terça-feira, outubro 08, 2013

Nós e o mundo - ANTÔNIO DELFIM NETO

VALOR ECONÔMICO - 08/10

Na organização da economia mundial, os países estão ligados pelos fatos e pelas expectativas que se formam dentro de cada um deles e pela intercomunicação que se estabelece entre eles. Nenhum é uma ilha. Numa razão maior ou menor, todos dependem de todos. Fundamentalmente, cada um é vítima ou beneficiário de sua organização política, da qualidade de suas instituições e da capacidade de liderança do poder incumbente de confirmar a confiança da sociedade e mobilizá-la para a consecução dos objetivos que ela mesmo estabeleceu.

A taxa de desenvolvimento econômico de um país pode ser vista como a soma de três componentes: 1) a resultante do seu próprio esforço interno e da qualidade da sua política econômica; 2) os efeitos de sua interação com o mundo, no que tange às ligações financeiras (movimento de capitais) e de comércio (exportação e importação), que dependem, por sua vez, do esforço interno e da qualidade da política econômica dos seus parceiros internacionais; e 3) de choques globais que afetam simultaneamente todos os países, ainda que cada um à sua moda. É isso que explica o nível da covariação entre as taxas de crescimento dos vários países.

Em setembro último, comemorou-se o quinto ano desde a enorme barbeiragem das autoridades monetárias americanas e inglesas, que foram atropeladas por sua incompetência em organizar a saída do Lehman Brothers do mercado. Finalmente parece que a justiça (não apenas com multas, mas a privação de liberdade) começa a bater nas portas dos que foram diretamente responsáveis pela destruição, nos últimos cinco anos, de cerca de 2/3 do PIB mundial de um ano e pelo desemprego de mais de 40 milhões de pessoas, que viviam honestamente do seu trabalho, enquanto eles continuaram a acumular formidáveis patrimônios.

A recessão iniciada em 2008 foi muito profunda e a recuperação lenta, como se vê no gráfico abaixo. As medidas monetária e fiscal foram insuficientes e mal coordenadas, não apenas por dificuldades políticas (o desarranjo institucional americano e a falta de arranjo institucional da Europa), mas também porque - como disse Ben Bernanke, o chairman do Fed - estávamos sem bússola numa noite escura num mar revolto nunca dantes navegado...

Os sinais de recuperação das economias desenvolvidas são tênues, modestos e, em certa medida, contraditórios. Lentamente, eles tomam fôlego. Por outro lado as emergentes, que foram o suporte do crescimento global, parecem imergir, iniciando um ciclo de menor crescimento, como se vê na tabela. O Brasil talvez tenha antecipado o ciclo, pelos efeitos da segunda componente mencionada acima, além de problemas próprios, como a queda de confiança do setor privado e a lentidão com que estamos aprendendo a fazer concessões eficientes de infraestrutura.

A verdade é que temos respondido frouxamente a algumas reformas absolutamente necessárias, como a radical simplificação do sistema tributário, o enfrentamento do problema previdenciário e a redução do dramático aumento das incertezas produzidas, por exemplo, pela ação discricionária do Tribunal Superior do Trabalho com suas súmulas vinculantes, e pelas decisões duvidosas e arbitrárias tomadas pelo Fisco.

É a falta de fortes e decididas iniciativas do Executivo e do Legislativo, para tentar resolver tais problemas, que aumenta as incertezas sobre o futuro, que põe na geladeira o espírito animal do empresário e retarda as suas decisões de investir. Mesmo quando o corporativismo e interesses menores controlam o Congresso, é a pressão do Executivo, forçando a discussão das reformas e ampliando o espaço da racionalidade, que mobiliza a sociedade para ajudá-lo a superar a resistência oportunística, cuja essência é o curto-prazismo.

Seguramente, não é o presente desconforto com relação às políticas monetária e fiscal que preocupa os potenciais investidores estrangeiros, ou as agências de risco, que, apesar de terem perdido credibilidade, ainda influem na determinação do risco Brasil e no aumento da taxa de juros (à qual pode somar-se o efeito da mudança da política monetária americana) e no custo da dívida pública. O que importa é o temor que a aparente pouca importância dada às reformas acabará por tornar a dívida insustentável, se persistirem o baixo crescimento do PIB e a redução sistemática do superávit primário.


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