quinta-feira, janeiro 10, 2013

O conselho de Olívio a Genoino - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 10/01


O ex-governador do Rio Grande do Sul, ex-prefeito de Porto Alegre, ex-ministro das Cidades e ex-presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), do qual é fundador e um dos quadros mais conhecidos e respeitados, Olívio Dutra discordou da decisão de seu companheiro José Genoino de ocupar a vaga de deputado federal a que tinha direito desde que o titular, Carlinhos Almeida, a deixou. E não se limitou a expressar sua opinião contrária à posse de Genoino na Câmara dos Deputados, após ter sido condenado a 6 anos e 11 meses de prisão no julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em contatos privados ou em reuniões partidárias, mas publicamente, pelo rádio. Olívio manifestou sua discordância no programa Esfera Pública, apresentado pelo jornalista Juremir Machado da Silva, na Rádio Guaíba de Porto Alegre. E chegou a dialogar com o correligionário sobre o assunto. "Eu acho que tu deverias pensar na tua biografia, na trajetória que tens dentro do partido", disse Dutra a Genoino, que telefonou para a emissora.

Genoino garantiu, na conversa transmitida pela Guaíba, que não cometeu crime algum enquanto presidiu o partido. "Fui condenado à noite e no dia seguinte eu saí do governo porque era cargo comissionado. É diferente de uma eleição. Os eleitores me delegaram o cargo de suplente. Esses eleitores não têm encontrado nenhuma restrição ao fato de eu assumir", afirmou Genoino, que tomou posse na semana passada porque um dos deputados da bancada federal do PT, Carlinhos Almeida, a deixou para assumir a prefeitura de São José dos Campos, no Vale do Paraíba, interior de São Paulo.

Mas Olívio não recuou da posição assumida antes de o alvo de sua crítica haver entrado na conversa. "É uma opinião pessoal, mas tenho convicção de que assumir nessas condições não foi a melhor escolha para a tua trajetória e para o sentimento partidário", rebateu. O diálogo entre os dois próceres petistas, ambos com biografias políticas importantes, não apenas no PT, mas também no movimento sindical (Olívio foi presidente do Sindicato dos Bancários) e na luta armada da esquerda contra a ditadura militar (Genoino pegou em armas para derrubar o regime como militante do Partido Comunista do Brasil na guerrilha rural do Araguaia), esclarece o antagonismo criado em torno do tema. E revela que esse antagonismo também existe no interior do partido em que ambos militam e do qual foram presidentes.

De um lado, com o apoio da cúpula do PT e do presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia, petista e gaúcho como Olívio, o ex-guerrilheiro se agarra com unhas e dentes à legalidade e à legitimidade de sua atitude. De outro, democratas de várias tendências ideológicas, entre os quais o interlocutor dele no programa da Guaíba, percebem a contradição de um político que sempre procurou pautar seu comportamento pela ética e pelo compromisso com a democracia, mas desafia esses valores que estão acima de vaidades, idiossincrasias e até convicções pessoais. Desde que depuseram as armas e aceitaram as regras de um Estado Democrático de Direito, ex-guerrilheiros, como Genoino, seu colega no banco dos réus José Dirceu e a presidente Dilma Rousseff, devem seguir a lei acima de seus personalismos e partidarismos.

Na volta à Câmara, irritado com o assédio dos repórteres que trabalhavam para manter a sociedade informada, o petista os comparou a torturadores da ditadura. A comparação disparatada expressa o engano em que os petistas condenados no mensalão - Genoino entre eles - incorrem ao imaginar que uma biografia heroica anistiaria automaticamente seu dono de delitos que cometeram. Ao sugerir que Genoino repare o erro da posse renunciando ao mandato, seu companheiro de esquerda e de partido Olívio Dutra lhe recomenda um gesto que o redimirá desse equívoco. Nunca vai ser lavada de sua biografia a mancha da condenação por crimes contra a administração pública, corrupção ativa e formação de quadrilha, pelos quais foi condenado. Mas o sacrifício do mandato em nome da democracia será um passo no rumo correto de recuperar a boa reputação, cumprida a pena.

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