quinta-feira, julho 04, 2013

Contra o tempo - LETÍCIA SARDAS

O GLOBO - 04/07

Há pleitos que podem ser atendidos de imediato, mas outros, como a reforma,merecem discussões mais profundas


Visto pelo lado técnico, é viável a realização do plebiscito sobre questões pertinentes a reformas políticas, de forma que seus resultados sejam aplicados já na eleição de 2014. Na nota que a Justiça Eleitoral divulgou após a representativa reunião da presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, com os presidentes dos tribunais regionais, admite-se essa possibilidade, sendo necessário um prazo mínimo de 70 dias para organizar a consulta e, em seguida, levá-la ao Congresso.

Registre-se que esse é um passo obrigatório nesse processo, de modo que as decisões sejam aprovadas pelo Legislativo no prazo mínimo de um ano antes do pleito, prescrito na Constituição como o período a ser observado para os efeitos de novas regras da legislação eleitoral passarem a valer. Mas, deixando-se de lado esse aspecto da viabilidade técnica, o que cabe agora é encontrar as respostas adequadas a perguntas pertinentes ao momento em que o país vive. É um momento dinamicamente rico para a vida política brasileira, de justas cobranças em relação à qualidade da representação política e contra determinadas práticas do poder público.

O aumento do custo, em recursos públicos, que o apressamento implicará compensaria a realização do plebiscito em prazo tão curto? Vale a pena mergulhar na incerteza do açodamento todo um processo que, há anos, tem sido cobrado pela sociedade? Ou seja, se a reforma política dormiu até agora nos desvãos do Legislativo — sinal de inapetência dos parlamentares em discuti-la dentro de prazos mais generosos —, querer imprimir-lhe uma velocidade que confunde a população pode pôr a perder uma grande chance de o país passar a limpo questões tão fundamentais para o estado democrático de direito. Será que os consultados estarão suficientemente esclarecidos sobre os temas em tela, alguns deles complexos até mesmo para especialistas?

Não resta dúvida que a discussão da reforma política voltou a entrar, e desta vez para valer, na agenda do poder público impulsionada pelo clamor das ruas. Atormentados por longo período de neutralização imposta por ouvidos moucos a seus reclames em favor de ética, contra a corrupção e temas correlatos, os cidadãos têm pressa de ouvir as respostas que julgam adequadas às demandas riscadas em cartazes nas manifestações.

Há, sem dúvida, reivindicações que podem ser atendidas de imediato. Outras, na órbita das mudanças estruturais, precisam passar por discussões mais profundas, não só porque a complexa natureza delas o exige, mas também porque, pelas implicações de longo alcance de sua adoção, o povo precisa estar esclarecido sobre elas, para soberanamente se manifestar.

É o caso, com certeza, de uma reforma que, de fato, ajuste os mecanismos da representação política à realidade do país. Por certo, o que ficar decidido em relação ao plebiscito, a Justiça Eleitoral se empenhará para viabilizar. Mas estaríamos fugindo à nossa responsabilidade, como autoridade maior em relação a um pleito de tamanha envergadura, se não colocássemos em discussão para toda a sociedade as questões aqui levantadas.

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