quinta-feira, julho 03, 2014

A indústria encolhe - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 03/07

A queda forte da produção industrial de maio, de 0,6%, confirma o sentimento geral de desânimo do setor. Por qualquer ângulo que se olhe, o número é negativo. O acumulado em cinco meses mostra uma queda de 1,6%; na comparação com maio do ano passado, há uma redução de 3,2%. Além da pouca atividade doméstica, há também dificuldades para exportar produtos manufaturados.

Os dados dos últimos dias mostram o seguinte quadro: a indústria está encolhendo, o Tesouro teve o pior déficit primário da série histórica, e abalança comercial fechou o semestre no vermelho. O saldo de janeiro a junho é negativo em US$ 2,4 bilhões, com queda das exportações, das importações, e, portanto, da corrente de comércio. A crise na Argentina já está afetando as exportações de manufaturados, que caíram 10% sobre o mesmo período de 2013.

A boa notícia é que o déficit externo diminuiu. Já houve momento do ano em que estava com US$ 6 bilhões e está agora com US$ 2,4 bi, após um bom superávit no mês de junho. Em parte, isso se deve ao aumento de produção e de exportação de petróleo. O déficit do ano passado no setor de petróleo ficou em US$ 20 bilhões, este ano pode fechar, nas previsões do governo, em US$ 15 bi.

A pior notícia dos dados da indústria é a queda de 2,6% da produção de bens de capitais em maio, em relação a abril, e de 9,7%, em relação a maio do ano passado. O número em relação ao mesmo mês de 2013 pode estar exagerado pelo aumento grande que houve de produção de caminhões para a renovação da frota com novos motores de baixa emissão. Mas está havendo queda até de um mês em relação ao anterior. E no ano já acumula redução de 5,8%.

No caso da balança comercial, ter déficit não é, necessariamente, um problema. Quando o volume de comércio está aumentando, ou quando as importações são de máquinas e equipamentos, a economia vai ser beneficiada por crescimento ou por um futuro aumento da produtividade. Nenhum problema. A questão é que o resultado divulgado pelo Ministério do Desenvolvimento mostrou que as importações de bens de capital caíram 5,1% no primeiro semestre, e isso reforça a percepção de que os empresários estão pouco confiantes com a economia e reduzindo investimentos. As importações em geral encolheram 3% na média diária. O déficit ficou menor porque o país importou menos combustíveis, 8%, e exportou mais petróleo.

Pelo lado das exportações, caíram as vendas externas que deveriam subir, e cresceu a dependência dos produtos básicos, como soja e minério de ferro. A exportação de produtos manufaturados recuou 10% no semestre, com retração de 31% nos automóveis e 25% nas autopeças. As vendas de produtos semimanufaturados também caíram 8,5%. Em compensação, vendemos mais produtos básicos, como carnes e soja.

A exportação de petróleo bruto cresceu 29% e ajudou a diminuir o rombo do setor energético no primeiro semestre. Ainda assim, o país ainda vive uma carência muito forte de produtos ligados ao setor de e nergia. Temos importado muito de tudo: gasolina, óleo diesel, gás, nafta petroquímico, querosene de aviação.

O quadro negativo revelado ontem pelos dados do IBGE em relação à indústria é muito maior, mais generalizado e permanente do que supõe o governo. O Ministério da Fazenda tem administrado os mesmos remédios que já foram usados e que não produziram nenhum resultado, como o pacotinho de não elevação do IPI de carros e alguns outros produtos. A indústria precisa mais que um medicamento temporário, tópico e setorial. Os dados confirmam as previsões de um ano de crescimento do PIB em torno de 1%, como registra a última pesquisa Focus, e consolidam o cenário de desânimo na economia.

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