domingo, novembro 22, 2020

Toda centralização será castigada - EURÍPEDES ALCÂNTARA

O GLOBO - 22/11

No domingo passado, milhões de brasileiros foram dormir sem saber dos resultados finais


No instinto de manter e ampliar seus privilégios, as altas burocracias têm na centralização uma aliada. Quando a oportunidade de centralizar não se apresenta naturalmente, o poder federal dá um jeito de criá-la. Foi o que o Brasil descobriu no domingo passado, dia 15, quando os resultados das eleições municipais foram divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com horas de atraso, numa total surpresa para uma população orgulhosa de seu sistema de urnas 100% eletrônicas, aquele que “dá de 7 x 1” no calhambeque eleitoral dos Estados Unidos. No pleito municipal anterior, o de 2016, às 20h do dia da votação do primeiro turno, os resultados finais nas principais capitais do país já eram conhecidos, e às 22h todas as urnas já haviam sido apuradas, informou O GLOBO em sua cobertura on-line das eleições. No domingo passado, milhões de brasileiros foram dormir sem saber dos resultados finais.

A culpa foi da centralização. Na tentativa de consertar o que nos vem sendo vendido desde 1996 como um sistema perfeito e indevassável de votação, o TSE decidiu centralizar a totalização dos votos num único computador instalado na sua sede, em Brasília. O novo sistema, pomposa e erradamente descrito como um “supercomputador”, dotado de Inteligência Artificial e contratado sem licitação à empresa americana Oracle por R$ 26 milhões, simplesmente “bugou”.

A primeira questão que o episódio suscita é por que cargas d’água é preciso usar Inteligência Artificial para o trabalho de soma aritmética de votos? Inteligência Artificial tem aplicações miraculosas em tarefas complexas com milhares de variáveis, como manufatura de robôs, gestão proativa de saúde, mapeamento de doenças contagiosas, automatização de investimentos financeiros e em ferramentas de conversação em linguagem natural. Usar Inteligência Artificial na tarefa repetitiva e simples de contar votos tem cara de ser apenas mais uma jabuticaba.

A segunda questão é mais delicada. Ela se refere às “vulnerabilidades” apontadas pelo relatório de 2018 da Polícia Federal. Foram elas que levaram a ministra Rosa Weber, presidente do TSE naquele ano, a decidir pela necessidade de um serviço centralizado. Não alimento a menor suspeita sobre a integridade do sistema eleitoral brasileiro. Como jornalista, já recebi dezenas de “denúncias” de fraudes nas eleições. A apuração das mais consistentes nunca produziu uma migalha sequer de evidências de que o sistema tenha produzido resultados fraudados. Como enfatizou o ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do TSE, o fato básico, o voto, não se adultera no processo, e cópias impressas dos boletins de urna podem dirimir dúvidas posteriores.

Acredito que a ministra Rosa Weber, confrontada como relatório da Polícia Federal, tenha agido com a intenção de melhorar ainda mais o que já era bom. A história do matemático Abraham Wald (1902-1950) talvez tivesse a ajudado a decidir melhor. Durante a Segunda Guerra Mundial, os militares aliados encomendaram a Wald um estudo que permitisse proteger as seções dos bombardeiros mais vulneráveis à artilharia antiaérea do inimigo. A ideia era aumentar a segurança sem muito peso extra, blindando apenas os pontos cruciais. Wald recebeu estudos minuciosos dos aviões que voltaram para suas bases na Inglaterra depois de cumpridas suas missões sobre a Alemanha. As áreas mais atingidas foram a fuselagem e os sistemas de combustível. Os motores apresentavam o menor número de impactos.

Sua recomendação, surpreendente, foi: blindem os motores. Como assim, blindar as partes menos atingidas? Sim, explicou Wald, pois foram examinados apenas os aviões que, mesmo alvejados, conseguiram voar de volta para as bases. Estes, portanto, receberam impactos não fatais. Os aviões derrubados em ação não retornaram e não puderam ser periciados. Wald enxergou o óbvio que ninguém podia ver: os aviões abatidos receberam impactos fatais nos motores. Genial. Esse raciocínio aplicado às urnas eletrônicas pode levar à conclusão de que as potenciais falhas do sistema sejam mais de causa humana do que técnicas.

2 comentários:

Palmiro disse...

Murilo Sou seu fã e do seu blog .Não sei seus conhecimentos de informática para dizer que as urnas são seguras .Se pensarmos no.processo tecnológico posso até concordar Porém me diga qual.a transparência do processo. ATE na Venezuela pode se imprimir o voto Claro o TSE deles diz que esta tudo bem e jamais acata uma denuncia apesar do presidente da Smartmatic assumir que 1.milhao de votos foram desviados para o Maduro Vou te fazer umas perguntas: Quantas pessoas cuidam do processo aqui no Brasil ? QUANTAS tem o código fonte completo ? Quem garante que o que foi testado é o que esta la no dia da eleição se vc nao tem transparência? CONSULTE a comunidade hacker se vc conseguir Eles vão te dar informações interessantes

A verdade está lá fora disse...

Na empresa em que trabalhava quando um novo gerente assumia recebia do que estava saindo 3 cartas que eram para abrir na sequência caso os problemas aumentassem.
Assim que começavam a chover problemas o gerente abria a primeira carta que estava escrito:
Carta 1: DECENTRALIZE
Lá ia o gerente descentralizando tudo. Passado um tempo e novos problemas surgiam e o gerente abria a segunda carta que estava escrito:
Carta 2: CENTRALIZE.
Numa virada o gerente voltava a centralizar tudo. Passado um tempo e novos problemas surgiam sem que os velhos fossem resolvidos levando o gerente a abrir a terceira carta que estava escrito:
Carta 3: ESTÁ NA HORA DE VOCÊ ESCREVER 3 CARTAS.