terça-feira, abril 09, 2013

A mulher que confundia - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 09/04

Até os conservadores estavam cansados de Margaret Thatcher quando ela saiu do poder e entregou-o ao insosso John Major. Foi nesse momento que ela veio ao Brasil, convidada para falar para empresários em São Paulo. Ela intercalava a defesa das suas ideias de um Estado menor com perguntas autoritárias à plateia: "Estou sendo clara?" Aparentemente, não.

Hoje, o Estado brasileiro é sócio da maioria das grandes empresas privadas através dos seus vários braços que se fortaleceram e se multiplicaram nos últimos anos. O empresário brasileiro, com raríssimas exceções, quer sempre que o Estado o financie, fique com o risco e seja sócio dele. O empresário Estado-dependente, que a ouviu naquela noite em São Paulo, até hoje ainda não entendeu as melhores lições de Margaret Thatcher.

Ela sempre provocou nas pessoas sentimentos fortes, jamais a indiferença. Até depois de morta, após os longos anos do ocaso, ainda assim sua morte foi comemorada nas ruas de Londres, 23 anos depois do fim do seu governo.

Nos 11 anos que governou, suas ideias de diminuição do tamanho do Estado, privatização de empresas que não fossem o centro da função governamental, desregulamentação e incentivo ao risco e ao empreendedorismo deram um novo vigor à Inglaterra. Não apenas econômico, mas como centro de ideias que foram copiadas, com as devidas adaptações, em várias partes do mundo, inclusive nos Estados Unidos.

Todos os excessos tiveram suas consequências. A desregulamentação excessiva do mercado financeiro está na origem das criaturas financeiras que deram certo por vários anos, até que deram muito errado. A crise econômica que o mundo vive desde 2007 vem da ideia de que o mercado é bom o suficiente para se autorregular.

O avesso criado pela falta de regulação foi a impressionante expansão monetária e o crescimento exponencial das dívidas públicas pela absorção dos bancos privados que quebraram. Não foi Thatcher a responsável pela crise que ocorreu tantos anos depois da sua saída do poder, mas a crise mostra o erro de não regulamentar, nem evitar excessiva alavancagem de instituições financeiras.

No momento que ela assumiu, havia Estado demais até nos países desenvolvidos. O Brasil dos anos 90 tinha toda a siderurgia estatizada produzindo um brutal prejuízo para os cofres públicos, uma telefonia incapaz de instalar telefones nas casas e que deixava os consumidores em filas de espera por anos, havia bancos públicos em cada estado brasileiro e em alguns estados, mais de um. Eles financiavam os governos estaduais da forma mais obscura. As privatizações aqui não foram uma questão de ideologia. Eram necessárias e ajudaram a fortalecer as bases da estabilidade monetária que tanto buscamos.

Agora, o ciclo de expansão do Estado recomeçou e em alguns pontos o que está acontecendo pode custar caro, como a criação de dez estatais nos governos petistas. A presidente Dilma criou cinco, o mesmo número de Lula em oito anos.

A guerra das Malvinas - ou das Falklands - como dizem os britânicos, elevou sua popularidade por um tempo e apressou o fim da ditadura na Argentina. Mas é uma aberração que sejam inglesas ilhas tão distantes do seu território. A população local, originária da Inglaterra, acaba de dizer que prefere ser britânica. Dificilmente diria o contrário.

Margaret Thatcher recusou-se a abrir mão da libra e entrar no euro. E hoje ninguém diria que ela estava errada. Em outros excessos dos seus cortes de gastos ela desamparou cidadãos que precisavam do Estado. Foi a mulher mais marcante da segunda metade do século XX, sua política mudou seu país e suas ideias influenciaram outros pelo mundo afora.

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