sábado, dezembro 28, 2013

As versões e os fatos - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 28/12

Duas iniciativas importantes ficaram de 2013: a abertura dos portos e a proposta de mudar a Lei de Licitações


Pessimismo ou otimismo são, em geral, abstrações. Refletem nosso sentimento diante da realidade, e não ela própria.

O que define a realidade são os fatos. Por isso, quando me perguntam se estou otimista ou pessimista quanto ao futuro, deixo de lado o alarido das impressões e me debruço sobre dados concretos da realidade.

Sustento que 2013 foi ano decisivo para o desenvolvimento do país, dos mais importantes dos últimos tempos, em especial para o agronegócio. Dele nos ficarão iniciativas para superar a crise de crescimento, expondo gargalos que há anos nos atormentam.

Cito duas, com peso equivalente à aprovação do Código Florestal, em 2012: a abertura dos portos à iniciativa privada e a proposta de mudança na Lei de Licitações.

São iniciativas que, além de desobstruir o desenvolvimento, revelaram forças do reacionarismo, que há décadas conspiram contra o país.

O novo Código Florestal é marco histórico democraticamente deliberado pelo Congresso Nacional. O anterior foi estabelecido pelo regime militar, em 1965. A partir de então --e sobretudo após o advento do debate ambientalista dos anos 1970-- ficou submetido a uma tecnocracia que legislava de costas para o país, indiferente a seus interesses.

Desnecessário dizer que, além dos danos à produção, infundia insegurança jurídica aos investidores. Sem regras claras, não se investe; sem investimentos, não se cresce nem se prospera; e, sem prosperidade, não se supera a crise social que realimenta dificuldades na política e na economia. É um círculo vicioso, que agora começa a se romper.

A abertura dos portos, iniciada 205 anos atrás, foi retomada com a concessão de sua exploração pela iniciativa privada. Mas não se extinguiu o modelo anacrônico anterior, defendido pelo lobby corporativista.

Executivo e Legislativo, felizmente, enfrentaram-no com altivez e espírito público. O modelo alternativo, privado, dará novo impulso às exportações.

Resta investir em hidrovias e reestruturar a navegação de cabotagem para baixar o custo Brasil. Infelizmente, ficou para 2014.

Chego, por fim, à nova Lei de Licitações, que consolidará as leis 8.666, a dos pregões e a do RDC (Regime Diferenciado de Contratação), responsáveis por alguns nós górdios que atrasam obras, oferecem brechas à corrupção e contaminam o sistema de concorrências.

Coube-me relatá-la e aprová-la na Comissão Especial do Senado. Deverá ser votada no primeiro semestre de 2014. Também nesse debate surgiram resistências às mudanças.

Aproveitadores do dinheiro público, por óbvio, preferem lei que favoreça licitações direcionadas, formação de cartéis e contratos fraudulentos com o poder público.

A 8.666 foi criada para assegurar o uso responsável dos recursos públicos, mas acabou estabelecendo barreiras burocráticas a obras importantes, sem, no entanto, barrar a corrupção. Saiu pela culatra.

Nosso desafio foi tornar mais objetivas regras de fiscalização sem abrir mão dos controles essenciais. Extinguimos duas modalidades de licitação mais suscetíveis a conluios: a carta-convite e a tomada de preços, explicáveis na era pré-internet, quando despesas de menor vulto não justificavam a abertura de um complexo processo de licitação.

A proposta dá também mais equilíbrio ao processo de seleção. Permite ao gestor considerar, como fator primordial, a qualidade do serviço, sobretudo em casos de grande complexidade técnica. O critério de eficiência corresponderá a 70% do peso da proposta e o valor sugerido terá peso de 30%.

Não só: nas concorrências, apenas a melhor proposta será analisada. Se sua documentação for insuficiente, passa-se à segunda melhor oferta.

A lei atual exige que o órgão licitante analise a aptidão de cada concorrente, com longa checagem da documentação, inclusive dos que não terão a menor chance de vencer a concorrência.

Foram seis meses de trabalho, que resultou vitorioso. O país avança no essencial: o aprimoramento de sua infraestrutura, que torna indispensável um modelo moderno e eficiente de licitação.

O Brasil prepara-se para ascender a um patamar superior, não importam o otimismo ou o pessimismo de quem observa.

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