sexta-feira, setembro 06, 2013

O salão verde como porta de saída - MARIA CRISTINA FERNANDES

VALOR ECONÔMICO - 06/09


A julgar pelas prisões preventivas e pelo reforço no aparato de segurança, governantes de norte a sul aguardam mais ruídos no 7 de setembro do que os do tradicional "Grito dos Excluídos", desde 1995 incorporado ao tradicional calendário de protestos da data.

Nos três meses que se passaram desde o início dos protestos, nem tudo mudou para conservar a ordem. Há mudanças para melhor e outras que pioram o que já era muito ruim.

Entre as boas mudanças está a aprovação de projeto que tramitava há anos no Congresso para punir empresas que ofertam vantagens a servidores públicos como parte de sua estratégia de expansão. Depois de uma sucessão de leis para aumentar o rigor contra a corrupção no Estado, foi a vez de o Congresso se voltar contra o corruptor. A lei foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff com vetos nos artigos que atenuavam as punições às empresas.

Entre os piores subprodutos das ruas está a minirreforma eleitoral em curso. Situa a atual lei na ala dos feitos nunca tão ruins que não possam piorar.

O texto aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado dificulta a vida de quem quer disputar mas não dispõe de mandato, carreira na televisão ou vocação para líder religioso.

Veta todas as alternativas surgidas para divulgação de candidaturas desde a proibição de outdoors, como placas e cavaletes, pintura de muro de casas e de casas. Regulou até o tamanho dos adesivos.

A justificativa para toda essa perfumaria foi a necessidade de reduzir o custo de campanha. Houvesse, de fato, esta motivação teriam reforçado a transparência e a vigilância sobre os gastos. Preferiram derrubar a emenda que obrigava a divulgação dos financiadores durante as campanhas. E ainda abrigaram as multas aplicadas às legendas entre os propósitos do fundo partidário. Preparam-se para infringir a lei eleitoral e debitar na conta do eleitor.

A votação do texto foi nota de pé de página numa semana em que só se falou da manutenção do mandato do deputado federal Natan Donadon (sem partido-RO), preso pelo desvio de verbas na Assembleia Legislativa de Rondônia.

São fatos derivados da mesma sofreguidão numa conjuntura de rechaço à representação política. Mas as mudanças na lei eleitoral têm consequências ainda mais danosas. Ao impermeabilizar o Legislativo a novas carreiras, a minirreforma eleitoral não apenas visa a preservar mandatos como frustra a renovação.

O Congresso pode se renovar sem melhorar. O sangue novo também pode chegar contaminado. As mudanças em curso não o esterilizam.

No banco de dados do Diap recolhe-se que a eleição parlamentar com o maior grau de renovação foi a de 1990. Na esteira da eleição do caçador de marajás no ano anterior, os eleitores mandaram para casa seis em cada dez deputados.

Foi uma renovação semelhante à que sucedeu no parlamento italiano depois da operação "Mãos Limpas" que varreu 70% da elite política.

Na Itália, a renovação eleitoral de 1994 deu origem à era Silvio Berlusconi. No Brasil, a renovação recorde de 1990 daria início à legislatura dos "Anões do Orçamento".

Concorre para piorar o que já é ruim a gritaria anticorrupção. Reúne no mesmo barco e esteriliza interesses conflitantes na disputa pelo Estado.

O PSOL, um dos partidos mais antenados contra os passeios de helicóptero da cachorrinha do governador Sérgio Cabral, por exemplo, pode pagar pedágio na rota de 2014. A líder do partido na Assembleia Legislativa e presidente do partido no Rio renunciou ao cargo depois de denúncia de financiamento irregular de campanha.

Um dos momentos mais emblemáticos do trimestre das manifestações foi o confronto entre a moçada das redes sociais e os carros de som dos sindicatos.

Mais reduzidos, os protestos sindicais foram criticados por discurso e método. Por carcomido que seja seu apego a privilégios das elites do sindicalismo e do funcionalismo público, o que há de fato mais ultrapassado neles é a incapacidade de convencer a audiência da atualidade de demandas trabalhistas.

O descaso pela discussão da duração da jornada ou das regras de aposentadoria só pode interessar a quem não ganha a vida pelo trabalho.

Tramita no Congresso, ignorado pelo distinto público, projeto de lei que amplia para além de atividades como limpeza, segurança e mão de obra rural a terceirização das contratações.

O líder do Solidariedade, nova legenda que deve chegar à Câmara em 2014, contesta a proposta, mas os políticos que recruta não guardam relação com o mundo do trabalho. Têm mais proximidade com o universo dos negócios. É uma janela de oportunidades para quem quer escapar das amarras da fidelidade partidária.

Na outra ponta, partidos também buscam verniz de rua com o recrutamento de lideranças que se projetaram nos últimos meses, do Passe Livre ao Midia Ninja, mas enfrentam resistências. Essas lideranças temem que a adesão institucional os afaste dos movimentos nos quais se originaram. Como a moçada que foge do Congresso não gestou um substituto para a democracia representativa, a temporada eleitoral que está para se iniciar corre o risco de aprofundar o fosso entre as ruas e o salão verde.

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