segunda-feira, março 04, 2013

Lanterna na proa - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

O Estado de S.Paulo - 03/04

Duas notícias caíram no colo dos que a candidata Dilma Rousseff tachou de "mercadores do pessimismo": o PIB nanico de 2012 e a terceira queda consecutiva da confiança do consumidor (INEC), já em 2013. Uma é o passado, a outra insinua o futuro. O mercado, de lanterna na popa, excitou-se com o PIB e esnobou o INEC. O governo, no discurso, sugere que se apaguem as lanternas. Navegar no escuro - ou iluminando a ré - dá na mesma: a praia.

Como sempre ocorreu no último quarto de século, a política segue o rastro da economia. Tem sido assim desde a hiperinflação de José Sarney e a eleição de Fernando Collor, passando pelo lançamento do real e a eleição de Fernando Henrique Cardoso, até chegar à explosão do consumo da era Lula e à eleição de Dilma. O PIB de hoje é o slogan eleitoral de amanhã. E o consumo de amanhã é o resultado da próxima eleição. Assim, lanterna à proa.

Um consumidor de manchetes mais distraído poderia protagonizar o seguinte diálogo com alguém que tenha lido até o fim o noticiário sobre os rumos da economia nos últimos tempos:

- E o PIB, hein? Caiu, né?

- Não.

- Não?

- Não. Freou forte, mas está subindo. Bem lentamente, mas continua indo para cima.

- Ah, mas está quase parando, indo cada vez mais devagar.

- Também não.

- Como não? Vi aí no jornal, por cima do seu ombro: diz que só não está pior do que na época do Collor.

- Você precisa ler a história toda. Depois da crise mundial de 2008, a economia do Brasil andou para trás por nove meses, até quase o final de 2009. Mas aí deu a louca e pisou fundo no acelerador por um semestre. Desde 2010 ela continuou crescendo, mas em ritmo cada vez mais lento. Foram dois anos de desaceleração contínua até junho do ano passado.

- Ah, então estamos a caminho do fundo do poço…

- Pois é. Não.

- Você é do contra, né?

- Deixa eu terminar? Quando parecia que iria parar e engatar a ré, a economia começou a acelerar novamente em 2012. No terceiro trimestre, cresceu mais depressa do que no segundo; e no quarto trimestre, mais rapidamente do que no terceiro.

- Puxa, que alívio! Então está tudo bem…

- Não.

- Você está de sacanagem!

- Não sou eu, são os números. Primeiro, que ela ainda está mais devagar que este ônibus. Depois, não dá para projetar nenhuma tendência de reaceleração da economia antes de maio ou junho.

- Por que?

- É preciso ver se essa retomada tímida do fim do ano passado se sustenta em 2013.

- E por que não se sustentaria?

- O capital continua assustado. Os investimentos pulam para cima e para baixo a cada um ou dois anos. Ao menor sinal de crise, a euforia vira desconfiança, às vezes depressão.

- O capital é bipolar, é?

- Não sei. O Delfim chama de "stop and go": anda e para, anda e para.

- Entendi, é como o trânsito em São Paulo.

- Sem falar que tem o problema do consumo.

- Que é que tem o consumo? O consumo está ótimo. Olha ali pela janelinha a quantidade de camelô na calçada.

- Não sei, não. Parece que o consumidor está perdendo a confiança.

- Desconfiado é você.

- Olha aqui essa nota no pé da página: diz que o índice de expectativa do consumidor caiu de novo em fevereiro. É o terceiro mês seguido que o consumidor fica mais desconfiado.

- Desconfiado de que?

- Da inflação, que voltou a subir.

- E daí? Olha lá para fora. Nunca teve tanto carro na rua nem avião no ar. A classe C deixou a rodoviária às moscas. Não leu aí no seu jornal, não?

- Eu sei, se não fosse o consumo das famílias o PIB já tinha se estatelado há muito tempo. Mas esse índice em queda…

- E esse tal de INEC por acaso é pitonisa?

- Não chega a tanto, mas sempre que ele caiu várias vezes em seguida, o consumo das famílias acabou desacelerando depois. E se o consumo não crescer mais tanto assim, aí o PIB pode ficar nanico de novo.

- Não esquenta, não. Se perceber que isso vai acontecer, a Dilma lança mais incentivo para o povo comprar geladeira e carro em 120 vezes sem juros.

- Aí é que este trânsito não vai andar mesmo.

- Mas a tentação é grande, né? Quem não quer ser popular como o Lula foi?

- Esse é que é o ponto. Quando a confiança do consumidor subiu, a popularidade do Lula e da Dilma subiram junto. Quando ela cair…

- Mas você não disse que o PIB está subindo, que pisou no acelerador de novo?

- É, bem… Puxa, me distraí. Dá licença, por favor, que eu preciso descer.

- Ih, passou do ponto, foi?

- Temo que sim. Quer ficar com o jornal?

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