domingo, julho 13, 2014

Xingamentos e a estratégia do ressentimento - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 13/07


Insultos à presidente são inaceitáveis, e esperamos que não ocorram hoje. Mas Lula e outros petistas vêm cultivando o “nós contra eles” há muito tempo


Duas grandes perguntas envolvem a final que será disputada nesta tarde, no Maracanã – o grande templo do futebol mundial em que a seleção brasileira nem botou os pés, por arrogância da organização –, entre Alemanha e Argentina. A primeira é óbvia e interessa a todo o mundo: quem conquistará a Copa mais uma vez? A segunda diz mais respeito aos brasileiros: a presidente Dilma Rousseff, que já garantiu sua presença e deve entregar a taça ao capitão da equipe vencedora, será recebida com a mesma hostilidade que enfrentou em São Paulo, no dia da abertura da Copa?

Se a vaia até faz parte do jogo, xingamentos como o que Dilma ouviu na Arena Corinthians são inaceitáveis, indignos de uma sociedade que se pretende civilizada. Não há justificativa para esse tipo de atitude e esperamos sinceramente que o episódio não se repita hoje. Mas nem por isso deixaremos de lembrar que tal reação é fruto de um ambiente cultivado, em grande parte, por diversos membros do PT, inclusive por seu grande líder, o ex-presidente Lula, que se mostrou escandalizado com os insultos a Dilma apesar de ele ter feito o mesmo contra Itamar Franco em 1993.

A própria reação ao caso do Itaquerão mostrou como funciona o modus operandi dessas pessoas. Chefões do partido e até comentaristas esportivos alinhados com sua ideologia recorreram a clivagens de gênero, socioeconômicas e até raciais para condenar o ato. Em vez de dizer o óbvio e o certo – que o insulto é um desrespeito atroz, independentemente de quem o profere e de quem o recebe –, o discurso predominante condenava a “elite branca” que estaria no estádio e seria a responsável pelos xingamentos.

Ricos contra pobres, brancos contra negros, homens contra mulheres, em resumo, “nós contra eles” – a estratégia de fomentar o ressentimento é clássica. O próprio Lula, que mesmo na presidência não tinha exatamente o vocabulário polido que agora cobra dos demais, disse inúmeras vezes que os ricos não desejavam a prosperidade dos pobres. “As pessoas não estão perdendo nada, só não querem que os pobres cheguem igual a eles”, afirmou a militantes negros em 2007; “Eles se incomodam. Eles preferiam um avião vazio, com meia dúzia de ricos”, afirmou dias atrás, comentando os insultos a Dilma. A presidente, aliás, aprendeu bem a lição do mentor e rebateu os xingamentos com um vídeo no qual afirmava que o Brasil “é um país em que mulheres, negros, jovens e crianças, a maioria mais pobre, passaram a ter direitos que sempre foram negados. É isso que vaiam e xingam. É isso que não suportam”.

Além do vitimismo e do estímulo ao ressentimento, até a agressão física já fez parte do cardápio dos líderes petistas. “Eles têm de apanhar nas ruas e nas urnas”, gritava José Dirceu a grevistas em 2000 – o agora mensaleiro condenado se referia aos tucanos paulistas. O governador Mario Covas, dias depois, seria agredido com paus, pedras e laranjas ao tentar entrar na Secretaria de Estado da Educação, que tinha sua entrada bloqueada por professores em greve. “Covas sentou em cima de um formigueiro”, foi a reação de Lula à agressão, comprovando não só que o clima agressivo vem sendo cultivado há muito tempo, mas também que a indignação de Lula é seletiva, dependendo do alvo do ataque.

A mistura entre esporte e política não é exclusiva desta ou daquela corrente ideológica. As ditaduras argentina e brasileira se aproveitaram do futebol, e os regimes totalitários de Cuba, da Cortina de Ferro e da China sempre usaram o sucesso de seus atletas como ferramenta de propaganda do socialismo. Dilma quis embarcar na campanha do hexa, posou para fotos imitando Neymar e organizou até um chat com internautas sobre a Copa, tentando colar sua imagem a um evento que se tornou a “Copa das Copas” não por fatores políticos, mas pelo desempenho das seleções em campo e pela festa das torcidas. No bate-papo, chegou a igualar o pessimismo com a organização da Copa ao pessimismo com a economia. Claro, não é por isso, e nem pelo histórico lulopetista de fomentar a divisão, que se deve xingar a presidente da República. Mas posar de vítima inocente diante da grosseria alheia nada mais é que cinismo.


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