sábado, outubro 17, 2015

O Brasil não merece - PLÁCIDO FERNANDES VIEIRA

CORREIO BRAZILIENSE - 17/10

Há aqueles que relativizam a corrupção. Se for do PT, é revolucionária. Faria parte de um processo sem o qual seria impossível garantir apoio de parte da direita, da esquerda fisiológica e da elite endinheirada ao governo e ao projeto redentor do partido. O mensalão, ou o pouco da roubalheira organizada que emergiu com o escândalo, mostra que a estratégia é essa desde o início. Estão aí os dutos abertos do petrolão para comprovar. Nos dias atuais, o "rouba, mas distribui" destronou o "rouba, mas faz" e aprofundou o assalto aos cofres públicos no país. Educação que é bom, ó!

Hoje, os pixulecos atribuídos a Maluf, PC Farias e outros parecem coisa de "batedores de carteira" perto da quadrilha montada para saquear a Petrobras. Há fortes indícios de que o dinheiro roubado da empresa foi lavado como se fosse doação na Justiça Eleitoral. Parte da ladroagem teria ajudado a eleger "bons companheiros". É disso que trata ação no TSE que pode levar à cassação de Dilma e Temer. Antigamente, quando descobertos, os ladrões fingiam vergonha de ter o nome estampado nos jornais. Nos dias atuais, os bandidos são saudados como "guerreiros" do povo brasileiro. Na internet, direitistas históricos posam de lulistas desde criancinhas, assassinam reputações de quem ousa denunciar os crimes - e recebem "likes" de "esquerdistas".

Chega a ser inacreditável. Mas, do mensalão, o esquema evoluiu para um grau de sofisticação e de desvio de recursos públicos incalculáveis. Parte da Operação Lava-Jato - sobretudo a comandada pelo juiz Sérgio Moro, Polícia Federal e uma força tarefa do Ministério Público - já identificou que o modelo de sangria do petrolão foi replicado em outros setores da administração pública. Existe a suspeita e também indícios de que há enes CPMFs (R$ 32 bilhões) escondidas em contas secretas mundo afora, além da Suíça.

Irônico é que uma peça menor dessa gigantesca engrenagem foi escolhida para pagar o pato por todos os vilões: Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara e inimigo número 1 da presidente Dilma. Sim, tudo indica que ele embolsou propina do petrolão e deve responder pelos crimes. Apesar de até petistas de carteirinha saberem que ele não é o chefe da quadrilha, a implacável cassada do procurador-geral da República ao Cunha Malvadão pode virar a salvação do chefe e dos principais culpados pelo assalto do século. Tão grave quanto isso é a negociata que ocorre nos subterrâneos da República para salvar tanto o mandato de Cunha quanto livrar Dilma de um possível processo de impeachment. O Brasil não merece. Ou merece?


É o fundo do poço. Ou não. - CELSO MING

O ESTADÃO - 17/10

O governo Dilma notabilizou-se por prometer o que os antigos chamavam de “mundos e fundos” e entregar resultados de medíocres para ruins. Em 2014, os fracassos prevaleceram

Se a presidente Dilma começa seu novo mandato com a economia no fundo do poço, então é de esperar que, nos quatro anos seguintes, conseguirá melhorá-la.

De cara, já se pode perguntar se chegamos de fato ao fundo do poço. Talvez não, uma vez que nada é tão ruim que não possa piorar. No entanto, o ajuste está sendo prometido com insistência quando a situação econômica está fortemente deteriorada.

O governo Dilma notabilizou-se por prometer o que os antigos chamavam de “mundos e fundos” e entregar resultados de medíocres para ruins. Em 2014, os fracassos prevaleceram.



O avanço do PIB ficará muito perto de zero. A perspectiva para 2015 não é muito melhor porque, se tudo der certo, será um ano de distribuição de contas. A indústria está no chão, com capacidade de competição cada vez menor. O nível de poupança do País é o mais baixo para o 3.º trimestre em 14 anos e o do investimento, o mais baixo desde 2006. Pior do que isso, todos os levantamentos apontam para um nível de confiança em fase minguante, o que congela os investimentos (veja o gráfico).

As contas públicas deverão fechar o ano com um superávit primário mais baixo do que o prometido. Ou talvez não apontem nem isso; apontem um rombo. Esse é o principal fator que ameaça com o rebaixamento da qualidade dos títulos da dívida pública, o que significaria aumento dos juros da dívida.

As contas externas estão em franca deterioração. As transações correntes (entrada e saída de moeda estrangeira para pagamentos de mercadorias, serviços e transferências unilaterais – menos fluxo de capitais) caminham para um rombo de US$ 85 bilhões, ou 4% do PIB. Não pode mais ser coberto só com entrada de investimentos. Depende cada vez mais de recursos de curto prazo, que podem abandonar o País a qualquer momento. Chegou ao fim o ciclo de alta das matérias-primas e suas exportações enfrentarão quebra de faturamento. Enquanto isso, os produtos manufaturados não conseguem mercado externo.

A inflação não saltará para acima do teto da meta por um triz. E, como o Banco Central vem repetindo, o realinhamento dos preços (reajustes dos preços administrados e do câmbio) tende a puxar a inflação em direção aos 7% ao ano.

A questão energética continua sem equação. Apesar dos financiamentos e da recomposição parcial dos preços, falta repassar ao consumidor uma alentada conta a pagar. Afora isso, as incertezas quanto ao suprimento futuro de energia continuam adiando os investimentos.

A toda essa lista, poderiam ser acrescentados : os juros altos demais, o emperramento das reformas, a baixa produtividade da mão de obra e qualidade do ensino… e por aí vai. Quanto pior for o quadro e quanto maior for a disposição de promover o ajuste, mais fácil será obter resultados. E quando esses aparecem, a confiança tende a aumentar.

Os manuais de Economia apontam como devem ser feitos os consertos dos estragos. O problema é que, nesses casos, a principal variável é política. E não há como saber até que ponto o governo da presidente Dilma poderá contar com apoio suficiente para impor a enorme distribuição de contas dessa crise.

CONFIRA:



Esta foi a evolução das cotações do petróleo desde o início de novembro. Queda acumulada de 30% tanto no tipo WTI negociado em Nova York quanto no tipo Brent negociado em Londres.

De olho no inverno
Os solavancos de preços seguem fortes. É sinal de que o mercado está longe de se estabilizar. Há semanas, especialistas apostaram em que o inverno mais rigoroso no Hemisfério Norte poderia aumentar o consumo de derivados destinados ao aquecimento e, portanto, provocar recuperação de preços. Até agora não há sinais disso.


A dúvida Levy - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 17/10

A grande dúvida em relação ao ministro Joaquim Levy é por que ele permanece no governo Dilma. A saída parece natural desde que ficaram mais fortes os ataques internos contra ele. Aos muitos interlocutores que perguntaram por que ele fica em uma equipe que nunca demonstrou valorizar seu trabalho, Levy responde que acha que ainda tem contribuições a dar.

Em um ambiente assim, em que o ministro da Fazenda vira alvo da própria base governista, e em uma crise desta dimensão, qualquer reunião como a de ontem à tarde pode dar origem a uma onda de especulações sobre a saída do ministro. Ainda mais quando há tanto fundamento, como foi o caso ontem. A grande dúvida, na verdade, não é se o ministro Joaquim Levy sai do governo, mas quando ele sai.

Houve vários momentos de estresse nesse período em que ele está no governo. Levy nunca se importou muito com os integrantes do PT, empresários ligados ao governo, ou líderes sindicais que o criticaram ou pediram sua cabeça. Mas na última semana houve demonstrações públicas de hostilidade a ele, e ao programa que tem tentado executar no governo até agora, lideradas pelo ex-presidente Lula. Na convenção da CUT, o ex-presidente Lula fez um discurso atacando o ajuste fiscal e foi interrompido várias vezes pelo coro “fora Levy”. Depois disso, Lula passou a trabalhar abertamente pela troca do ministro da Fazenda, culpando-o pelos desastres que foram plantados antes da sua chegada e fortalecidos pela base do governo.

Um momento de grande tensão em que o ministro quase deixou o governo foi o do envio do Orçamento deficitário para o Congresso. Ele só foi informado quando já era fato consumado. A decisão fora tomada numa reunião da qual não participou. Na época, quando um interlocutor perguntou por que não deixava o governo, ele disse que não era o tipo de pessoa que sai no pior momento e que previa que haveria muita turbulência a partir daquela decisão equivocada. De fato, as consequências foram o rebaixamento do Brasil, a disparada do dólar, o salto do custo cobrado do país e de suas empresas em empréstimos no exterior.

Numa conversa com um interlocutor frequente, Joaquim Levy disse que sabe que está na linha de tiro de cada vez mais gente, mas que tenta manter a calma e continuar trabalhando. Nos últimos meses, ele fez inclusive o que nunca em sua vida profissional teve a habilidade de fazer: a negociação política para conseguir apoio às medidas propostas para reequilibrar o Orçamento. E o fez porque no governo falta de tudo, inclusive, e principalmente, articulador político. Levy acha que com essa sua iniciativa de interlocução com o Congresso conseguiu em alguns momentos evitar o pior. O problema é que frequentemente a maior derrota vem das bases do governo, como a aprovação da permissão de recálculo da aposentadoria, que aprofunda o déficit da Previdência e que teve apoio maciço do PT.

O Brasil está vivendo uma recessão forte com uma inflação perto de 10% e nada disso se deve à tentativa de ajuste fiscal comandada pelo ministro Levy. A inflação foi reprimida nos últimos anos com manipulação de tarifas públicas. Os gastos públicos foram exacerbados nos últimos anos e, como ficou provado pelo TCU, foram manipulados e jogados para adiante nas famosas pedaladas fiscais.

A reunião de ontem, na parte em que participaram outros ministros, foi dedicada ao problema de como pagar os atrasados aos bancos públicos para eliminar qualquer risco de um processo semelhante ao do ano passado nas contas públicas. Como esse é um dos caminhos do impeachment, a presidente está preocupada em eliminar qualquer ruído com o Tribunal de Contas. O problema é que os atrasados são uma conta alta demais para ser quitada de uma vez. A engenharia financeira para pagar tudo o que se deve ao Banco do Brasil e BNDES, e mais a conta de tarifas não pagas à Caixa, é muito alta.

Não há quem seja insubstituível, mas o que pouca gente no governo se dá conta é que sem Joaquim Levy haverá um aumento forte da desconfiança em relação ao Brasil e será difícil encontrar outro que aceite ir para o cargo e ser atacado como inimigo pelo próprio partido do governo.

‘Vade-retro, satanás!’ - JORGE BASTOS MORENO

O GLOBO - 17/10

Depois que perderam as mordomias dos jatinhos da FAB e passaram a embarcar em voos normais das companhias aéreas, como parte do ajuste fiscal, os ministros de Estado começaram a sentir na pele a impopularidade do governo junto aos passageiros comuns.
Esta semana, por exemplo, o ministro dos Transportes, Antônio Carlos Rodrigues, só consegui evitar um incidente graças a uma admirável presença de espírito. Sentado numa das primeiras fileiras do voo, Rodrigues era cumprimentado pelos parlamentares que embarcavam pelo aceno “olá, ministro!”. Uma passageira, vendo a cena, não se conteve e se dirigiu ao ministro, já de dedo em riste:
— Não me diga que o senhor é ministro desse governo?!
E Antônio Carlos Rodrigues, a essa altura, abaixa o jornal que fingia ler, para na verdade tentar cobrir o rosto, e responde com a maior tranquilidade:
— Não! É apelido!

Bandeirada

O mais contundente discurso de Dilma, em quase cinco anos de governo, feito esta semana na CUT, não foi de improviso, mas lido.
Perguntei à minha comadre implicante, que conhece tudo de poder, se o texto era da lavra da própria presidente e ela, na bucha:
— Rosseto!
Quis eu, então, saber o motivo de tanta certeza.
— Pela forma entusiasmada com que ele aplaudiu.

Cabeça

Na conversa com Jaques Wagner, Cunha insinuou que, enquanto Cardozão estiver na Justiça, ele entenderá como um recado de que o governo está por trás da Lava-Jato.

Prazo

Não por isso que Cardozão pode sair. Ele se deu um prazo de até novembro. Independentemente do tratamento médico a que está sendo submetido.

Três erros

Um conhecedor profundo do PMDB, de Eduardo Cunha e da política em geral enumera três erros graves que teriam sido cometidos pelo presidente da Câmara:
1. falou demais; 2. meteu-se em assuntos que não lhe diziam respeito; 3. julgou-se muito poderoso.

Infantilidade

O mesmo sábio considera que a oposição jogou fora uma janela de oportunidade para o impeachment ao se aventurar numa completa impossibilidade: derrubar Dilma Rousseff e Eduardo Cunha ao mesmo tempo.

Corre-corre

Numa terça-feira que antecedeu uma viagem sua ao exterior, Levy confidenciou ao presidente da FGV, Carlos Leal, que entregaria o cargo a Dilma.
E o fez!
Mas a presidente mobilizou o mundo.
E Levy ficou!

Lambança

Um ex-ocupante da cadeira de Levy o enxerga cada dia mais parecido com ministros da Fazenda de Sarney.
— Ele foi chamado para montar um time de basquete. Agora, Lula e Dilma querem que o time jogue vôlei.

Vidente

Irritado por Levy não estar prestando atenção na sua inquirição, Rodrigo Maia descontou na Dilma:
— Ministro, preste atenção! Olhe nos meus olhos: a sua presidente cai agora ou, no máximo, em março que vem.
Quem respondeu foi o petista Chico D’Ângelo, para o delírio dos governistas:
— Falou a mãe Dinah!

Blindagem

Henrique Meirelles seria opção do empresariado para o lugar de Levy, mas num eventual governo Temer.
Para evitar o Serra, que já se comporta como tal.

Arrocho

Com medo de novos vazamentos, a força-tarefa da Operação Zelotes apertou a segurança: telefones foram trocados e documentos transferidos para salas com proteção maior.
O escândalo de compra de sentenças no Carf não tinha tanta visibilidade quanto a Lava-Jato, mas a expectativa é que isso mude quando começar a aparecer mais políticos nas denúncias. E chegar ao STF.

‘Coisa boa’

Vai começar a insonia de Renan e Delcídio.
E ela se chama Fernando Baiano.
Já era tempo. Parecia que a lista dos 37 de Janot só tinha o meu Eduardo Cunha.
( Será que estou sofrendo da “síndrome de Estocolmo” pelo meu algoz de 15 processos e muitos xingamentos? )

Guerra total - IGOR GIELOW

Folha de SP - 17/10

A charge de Jean Galvão ali acima na sexta (16) elaborou com muito mais propriedade o que eu havia escrito cá abaixo duas semanas atrás. A queda de Eduardo Cunha, àquele momento paralela à de Dilma Rousseff, tornou-se uma só e de mãos dadas no traço brilhante do cartunista.

A eficácia da PGR em trucidar seletivamente o presidente da Câmara, com provas de resto irrefutáveis, sugere que o chão esteja mais próximo de Cunha, embora ele tenha insinuado confiança atípica no desfecho.

Na semana em que Dilma cumpriu seu destino traçado pelo PT e transmutou-se num boneco do ventríloquo Lula, faltando só a cabeça de Levy numa bandeja, a corda não apertou apenas o pescoço de Cunha.

O chefão petista se viu jogado na confusão, com as ainda incipientes acusações de Fernando Baiano dando corpo àquilo que é dito nos corredores do poder há anos.

Dilma, ou seu holograma, luta. Tendo obtido a mão do Supremo para congelar o que insiste em chamar de golpe, um exercício de desonestidade intelectual comparável aos malabarismos da oposição ao lidar com Cunha, ela contudo está longe de se ver amparada por alguma rede –a PF em suas investidas nas contas da campanha que o diga, para não falar no horror econômico cotidiano.

Como no cerco à Constantinopla bizantina pelos otomanos em 1453, a bruma da guerra turva previsões. Lá, como cá, ambos os lados se veem perto da vitória estratégica só para provarem da frustração da derrota tática no momento seguinte.

Não muitos se dão conta de que o ataque final de Mehmet 2º à minguada defesa de Constantino 11 por pouco não resultou numa retirada humilhante, dado que ambos os lados estavam exauridos e à mercê da sorte.

Essa é uma esperança do Planalto hoje, a de que o cerco possa ser levantado de uma vez. Sobriamente, ninguém pode encampar essa versão ainda, talvez muito ao contrário.


Blindagens à vista - EDITORIAL FOLHA DE SP

Folha de SP - 17/10

A divulgação de documentos comprovando a existência de contas bancárias na Suíça em nome do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) vem representar a derrocada de uma figura que, por um bom período, ocupou o papel que os partidos oposicionistas no Congresso Nacional não souberam ou não tiveram condições de exercer.

Recaiu sobre Cunha o manto, que não lhe servia em nenhuma hipótese, de grande magistrado nacional e de procurador-geral da moralidade, na possível iniciativa de desencadear processo de afastamento da presidente da República, Dilma Rousseff (PT).

A esse título, vinha sendo abjetamente cortejado por uma oposição que encampa, com má memória de seus próprios mensalões, a defesa do patrimônio público.

Segundo o noticiário da TV Globo, seria equivalente a R$ 23,8 milhões, pelo menos, o total dos recursos secretamente transferidos para a Suíça em benefício do atual presidente da Câmara dos Deputados.

O peemedebista teria encerrado duas contas há pouco mais de um ano, quando começaram a surgir resultados da Operação Lava Jato.

As revelações parecem selar o destino do deputado, que já tivera frustrado no Supremo Tribunal Federal seu plano de dividir com o plenário da Câmara a responsabilidade pela abertura do processo de impeachment.

Nem por isso parecem diminuídas as preocupações do governo. Afora eventual ato de desespero do presidente da Câmara, outros perigos assombram os esquemas do PT.

Graves denúncias aproximam-se do ex-presidente Lula. Sua nora teria recebido R$ 2 milhões de um pecuarista amigo, em transação feita pelo lobista conhecido como Fernando Baiano, a título de propina.

Não é a única notícia de irregularidades envolvendo familiares de Lula, e pesam sobre o próprio petista, como se sabe, suspeitas de atuação indevida em favor de empresas implicadas na Lava Jato.

Os estrategistas do Planalto, cujos escassos talentos têm sido postos rudemente à prova, veem-se ocupados, assim, em obscenas e contraditórias ações de blindagem.

Lula poderia proteger-se de iniciativas judiciais de primeira instância se lhe fosse concedido um posto ministerial. Cunha poderia ser preservado caso não se disponha a atacar. Como as ruas reagiriam a manobras tão deploráveis?
Sobre uma conjuntura que pode conhecer reviravoltas a todo instante, não é possível arriscar previsões, mas uma conclusão se tira.

Num ambiente de corrupção generalizada, acusadores e acusados, aliados e adversários trocam de papel sem que seus discursos e lemas tenham qualquer relevância –e a propina, que antes se contava em dólares, talvez se calcule hoje em meses ou anos a menos de cadeia.

Éticas na política - HÉLIO SCWARTSMAN

FOLHA DE SP - 17/10

SÃO PAULO - A filosofia distingue entre a ética descritiva e a normativa. Enquanto a primeira se limita a arrolar as crenças morais das pessoas, a segunda tenta estabelecer se essas crenças se justificam à luz de princípios que permitam classificá-las em termos de certo e errado.

Como filósofos têm imaginação fértil, há desde sistemas baseados no cálculo da felicidade até os que se fundam na religião. Um dos favoritos é a chamada regra de ouro, segundo a qual não devemos fazer ao próximo aquilo que não desejaríamos que ele nos fizesse. Surgem assim normas morais invioláveis como não roubar, não mentir, pôr o interesse público acima dos particulares etc. O princípio é tão popular que já foi sequestrado por religiões tão diversas quanto cristianismo e budismo e por filósofos do calibre de Kant.

A aplicação da regra de ouro ao cenário político brasileiro recomendaria desistir do país. Ao que tudo indica, o governo acuado pela ruína econômica e por infindáveis denúncias de corrupção está em vias de fechar um acordo com o presidente da Câmara, ele próprio enredado em acusações de corrupção. Se os relatos de bastidores são precisos, parlamentares da base governista livrariam a cara do chefe dos deputados no Conselho de Ética em troca de ele segurar os trâmites que poderiam levar a um processo de impeachment contra a presidente da República. Como a oposição calcula que não pode dispensar as boas graças do ilustre parlamentar, também evita contrariá-lo.

Ninguém admite nada disso, pois fazê-lo equivaleria a confessar que um bom naco das normas morais supostamente invioláveis estão sendo violadas. Uma alternativa seria trocar a regra de ouro por éticas mais realistas, como o consequencialismo, segundo o qual ações devem ser julgadas pelos resultados que acarretam. Mas, neste caso, a emenda fica pior que o soneto, pois são as disputas entre políticos que estão magnificando a crise econômica.

Fausto no trópico - DEMÉTRIO MAGNOLI

FOLHA DE SP - 17/10

"O PSOL é linha auxiliar do PT. Fiz uma aposta com eles: assinem o pedido de impeachment, que eu assino o pedido contra Cunha." Carlos Sampaio, o líder tucano dos cavaleiros do impeachment, tem alguma razão no diagnóstico sobre o PSOL, mas seu repto evidencia a armadilha na qual o PSDB se enredou. Tal como na célebre lenda folclórica germânica, os tucanos firmaram um pacto com o Diabo, representado pela figura mefistofélica de Eduardo Cunha. Se Fausto entregou sua alma em troca de ilimitado conhecimento e poderes mágicos, o PSDB intercambiou sua integridade política pela promessa de deflagração do impeachment. Mas, à diferença de Mefistófeles, que cumpriu a palavra empenhada durante os 24 anos da vigência do pacto, Cunha ensaia rasgar o compromisso no balcão de negócios do Planalto. Será uma bela lição para o principal partido oposicionista.

Sampaio e seus cavaleiros não entenderam a relação entre o PSDB e as multidões que ocuparam as ruas para maldizer o governo. No calor do asfalto, impeachment é uma síntese possível da indignação nacional contra o lulopetismo. Nas maquinações do Congresso, contudo, o impedimento da presidente exige a ruptura do PMDB com o governo, algo que escapa ao controle dos tucanos. Em meio à implosão da base governista, o PSDB teve a oportunidade de delinear uma agenda parlamentar de oposição, prefigurando o cenário político do pós-Dilma. No lugar disso, escolheu agir como linha auxiliar dos caciques peemedebistas. O produto da escolha está aí: os tucanos reduziram-se a espectadores turbulentos do jogo de chantagens entre o PMDB e o lulopetismo.

Na sua obsessão pelo impeachment, os cavaleiros tucanos embrenharam-se na senda de fundamentá-lo sobre a base pantanosa das "pedaladas fiscais", que abriria caminho para um governo de Michel Temer. As "pedaladas" são manifestações financeiras do populismo econômico lulopetista –mas, em si mesmas, não constituem crime de responsabilidade. O crime passível de impeachment, ainda não totalmente comprovado, encontra-se no financiamento de campanha com recursos desviados da Petrobras. O PSDB desviou-se dessa rota complexa pois ela não conduz a um acordo com os caciques peemedebistas implicados na Lava Jato. No fim, tramaram com o suspeito do crime maior um impeachment justificado pelo crime menor. O pacto faustiano teve o aplauso dos grupelhos excitados que convocaram as manifestações anti-Dilma, mas só produziu confusão na opinião pública.

"Aécio, o PSDB está em conluio com o deputado Cunha", acusou o senador petista Lindbergh Farias, enquanto Lula acionava o PT para oferecer um bote salva-vidas ao presidente da Câmara, propondo-lhe a absolvição no Conselho de Ética em troca da rejeição do pedido de impeachment. O abraço de afogados entre Dilma e Cunha, uma evolução do contrato oculto de pilhagem da Petrobras, faz parte da ordem natural das coisas. Já o conluio tucano com nosso Mefistófeles de aldeia não só viola princípios elementares como revela um primitivismo digno de amadores. "Se eu derrubo Dilma agora, no dia seguinte vocês me derrubam", ensinou Cunha aos aparvalhados cavaleiros do impeachment.

"Nossa aliança é com mais de 70% da população", balbuciou Aécio Neves, numa resposta inverossímil à cínica imputação de Lindbergh. Imersos na idiotia política, os cavaleiros do impeachment não captaram os sentimentos majoritários dos brasileiros, que estão fartos de Dilma, essa deplorável caricatura presidencial, mas sobretudo do sistema corrupto de governo cristalizado à sombra do lulopetismo. Os tucanos tiveram o privilégio da escolha entre a oposição íntegra e um pacto com bandidos pelo poder. Eles optaram pelo segundo –e terão a primeira, mas sem a integridade.

O Fausto original termina no inferno; o de Goethe salva-se por uma graça divina. Qual será a sorte do PSDB?


Contagem regressiva para definição sobre ajuste - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 17/10

Governo e Congresso precisam se entender sobre várias medidas até o final de dezembro, mas o Planalto não quer afrontar aliados, e cresce o risco de agravamento da crise


Como a velocidade da evolução da crise política não atende às necessidades terapêuticas da crise econômica, há a percepção de que as respostas do governo e Congresso para estabilizar a economia, e preparar a retomada do crescimento, não chegarão a tempo. E o pior é que as medidas anunciadas até agora não são as adequadas.

Como a vida não para à espera dos políticos e do Planalto, na quinta-feira mais uma agência internacional, a Fitch, rebaixou a nota de risco do Brasil, de BBB, para BBB-, deixando o país a apenas um passo da saída do “grau de investimento”, selo de qualidade para os investidores.

Antes, a S&P, outra agência, maior que a Fitch, rebaixou o país para o “nível especulativo" — investimento no Brasil passou a ser de alto risco. Entre as justificativas, o envio ao Congresso pelo governo de uma proposta de Orçamento para 2016 com déficit, algo inédito. Reconhecido o erro, o Planalto se mobilizou para remeter ao Legislativo um conjunto de propostas embaladas como de ajuste fiscal, em que se destaca a recriação da CPMF, imposto renegado pelas distorções que provoca, e, por isso, com baixa probabilidade de ser carimbado pelo Congresso.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, não se cansa de repetir a meta de 0,7% de superavit primário para o ano que vem. E com razão alerta que, sem reequilíbrio fiscal, não haverá crescimento.

Para a preocupação geral, mesmo que a CPMF viesse a ser recriada, o nó fiscal continuaria atado. Por conveniência política, para não afrontar aliados e o próprio partido, o PT, o Planalto não aborda a crise fiscal em toda a sua dimensão.

Em artigo publicado na segunda-feira no GLOBO, o economista Raul Velloso voltou a chamar a atenção para pontos essenciais da crise: de 2002, quando Lula ganhou o primeiro mandato, ao ano passado, fim do governo Dilma I, as despesas primárias (sem considerar os juros) da União cresceram 344%: bem mais que a inflação de 108% do período e a expansão real do PIB, de 46%.

Se cortes pudessem ser feitos, a questão não seria tão grave. Mas não podem: 75% do Orçamento são para pagar a pessoas — aposentadorias, outros benefícios previdenciários, funcionalismo, bolsas e demais programas ditos sociais. São recursos engessados por lei, ou razões políticas, e indexados à inflação ou ao salário mínimo, cuja fórmula infla uma parcela grande das despesas, mesmo numa profunda recessão como agora. Em janeiro, por exemplo, o salário mínimo subirá cerca de 10%, com brutal reflexo sobre bilhões em gastos. Calcula-se que apenas o novo mínimo inchará os gastos em 0,2% do PIB, enquanto cai a arrecadação tributária. Do Orçamento, há ainda a obrigatoriedade de 8% irem para a Saúde e 4%, para a Educação.

Não há possibilidade, portanto, de se obter algum superávit substancial sem se alterar as regras de engessamento e de indexação dos gastos. É preciso, ainda, lançar logo reformas como a da Previdência, para desanuviar o horizonte da economia.

A fim de quebrar a rigidez na administração orçamentária, existe a DRU (Desvinculação de Recursos da União), emenda constitucional que precisa ser aprovada até o fim de dezembro. Desengessará 30% até dezembro de 2023. A DRU é um “jeitinho” criado ainda na Era FH para contornar esta vinculação excessiva.

O tempo passa e muita coisa precisa ser feita até 31 de dezembro, para vigorar logo no dia 1º de janeiro. Mas, devido à crise política, o Congresso resiste até mesmo a renovar a DRU. Fazem sentido, então, o clima tenso e o pessimismo de agências de avaliação de risco.

Para agravá-los, ainda há o discurso piromaníaco de Lula contra o ajuste fiscal. A saída, para ele e seguidores lulopetistas, é retornar à política anterior do “novo marco macroeconômico” — juros baixos e mais gastos, sempre na base da “vontade política”. Mas o “novo marco” é a causa da crise. Imagine-se o que acontecerá. O risco é o ajuste fiscal ser feito de forma selvagem, à la grega, pelo mercado, por meio de uma hiperinflação, acompanhada de profunda recessão, pior que a atual.

Déficit de atenção - CRISTOVAM BUARQUE

O GLOBO - 17/10

A pedagogia brasileira considera como doença o déficit de atenção dos alunos, sem perceber o déficit de atenção dos governantes com a escola e seus alunos.

Impossível uma criança não sofrer déficit de atenção em aula para turmas diferentes na mesma sala, dividida por meia-parede, às vezes por um simples móvel entre duas ou mais turmas; ou em uma sala de aula deficiente, com bancos desconfortáveis onde os alunos se sentam. Os baixos salários dos professores e suas constantes greves são déficit de atenção dos governos com a educação e provocam obviamente déficits de atenção das crianças nos seus estudos. Difícil não haver déficit de atenção do aluno quando o professor usa quadro-negro no lugar de lousas inteligentes e outros equipamentos de tecnologia da informação para crianças da era da informática e dos celulares, nascidas no século XXI.

Injustificável jogar sobre as crianças a razão do déficit de atenção que elas têm. Apesar disso, tratamos o problema do déficit de atenção das crianças como um problema biológico, de hormônios; psiquiátrico, de desajustes; ou mesmo neurológico, de disfunções. O déficit de atenção é do Brasil para com elas, ao não lhes oferecer as condições ideais em boas salas de aulas, climatizadas, bem equipadas, com professores muito bem remunerados, preparados e motivados.

A escola é um exemplo, mas não é apenas em relação a ela que o Brasil padece de déficit de atenção.

O país tem déficit de atenção para com suas florestas, seus rios, suas cidades, seus pobres. As doenças endêmicas que molestam milhões de brasileiros por ano, o descuido com os sistemas preventivos e o abandono dos hospitais são o resultado do déficit de atenção com a saúde pública. As mortes no trânsito ou por violência também seriam evitadas se o Brasil não tivesse déficit de atenção; cada ano, acidentes com deslizamentos de encostas seriam evitados com um pouco de atenção. Há déficit de atenção quando fazemos projetos de infraestrutura sem reservar os recursos necessários, nem cuidamos da qualidade da obra, e especialmente quando não impedimos corrupção de sobrepreços e propinas.

O próprio déficit fiscal, além de crime de responsabilidade, é também um déficit de atenção dos governos com o valor da moeda.

Nossa preferência pelo consumo no presente, sem preocupação com poupança para o futuro; a opção pelo ensino superior, deixando de lado a educação de base; o desprezo à ciência, à tecnologia e à inovação são decisões tomadas com déficit de atenção ao país. As políticas dos governos brasileiros e o comportamento de nossa população se caracterizam por déficits de atenção.

O Brasil padece de déficit de atenção, e a culpa não é das crianças. Como cada criança não aprende por déficit de atenção no estudo e compromete seu futuro pessoal, o Brasil compromete nosso futuro nacional por déficit de atenção com seus problemas.


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

DELATOR REVELA ATUAÇÃO DE AMIGO OPERADOR DE LULA
Os depoimentos do lobista Fernando Soares, o “Fernando Baiano”, não apenas colocam o ex-presidente Lula no esquema de corrupção investigado na Lava Jato como lança luz sobre uma das figuras mais poderosas do “lulismo”, o fazendeiro José Carlos Bumlai. O operador do PMDB confirmou à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal que Bumlai atuava como uma espécie de “operador” do ex-presidente.

PADRINHO DE CERVERÓ
Bumlai “cuidava” para Lula de assuntos envolvendo a Petrobras desde 2005. Passou por ele a escolha de Nestor Cerveró para sua diretoria.

GURU DO SETOR ELÉTRICO
No setor elétrico, atribui-se a Bumlai a montagem do consórcio para construir a usina de Belo Monte – um negócio de R$ 25 bilhões.

RESOLVEDOR DE PROBLEMAS
Bumlai também estaria envolvido no esquema que rendeu R$ 2 milhões para Lulinha e mais R$ 2 milhões para uma nora de Lula.

FALTA O CHEFE
Apesar de Lula ter sido tantas vezes citado e até denunciado, até agora a Procuradoria-Geral da República não abriu investigação contra ele.

DILMA AINDA NÃO CASSOU MEDALHAS DE MENSALEIROS
Condenados há mais de três anos por crimes cometidos no Mensalão, José Dirceu, José Genoino, Roberto Jefferson, João Paulo Cunha e Valdemar Costa Neto ainda mantêm as medalhas da Ordem do Mérito Aeronáutico. A honraria deveria ter sido cassada pela Grã-Mestre da Ordem, a presidente Dilma, já que o decreto 3.446/00 obriga cassação de condenados por atentado contra “erário, instituições e a sociedade”.

PURO MÉRITO
Ex-ministro da Casa Civil, Dirceu recebeu das mãos do ex-presidente Lula a comenda no grau de Grande-Oficial, o segundo mais alto.

‘CUMPANHÊROS’
O ex-deputado José Genoino era réu no processo do mensalão quando foi condecorado pelo então ministro da Defesa Nelson Jobim, em 2011.

ALÔ, PROCURADORIA
A Medalha do Pacificador dos mensaleiros só foi cassada após ofício enviado pela procuradora da República Eliana Pires Rocha ao Exército.

VISITANTE FALASTRÃO
Presidente da Comissão de Relações Exteriores, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) cancelou reunião com o secretário da Unasul, ex-presidente da Colômbia, que defendeu de Dilma: “Ernesto Samper faria melhor se dedicasse atenção à escalada autoritária em outros países”.

LEXOTAN NA VEIA
É consenso na presidência da Câmara a tranquilidade de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Quanto mais o peemedebista é denunciado, mais ele se mostra disposto a continuar no cargo.

PORTEIRA FECHADA
O ministro da Secretaria de Portos, Helder Barbalho, demitiu Guilherme Penin do cargo de secretário-executivo. Tentou dar carteira no ministro, mas foi obrigado a ouvir: “A porteira (fechada) é minha”.

ESTÁ ESCRITO
Em Brasília, esta semana, Roberval Batista, o “Pai Uzeda”, jogou os búzios e avisou que está escrito: não apenas a presidente Dilma vai perder o emprego. “Eduardo Cunha e Renan Calheiros também vão cair”, garantiu, ele convicto, após dar consulta a um ministro.

DIA DEPOIS DE AMANHÃ
No Congresso, não se falava outra coisa: foi semana de alívio para o governo, com representação contra Eduardo Cunha no Conselho de Ética e suspensão do impeachment. Mas a próxima deve ser dura.

PEGA MAL
Incumbido pela Comissão de Trabalho de contatar o presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, o deputado Sílvio Costa (PSC-PE) deu pinote: “Não me peçam para ligar para a Petrobras!”. A risada foi geral.

MORRENDO PELA BOCA
Damião Feliciano (PDT-PB) espalhava que sua mulher, Lygia Feliciano, seria governadora da Paraíba por dez dias. Ao saber disso, Ricardo Coutinho suspendeu seu atestado e melou as pretensões do deputado.

ENTRINCHEIRADOS
“Não há nada pacificado, sobretudo em um clássico como os vetos ao reajuste do Judiciário”, afirma o deputado José Priante (PMDB-PA), que foi cotado para ministro e barrado pelo primo Jader Barbalho.

PENSANDO BEM...
... foi uma boa semana para o governo: o termo #impeachment foi mencionado “apenas” 8 vezes por hora no Twitter.