quarta-feira, março 20, 2013

Meio cheio, meio vazio - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 20/03
É possível definir o encontro entre o senador Aécio Neves e o ex-governador José Serra, ocorrido segunda-feira em São Paulo, como sendo o primeiro passo de uma longa caminhada rumo à pacificação do PSDB. Mas essa seria a escolha de um otimista incurável. É possível, por outro lado, considerar a indefinição de Serra a respeito da candidatura de Aécio à Presidência da República em 2014 como um sinal de que essa pacificação está longe de acontecer, mas essa seria uma escolha de um pessimista.

Se Serra sempre demorou tanto para se definir pela própria candidatura, por que seria rápido em uma eventual adesão à candidatura de outrem, especialmente alguém que não faz parte de seu círculo de amizades nem de seus interesses políticos imediatos? Nenhum dos dois tocou no assunto diretamente na conversa de segunda à noite, mas tudo girou em torno da eleição. Mais importante do que o que foi dito foi o não dito, e pelo visto essa situação permanecerá inalterada, mesmo que cheguem a um acordo.

O fato é que Aécio Neves, o provável candidato do PSDB à Presidência, e José Serra são de grupos distintos, tucanos de plumagens diferentes, e não se bicam. O máximo que conseguirão, se conseguirem, é conviver, como aconteceu na noite de segunda-feira em São Paulo, sem que o clima seja pesado. Uma coisa parece certa: Serra não pretende fazer uma aventura para se candidatar à Presidência por um partido pequeno, como o PPS, apenas para marcar posição, sem condições de disputar para valer. E não disputaria contra o PSDB.

Além do mais, sair do PSDB, partido que ajudou a fundar, e cuja redação final do programa ele realizou junto com Fernando Henrique Cardoso, não é um movimento banal. A especulada saída do PSDB parece mais uma arma retórica de Serra do que uma realidade concreta, embora continue muito ressentido com o tratamento que vem recebendo do grupo que hoje é hegemônico no partido, ligado ao senador mineiro, e nisso estão incluídos o atual presidente da sigla, Sérgio Guerra, e até mesmo o ex-presidente Fernando Henrique.

Mas a relação entre Serra e Fernando Henrique é de outra qualidade, há uma admiração recíproca e muitas histórias para contar, o que ameniza possíveis dissabores. De ambos os lados, diga-se de passagem. Serra sente falta do ambiente mais afável, de mais camaradagem, entre os tucanos quando Mario Covas, Fernando Henrique e ele brigavam entre si, mas encontravam os caminhos.

Paradoxalmente, ele, que é acusado de ser um elemento desagregador dentro do partido, acha que o ambiente hoje está muito desgastante pela disputa interna. Se se arrependesse de alguma coisa, seria de não ter permanecido no governo do estado de São Paulo até o final e ter disputado a reeleição, em vez de enfrentar uma segunda campanha presidencial para ser derrotado pela força de Lula. Estaria agora em boas condições para decidir sobre a sucessão de 2014, acredita.

Já Aécio está realmente empenhado em reduzir as diferenças que o separam de Serra, e certamente os dois terão novas conversas. Com relação ao governador Geraldo Alckmin, tudo parece estar nos eixos, e ontem ele e Aécio estiveram juntos em Brasília por iniciativa do governador paulista, que foi ao gabinete do senador mineiro para uma conversa e convidou-o para irem juntos à reunião do PSDB paulista na segunda, uma maneira de demonstrar unidade. Serra não estará presente, mas por razão justa: vai fazer uma palestra na Universidade Princeton previamente marcada.

Aécio e Serra se tratam com bastante cuidado, o que demonstra pelo menos que nenhum deles está disposto a estressar a relação. Mas Serra considera absurdo culpá-lo pela divisão do partido. Está em momento de reflexão, sobre sua vida política e também particular, mas não descarta participar da campanha de Aécio Neves à Presidência, embora não explicite qual papel considera adequado para sua atuação. Mas também não está muito entusiasmado com a ideia.

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