quarta-feira, julho 24, 2013

Lula na disputa - TEREZA CRUVINEL

CORREIO BRAZILIENSE - 24/07
O tom de Lula na fala de ontem foi revelador de sua disposição para a refrega política em defesa de Dilma

Falando ontem no Festival da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a retórica cortante que sempre adotou nos momentos cruciais, deixou claro ontem que deixará a reserva de lado para emprestar sua força e popularidade à disputa política, no momento de maior ameaça à continuidade do PT no poder. "Eles estão colocando as unhas de fora. As minhas, eu vinha cortando no dente. Agora, vou deixar crescer."

A uma plateia de 500 pessoas, ele fez um exaustivo balanço das conquistas dos negros e das mulheres e das relações Brasil-África em seu governo, ao longo do qual lançou vários "cacos", arrancando risos e aplausos, como registra a matéria de Juliana Braga nesta edição. Em nenhum momento falou de eleição, mas, no fim, disse que não podia sair dali "sem dizer duas coisas que estão me engasgando". Disse várias, e todas indicadoras de que ele está com enorme disposição para a refrega em favor da presidente Dilma, que tem a reeleição ameaçada pela queda na popularidade e nas intenções de voto. Se não como candidato, pois na saída Lula voltaria a descartar a candidatura; como o grande eleitor, papel que cumpriu com êxito na eleição de Dilma em 2010 e do prefeito Fernando Haddad em 2012.

Começou falando das manifestações, que estaria buscando compreender com cautela e sem ansiedade. "Eu sempre disse que democracia não é pacto de silêncio." Isso posto, admitindo existirem grandes problemas na área da saúde, afirmou, no velho estilo fustigante, que, em 2007, as elites impediram a prorrogação da CPMF, tirando recursos da saúde que hoje somariam mais de R$ 50 bilhões. "Eles tiraram porque não precisam da saúde pública, têm os melhores planos de saúde, que dão acesso aos melhores hospitais e tratamentos. E dizem que têm porque pagam. Mentira. Quem paga é o povo brasileiro, porque tudo é abatido do Imposto de Renda." Em tempo, disse que já foi pobre e que precisou de hospital público. "Hoje, tenho aqueles planos, e mesmo que não tivesse, Lula já é um plano." Daí, pulou para a defesa de Dilma na queda de braço com as corporações médicas em torno da abertura do país ao ingresso de médicos estrangeiros.

O segundo desabafo também começou pelas manifestações, condenando os que delas participam negando a política. "Manifestações contra a política nunca levaram a mais democracia, mas a coisas piores, como o fascismo e o nazismo. Já fui assim. Eu batia no peito e dizia que não gostava de política nem de quem gostava de política. Mas sabe qual é a desgraça de quem diz isso? É que será governado por quem gosta. Então, você tem todo o direito de não gostar de um partido, de um deputado, de um presidente. Mas acorde o político que tem dentro de você, seja você o candidato, porque fora da política não há salvação." E, novamente, partiu para a defesa de Dilma. "Eles odiavam ela. Depois que ela ganhou, tentaram criar uma cisão entre nós, dizendo "o Lula é que não presta", tentando sempre mostrar uma diferença. Ela deu um chega para lá nisso. Agora, gente, estão com um preconceito contra ela, maior do que o que tinham contra mim. Nunca vi tanta falta de respeito a uma mulher com a qualidade da Dilma. Será que é só porque é mulher? Será que eles têm com a mãe deles a mesma falta de respeito que têm com a Dilma Rousseff? Desrespeitam o país, porque a Dilma é uma extensão nossa lá."

Antes, voltara ao tema do câncer, já abordado na semana passada, referindo-se à maldade dos que espalharam o boato de que o tumor teria voltado, assegurando que não esconderia o fato: "Eu posso dizer para vocês que o câncer não existe mais".

Lula encerrou avisando que estava deixando as unhas crescerem. Na saída, em rápida entrevista, voltou a jogar água fria no "volta, Lula". "Se eu tivesse que voltar a fazer alguma coisa em minha vida, seria jogar futebol. Mas acho que o Felipão não está de olho em mim, não." Minimizou, por fim, os problemas entre Dilma e o PT, dizendo que ele mesmo foi a poucas reuniões partidárias quando era presidente. Mais que o conteúdo, entretanto, o tom e o ânimo de Lula é que foram reveladores, ontem, de que ele recuperou a melhor forma política e está com fome de disputa.

Um sonho de Francisco
Apesar das expectativas, a primeira fala do papa no Brasil foi eminentemente pastoral. Não houve, ainda, a esperada sinalização política sobre os rumos de seu pontificado, o chamado Evangelho Social. Um de seus púlpitos mais importantes será o de hoje, na Basílica de Aparecida.

Outra expectativa é a de que ele proponha, aqui, a realização de um encontro ecumênico mundial, reunindo líderes de todas as religiões, em torno de objetivos comuns, como a paz e a fraternidade. Segundo o correspondente do jornal espanhol El País no Brasil, Juan Arias, o papa teria confidenciado esse projeto a seu amigo argentino, o rabino Abraham Skorka, em recente encontro que tiveram em Roma.

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