segunda-feira, janeiro 02, 2012

TRAGÉDIA EM DONA EUZÉBIA-MG


18:10hS
A SITUAÇÃO NESSE MOMENTO É BEM PIOR
 NESSE TRECHO AS CASAS FICARAM COBERTAS PELAS ÁGUAS


Fotos de Renato Correia de Castro 

Caso em aberto - J. R. GUZZO

REVISTA VEJA

O ano de 2012 começa com uma porção de coisas que deveriam ter sido resolvidas pelo governo em 2011 e não foram. E natural. Não dá mesmo para resolver tudo, e menos ainda para resolver tudo da maneira mais certa. Robert McNamara, homem que muito mandou e muito errou no governo dos Estados Unidos, durante os sete anos mais complicados da Guerra do Vietnã, dizia que o grande problema dos governos deste mundo é que o dia tem 24 horas. É logicamente impossível, sustentava McNamara, qualquer governo fazer tudo o que precisa ser feito durante as 24 horas diárias que tem para funcionar; não dá tempo, pura e simplesmente. Como não há tempo, não se decide, ou então se decide com pressa – e aí é fatal que se acabem tomando decisões erradas. Tudo fica ainda pior, é claro, quando a essa dificuldade toda se junta a deliberação de não resolver questões que nada têm a ver com o relógio, na esperança de que elas desapareçam sozinhas. O problema, então, não é falta de tempo. É falta de vontade, e para isso não existe remédio.

Em matéria de história não resolvida, poucas se comparam à do ministro Fernando Pimentel, da Indústria e Comércio, que a esta altura poderia perfeitamente estar na condição de ex-ministro e de ex-problema. O que sem dúvida daria mais sossego para o governo e não faria a menor diferença para a indústria ou para o comércio. Mas não, eis que ele continua aí, sobrevivendo no ministério com equipamento de respiração artificial, e servindo de exemplo vivo de um desses surtos de rompimento com a realidade que se tomaram um dos hábitos mais curiosos do governo da presidenta Dilma Rousseff. Como se sabe, segundo revelou O Globo no começo de dezembro, Pimentel recebeu 2 milhões de reais durante os anos de 2009 e 2010, período entre sua saída da prefeitura de Belo Horizonte e sua entrada no ministério Dilma; pelo que disse, esse dinheiro lhe foi pago por clientes privados, em troca de serviços descritos como de "consultoria". A história, em si, não é boa. Seu principal cliente, pelo que deu para entender, foi a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), conhecido cartório que representa interesses particulares mas se alimenta de dinheiro público para sobreviver, como acontece com suas irmãs espalhadas pelos demais estados brasileiros. Já o próprio Pimentel, na época em que recebeu os seus 2 milhões, era um personagem muito público; embora parte desse tempo, aliás, trabalhou abertamente como um dos chefes da campanha para a eleição de Dilma. Estaria certa uma coisa dessas? Não deu nem para começar a discussão – na verdade, não deu sequer para saber, até agora, se ele fez mesmo o trabalho pelo qual foi pago, ou se apenas recebeu o dinheiro. A presidente, o ministro e todo o governo decidiram, automaticamente, que não havia coisa nenhuma para discutir, informar ou esclarecer. O que aconteceu foi um negócio entre particulares. É confidencial. Ninguém tem nada a ver com isso. Caso encerrado.


No mundo da lógica, normalmente, o procedimento é examinar primeiro os fatos e só depois, com base no que foi constatado nesse exame, chegar a uma conclusão. No governo Dilma Rousseff chega-se primeiro à conclusão – e por aí mesmo se fica.

 A consequência, como no episódio das consultorias de Pimentel, é que os problemas não fecham. Como poderiam fechar, se não são respondidas perguntas básicas sobre o que realmente aconteceu? Toda consultoria, no mundo das realidades, exige reuniões entre consultor e consultado, entrevistas com uma porção de gente, apresentações em PowerPoint, gráficos coloridos, curvas disso e daquilo. Mais que tudo, exige a apresentação de um relatório por escrito ao fim do trabalho, com as recomendações do consultor ao cliente. No caso, nem a Fiemg nem Pimentel comprovaram que houve qualquer reunião. Entrevista, apresentação etc. E o relatório final? Isso, pelo menos, existe? Ninguém, até agora, respondeu a nenhuma pergunta a respeito. Outro enigma são as conferências que, segundo a Fiemg, Pimentel fez para seus associados, e que justificariam uma boa parte dos pagamentos que recebeu. De novo, aqui, temos problemas com a realidade. Onde foram dadas essas palestras? Em que dias? A que horas? Quem assistiu a elas? Não se sabe.

A respeito disso tudo, a presidente da República, no fim do ano, fez uma declaração extraordinária. "Se quiser falar, ele fala", disse Dilma. "Se não quiser, ele não fala”. O governo imagina, ao tratar o público dessa maneira, que está sendo forte. Está sendo apenas incompreensível.

MAIS GRAVE DO QUE PALMADAS - LYA LUFT

REVISTA VEJA
Não gosto do politicamente correto: ele muitas vezes tem um ranço de hipocrisia. Não devo dizer que alguém é negro, mas os próprios negros falam em raça negra, cultura negra etc. Não seria muito mais respeitoso usar o termo habitual, assim como dizemos branco, japonês, alemão, turco, polonês? O politicamente correto em muitos casos, como neste, aumenta a discriminação. Será politicamente incorreto, daqui a pouco, dar uma palmada num menino travesso demais? Sou contra qualquer violência, mas me assombra a tal lei da palmada, ainda esperando aprovação no Senado: considero a tal lei uma excrescência a mais na nossa legislação e na nossa cultura. E é perigosa, numa sociedade que vai ficando denuncista e policialesca, cada vez maiores seus olhões de big brother.
Mil dúvidas me ocorrem. Quem vai avaliar o que é palmada forte, bofetada humilhante no rosto ou aviso carinhoso, leve tapa sobre uma bundinha bem acolchoada de fraldas? Quem vai, sobretudo, denunciar? Penso que haverá filas de acusadores: a vizinha invejosa, a funcionária ofendida, a ex-mulher vingativa, o ex-marido raivoso. Receio que, se aprovada e efetivada, ela não vá ser aplicada, como tantas leis tolas entre nós ( e algumas úteis, que não deveriam ser ignoradas). Ou, se aplicada, vá desencadear uma onda de confusões, inseguranças, injustiças, intromissões indevidas. Aberta a porta para um controle nada democrático, uma ditatorial interferência do estado na vida familiar e nas relações pessoais mais próximas.
Esse o grande perigo, essa a cara feia de tal novidade. Parece que se criou no país até mesmo um “plano nacional de convivência familiar”, no mínimo bizarro. Para nos ensinar a ser mais gente, seria preciso, em lugar de intervir em nossas casas e se intrometer em nossa vida, dar condições de sermos menos agressivos por ignorantes ou estressados. Isso significa, em lugar de um olho intrometido e humilhante, mais segurança, saúde, moradia e educação – ah, a educação, esse botão que aperto mil vezes ao dia e tanto comento.

“Considero um desperdício de energia política essa lei da palmada, quase impossível de aplicar sem que ocorram aberrações, quase impossível de encarar com respeito e seriedade.”

Será que os políticos não têm coisa mais importante a fazer além de inventar uma lei tão antidemocrática, antipedagógica e anti-qualquer-bom senso, como, por exemplo, votar leis que têm a ver com o bem-estar do cidadão comum? Desengavetar e fazer funcionar tantos projetos trancados por incompetência ou desinteresse, exercer a verdadeira política, resgatar tanto dinheiro empregado em outras coisas ou desparecido em frestas de mesas-de-não-trabalho de muita gente por aí?
Não é uma lei invasiva que vai nos tornar melhores pais, melhores educadores, melhores pessoas. É a cultura, são as condições sociais, econômicas e culturais, é a educação que informa direito, é a construção de nossa identidade pessoal, nossa bagagem de valores, os elementos básicos que os governos nos oferecem para que a gente possa evoluir. Em resumo, é a arquitetura de nós mesmos enquanto povo e indivíduos decentes – incluindo como tratamos, criamos, amamos, educamos quem depende de nós.
Considero um desperdício de energia política essa lei da palmada, quase impossível de aplicar sem que ocorram aberrações, quase impossível de encarar com respeito e seriedade. Além de querermos infantilizar eternamente nossos jovens dando-lhes privilégios como a meia-entrada até quase 30 anos, quando deveriam estar estabelecidos, com família formada, crescendo na profissão, vida em pleno funcionamento, ainda queremos nos meter nas casas, nos quartos, na vida pessoal doa adultos, vigiando-os como se fossem crianças arteiras. Bem mais graves do que uma ocasional palmada (não falo em surra, bofetada, sofrimento físico) são, de parte dos pais, a frieza, a futilidade, o desinteresse, a falta de uma autoridade amorosa, de vigilância e cuidado. A humilhação verbal, a crítica constante, a ironia. A lista é longa. Que o novo ano nos traga um pouco mais de bom-senso e de bom humor, e verdadeiro interesse por coisas que verdadeiramente precisam dele.

Turismo sexual - ANCELMO GOIS

FOLHA DE SP - 02/01/12

Gera polêmica nas redes sociais o vídeo patrocinado pela RioTur “Come to live the Rio sensation”. Nele, gays trocam beijos em cenários do Rio. Há quem o compare com antigos comerciais da Embratur que tentavam atrair turistas exibindo bumbuns de moças nas praias.

Segue...

Antônio Pedro Figueira de Mello, da RioTur, nega que o vídeo tenha conotação sexual. Diz que o trabalho foi feito para ser exibido em uma feira de turismo LGBT.

Acervo de Prestes

Maria Prestes, viúva do líder comunista, rebate as críticas feitas por Anita Leocádia, filha de Prestes e Olga: — Existe um acervo grande sobre Prestes nas mãos de Anita. Ele é usado sem qualquer consulta a mim ou a seus nove irmãos. Como ela não tem vergonha de exigir de mim uma consulta a ela para eu encaminhar a doação de documentos para o Arquivo Nacional?

Segue...

Maria rebate a crítica de Anita à publicação da foto do pai de sunga tomando banho de sol: — Desrespeito é imaginar que em toda sua vida ele andou de gravata. Ele andava, sim, de sunga, camiseta, pijama e adorava arrastar seu chinelo. Acontece que Anita nunca viveu com o pai na intimidade. É um espanto para ela ver Prestes de carne e osso.

No mais

Este médium Cacique Cobra
Coral já é folclore do Rio. O que
não pode é ser levado a sério.

Menino do Rio
O americano Calvin Klein, 69 anos, nome de uma das
grifes mais famosas do mundo, passou o réveillon no... Brasil. Foi visto caminhando incógnito no meio da multidão na Praia de Copacabana.

A CASA ONDE O SAUDOSO
mestre Darcy Ribeiro passava temporadas na praia da Barra de Maricá, RJ, projetada por Oscar Niemeyer, foi restaurada pela prefeitura de lá, em parceria com empresas da cidade. Agora, o lugar, em homenagem à luta do senador na área da educação, vai se transformar em um centro de capacitação de professores da rede municipal, com inauguração prevista para fevereiro. A casa ainda ganhou, veja na foto ao lado, uma escultura do artista local Alexandre Shiachticas, que reproduz o gesto de Darcy ao voltar do exílio.

Orfanato ou pedinte?
Uns diretores da Associação dos Moradores da Urca (Amour) estiveram no 2o- BPM em defesa dos dois guardas que interpelaram semana passada, lembrase?, a querida Elba Ramalho. A cantora, em seu facebook, disse que, após assistir a uma missa na Urca, deu R$ 20 a um pedinte, mas, quando estava manobrando, viu um policial gritar para o pobre coitado: “Me dá esse dinheiro.”

Mas...

O pessoal da Amour diz que os policiais estavam “no cumprimento de seu dever impedindo a ação dos flanelinhas que ficam na porta da igreja achacando e ameaçando os motoristas que não aceitam pagar a quantia exigida”. Os guardas também teriam sugerido que Elba ajudasse orfanatos, e não moradores de rua.

No mais...

Calma, gente.

Tempo de Facebook
Uma carioca de 55 anos suspeitou, veja só, que a mãe dela, de 74, estava sendo enganada por um... pretendente, dez anos mais novo. O sujeito já tinha até feito um pedido de casamento. Desconfiada, ela criou um perfil falso no Facebook e começou a flertar com seu futuro padrasto. E o vovô danadinho... mordeu a isca. Fim do romance.

Tempo de iPad

Um carioca de 30 anos teve seu carro roubado por dois homens armados, quarta passada, no Centro do Rio. E junto com o veículo, os ladrões levaram o iPad do motorista, que estava embaixo de um dos bancos.

E...

Horas depois, já em casa, o homem acessou a internet e acionou o localizador do iPad. O aplicativo mostrou que o aparelho estava numa esquina de Vigário Geral, Zona Norte carioca. No dia seguinte, a vítima chamou a polícia, que recuperou o iPad e o carro.

O réveillon dos ex

A festa de réveillon de Edson Bueno (Amil), em Búzios, contou este ano com quatro ex-ministros: Luiz Fernando Furlan, Reinhold Stephanes, Luiz Felipe Lampreia e Gilberto Gil. O único que trabalhou foi o artista, contratado para fazer o show da virada.

Clube de bacanas

Um sócio do Iate Clube do Rio de Janeiro desferiu, semana passada, um soco num funcionário do clube que teria demorado a lhe entregar uma toalha na sauna. O caso foi parar na polícia.

Gato que nasce em forno - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 02/12/11
RIO DE JANEIRO - Carlos Gardel (1890-1935), o cantor de "Mano a Mano", nasceu na França (em Toulouse). Mas algum argentino duvida que ele foi o maior portenho de todos os tempos? E a brasileira e carioquíssima Carmen Miranda (1909-55), nascida em Marco de Canaveses, a 40 km do Porto, em Portugal? E o francês Yves Montand (1921-91), marselhês e malandro até o último Gitanne, que nasceu em Monsummano Alto, na Itália?

Irving Berlin (1888-1989), autor do hino nº 2 dos EUA ("God Bless America") e do clássico sobre o Natal, "White Christmas", além de canções que fizeram a glória da música americana, como "Cheek to Cheek", era de Mohilev, então na Rússia. Outro americano da gema nascido na Rússia, em Srednicke, era Al Jolson (1883-1950), o intérprete de "My Mammy". E quem diria que Bob Hope (1903-2003), que, durante 60 anos, cantou para soldados americanos no front, era inglês?

Milton Nascimento (n. 1942), que todos julgam mineiro, é carioca de São Cristóvão. Já o carioca Ferdy Carneiro (1929-2002), fundador da Banda de Ipanema, era mineiro de Ubá, assim como Jayme de Carvalho (1911-76), fundador da Charanga do Flamengo, baiano de Salvador. E os ultracariocas João Saldanha (1917-90), Walter Clark (1936-97) e Carlinhos Oliveira (1934-86) eram, respectivamente, de Alegrete (RS), São Paulo (SP) e Vitória (ES).

Todos esses são ou foram pessoas que, por acaso, nasceram longe de casa. Como o ipanemense Tom Jobim, nascido na Tijuca.

Gato que nasce em forno não é biscoito, diz o ditado. E, como acabo de descobrir, cachorro também não. Rin Tin Tin (1918-32), o pastor que foi mascote e símbolo da Cavalaria americana e ajudou a matar na tela mais búfalos e índios do que todos os cachorros juntos na história de Hollywood, era francês da Lorena. A qual, então, era alemã.

Retrato do Brasil - AÉCIO NEVES


FOLHA DE SP - 02/01/12
Fechamos o ano com a notícia de que o Brasil deverá ascender à posição de sexta economia do planeta, ultrapassando o Reino Unido.

Se essa é uma boa-nova, devemos recebê-la, porém, sem as tintas do excesso de euforia. Ainda temos um oceano pela frente para chegar ao patamar do PIB per capita inglês. As projeções de 2011 do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) revelam que o Brasil ocupa a 84ª posição no IDH, muito distante da 28ª posição do Reino Unido.

Do ponto de vista da nossa realidade, aos poucos, o Censo de 2010, do IBGE, desnuda o Brasil real e as suas grandes tragédias, que convivem com os avanços conquistados desde o advento do Plano Real.
O paradoxo brasileiro permanece: o país cresceu, o desemprego caiu, mas nada disso impediu, por exemplo, o aumento crescente do enorme contingente da população que vive em condições precárias e carente de serviços públicos essenciais nos chamados aglomerados subnormais, eufemismo para favelas, palafitas e outros congêneres.

São mais de 11,4 milhões de brasileiros, número maior que a população isolada de muitos países mundo afora, vivendo em 6.329 desses aglomerados em 323 municípios. Isso representa 6% da população!
A radiografia do IBGE demonstra o fracasso das políticas para conter o fenômeno da favelização, mesmo após a criação do Ministério das Cidades e do Programa Minha Casa, Minha Vida, ainda distante das metas com que foi lançado.

Em 2011, por exemplo, foram contratadas apenas 52 mil unidades para famílias até três salários mínimos, um desempenho minúsculo para o segmento de baixa renda, o que torna pouco crível a perspectiva de "mais equilíbrio" entre demanda e oferta em 2023, tendo em vista um deficit habitacional de 6 milhões de moradias.

Quando se trata de enfrentar o desafio das favelas, voltam à pauta a questão da melhoria da infraestrutura e a do fornecimento de serviços básicos -contenção de encostas, saneamento, coleta regular de lixo, postos de saúde, regularização de terrenos e acesso aos transportes, entre outros, itens que desafiam uma gestão pouco afeita ao planejamento e que padece de crônico imobilismo executivo.

Por isso, ampliam-se sempre as dúvidas sobre a capacidade do governo federal de avançar mais. Basta ver o desempenho pífio do PAC em 2011, a menor execução desde que foi lançado.

Nesta entrada de 2012, quando todas as promessas se renovam, é hora de cobrar os compromissos assumidos com os brasileiros. Eles precisam ser transformados em realidades enfrentadas de forma completa e integrada e não servirem apenas como matéria-prima para a farta propaganda oficial sobre um Brasil que ainda não conquistamos.

As raízes da corrupção no Brasil - EVERARDO MACIEL

O ESTADÃO - 02/01/12
Seria fora de propósito analisar as causas da corrupção no Brasil em um despretensioso artigo. Tenciono, tão somente, explorar algumas ideias que possam servir de subsídio para uma reflexão mais percuciente sobre o tema.
Consideradas as múltiplas causas da corrupção, tem destaque a impunidade associada à morosidade dos processos, que maltrata os inocentes e faz a alegria dos culpados. A despeito da obviedade dessa causa, não se pode esquecer de que a matéria ainda carece de um debate aprofundado, que permita encontrar saídas que conciliem agilidade processual com direito à ampla defesa, para não falar de um maior incentivo aos meios alternativos para solução de litígios, a exemplo da mediação e da arbitragem. A única certeza é de que a legislação processual necessita de mudanças.
A impunidade assume grande importância na execução fiscal. Hoje, os débitos inscritos na Dívida Ativa da União ultrapassam a espantosa soma de R$ 1 trilhão. Evidentemente, há algo errado nesse processo. Tal fato, combinado com recorrentes anistias e remissões - instrumentos que só excepcionalmente deveriam ser utilizados -, constitui generoso estímulo ao sonegador e desrespeito ao bom contribuinte.
A ineficácia da execução fiscal, entretanto, não pode servir de pretexto para a adoção de medidas desproporcionais, como a penhora administrativa ou a publicação de listas de devedores do Fisco.
Penhora administrativa significa excluir a medida da apreciação judicial, conferindo extravagantes poderes ao Fisco. Já a publicação de listas de devedores corresponde apenas à utilização de um meio vexatório para cobrança fiscal, cujo respaldo moral claudica, porque não se faz acompanhar da lista de precatórios, nomeando os credores da Fazenda Pública.
A execução fiscal demanda mais inteligência e menos músculos. Não funciona, porque os processos inscritos em Dívida Ativa não são adequadamente preparados, no pressuposto de que os magistrados responsáveis pelas varas de execução fiscal supram as deficiências originais. Aqui não se exploram as escandalosas situações de imputação de responsabilidade, sem observância do devido processo legal, princípio constitucional consagrado universalmente.
Eleições são fontes inesgotáveis de corrupção. Há os que pensam que a questão pode ser resolvida por mudança no sistema eleitoral e no financiamento das campanhas. Não creio que seja assim.
É necessário perquirir a razão pela qual há um aviltamento moral no Congresso Nacional. Em boa medida, a explicação se encontra na degradante subtração de sua missão constitucional de legislar e fiscalizar, em virtude, sobretudo, do abuso das medidas provisórias.
A atividade congressual passou, por consequência, a centrar-se nas inúmeras barganhas para tramitação de medidas provisórias e outras propostas legislativas oriundas do Poder Executivo, tendo como foco a aprovação de emendas à proposta orçamentária, classificáveis em geral como transferências voluntárias a Estados e municípios, ou demandas por fisiologismo ou aparelhamento. Essas práticas deságuam, quase sempre, em corrupção.
"Anões do orçamento", "mensalão", "sanguessugas", "vampiros", comissões pagas para liberações de verbas ou licenciamento de atividades, etc., são apenas nomes distintos para fenômenos decorrentes daquelas práticas.
Mais recentemente, um conhecido parlamentar mineiro, segundo o jornal O Globo (coluna Panorama Político de 8/12/2011), pronunciou esta pérola do cinismo impune: "O governo nos pede milhões para a DRU e nos dá uma merreca. Ninguém é capacho".
O espantoso é que o autor dessa indecorosa frase não foi submetido a uma apuração por falta de decoro ou nem sequer foi objeto de uma leve indignação.
Enquanto permanecerem as causas que geram essa modalidade de corrupção, é somente esperar pelo próximo escândalo, que será mitigado por uma discreta investigação de Comissões de Ética ou demissão de alguma autoridade. Enfim, todos confiam, como proclamou um dos investigados no escândalo do mensalão, que o tempo se encarregará de apagar de nossa complacente memória a história da corrupção e seus personagens.
É simplismo, portanto, atribuir as deficiências do Poder Legislativo meramente ao sistema eleitoral ou ao financiamento de campanhas.
Outras hipóteses de corrupção poderiam ser exploradas. De tudo, todavia, resta a conclusão de que vivemos uma perturbante crise axiológica, em que nossos valores estão sendo jogados ao rés do chão. Quando se aceitam, com naturalidade, pretensas teses como "recursos não contabilizados", "caixa 2 de campanha" ou desvios éticos para assegurar a governabilidade, é inevitável, também, que a sociedade passe a aceitar, sem repulsa, o governante que "rouba, mas faz".
A eliminação do "ovo da serpente" da corrupção não é tarefa fácil, porque reclama lideranças políticas capazes de mobilizar a sociedade para esse objetivo, em bases estritamente democráticas. A reversão dessa crise moral, entretanto, é condição indispensável para a construção do futuro do País.

O cineminha do padre - JOSÉ DE SOUZA MARTINS


O Estado de S.Paulo - 02/01/12



A molecada da minha rua era quase toda frequentadora do cineminha do Padre Ézio, na matriz nova de São Caetano. O subúrbio voltava a respirar aliviado depois das noites medonhas dos blecautes da Segunda Guerra mundial, alcaguetes disfarçados de patriotas caçando furtivamente quintas-colunas pelas ruas escuras, os supostos espiões do Eixo.

Seu Sales, subdelegado de polícia, mesmo de dia, ao encontrar alguém na rua, especialmente os moleques, levava o indicador esquerdo ao olho e puxava a pálpebra inferior para baixo, num gesto típico da época, que queria dizer "estou de olho em você". Acabou a guerra, passaram-se os anos e o subdelegado envelhecido e barrigudo continuava com o gesto ameaçador. Castigara-o a contumácia: de tanto arregaçar a pálpebra, ela não voltara mais ao lugar, aquele olho arregalado, o róseo avesso exposto, deformando-lhe o rosto como testemunho pavoroso da ditadura, da guerra e da repressão.

Terminara, também, o miserê de pão, das longas filas para conseguir um filãozinho de pão de trigo com o cartão de racionamento. Filas demoradas, de crianças, pois os pais não podiam perder tempo. A criançada se animava a ir à padaria mais para sentir o aroma do pão quente, saindo do forno. Nos bairros, nos arrabaldes, no subúrbio, os aromas eram monumentos olfativos que, com o tempo, a metrópole perderia. Eu podia cheirar o que não podia comer.

A molecada de minha rua chegara, também, à idade da primeira comunhão. Quem fosse à missa e comungasse recebia na porta da igreja um cartão carimbado que dava direito a ingresso no cineminha do padre Ézio, italiano de Trento, vigário da paróquia da Matriz Nova, na tarde do domingo. Muitas das crianças dos bairros operários de São Paulo e do ABC não tinham os tostões para pagar o ingresso dos cinemas de verdade. Mas algumas paróquias tinham o seu modesto cinema dos pobres de Nosso Senhor. Em silêncio e em nome de Deus, o padre disputava com os cinemas comerciais a alma pura das crianças. Era cinema mudo, de tela pequena, que projetava filmes antigos, em preto e branco, pequenas comédias do Carlitos, desenhos do Popeye, do Mickey. Eram filmes curtos, de poucos recursos, em que o maravilhoso dependia muito da imaginação de quem os via, distantes no tempo e antiquados em relação aos luxuosos filmes falados e coloridos.

Quase na metade do século 20, as crianças viam no cineminha do Padre Ézio os filmes que seus pais e avós haviam visto no começo do século. O que dava uma sensação muito boa de que o mundo mudava, mas não mudava tanto. As gerações continuavam juntas. Sendo os mesmos filmes de antes da guerra, a guerra parecia apenas indevida intromissão, mero e descabido incidente na vida das gentes simples, que viviam do suor do próprio rosto para ter na mesa o pão nosso de cada dia.

A Presidência no feminino - RENATO JANINE RIBEIRO


Valor Econômico - 02/01/12



Estamos completando um ano com uma mulher na Presidência da República, a primeira em nossa história. A data pede reflexão. Três importantes países da América Latina elegeram nos últimos anos mulheres para governá-los: na ordem cronológica, Michelle Bachelet, no Chile, Cristina Kirschner, na Argentina, e Dilma Rousseff. Todas tiveram ótima avaliação. Bachelet, que não fez seu sucessor, saiu do governo altamente popular. Cristina foi reeleita com ampla votação. As pesquisas de opinião são bem favoráveis a Dilma. Mas mal temos mulheres nos demais escalões do poder. São poucas as governadoras, prefeitas, deputadas, senadoras e vereadoras. Sentimos dificuldade até com a palavra para designar quem está na chefia de Estado. Embora Dilma Rousseff se diga "presidenta", quase toda a imprensa a chama de "presidente". O dicionário valida ambas as formas, mas já li no Facebook, depois que usei o "presidenta", que isso provaria meu suposto petismo... Uma dedução, obviamente, mal feita.

Porém, tudo isso é sintoma de uma grande dificuldade, não apenas dos brasileiros mas dos homens em geral - e aqui uso "homem" no sentido de varão e no de membro do gênero humano -, para assimilar a novidade que é ter mulheres no poder. Só no século XX elas adquiriram o direito de voto. No Brasil, votaram pela primeira vez em 1933. Antes disso, algumas mulheres exerceram o poder como rainhas, por direito próprio - isto é, não como meras esposas de homens que fossem reis. Mesmo isso não foi fácil. Ironicamente, a maior estadista inglesa, Elizabeth I, que reinou de 1558 a 1603, só nasceu devido à ansiedade do pai, Henrique VIII, por ter um filho varão. Como o primeiro casamento do rei lhe deu apenas uma filha, ele receava que uma sucessão feminina fosse contestada. Daí, a famosa série de divórcios de Henrique e sua ruptura com a Igreja Católica - para, afinal, ter como definitiva sucessora logo uma mulher... Mas, embora Elizabeth tivesse enorme poder em suas mãos, seus auxiliares a pressionavam para se casar. Ela deveria ceder o poder a um homem. No fim das contas, ela só governou porque decidiu conservar-se solteira. Contudo, a estabilidade de seu longo governo teve um preço: com ela, terminou sua dinastia. O trono inglês passou aos reis da Escócia.

A despeito de tudo, avançamos muito. Lembro que, em 1989, a antropóloga Mariza Corrêa foi a primeira diretora de uma faculdade na Unicamp. Já a USP demorou mais - o que é espantoso, levando-se em conta que tem unidades, como a enfermagem e a educação, predominantemente femininas - mas já teve uma reitora. A primeira senadora do Brasil foi Eunice Michilles, em 1979; ela era, porém, apenas uma suplente, que assumiu o cargo com a morte do titular. Só em 1990 tivemos mulheres eleitas para o Senado. Hoje, isso já não é exceção, mas está longe de ser a regra. Uns anos atrás, ouvi uma vereadora paranaense contar que - toda vez que falava na Câmara - os colegas homens riam dela. Isso tornou sua vida insuportável até que, participando em Curitiba de um encontro de mulheres detentoras de mandatos, percebeu que podia ter o apoio, mesmo a distância, de outras mulheres, e enfrentou a situação.

Ainda é difícil, porém, aceitar uma mulher chefiando o governo. Não falo do mundo islâmico; curiosamente, países muçulmanos - embora não árabes - já tiveram mulheres no poder, como Benazir Bhutto, no Paquistão (mas será que o fato de ser mulher contribuiu para ela ser assassinada?). Penso em nosso próprio país. Porque o preconceito é tenaz. Mesmo quando não é agressivo contra as mulheres, um resíduo importante dele aparece na quase-impossibilidade de conciliar o que se espera da mulher e o que se espera do governante.

De quem governa, esperamos que mande. Da mulher, esperamos que seja doce. É possível mandar docemente? Milhares de anos nos acostumaram a uma experiência em que o ato de mandar é duro, agressivo, viril. Também nos acostumaram à ideia de que a mulher é boa, compreensiva, receptiva. Daí que, quando uma mulher manda, entremos em curto-circuito. Talvez tenha sido isso o que levou à queda de Nelson Jobim, político hábil e capaz: quem sabe não aceitasse que uma mulher mandasse nele, que por sua vez dava ordens à cúpula das Forças Armadas. A sucessão de declarações aparentemente desastradas de Jobim, praticamente forçando Dilma a exonerá-lo, permite considerar essa explicação tão boa quanto qualquer outra.

A situação tampouco é fácil para as mulheres. Hillary Clinton, quando o marido concorreu à Presidência dos Estados Unidos, teve que reduzir seu perfil de profissional competente e se apresentar como dona de casa que fazia "cookies". Depois voltou a seu perfil mais verdadeiro, mas parece que nunca presidirá seu país.

Creio, porém, que é justamente esse problema que traz, no seu bojo, a solução. As mulheres assumirem o poder não significa elas se tornarem másculas - imagem que se insinua, às vezes, sobre a própria Dilma. Significa um novo estilo de poder. Não é fortuito que estes anos se fale tanto em "soft power". Aproveitando a palavra, mas dando-lhe novo sentido, o poder precisa se feminizar. Ele não pode, numa democracia, estar na dureza, na repressão, na ordem. Aliás, depois do hiper-masculino Collor, nossos três últimos presidentes foram mais de persuadir que de ordenar. Sua retórica era mais importante que suas ordens. Essa é uma das tarefas que teremos de cumprir, nós e o mundo, nos próximos anos ou décadas: compreender, definir, construir um poder com mais traços femininos. Isso pode demorar bem mais que o mandato de Dilma Rousseff, mas vai acontecer.

Feliz Ano-Novo, Kafka - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 02/01/12
Acho o Réveillon uma festa chatíssima. Quando você estiver lendo esta coluna, estarei em Tel Aviv, e ainda bem que aqui não tem Réveillon.

A cidade é patrimônio cultural universal porque tem o maior conjunto arquitetônico Bauhaus do mundo, o que dá a ela um tom entre o blasé (isto é, a soma do cinza e branco típico dos prédios Bauhaus de poucos andares com o desleixo chique característico da população local mediterrânea) e o moderno da primeira modernização, antes de a modernidade virar essa coisa brega de massa.

Tel Aviv é descrita pelos israelenses como sendo "outro mundo", diferente do resto do país, justamente por seu caráter secular, arredio ao fanatismo religioso que cresce por aqui e aberto à convivência mundana.

Diante desse cenário, sempre que estou nesta cidade, meu pessimismo (que tem sua origem provavelmente em alguma forma de disfunção fisiológica) cede. O desleixo e o ar mediterrâneo, associados ao desespero mudo, embutido no cotidiano de quem se sabe uma espécie caçada, me acalmam. Estranho? Sou estranho mesmo.

Segundo reza uma das lendas sobre Franz Kafka, quando perguntaram a ele se não havia esperanças para o mundo, ele teria respondido: "Esperanças há muitas, mas não para nós".

De todas as formas de pessimismo, a de Kafka é a única que me assusta. Não temo pessimismos cosmológicos. Não espero nada da vida na forma de recompensa moral (aquilo que a teologia cristã chama "retribuição pelos méritos").

Antes de tudo porque não sou uma pessoa boa. Raramente me preocupo com os outros, e a África pouco me importa. Nem a fome. Nem as baleias. Nem você.

Não conto com a misericórdia de Deus porque não a mereço. Guerras sempre existirão, e a humanidade faz o que pode para sobreviver ao mundo e a si mesma.

A possível falta de sentido da vida não me interessa. Durmo bem com ela. Sou daqueles que pensam que a metafísica é fruto de indisposição e mau humor. Mas temo o pessimismo kafkiano como nada mais no mundo. Temo a burocracia. Todo amante da burocracia tem cara de rato. Kafka tinha razão.

O pior mundo de Kafka não é sua barata, mas aquele do seu conto "A Construção". O roedor que faz a "construção" em sua casa é a melhor descrição do inferno burocrático em que o mundo se transformou.

Kafka, à diferença da maioria de nossos especialistas em ciências humanas, sabe que construímos a burocracia para nos sentir seguros, e não porque nos obrigam a isso. E o pior é que existem muitas razões para nos sentirmos inseguros, por isso não há saída para o inferno que é a burocracia.

Algumas almas menos brilhantes assumem que um mundo "paperless" (nada mais ridículo do que usar expressões em inglês para se sentir mais científico), ou seja, sem papel, seria menos burocrático. Risadas... Nada mais horroroso do que alguns restaurantes que começam a trocar seus menus "físicos" por iPads. Logo nos farão escolher nossos pratos via rede, e eles acharão isso o máximo.

Um mundo "paperless" afogar-se-á em senhas. Você precisará de uma senha especial para usar sua senha menos especial e assim sucessivamente, ao infinito. Depois, precisará de um programa superavançado para ter acesso a todas as suas senhas e combiná-las de modo secreto (em si, uma outra senha).

Quando você tiver uma crise diante de tudo isso, algum burocrata dirá para você que isso tudo é para sua segurança. E você será obrigado a concordar, assumindo também uma cara de rato.

Mas, dirão as almas menos brilhantes, graças a Deus estamos cortando menos árvores e não estamos gerando papel.

No conto de Kafka "A Construção", nosso roedor atarefado teme um ruído horroroso que vem não sabe de onde e por isso começa a construir "rotas de fuga" em sua moradia subterrânea.

Logo, a rede de "rotas de fuga" é tão grande que ele se esquece onde começou e descobre que, apesar de o ruído aumentar cada vez mais e sua sensação de perigo aumentar junto com o ruído, ele já não sabe como fugir, porque suas rotas de fuga viraram um labirinto infernal.

O mundo de Kafka é uma prisão a céu aberto, e os ratos venceram. Feliz Ano-Novo.

Voto de silêncio - RICARDO NOBLAT


O GLOBO - 02/01/12
Todo governo tem pessoas destacadas para espalhar versões de fatos que mais o favoreçam. As versões começam a ser criadas logo de manhã, à primeira leitura dos jornais. São aperfeiçoadas ao longo do dia de acordo com a evolução do noticiário. Ao cair da tarde ou no início da noite, são servidas a jornalistas ávidos por uma palavra oficial.
Antes de pisar pela primeira vez numa redação, o jornalista é informado sobre uma das clausulas pétreas do código que deve orientar todos os seus passos. A cláusula: é obrigatório ouvir o "outro lado" de uma questão. Se a questão tiver vários lados todos devem ser ouvidos: Assim se produzirá uma narrativa mais isenta.
Na teoria, funciona Na prática, nem sempre. Com frequência, o leitor acaba sendo contemplado com versões contraditórias de um mesmo fato. E fica sem saber ao certo o que aconteceu - e como, jornalista e pago (ou deveria ser) para esgotar a maioria de suas dúvidas, só voltando à redação com uma história que tivesse começo, meio e fim.
Uma história assim não dispensa a audiência do "outro" ou de tantos "outros lados" de uma questão. Mas uma coisa é ouvi-los e registrar o que disseram de crível e de relevante, desprezando o resto. Outra, muito diferente, é se prestar ao papel de porta-voz de manipuladores que se empenham em plantar o que lhes interessa:
O jornalista encarregado da cobertura de assuntos políticos raramente testemunha algo de muito valor. O que realmente importa acontece longe dos seus olhos - no escurinho dos gabinetes ou nos ambientes ensolarados, mas inacessíveis do poder. Ou alguém conta para o jornalista o que ocorreu ou ele jamais saberá.
Nada é mais difícil, pois, para um jornalista do que administrar suas relações com as fontes de informação. Boas fontes são aquelas que sabem muito - e que nos contam parte do que sabem. Elas sabem o quanto valem. E não dão informação de graça. Esperam, em troca, ser bem tratadas. E socorridas em meio a dificuldades.
O jornalista tem consciência de que seu compromisso numero um é com o distinto público. Ao fim e ao cabo, e ele que lhe garante o emprego. Mas para manter-se bem informado o jornalista precisa ser bem informado. E aí o círculo se fecha: ele precisa dispor de fontes, que não informam de graça, que ...
O Congresso é o alvo principal das criticas dos jornalistas porque é o poder mais aberto. São 513 deputados e 81 senadores. Se para informar corretamente o público o jornalista tem que sacrificar algum parlamentar que o abastece com notícias, haverá outro para substituí-lo.
No governo não é assim. Ha menos fontes de informa<;ao. E a depender do DNA do governo, elas são mais fechadas. Havia fontes de mais no governo José Sarney e notícias em excesso. Foi uma maravilha. Sob esse mesmo aspecto, não foi mal o governo de Fernando Collor. Nem o de Itamar Franco.
Fernando Henrique Cardoso foi uma preciosa fonte de informações para os jornalistas. Deixou de ser quando se elegeu presidente. A maneira como lidara antes com os jornalistas contaminou os que governaram com ele. A informação circulou com desenvoltura mesmo quando o governo apanhava sem dó nem piedade.
Se comparado com o de Fernando Henrique, o governo Lula foi refratário à livre circulação de informações. O próprio Lula confessou uma vez: "Gosto mais de publicidade do que de notícias". Quis dizer: gosto mais de notícias que exaltam os meus feitos e os leitos do governo do que de notícias neutras ou críticas.
Prevaleceu o silêncio no primeiro ano de governo Dilma. Ou porque o governo não teve muito que dizer ou porque não é do feitio dizer muito. Dilma respeita a mídia e lhe reconhece a importância - mas não gosta dela. Prefere mantê-la à distância. E exige que seus auxiliares a mantenham a distância.
O mundo seria melhor para governantes como Lula e Dilma se só fosse divulgado aquilo que eles gostariam que fosse.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

FOLHA DE SP - 02/01/12
Justiça particular

Crescimento do uso de arbitragem para solução de conflitos no país demanda mudanças

A solução de conflitos por meio de arbitragem cresceu tanto no Brasil nos últimos anos que as câmaras passam agora por mudanças para se adequar à dimensão que o mercado tomou.

Novos regulamentos já foram editados por diversas câmaras de arbitragem e outros ainda estão por vir.

Algumas preveem alteração radical. "A câmara da Bovespa inseriu uma figura inédita no Brasil, que é o árbitro de apoio. As da Fiesp e a Brasil-Canadá também estão se renovando", diz Selma Lemes, professora do curso de arbitragem da Direito GV.

"Tivemos ampliação do número de árbitros para elevar a oferta de expertises mais específicas", diz Sílvia Salatino, da CCBC (Câmara de Comércio Brasil-Canadá).

A ampliação do rol de árbitros envolve profissionais estrangeiros, segundo Marcelo Inglez de Souza, do escritório Demarest.

"As câmaras estão buscando se internacionalizar. O Brasil passa a ser visto como campo neutro para realizar disputas arbitrais em litígios estrangeiros", diz Souza.

O aumento do volume de contratos de infraestrutura impulsionou o resultado do escritório, que registrou alta de 200% no volume de arbitragens em andamento.

A Camarb (Câmara de Arbitragem Empresarial Brasil), foi uma das primeiras a revisar o regulamento para a nova realidade, segundo seu secretário-geral, Felipe Moraes.

"Também tivemos reajuste de honorários. Hoje, os casos são mais complexos."

No Caesp (Conselho Arbitral do Estado de São Paulo), foram feitas alterações na tabela de custas, com mudança na forma de remuneração de porcentagem para hora trabalhada, segundo Ana Claudia Pastore, superintendente da entidade.

Se os custos subirem muito, porém, perde-se vantagem em relação ao Judiciário.

"As preocupações envolvem manutenção do procedimento enxuto e ganhos em celeridade", diz Souza.

"Nossas câmaras têm sido modificadas e reconhecidas. Muitas já têm regulamento similar ao de estrangeiras"
MARCELO INGLEZ DE SOUZA
sócio do Demarest

Jovens... A Amil contratou os 13 trainees que passaram pela empresa no ano passado. O treinamento, que recebeu mais de 2.500 inscrições, teve 12 meses de duração. A próxima edição será em 2013.

...no mercado Os 20 profissionais escolhidos pela Ambev em seu programa de trainee começam hoje a trabalhar na companhia. O processo seletivo durou cinco meses e a concorrência foi de 3.690 candidatos por vaga.

Fundo Popularizado
Executivos de instituições que operam fundos vinculados a um índice com cotas negociadas em Bolsa, os ETFs, afirmam que o instrumento começa a se tornar mais familiar entre os gestores do país.

"Foi um ano em que investidores institucionais passaram a adotar o produto de maneira significativa", diz Luiz Felipe Andrade, presidente da BlackRock (Brasil), que tem US$ 3,5 trilhões sob gestão global e mais de US$ 40 bilhões investidos em ações de empresas brasileiras.

"Nossos fundos têm 40% mais cotas que no fechamento do ano anterior."

As fundações são hoje os maiores investidores nesse instrumento.

Falta, porém, uma regulamentação melhor, dizem gestores. Os ETFs são proibidos de negociar títulos de renda fixa no país.

A Anbima (que representa entidades do mercado financeiro e de capitais) encaminhou uma proposta com sugestões de aprimoramentos na legislação.

Na Receita Federal, ainda faltam definir tratamentos específicos.

"A indústria não encaminhou à Receita um pedido formal de revisão da legislação", diz Andrade, que também preside o comitê da área da Anbima.

"Tenho certeza de que evoluiremos bem. Não se pede isenção fiscal, mas a definição de um tratamento adequado", acrescenta.

"Por ser um instrumento híbrido entre um fundo e um ativo, dá margem a controvérsias."

Segundo Emprego
Um terço dos norte-americanos pretende procurar um segundo emprego para aumentar sua renda, segundo estudo da Met Life.

Entre as alternativas levantadas pelos entrevistados estão mudar de cidade, voltar a estudar e começar um negócio próprio. A empresa ouviu 2.420 pessoas entre setembro e outubro passados.

Números

33% dos americanos pretendem buscar um segundo emprego para aumentar sua renda

25% da população dos EUA relaciona boa situação financeira com empreendedorismo

com JOANA CUNHA, VITOR SION e LUCIANA DYNIEWICZ

À TOA NA VIDA - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 02/01/12

Chico Buarque conta histórias de viagens que fez à revista de bordo da Gol deste mês. Em novembro, ele foi à Argentina. "Foi a primeira vez na vida em que eu estava em Buenos Aires sem trabalhar, só vagabundeando. Não tinha show nem ensaio, não tinha entrevista, não tinha compromisso com nada nem horário para nada. As cidades melhoram muito quando você está à toa na vida..." Os shows cariocas da nova turnê do compositor começam no dia 5, no Vivo Rio. A Gol é a transportadora oficial da temporada.

REFRESCO DE VERÃO
O Ministério do Turismo abriu negociações com a Receita Federal para tentar reduzir as alíquotas de impostos para o setor, a exemplo do que já foi feito com carros e produtos da linha branca, como geladeiras e fogões. A ideia é diminuir o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de empresas que forneçam materiais e serviços para hotéis, por exemplo. O Leão resiste à ideia.

DIREÇÃO
Para convencer os técnicos, o ministro Gastão Vieira mostra pesquisa da Fipe que revela que, a cada ano, 1,7 milhão de fronhas, 1,6 milhão de lençóis e 1,5 milhão de toalhas são repostos em hotéis e pousadas. E também 116 mil telefones, 108 mil chuveiros e 100 mil televisores. O turismo é responsável pela aquisição de 160 mil carros por locadoras de automóveis, cuja frota aumentou 14% em 2010.

NA BAIXA
Vieira está encaminhando também ao Confaz, o conselho que reúne secretários estaduais da Fazenda, proposta para a redução do ICMS sobre o combustível de aviação. Alega que, na baixa temporada, os aviões viajam mais vazios. O corte no imposto poderia reduzir o preço das passagens no período.

BOLA
Voltou a circular com força no fim da semana a informação de que Ricardo Teixeira pode deixar definitivamente a CBF. Faria isso na esteira da decisão da Justiça suíça de suspender o sigilo do dossiê ISL, o maior escândalo de corrupção da história da Fifa. O dossiê revelaria que Teixeira e João Havelange devolveram dinheiro de propinas após fazerem, junto com a entidade, acordo para encerrar sob sigilo investigação criminal, em 2010.

BOLA 2
A CBF não se pronuncia oficialmente desde que o caso explodiu.

Interlocutores de Teixeira afirmam, no entanto, que ele não pretende se afastar da entidade.

BOLO E GUARANÁ
Marcelo Médici retorna ao Teatro Faap com a peça "Eu Era Tudo pra Ela... E Ela me Deixou", na sexta, 6, data de seu aniversário. "As duas primeiras semanas já estão esgotadas, um presentão", afirma o ator.

É DOS CARECAS
O ator Caco Ciocler vai aparecer de cabelo e barba raspados na peça "A Construção", de Franz Kafka, que estreia em janeiro. Adotou o visual para viver um autor atormentado.

É DOS CARECAS 2
E Vicente Celestino (1894-1968), intérprete do clássico "O Ébrio", será vivido no palco por um ator careca. Ricca Barros usará uma peruca para protagonizar "Vicente Celestino, a Voz Orgulho do Brasil", que estreia no dia 13 no teatro Anhembi Morumbi.

SP PARADA
A agenda pública do prefeito Gilberto Kassab na sexta, véspera de Réveillon, tinha um só compromisso: "Soltura de balões" da Associação Comercial de SP, no Pátio do Colégio.

AO PÔR-DO-SOL...
As modelos Ana Beatriz Barros e Fernanda Motta circularam pela festa It's Miller Time, no Praia Café de la Musique, em Jurerê Internacional, em Florianópolis. O DJ americano Orazio Rispo e Rico Mansur fizeram o som da balada, que aconteceu ao longo do anoitecer na ilha.

...E NOITE ADENTRO
E os atores Selton Mello e Colin Egglesfield foram ao clube Posh, na mesma praia, em Florianópolis. A modelo Cintia Dicker e a DJ Lara Gerin também circularam pela balada.

CURTO-CIRCUITO

A peça "Ciranda" reestreia na sexta, às 21h30, no teatro Renaissance. Classificação etária: 12 anos.

As inscrições das oficinas de criatividades do Sesc Pompeia serão abertas no sábado, às 10h, no local.

A peça "12 Homens e Uma Sentença" reestreia no dia 13, às 21h, no Tucarena. Classificação: 12 anos.

Jacques Wagner e Thomas Shannon confirmaram presença em festa da Ford, na quarta, em Brasília.

Arlindo Cruz se apresenta na sexta no Citibank Hall (RJ), a partir das 22h. Classificação: 15 anos.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

Moral e legal - DENIS LERRER ROSENFIELD


O Estado de S. Paulo - 02/01/12


A imagem do Judiciário é vital para a democracia brasileira. Sem a sua correção e sem os seus valores a República se veria privada de um dos seus pilares. Nos últimos anos esse Poder, graças ao Supremo Tribunal Federal (STF), tem se destacado publicamente interpretando - e muitas vezes regrando - questões controversas, vindo a aparecer como uma instância de recurso de alta propriedade moral, e não apenas legal. Pode-se mesmo dizer que no vácuo criado pelo Poder Legislativo ele veio a ocupar um novo espaço propriamente político.

Essa "nova" função do STF, no entanto, não se faz sem algumas condições, pois novas tarefas exigem, também, novas qualificações. Dentre estas, a imagem de moralidade é uma das mais essenciais, sobretudo considerando que foi aí que o Legislativo e o Executivo mais sofreram baques nos últimos anos. Corrupção e desvio de recursos públicos se tornaram, infelizmente, o cotidiano dos brasileiros. Ou seja, no que diz respeito a esse critério, o Judiciário e o Supremo, sua instância máxima, não podem ser um Poder como os outros.

O corporativismo tem sido uma forma de imoralidade ao privilegiar os interesses de uma corporação determinada em detrimento do bem coletivo, isto é, do bem de todos os outros cidadãos, que não fazem parte da corporação em questão. Isso é tanto mais flagrante porque os recursos dos contribuintes, pagos em impostos e contribuições dos mais diferentes tipos, são limitados. Se alguns têm privilégios, outros não os terão, pois os privilégios, por definição, são exclusivos, só valendo para alguns. São "direitos" exclusivos de tipo muito especial.

Tomemos um dos motivos de toda a celeuma sobre as investigações que estavam sendo conduzidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Tribunal de Justiça de São Paulo e foram sustadas por atendimento de uma liminar impetrada por uma associação corporativa. O que estava em questão era um passivo trabalhista que remonta à década de 90 do século passado, algo legalmente reconhecido, que alguns desembargadores, à diferença dos demais, teriam recebido de uma só vez. Em alguns casos, o montante seria superior a R$ 1 milhão.

Um privilégio consistiria nesse montante muito elevado, principalmente considerando que o Judiciário é entre os Poderes o que usufrui maiores salários e benefícios. Alguns juízes, inclusive, estariam reclamando de por que teriam recebido em parcelas o que outros receberam de uma só vez. Aqui se trata de uma questão interna à própria corporação, pois não está em causa a legitimidade do privilégio, mas o fato de ele ter distinguido, sob a forma do recebimento, os seus beneficiários.

A questão, no entanto, deveria focar-se no recurso trabalhista em pauta, isto é, qual é a sua proveniência. Aí reside o problema. Trata-se de um auxílio-moradia que, já usufruído por deputados federais e senadores, foi estendido pelo ex-ministro Nelson Jobim a todos os juízes. Houve o atendimento de uma demanda essencialmente corporativa, que se apresentou como uma espécie de equivalência "justa" com os parlamentares.

Ora, a situação é apenas parcialmente equivalente. Se deputados e senadores usufruem um auxílio-moradia, isso se deve ao fato de exercerem suas funções em Brasília, longe de seus respectivos domicílios, por um período determinado. Nesse sentido, o auxílio em questão é plenamente justificado. Analogicamente, ele poderia, portanto, ser estendido a ministros do Supremo e dos tribunais superiores, também constituídos por pessoas das mais distintas procedências. Daí não se segue, porém, que ele deveria valer para todos os juízes do País, até mesmo para os aposentados. Aí surge a imoralidade.

Por que um juiz ou desembargador de qualquer Estado, com domicílio, deveria usufruir um auxílio-moradia, se já tem uma? Por que um aposentado deveria usufruir esse mesmo auxílio, se nem mais trabalha nos tribunais? Ainda seria compreensível que tal auxílio fosse concedido a juízes cujo local de trabalho não coincida com o seu domicílio, o que ocorre com muitos magistrados em início de carreira, mudando constantemente de comarca. Agora, concedê-lo a todos os juízes e desembargadores indiscriminadamente é uma flagrante imoralidade, contrastando com a situação de todos os outros cidadãos brasileiros, que devem trabalhar para pagar sua moradia.

O corporativismo tem essa estranha "virtude" de tornar legal um interesse particular, exclusivo, coagindo todos os contribuintes a financiá-lo. Quando questionado sobre a sua legitimidade, a única saída consiste em dizer que ele é legal, procurando, com isso, que a questão essencial seja esquivada, a saber, a da sua imoralidade.

Nesse sentido, o trabalho do CNJ tem dado uma inestimável contribuição à democracia brasileira, saindo atrás de irregularidades no funcionamento do Judiciário, verificando os seus disfuncionamentos e morosidades, procurando prestar contas à sociedade de seu trabalho. Um Poder republicano que não se abre à sua análise corre o risco de se encastelar em seus privilégios e interesses corporativos.

A polêmica em torno da competência concorrencial ou subsidiária do CNJ em relação às Corregedorias próprias dos tribunais lança luz sobre um aspecto crucial da moralidade, ou seja, a transparência das ações, no caso, dos atos e procedimentos dos diferentes tribunais. Se as Corregedorias funcionassem a contendo, talvez o CNJ nem tivesse sido criado. Se o foi, foi para equacionar uma lacuna existente. Mais ainda, permitiu que a sociedade, em seu conjunto, pudesse vir a exercer publicamente controle sobre o modo de funcionamento do Judiciário.

A transparência é outro nome da moralidade. Em seu escrito sobre a paz perpétua, Kant elaborou um imperativo que pode ser transcrito da seguinte forma: "Aquilo que não pode ser publicizado, tornado público, é imoral". Ainda, segundo ele, poderíamos dizer que a satisfação de um interesse corporativo que não vale para todos os cidadãos, que não pode ser universalizado, é imoral.

Dedos cruzados -RENATA LO PRETE

FOLHA DE SP - 02/01/12
O roteiro imaginado pelos interessados em adiar ao máximo o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal inclui a convicção de que a ministra Rosa Weber, recém-chegada à Corte, egressa da Justiça do Trabalho e com pouca experiência em matéria penal, pedirá vista quando chegar sua vez de votar.
Na condição de mais nova integrante do STF, Rosa será a terceira a se manifestar, depois do relator, Joaquim Barbosa, e do ministro revisor, Ricardo Lewandowski. Barbosa é dado como voto certo pela condenação. Já Lewandovski é visto como uma espécie de porto seguro dos mensaleiros.

Buracos 1 A estratégia de empurrar tudo com a barriga até pelo menos a aposentadoria, no segundo semestre, dos ministros Cezar Peluso e Ayres Britto, ambos considerados perigosamente inclinados pela condenação, embute alguma dose de risco.

Buracos 2 

A depender do ponto em que o julgamento se encontre, tanto Peluso quanto Britto poderiam, em tese, antecipar seus votos antes da aposentadoria. Fora o risco de esta ser adiada pela eventual aprovação da chamada PEC da Bengala_ que elevaria de 70 para 75 anos a idade da expulsória.

Escola
Colegas de Esplanada observam que o estilo um tanto duro da presidente Dilma Rousseff começou a ser incorporado pela ministra Gleisi Hoffmann. Como chefe da Casa Civil, ela controla o andamento de projetos de uma série de pastas e está incumbida de fazer cobranças.

Censo 1 

Na esteira do escândalo das emendas na Assembleia, o governo paulista iniciou um pente-fino em cem ONGs com as quais mantêm convênio. A varredura inclui checagem de informações cadastrais e certificação preliminar das entidades para credenciá-las a aplicar verbas repassadas por indicação dos deputados.

Censo 2 

Geraldo Alckmin quer ainda criar um cadastro positivo de ONGs, especialmente as aquinhoadas com recursos das secretarias de Esporte e Cultura. A medida serviria também como vacina contra brecha aberta na redação do Orçamento de 2012 para permitir aos parlamentares redirecionar emendas no decorrer do ano.

É pra já 

Sob pressão de prefeitos que pretendem se reeleger em 2012, secretários de Alckmin promovem mutirão para assinatura de convênios de liberação de recursos, sobretudo para obras de infraestrutura urbana. A ideia do governador é autorizar os empenhos até 30 de janeiro.

Calendário 

O cronograma do tucano permitirá a licitação e a execução de obras, inclusive de pavimentação, sem que a Justiça Eleitoral imponha restrições.

Tiozão 
De um aliado do PSD, sobre o esforço de Gilberto Kassab para associar a agenda de mobilidade urbana da prefeitura, como a extensão das ciclofaixas e a campanha de valorização do pedestre, à campanha eleitoral de 2012: "O problema é que o Afif não anda de bicicleta nem atravessa rua".

Outro rumo 1 

Um dos reflexos da operação do PT para liquidar suas prévias na sucessão paulistana deve ser a implosão da corrente Novo Rumo, há anos majoritária na capital.

Outro rumo 2 
O deputado Carlos Zarattini, que se sentiu abandonado por correligionários no processo, já discute com aliados a qual tendência se ligar. Carlinhos Almeida, outro nome da bancada federal que integrava a ala, migrou para a CNB.

tiroteio

"Quando uma emenda de bancada é usada para atender determinado parlamentar, o processo do Orçamento é desvirtuado. Acaba sendo um desserviço."
DO SENADOR WALTER PINHEIRO (PT-BA), criticando o "jeitinho" encontrado pelo Palácio do Planalto para atender, no apagar das luzes de 2011, promessas feitas a aliados.

contraponto

Bitributação
 

Em recente reunião do secretariado paulista, o vice-governador Guilherme Afif (PSD) falava da importância das PPPs para a expansão das linhas de trem e metrô.
Sem mencionar o aliado Gilberto Kassab, principal defensor de sua pré-candidatura a prefeito, Afif criticou os congestionamentos da capital:
-Não há prefeitura que dê jeito. O trânsito fica parado em qualquer época do ano. Estou pensando em propor a substituição do IPVA pelo IPTU, porque os carros, embora automotores, ficam mesmo é imóveis!

Eles não morreram de overdose - JOÃO LUIZ MAUAD


O GLOBO - 02/01/12


A repercussão da morte de Steve Jobs e as merecidas homenagens a ele prestadas, inclusive e principalmente aqui no Brasil, são dignas de registro, pois mostram talvez uma mudança profunda na opinião pública, historicamente avessa ao capitalismo em geral e aos capitalistas em particular. Devido a uma persistente cultura de privilégios e do intenso compadrio entre agentes públicos e privados, vigente por aqui desde priscas eras, a imagem dos empresários sempre foi a pior possível, não raro considerados ladrões, sonegadores ou exploradores do trabalho alheio.

O egoísmo é outra pecha frequentemente lançada contra os empreendedores para desmerecer seu trabalho e as realizações. Os detratores anticapitalistas esquecem que quase todos nós trabalhamos somente em proveito próprio. A única diferença é que a compensação pelo trabalho, seja ele de um humilde servente ou de um renomado cientista, é o salário, enquanto a dos empresários é o lucro. Aliás, há outra importante diferença: o risco. Os assalariados recebem pelo trabalho executado independentemente do resultado alcançado, mas os capitalistas serão recompensados apenas caso os seus investimentos e esforços se tornem lucrativos.

No verdadeiro capitalismo - onde a eficiência é recompensada, a ineficiência é punida e os favores do Estado estão fora do alcance -, a luta pela sobrevivência é tão dura que o bom empresário não pode se dar ao luxo de olhar o interesse social, mas unicamente os seus próprios interesses, sob pena de sucumbir ante a concorrência alheia ou a ineficiência própria. Contudo, foi justamente este famigerado "egoísmo" o responsável pela criação de produtos e serviços que transformaram o mundo num lugar muito melhor para viver.

Por mais que possa parecer estranho, foi graças à ambição de homens como Steve Jobs que a imensa maioria dos nossos contemporâneos goza hoje de um padrão de vida bem acima do que, há apenas poucas gerações, era impossível até aos mais abastados. Ou alguém duvida que o autointeresse dos capitalistas está por trás de quase todas as inovações tecnológicas que, de alguma forma, concorreram para satisfazer boa parte das carências humanas?

Convido-o a pensar algumas das maravilhas já criadas pelo engenho humano. Pense nos automóveis, locomotivas, navios e aviões, que possibilitam deslocamentos cada vez mais rápidos e seguros. Pense nos eletroeletrônicos que facilitam a vida e entretêm bilhões de indivíduos: geladeiras, televisores, máquinas de lavar, micro-ondas, condicionadores de ar, computadores, telefones celulares. Pense nos equipamentos que ajudam a tornar a medicina muito mais eficiente e prática, como tomógrafos, centrífugas, aparelhos de ultrassonografia, de ressonância magnética, microscópios eletrônicos, microchips, marca-passos. Pense na indústria farmacêutica, seus avanços e descobertas. Pense, por exemplo, que, há poucos anos, a maior parte dos doentes com úlcera gástrica terminava numa mesa de operações e hoje aquela é uma doença facilmente tratável com medicamentos. Pense na agricultura e nos avanços de produtividade que permitem alimentar um contingente humano que cresceu de forma geométrica, contradizendo as previsões catastróficas de Thomas Malthus e seus seguidores.

Esses avanços, e toda a fantástica geração de riquezas conseguida pelo homem, foram obtidos graças à divisão e à especialização do trabalho e, acima de tudo, ao interesse pessoal dos indivíduos, principalmente dos execrados capitalistas. Sem isso, talvez a maior parte da população ainda estivesse labutando de sol a sol, morando sem qualquer conforto e sujeita a condições extremas de insalubridade. Sem falar do cotidiano monótono, restrito a atividades básicas de sobrevivência.

Sem a recompensa pessoal, seja ela fruto da remuneração do trabalho ou do capital (lucro), não há incentivo para que os indivíduos produzam, invistam, pesquisem, desenvolvam novas tecnologias, criem e coloquem novos produtos e serviços à disposição dos demais. Analisem a relação de ganhadores do Prêmio Nobel nas áreas de ciência e tecnologia. Onde está (ou esteve) domiciliada a imensa maioria deles? Sem dúvida, em países onde há liberdade econômica (capitalismo) e, consequentemente, a busca pelo lucro. Será que isso acontece por acaso?

O próximo presidente dos Estados Unidos - LEE SIEGEL


O ESTADÃO - 02/01/12

Se os eleitores aceitarem por completo o fato de ele ser mórmon, Mitt Romney será o próximo presidente dos Estados Unidos. Não será eleito por suas ideias a respeito do futuro do país. Será eleito porque o presidente Barack Obama é negro. Apesar de tudo o que se fala sobre a divisão existente entre os eleitores americanos conservadores, eles votarão de forma unânime em qualquer candidato republicano que seja branco. Herman Cain, quem sabe? Este nunca teve qualquer chance.

Deixando de lado as considerações de cunho ideológico - admito que, embora espere que Obama seja reeleito, se Romney se tornasse presidente eu não pegaria a minha família e sairia do país. A verdade nua e crua, olhando retrospectivamente os últimos três anos, é que o presidente negro desconcertou a metade dos cidadãos deste país. Se Obama fosse branco, nunca teria encontrado a resistência frenética que o persegue praticamente desde a posse, em janeiro de 2009.

Não consigo lembrar de outro presidente americano que tenha despertado tanto rancor e ódio quanto Obama. Nixon foi odiado porque estendeu e intensificou uma guerra absurda no Sudeste Asiático, na qual pereceram 50 mil americanos. Clinton foi violentamente odiado pela direita, mas em especial na periferia da política americana - e não no que ela tem de mais tradicional.

Obama recebeu mais ameaças de morte do que qualquer outro presidente moderno. Ele provocou o tratamento mais desrespeitoso por parte da oposição de que se tem memória. Em várias ocasiões, os republicanos se recusaram a sentar com ele à mesa para negociar o compromisso mais básico. Quando, em setembro, o presidente pediu permissão para discursar em uma sessão conjunta do Congresso, John Boehner, o presidente da Câmara, recusou. Isto jamais aconteceu. Como alguns dos republicanos mais destacados afirmaram off the record, sua única estratégia é repudiar toda e qualquer iniciativa proposta por Obama.

São políticos ambiciosos. Eles não insultariam e obstruiriam o presidente se não tivessem a certeza de que este comportamento arbitrário provoca uma reação favorável em seu eleitorado. A verdade pura e simples é que os Estados Unidos são na realidade dois países. "Vermelhos" e "azuis" - como costumam ser designados respectivamente conservadores e liberais - são qualificativos que não traduzem a feroz polaridade expressa pela fratura. Estas duas Américas existem desde a Guerra Civil. Os transtornos econômicos e a desorientação social só contribuíram para tornar as divergências entre ambos ainda mais amargas.

A divergência mais profunda diz respeito à raça. Não que os conservadores sejam racistas e os liberais não. O mito da inteligência de uma raça foi relegado à margem da vida americana. Hoje existe uma sólida classe média negra e um crescente estrato social de negros ricos. Milhões de donas de casa brancas bebem avidamente cada palavra de Oprah Winfrey. Personalidades negras irrefutáveis em todos os aspectos da nossa vida servem de modelo de comportamento às crianças brancas. Uma breve incursão em qualquer pátio de escola revelará grupos de crianças negras e de crianças brancas que se segregam voluntariamente, mas tribalismo não é racismo. Toda a vida social é uma lenta jornada que leva da semelhança à diferença.

Contudo, não obstante todo o progresso social ocorrido nos Estados Unidos, uma ideia de hierarquia permaneceu arraigada nas profundezas da mente americana. Quando a indústria do país entrou em crise, e milhões de trabalhadores brancos perderam os seus empregos ou tiveram de aceitar ocupações inferiores, nunca deixou de persistir um sentimento atávico de que os brancos sempre deteriam uma posição social acima da dos negros.

Porque, apesar da ascensão de alguns negros em todos os campos da vida americana, a preponderância dos negros ricos e bem-sucedidos ocorre nas áreas do entretenimento e dos esportes. É fácil para a classe média baixa branca afetada pela crise sentir-se superior a personagens, por mais que estes sejam pessoalmente dotados, cujo trabalho consiste em representar para dar prazer a um público.

De repente, quando todo o universo do trabalho e da posição social parecia mudar, apareceu um presidente negro, e como se não bastasse, um intelectual. Isto foi, e é demais para pelo menos a metade do país, que todos os dias vê seu mundo virar de cabeça para baixo, em vários sentidos. Neste país, há pessoas, talvez a maioria, que votarão contra Obama simplesmente para corrigir o erro histórico que sua presidência representa para elas. Em comparação com a aberração, na opinião delas, de um presidente negro, o fato de ter um presidente mórmon parece menos aberrante. Observem Romney atentamente quando ele aparece no noticiário. Os candidatos à presidência costumam esforçar-se em projetar um ar de confiabilidade, estabilidade, conhecimento e sucesso. Romney se esforça, principalmente, por parecer branco.

A língua de Dilma - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


O Estado de S.Paulo - 02/01/12


Contrariando o mito machista de que mulher fala muito, no seu primeiro ano de governo a presidente Dilma Rousseff pronunciou-se menos do que seus dois mais recentes antecessores. Foram 189 discursos em 2011 - praticamente uma fala a cada dois dias. Em relação ao primeiro ano de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma usou a palavra em 25% menos ocasiões. Já na comparação com o primeiro ano de Fernando Henrique Cardoso, falou 13% menos vezes.

O começo do mandato, porém, não é um espelho fiel de uma gestão, pelo menos no discurso. Lula começou com 251 falas em 2003 e terminou seu governo, oito anos depois, com 353 pronunciamentos ao longo de 2010 - um recorde absoluto de verborragia entre seus pares. Na média, o petista falou 11% mais vezes no segundo mandato vis-a-vis os quatro primeiros anos no Palácio do Planalto.

Se a língua presidencial foi crescentemente acionada na gestão de Lula, sob FHC, tornou-se cada vez menos eloquente. O primeiro de seus oito anos de governo foi o mais palavroso do tucano, com 216 discursos. Ano a ano, Fernando Henrique economizou pronunciamentos e, mesmo tendo uma recaída verbal em 2002, falou em média 18% menos vezes no segundo mandato.

Nos casos de Lula e FHC, há uma semelhança entre as curvas de popularidade e de frequência dos pronunciamentos. Quanto maior a aprovação junto à opinião pública, mais discursos o presidente fazia - e vice-versa. Pode ser uma reação natural de exposição/preservação dos homens públicos, ou simples coincidência.

Na quantidade, Dilma se aproxima mais do tucano do que de seu mentor político. Na média dos oito anos de mandato, Lula discursou 33% mais vezes do que sua sucessora. Já a média anual dos dois governos FHC é praticamente igual à do primeiro ano de Dilma: 184 discursos a 189.

Na forma também, Dilma se aproxima mais de Fernando Henrique. Ambos privilegiaram a leitura à improvisação. Para FHC, por apreço à liturgia do cargo e pelo trauma dos dolorosos estragos que as blagues improvisadas provocaram em sua popularidade. A atual presidente ainda se ressente da pouca prática em pronunciamentos públicos. Lula, ao contrário, nasceu para a política em palanques e comícios, observando as reações do público e improvisando o discurso ao gosto da audiência.

Mensalinho - MELCHIADES FILHO

FOLHA DE SP - 02/01/12
BRASÍLIA - Viraram a casaca os dois tucanos que, no passado, mais aguerridamente investigaram e denunciaram o esquema de desvio de dinheiro público para a compra de apoio político ao governo Lula.

Gustavo Fruet bandeou-se para o PDT. Neste ano sairá candidato a prefeito de Curitiba, como "peão" no jogo do PT para desbancar o PSDB do poder no Paraná _o movimento seguinte será o lançamento da ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) ao governo em 2014.

Eduardo Paes, que em 2005 chamou Lula de "chefe da quadrilha", pediu desculpas, migrou para o PMDB e virou prefeito do Rio. Tem agora o respaldo do PT para se reeleger e comandar a festa (e os "preparativos") da Olimpíada de 2016.

Outro garoto-propaganda das CPIs nascidas do mensalão, ACM Neto (DEM-BA) por pouco não fechou com o PMDB e se juntou à base de Dilma no ano passado.

Seis anos atrás, Gastão Vieira (PMDB-MA) fazia parte da bancada não (tão) alinhada com o Planalto. Acusava Lula de "comprar partidos e cooptar deputados", em um "caso de corrupção sem paralelo" na história. Em setembro, foi premiado com o Ministério do Turismo.

Quem também virou ministro de Dilma foi Garibaldi Alves (PMDB-RN), que, à frente da CPI dos Bingos, acolhia sem pestanejar os pedidos da oposição para fustigar o presidente então enfraquecido.

Como peça de promotoria, o mensalão está mais forte do que nunca. Apesar dos ardis de alguns ministros e de personagens do bastidor, o julgamento deverá mesmo ocorrer neste ano no STF. Não surpreenderá se resultar em prisões. O inquérito é detalhado e devastador.

Do ponto de vista político, porém, o escândalo aos poucos esmaeceu. Perdeu a octanagem do "nunca antes neste país" e começa o ano novo sem apelo no Congresso, vítima da força dos governos do PT e do adesismo de ocasião.

Currículo, a Constituição da educação - JOÃO BATISTA ARAUJO E OLIVEIRA


O ESTADÃO - 02/01/12


O Ministério da Educação (MEC) anunciou, com atraso considerável, que vai apresentar sua proposta de currículo. A Constituição de 1988 promoveu avanços notáveis em várias áreas, apesar de inúmeras disfunções criadas. Mas faltou uma visão de futuro mais clara e pragmática.

Resta assegurar que, da mesma forma, a iniciativa atual não aumente ainda mais o nosso atraso.

A última decisão nessa área resultou nos desastrados" parâmetros curriculares nacionais". A maioria das iniciativas do MEC que envolvem questões de mérito tem sido sistematicamente cativa de mecanismos e critérios corporativistas e de duvidosos consensos forjados em espúrios mecanismos de mobilização.

Tradicionais aliados do ministério, inclusive internamente, têm aversão à ideia de currículo e mais ainda de um currículo nacional.

Documentos desse tipo,produzidos por alguns Estados e municípios em anos recentes, continuam vítimas do pedagogismo.

Isso é o melhor que temos.

O assunto é sério demais para ser deixado apenas para os educadores e especialistas. Nem pode ser apropriado pelo debate eleitoral.

O Brasil - especialmente suas elites - precisa estar preparado para discutir abertamente a questão.Aqui esboçamos os contornos desse debate.

O que é um currículo? Um documento que diz o que o professor deve ensinar, o que o aluno deve aprender e quando isso deve ocorrer. Em outras palavras, conteúdo, objetivos (o termo da vez é expectativas de aprendizagem), estrutura e sequência.Para que serve um currículo? Primeiro, para as segurar direitos:o currículo especifica o que o aluno deve aprender. É um instrumento de cidadania fundamental para garantir equidade e os direitos das famílias. Segundo, para estabelecer padrões, ou seja, os níveis de aprendizagem para cada etapa do ensino:atingir esses níveis é o dever, que cabe ao aluno. Terceiro, para balizar outros instrumentos da política educativa, como avaliações, formação docente e produção de livros didáticos, instrumentos essenciais em qualquer sistema escolar.Os currículos,sozinhos, não mudam a educação.

Por que ser de âmbito nacional? A experiência dos países mais avançados em educação,sejam federativos ou não, indica a importância de uma convergência. Depois do advento do Pisa, mesmo países extremamente descentralizados, como Suíça, Alemanha ou EUA, têm promovido importantes convergências em seus programas de ensino, até em caráter de adesão.Num município,um currículo básico permitirá que alunos transitem por diferentes escolas sem que se instaure o caos a que hoje submetemos nossas crianças e seus professores.

Como saber se um currículo é bom? A condição é que seja claro.

Se o cidadão médio ler e não entender, não serve. Deve ser parecido com edital de concursos: você lê, sabe o que cai no exame e sabe como precisa se preparar.O currículo não é exercício parnasiano ou malabarismo verbal.

Deve também levar em conta os benchmarks, as experiências dos países que,usando currículos robustos, avançaram na educação.

É preciso cuidado para não confundir os currículos que os países adotam hoje, depois de atingido o nível atual, com os currículos que os levaram a esse patamar.

A proposta deve ser dinâmica e corresponder às condições gerais de um sistema. O currículo não pode ser avaliado isoladamente de outras políticas, em especial da condição dos professores.Hoje a Finlândia, com os professores que tem,pode ter currículos mais genéricos do que há 15 ou 20anos.

A análise dos benchmarks sugere quatro outros critérios para avaliar um currículo: foco,consistência, rigor e referentes externos.

Um currículo deve ter foco,concentrar- se no primordial e só em disciplinas essenciais, cuidando de poucos temas a cada ano,sedimentando a base disciplinar e evitando repetições. William Schmidt, que esteve recentemente no Brasil, desenvolveu escalas comparativas que permitem avaliar o grau de focalização de currículos de Matemática e Ciências.

Deve ter consistência, isto é, respeitar a estrutura de cada disciplina. Isso se refere tanto aos conceitos essenciais que devem permear um currículo quanto à organização do que deve ser ensinado em cada etapa ou série. Por exemplo, um currículo de Língua Portuguesa considerará as dimensões da leitura, escrita e expressão oral, levando em conta o equilíbrio entre a estrutura e as funções da linguagem e contemplando o estudo dos componentes da língua (ortografia, semântica, sintaxe, pragmática).

Um currículo deve ter rigor, ser organizado numa sequência que evite repetições e promova avanços a cada ano letivo. Esses avanços devem observar a relação entre disciplinas e a capacidade do aluno de estabelecer conexões entre elas.

Interdisciplinaridade e contexto não são matérias de currículo, são consequência deste.

Um currículo deve ter referentes externos claros.

Um currículo de pré-escola deve especificar tudo o que acriança precisa para enfrentar com sucesso os desafios posteriores do ensino fundamental.

Isso não significa tornar o pré uma escola antes da escola: currículo não é proposta pedagógica.

Já o ensino fundamental deve preparar o indivíduo para operar numa sociedade urbana pós-industrial.

O Pisa não é um currículo, mas contém sinalizações que sugerem o que é necessário para a formação básica do cidadão do século 21. É uma boa baliza para o ensino fundamental. Os currículos do ensino médio, por sua vez, devem ser diversificados, contemplando diferentes opções profissionais e acadêmicas. Pelo menos é assim que funciona no resto do mundo que cuida bem da educação e se preocupa como futuro de sua juventude.

Finalmente,o que um currículo não deve ser? Um exercício de virtuos e verbal,um manual de didática, a advocacia de teorias,métodos e técnicas de ensino, uma vingança dos excluídos e muito menos um panfleto ideológico ou uma camisa de força. Muito menos deve ser o resultado de consensos espúrios.

O currículo definirá se queremos cidadãos voltados para a periferia ou o centro, para o particular ou para o universal.

PRESIDENTE DO INSTITUTO ALFA E BETO