quarta-feira, janeiro 30, 2013

No quintal de Dilma - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 30/01

O Correio Braziliense de ontem e de hoje trazem notícias assustadoras relativas à segurança em nossas boates e casas de shows. Em Brasília, por exemplo, todas as casas noturnas do Lago Sul, onde se divertem filhos e netos das autoridades — às vezes, até as próprias autoridades — não têm alvará para funcionar como tal. A maioria desses estabelecimentos no Plano Piloto estão com as licenças vencidas. E continuam lá, recebendo nossos jovens do mesmo jeito que a Kiss, em Santa Maria, recebia centenas de pessoas.

Se tomarmos por base as declarações presidenciais durante o encontro de prefeitos na última segunda-feira, a hora das cobranças chegou, aliás, já passou. A presidente Dilma Rousseff disse com todas as letras em seu discurso para os prefeitos e prefeitas que é preciso agir para que a tragédia não se repita. Então, vamos lá, presidente! Pode começar hoje mesmo, se tiver vontade política.

Basta pegar o telefone e pedir ao governador Agnelo Queiroz que mobilize o comando dos bombeiros e seus fiscais para que Brasília se torne a cidade exemplo de divertimento seguro. E nem adianta vir com a desculpa de que não tem gente, não dá. Todos sabem que, quando um tema é prioridade, encontra-se gente, mobilizam-se esforços. Os estabelecimentos do Lago Sul estão a menos de 15 quilômetros do Palácio do Planalto. E a menos de 25 do Palácio do Buriti.

É preciso fechar as casas noturnas que descumprem as normas? Sim, especialmente, as que não seguem regras básicas de segurança (e olha que as normas atuais são falhas!). E só deixar abrir as que cumprirem tudo ipsis litteris? É isso? Então, mãos à obra. Estão esperando o quê?

O problema é que, geralmente, autoridades nos mais diversos níveis fecham os olhos às normas. Não é incomum o dono de um estabelecimento falar com um amigo poderoso que, por sua vez, entra em contato com uma autoridade pedindo paciência, avisando que o proprietário vai resolver o problema dos extintores, dos sprinklers, da fiação exposta e por aí vai. E, assim, com um jeitinho ali, uma paciênciazinha acolá, tudo continua funcionando. Até que a tragédia aconteça.

Em Santa Maria, muitos se perguntam: por que o meu filho (filha, pai, neto, neta, mãe, irmã, tia, tio)? E lá vem investigação para buscar culpado. Nesse quesito, conforme você pôde ler hoje no Correio, começou o jogo de empurra. As entrevistas das autoridades públicas locais ontem foram uma lástima. O governo estadual culpa a prefeitura, que responsabiliza o bombeiro, que atribui a tragédia aos donos da Kiss e a todos os demais personagens desse enredo macabro, menos à corporação. Socorro! É uma tristeza ver tanta gente querendo tirar o corpo fora enquanto centenas de pais e mães velam seus filhos, a maior dor de todas as dores.

Enquanto isso…

Quero crer que a frase da presidente Dilma Rousseff não cairá no baú da retórica política, virando letra morta em mais um discurso presidencial. E a única maneira de manter essa crença viva será poder ter a alegria de relatar ações de prevenção em todos os níveis de governo. Os prefeitos, por exemplo, voltam hoje aos seus municípios depois de dois dias de reuniões em Brasília.

Aqueles que quiserem podem começar hoje a dar o exemplo. Não deve ser tão difícil pedir uma “batida” nas casas noturnas. Do jeito que o país está comovido e indignado com a morte tão precoce de 234 pessoas, é o momento ideal para impor o respeito às normas. Talvez isso sirva de algum conforto para quem perdeu filho, filha, irmã, prima, primo, neto… Saber que, apesar de toda a dor, as autoridades estão agindo para proteger outros filhos. E aí, excelência, autoridade? Vai se agarrar no serviço ou precisa de alguém que empurre?

E no rame-rame da política…

Faltam dois dias para a escolha do presidente do Senado e cinco para a eleição do sucessor de Marco Maia na condução da Câmara dos Deputados. A eles caberá conduzir a votação das leis federais, inclusive as que tornam mais rígidas as normas de segurança em casas de espetáculos. Se cada profissional desse país se agarrar no serviço que lhe cabe, certamente, tudo ficará bem melhor. Ao trabalho!


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