domingo, janeiro 04, 2009

PARA...HIHIHIHI

Joãozinho
Joãozinho viu o pai entrando no banheiro.A porta ficou aberta e ele entrou também.
Quando percebeu a presença do filho, o pai foi logo botando a mão no pau e gritou:
- Sai daqui, menino!
- Não, não saio! O que é que senhor tá escondendo?
- Sai daqui, filhinho! Não é nada!
- Não, não saio enquanto num me mostrar o que o senhor tá escondendo aí, pai!
- É um passarinho!
- Sacanagem, heim, pai... Comendo a bunda do passarinho?

JOÃO UBALDO RIBEIRO

Despetalando a flor do Lácio

O Globo

Despetalando” está correto, tenho praticamente certeza. Não acredito que um filólogo desalmado tenha resolvido que aí vai hífen.

Não, não vai, não é des-petalar. “Flor” e “Lácio” continuam, uma sem acento, outro com acento. Portanto, cem por cento de acerto em meu primeiro título na ortografia nova, brilhei mais uma vez. Isso, contudo, não me aplaca o nervosismo.

Deve ser a idade, porque já encarei algumas reformas ortográficas nesta curta existência e me saí satisfatoriamente, mesmo no tempo em que a gente tinha que grafar “tôda” com circunflexo, para distinguir de “toda”, que ninguém sabia o que era, embora, no ver de alguns, fosse uma ave amazônica pouco sociável, ou, segundo outros, uma exortação obscena de origem xavante.

Acho que esse ponto nunca será esclarecido (de qualquer forma, cartas de esclarecimento para o editor, por caridade) e constituirá mais uma das graves interrogações sem cujas respostas minha geração deixará este mundo.

Quando me peguei lendo, a maior parte da livrama de meu pai era na orthographia antiga e havia livros portugueses com suas próprias normas.

Apesar de leitor fominha que, mesmo sem entender nada, traçava o que aparecesse, levei semanas para compreender que “augmentar” era “aumentar”. Mas me acostumei e sempre transitei bem nessa área, para alguma coisa eu tinha de levar jeito.

Chefiei redação no tempo da abolição do acento diferencial e dedicava grande parte de meu tempo a explicar que, de então em diante, não se escreveria “voce”, mas “você” mesmo, como sempre. Foi difícil, muito mais difícil do que qualquer um imaginaria, tratando-se de gente instruída e, em muitos casos, talentosa.

Uma amiga minha sustenta que tudo vem de trauma da infância e eu tendo a concordar com ela. Sei de traumas profundos, carregados por amigos meus sob o jugo — o que, graças a Deus, não foi meu caso — de professores de português dogmáticos e caturras, que entupiam todos de regras quase impenetráveis e só podiam com isso instilar ódio e temor pela língua e pelo que nela é escrito. Para muitos, os livros são dolorosas memórias de torturas.

E as reformas sempre levam alguma coisa com elas. Já haviam feito isso com o K, o W e o Y, agora reabilitados, se bem que nunca de fato o povo os haja banido, aí estando o Kilo, o Waldir e o Ruy, que não me deixam mentir e nem ao menos caíram na clandestinidade, mas continuaram a circular com grande liberdade.

Levaram a indicação da subtônica também, aquela que, por exemplo, marcava com acento grave palavras como “precàriamente” e mostrava a existência da subtônica (“cà”). Mas, segundo eu soube, nem precisamos (precisamos, sim), nem temos condição de exigir que as subtônicas se pronunciem, tudo bem, não estamos à altura.

Por mim, tenho trauma do trema.

Ontem me disseram que fui visto com o olhar distante, em frente a este monitor, sacudindo lentamente a cabeça e murmurando “não me conformo, não me conformo”. Não me recordo disso, pode perfeitamente ser uma invencionice, mais uma das anedotas apócrifas que contam sobre nós, celebridades internacionais. Mas a verdade é que não me conformo não somente com a saída do trema e suas temíveis consequências (em breve alguém lerá aí “consekências”, assim como chegará o dia em que um simpático alemão que veio morar no Brasil nos perguntará, com sotaque ainda carregado, onde poderá comprar “linghiças”, raio de lingúa difícil, depois reclamam do alemão).

Não posso igualmente aceitar a maneira sem-cerimoniosa com que ele foi humilhantemente defenestrado, depois de tanto tempo de serviços prestados.

Expulso sem nem um relógio folheado a ouro de lembrança, uma plaquinha sequer.

O volume principal de besteiras que vem aí, em nome dessas mudanças, embora esteja longe de restringir-se a ele, deverá ser o despejado pelo enlouquecido movimento do “fala-se como se escreve”, uma completa piração defendida exaltadamente por muita gente.

Gente esquecida, é claro, de que a grafia é uma maneira sempre imperfeita, rudimentar mesmo (os textos gregos clássicos não costumavam ter intervalos entre as palavras e muito menos sinais de pontuação ou acentos, isso tudo veio muito depois), de se tentar congelar em símbolos toda a riqueza da fala, suas inflexões, os gestos, os timbres e os tons que a acompanham, enfim, um universo imensamente amplo para 26 letras e alguns sinais diacríticos.

Então, “falar como se escreve” é uma inversão completa, que só pode ter efeitos grotescos, para não dizer maléficos. Alguns já podem ser notados, em suas primeiras manifestações insidiosas. O que mais me mexe com os ner vos é o umazero (1x0) ou umaum (1x1) de grande parte dos narradores esportivos. Não sei o que deu neles, praticando a forma mais execranda do “fala como escreve”. O eme do final de “um” está aí para nasalar a vogal, só para isso, tanto assim que, em português antigo, era comum escreverse com til. Agora não, agora se pronuncia “como se escreve”, e o resultado é que, se deixarem a coisa correr solta, daqui a pouco ninguém distingue mais “um olho”, de “um molho”, “um achado” de “um machado”.

Ouço também, embora com muito menos frekência (esta palavra está errada, foi só vontade de usar o K) o M final de “com”, ser “misturado” à vogal inicial da palavra que a segue. “Com ida marcada para” seria “comida marcada para”, o que poderia render um mal-entendido ou outro. E por aí vai a língua, junto com a vida. Alguém já está ganhando dinheiro com isso. Não somos nós, como de hábito, mas nem por isso deixemos de nos alegrar. Combustível novo na combalida economia do livro. E que serve para mais uma vez mostrar aos eternos descontentes como este governo é reformista

CLÓVIS ROSSI

Duas hipóteses sobre o Hamas

Folha de São Paulo

PARIS - Claudia Antunes, a competentíssima editora de Mundo, matou a charada da atual crise em Israel/Palestina em artigo no primeiro dia dos ataques a Gaza, sob título que diz tudo: "Falta um plano para lidar com Hamas".
Qualquer plano teria que partir de uma de duas hipóteses. Hipótese 1 - Tratar o Hamas como um grupo terrorista com o apoio da maioria dos palestinos (pelo menos os de Gaza). Se é assim, o plano seria aniquilar o grupo, transformando Gaza no maior cemitério do mundo. Hipótese 2 - Tratar o Hamas como um movimento político, religioso e assistencialista que tem, sim, um grupo armado -e terrorista. A pergunta seguinte é: dá para amputar o braço podre sem matar o resto do corpo? Tudo indica que não.
Aliás, o Ocidente já foi submetido a uma prova parecida, na Argélia de 1992. A FIS (Frente Islâmica de Salvação, grupo com algum parentesco com o Hamas) ganhou o primeiro turno da eleição. A reação foi um golpe militar, com apoio/estímulo ocidental, que deu origem a uma guerra civil cruenta, dezenas de milhares de mortos e uma paz apenas relativa, vira e mexe interrompida por atentados. Se se aceitar a hipótese 2, o lógico seria negociar com o Hamas.
É horrível negociar com um grupo que abriga terroristas? Também acho. Mas não é igualmente horrível ter parte da população de Israel sob ameaça permanente de que um foguete caia dos céus na cabeça dela? Não é igualmente horrível promover um banho de sangue de civis inocentes, inclusive crianças, e de suspeitos de terrorismo, condenados à morte sem o direito ao devido processo legal, o que contraria a essência do judaísmo? Há até antecedente: a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) também era dada como terrorista, mas Israel acabou por negociar com ela.

CLÓVIS ROSSI

Duas hipóteses sobre o Hamas

PARIS - Claudia Antunes, a competentíssima editora de Mundo, matou a charada da atual crise em Israel/Palestina em artigo no primeiro dia dos ataques a Gaza, sob título que diz tudo: "Falta um plano para lidar com Hamas".
Qualquer plano teria que partir de uma de duas hipóteses. Hipótese 1 - Tratar o Hamas como um grupo terrorista com o apoio da maioria dos palestinos (pelo menos os de Gaza). Se é assim, o plano seria aniquilar o grupo, transformando Gaza no maior cemitério do mundo. Hipótese 2 - Tratar o Hamas como um movimento político, religioso e assistencialista que tem, sim, um grupo armado -e terrorista. A pergunta seguinte é: dá para amputar o braço podre sem matar o resto do corpo? Tudo indica que não.
Aliás, o Ocidente já foi submetido a uma prova parecida, na Argélia de 1992. A FIS (Frente Islâmica de Salvação, grupo com algum parentesco com o Hamas) ganhou o primeiro turno da eleição. A reação foi um golpe militar, com apoio/estímulo ocidental, que deu origem a uma guerra civil cruenta, dezenas de milhares de mortos e uma paz apenas relativa, vira e mexe interrompida por atentados. Se se aceitar a hipótese 2, o lógico seria negociar com o Hamas.
É horrível negociar com um grupo que abriga terroristas? Também acho. Mas não é igualmente horrível ter parte da população de Israel sob ameaça permanente de que um foguete caia dos céus na cabeça dela? Não é igualmente horrível promover um banho de sangue de civis inocentes, inclusive crianças, e de suspeitos de terrorismo, condenados à morte sem o direito ao devido processo legal, o que contraria a essência do judaísmo? Há até antecedente: a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) também era dada como terrorista, mas Israel acabou por negociar com ela.

ELIANE CANTANHÊDE

O Maranhão é o Brasil

BRASÍLIA - Nada poderia espelhar melhor a desigualdade brasileira do que o Maranhão que emergiu de três páginas diferentes da Folha na última sexta-feira.

Na pág. A2, no texto "A crise na janela", delicioso como sempre, José Sarney não fica a ver navios e sim "um solitário barco envolto na bruma de sal". É a crise a olho nu, mas Sarney trata de enaltecer São Luís como o segundo porto do Brasil, exportando 110 milhões de toneladas de minério de ferro e alumínio, além de soja, milho, babaçu.
O Maranhão também tem "a maior fábrica de alumínio do mundo, da Alcoa" e a "melhor infraestrutura do Nordeste", com estradas de ferro e "comboios imensos, milhares de operários, lavra, energia e estradas". Fantástico.
Mas esse é um Maranhão. Há outros. Você vira a página e, na A4, as notas "Fichados 1" e "Fichados 2", do Painel, informam que o Estado contribui para a nova "lista suja" de trabalho escravo com um juiz, Marcelo Baldochi, e o ex-prefeito de Santa Luzia Antonio Braide, pai de um ex-assessor do ministro maranhense Edison Lobão.
Virando mais uma página, chegamos à A6 e à reportagem sobre maranhenses que, no primeiro dia do ano, incendiaram a prefeitura, o fórum e o cartório da mesma Santa Luzia, a 300 km de São Luís e do segundo porto brasileiro. Motivo: quem ganhou a eleição para prefeito não levou. A Justiça não deixou.
Na véspera, com os salários atrasados e sem Natal, prestadores de serviço tinham invadido a casa do prefeito Zilmar Melo e a empresa de informática da família, em Tutoia (457 km da capital e do porto maravilhoso). Quebraram até os carros. O que restou, levaram.
E o Maranhão de um ex-presidente recente (1985-1990) e "da maior fábrica de alumínio do mundo" não é só lembrado por trabalho escravo e pela fúria de cidadãos, mas pelos piores desempenhos em português e em matemática. E no IDH, claro.
O Maranhão é o Brasil. Ou melhor, o Brasil é o Maranhão.

STEPHEN KANITZ

REVISTA VEJA


Stephen Kanitz 
Um castelo de cartas
que desaba?

"Para o futuro, devemos indagar por que 
as empresas não possuem as reservas
que deveriam ter para aguentar as crises"

Ilustração Atómica Studio


Duas alegorias estão sendo associadas à crise de 2008. A primeira, a de que se trata de um castelo de cartas que desabou, como o Muro de Berlim – só que agora é o muro de Wall Street –, o que significaria uma nova ordem mundial a ser construída, com Barack Obama no comando. Por isso tão poucos artigos foram escritos numa tentativa de impedir essa crise. Muito pelo contrário, a maioria dos intelectuais americanos noticiava, com certo prazer, cada detalhe desse desmoronamento. Quanto pior e mais rápido, melhor. O problema é que o castelo de cartas era americano, e não brasileiro, e quem vai pagar pelo pânico aqui gerado é nosso trabalhador, como sempre.

Uma pesquisa do Datafolha revela que 29% dos trabalhadores brasileiros acham que perderão o emprego em 2009, o que mostra a extensão do medo disseminado. Nem em 1929 o desemprego chegou a tanto. Pesquisa do Ibope indica que 50% dos brasileiros vão reduzir gastos. 
Se não revertermos esse pânico, aí, sim, teremos uma recessão em 2009. Portanto, demos vários tiros no pé, podería-mos ter passado relativamente imunes, mas não agora com esse pessimismo todo. Acreditar que reduzir juros resolve, como muitos estão sugerindo, é até infantil. Quem teme perder o emprego não compra a prazo nem com juro zero. Nem com redução de IPI.

A outra alegoria, a que eu prefiro, é a da cadeia de dominós que tombam um a um. É o setor imobiliário, que derruba o setor financeiro, que derruba o setor automobilístico, que derruba o de autopeças, e assim por diante. Não é um castelo de cartas que desaba, mas, sim, uma única peça que cai por alguma razão e arrasta as demais. Perguntas que aqueles que se dizem especialistas no assunto deveriam fazer, mas, infelizmente, não fazem, são: por que o segundo dominó não conseguiu aguentar o tranco do primeiro? Por que, quando um cliente seu não paga, você tem de atrasar seu fornecedor ou despedir seus funcionários? Quando uma empresa despede 2% dos funcionários, como fez a Vale do Rio Doce, o que ela está dizendo é o seguinte: "Vocês, trabalhadores, que sobrevivam usando as suas reservas financeiras pessoais. Não vamos ajudá-los usando as nossas reservas empresariais. Boa sorte e adeus!".

A solução para o futuro é fazer indagações como estas: por que as companhias não possuem as reservas que deveriam ter para aguentar o tranco do parceiro na frente, se ele tropeçar? Por que as empresas não constituem reservas nos tempos bons para usar nos tempos difíceis? Não é por ganância, mas por arrogância intelectual. Muitas companhias passaram a contratar especialistas em prever o cenário econômico, aqueles que previram que o dólar fecharia o ano a 1,67 real, lembram-se? Derrubaram a Sadia, a VCP e a Aracruz. "O futuro é previsível, senhores, o câmbio não passa de 1,80 real, portanto as reservas da sua empresa podem ser reduzidas." Ledo engano, como já alertei inúmeras vezes aqui. O futuro não é previsível, minha gente, e foi essa arrogância intelectual que fez o sistema todo ruir.

O Brasil em outros tempos já estaria pedindo socorro ou reservas financeiras ao FMI. O que ocorreu de diferente desta vez? O país tinha reservas de 200 bilhões de dólares, acumuladas sob críticas constantes de que eram desnecessárias. Existem inúmeras outras razões por que empresas não constituem reservas, desde a pressão de analistas, a tributação de reservas, o que é um absurdo, e otimismo demasiado com relação ao futuro. No Brasil, taxamos reservas na pessoa jurídica em 32% e na pessoa física em 20%, o que leva à distribuição imediata aos sócios. Outro absurdo.

Para que companhias se mantenham sólidas no futuro, temos de lidar com essas questões, e não com a redução de juros, mais gastos do governo, mais supervisão mundial. Portanto, preparem-se, porque em 2009 vamos ler um monte de bobagens, com prêmios Nobel sugerindo uma nova ordem mundial, e ninguém vai se lembrar do óbvio de que países, empresas e famílias precisam de reservas financeiras adequadas, para aguentar as tempestades futuras e não demitir pessoal.

DOMINGO NOS JORNAIS

Globo: Preço de passagem aérea pode cair 30% em 2009

Folha: Prevista para 2010, obra do São Francisco tem trechos parados

Estadão: Indústria aposta no mercado interno para enfrentar crise

JB: Os 100 primeiros dias de Paes

Correio: Material escolar: Está tudo mais caro

Valor: Economia desaquecida vai garantir oferta de energia

Gazeta Mercantil: Por que as 'ações de viúva' fazem sucesso