terça-feira, fevereiro 12, 2013

Uma coisa leva a outra - CRISTOVÃO TEZZA

GAZETA DO POVO - PR - 12/02

Como sempre vivi preguiçosamente na província, sou um apaixonado por correio. Passei muito tempo na vida escrevendo cartas. Uma boa “História universal dos correios”, se existe, certamente seria uma leitura fascinante. Não estacionei nas cartas, é claro. No meu exílio em Gaivotas, onde não passa carteiro, recorro ao milagre da tabuleta digital. Com o chipezinho que contratei (mesmo lento e caro, à brasileira), consigo comprar livros e revistas do mundo inteiro, sem intermediários. Semana passada, a revista The New Yorker trouxe uma matéria sobre Galileu, considerado o pai da ciência moderna (“Moon man”, por Adam Gopnik), que frisa a importância do correio já há 450 anos.

“O correio era o milagre da época. Pelo correio, a nova ciência cruzava a Europa de modo quase tão fluido como no tempo do e-mail. É assombroso seguir a tríplice correspondência entre Tycho Brahe, Kepler e Galileu.” E desde aqueles tempos heréticos o correio era monopólio do Estado, para quem o controle da informação é crucial. Mas hoje, pela revolução digital, os correios perderam sua função de origem – transportam, basicamente, encomendas. Alguém ainda se lembra dos telegramas?

Dia seguinte, eureca! Descobri que Praia de Leste também tem uma agência! No outro dia fui lá, cheio de entusiasmo. Só cinco pessoas na fila. Enquanto esperava, conferi na publicidade sorridente que os Correios agora fazem de tudo: são até banco, e sobre os guichês balançava-se um rosário de raspadinhas à venda. E ainda aceitam cartão! Incrível! Mas, na hora de pagar, não houve jeito: o tal do “sistema” não funcionava. A funcionária gentilmente sugeriu que eu fosse ao caixa eletrônico da esquina para pegar dinheiro e pagar os R$ 42.Pois bem, mesmo aqui chega um hora em que você precisa de correio físico. Eu tinha de enviar à editora as provas revisadas de um livro e, portanto, teria de ir “à cidade”. Coloquei minha melhor bermuda, um boné discreto, tênis e meia, me despedi da família e fui para Matinhos, a 15 km daqui. Cheguei à agência amarelinha e esbarrei com uma fila de – contadas – 23 pessoas. Dois abnegados funcionários tocavam o barco, que entretanto não se movia. Quinze minutos depois, resolvi sair, tomar sorvete, passear na orla, andar de triciclo, e, perto das 5 da tarde, voltar lá para ver se a espera seria menor. Contei 17 pessoas, fazendo aquelas dobras respeitosas de fila indicadas por setas desenhadas no chão. Desisti: estou em férias.

Em outras palavras, nada parece funcionar nos Correios: são uma instituição obsoleta, que cobra muito caro, atende mal e, cada vez mais, entrega com atraso. E vem se tornando um balcão político. Quando sugeri que talvez fosse o momento de acabar com o monopólio, que hoje não faz nenhum sentido, a funcionária brincou: “Assim vou perder o emprego”. É o contrário: haveria mais emprego. E mais eficiência, como nos tempos de Galileu.

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