quinta-feira, novembro 01, 2012

Trem-bala na cabeça - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 01/11


Governo oferece mais subsídio para obra inviável enquanto cidades e infraestrutura apodrecem



O GOVERNO promete bancar mais prejuízos da operação do trem-bala-fantasma de Dilma Rousseff, informava ontem esta Folha. Páginas adiante, a gente lia a respeito dos prejuízos causados pela falta de trens decentes para transportar os produtos brasileiros.

O trem-bala não sai da cabeça de Dilma. A ideia veio de um lobby de empreiteiras nacionais e empresas estrangeiras que vendem equipamento e tecnologia de trem-bala, criado em 2006.

O projeto terá parceria de estatal, subsídios diretos e vários indiretos, como financiamento do BNDES e seus juros baratinhos, bancados por dinheiro de impostos. Sem dinheiro público, nem o orçamento criativo do projeto faz sentido.

Segundo estudo da Fundação Dom Cabral, estradas ruins, ferrovias podres e a necessidade de usar a congestionada infraestrutura das grandes cidades levam 13% da receita das empresas. Admita-se que elas exagerem. Mas sabe-se muito bem que a produção de soja, por exemplo, é a mais eficiente do mundo até sair das fazendas do Centro-Oeste. Quando chega aos portos do leste, ela já tem preço brasileirinho.

Quais os setores mais prejudicados?

Bens de capital, o de bens de investimento, setor que pede ajuda do governo porque padece devido à concorrência estrangeira.

Construção. O custo de morar cresce. O custo da infraestrutura (estrada, porto etc.) aumenta.

Agricultura, setor que banca as contas externas com exportações, que fornece comida e matéria-prima para uma vastidão de produtos.

Dilma prometeu em agosto chamar empresas para construir rodovias e ferrovias. Deve anunciar as concessões por agora.

Afora promessas, na realidade a Ferrovia Norte-Sul está em construção desde 1987 (25 anos). Em parte, tem de ser refeita, pois a obra era porca e não havia pátios de carga e descarga ao longo do caminho!

A Norte-Sul deve ligar, no fim das contas, o noroeste de São Paulo ao Maranhão. Em Tocantins, solta um ramo para o sul da Bahia, a Ferrovia Leste-Oeste. É a segunda maior obra do PAC. Está atrasada.

A Norte-Sul e a Leste-Oeste, com as devidas conexões a outros modos de transporte e terminais, desafogariam as artérias do país, que anda devagar porque o sangue não circula direito.

Dilma diz que o trem-bala não vai atrapalhar essa e outras obras. Vai. Já atrapalha. Tira energia e atenção do essencial. Vai concentrar capital e energia pública e privada num projeto de baixo retorno econômico e social. Vai ocupar recursos que poderiam ser utilizados na reforma logística de São Paulo e Rio. A Grande São Paulo, onde vive 10% da população do Brasil, está parando.

Prevê-se que o trem-bala fique pronto em seis anos. Para fazer sua primeira linha, que tinha metade da extensão da brasileira, a Coreia do Sul levou dez anos.

A obra não tem projeto de verdade; seu custo é uma aposta. Custos estouram até em reforma de cozinhas, que dirá numa obra monstruosa. Desconhece-se o preço de desapropriações, de túneis, viadutos, nada se sabe sobre terreno, os problemas de solo e outras complicações de engenharia.

O projeto é uma ficção, aventura subsidiada por dinheiro de impostos num país com infraestrutura em ruínas e metrópoles em colapso.

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