, não muda o preço da fatura que tem de ser paga agora.

SÁBADO NOS JORNAIS

Globo: Protecionismo abre o 1 º confronto da era Obama

 

Folha: Em 9 anos, homicídio cai 66% em SP

 

Estadão: Governo prepara ofensiva para baixar spread bancário

 

JB: Barack Obama tira US$ 1 bi do Brasil

 

Correio: Pardais ganham painéis de alerta

 

Valor: Itaipu e térmicas trazem reajuste maior de energia

 

Gazeta Mercantil: BB vai liberar R$ 2,5 bi para estimular venda de carro usado

 

Estado de Minas: Novo mínimo injetará R$ 23 bi na economia

 

Jornal do Commercio: Celpe vai pedir 8% de reajuste