sexta-feira, novembro 02, 2012

Lula no seu labirinto - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 02\11


O julgamento do mensalão, que se encaminha para seu fim com a definição das penas dos condenados após o STF ter decidido que houve, sim, desvio de verba pública para compra de apoios políticos, clareou o cenário para a discussão sobre se o ex-presidente Lula sabia ou não do que ocorria “entre quatro paredes” no Palácio do Planalto, o aspecto mais delicado politicamente desse processo.

Desde que estourou o escândalo do mensalão, em 2005, muitas vezes surgiu a insinuação de que o então presidente Lula sabia de toda a trama, como quando se atribuiu ao próprio José Dirceu a afirmação, jamais desmentida, de que não fazia nada sem que Lula não autorizasse. Nos últimos dias, entrevistas, declarações diretas ou atribuídas a participantes do esquema revelam novos detalhes, todos convergindo no sentido de afirmar que o ex-presidente foi parte ativa do esquema do mensalão.

O publicitário Marcos Valério, em depoimento ao Ministério Público, acusou Lula de ser o responsável pelo esquema do mensalão e acrescentou no rol dos envolvidos não julgados neste processo do STF o ex-ministro Antonio Palocci. Valério pede os benefícios da delação premiada, diz-se ameaçado de morte e está pedindo sua inclusão no serviço de proteção às testemunhas.

Ex-mulher de Dirceu, Clara Becker disse à repórter do “Estadão” Débora Bergamasco que tanto ele quanto José Genoino “estão pagando pelo Lula”. E lançou a pergunta que está no ar há sete anos: “Ou você acha que o Lula não sabia das coisas, se é que houve alguma coisa errada? Eles assumiram os compromissos e estão se sacrificando.” Difícil crer que a mulher que viveu com Carlos Henrique, a persona vivida por Dirceu no interior do Paraná, sua amiga até hoje, mãe do deputado federal Zeca Dirceu, declare isso sem conhecimento de causa e, sobretudo, sem a autorização do próprio.

A revista “Veja” tem em seu poder entrevista gravada em que Marcos Valério diz que Lula é o verdadeiro chefe por trás do esquema do mensalão. Nessa entrevista, cujos detalhes mais importantes a revista publicou atribuindo a comentários de Valério com seus amigos, o publicitário fala da morte do prefeito Celso Daniel, episódio que também teria abordado no seu depoimento ao Ministério Público Federal (MPF). Essa parte, a revista ainda não revelou, pois considerou que se tratava de assunto de que Valério não participou diretamente, sendo suas denúncias fruto do que ouviu dizer.

No próprio julgamento, o advogado Luiz Francisco Barbosa, que defende Roberto Jefferson, acusou o ex-presidente Lula de ser o verdadeiro mandante dos crimes. Ele se baseou na tese do “domínio do fato”, que levou o procuradorgeral a acusar o ex-ministro José Dirceu como o “chefe da quadrilha”, e garantiu que os ministros envolvidos “eram apenas agentes de Lula”. A repercussão dessa denúncia só foi neutralizada devido à posição dúbia de Roberto Jefferson, que acusou e defendeu Lula ao longo destes sete anos.

Da mesma forma, o advogado Marcelo Leonardo, que defende Valério, apresentou um memorial afirmando que seu cliente foi o bode expiatório de um esquema que tinha outros líderes, insinuando que entre eles estava o ex-presidente Lula.

Com o depoimento de Valério ao MPF, abre-se a perspectiva de uma investigação sobre a participação de Lula nos episódios. Os partidos de oposição anunciaram uma representação na Procuradoria pedindo essa investigação, pois Lula, tendo sido o principal beneficiário do esquema criminoso, pode estar envolvido, e “todos os brasileiros querem saber se ele teria sido o seu mandante também. Essa pergunta precisa de resposta”, na afirmação do presidente do PPS, Roberto Freire.

O tema saiu da redoma que o protegia há sete anos e está colocado publicamente. Seria bom se Lula viesse a público dar a sua versão dos fatos, em vez de querer negá-los. Mas teria que ser uma versão definitiva, com começo, meio e fim, e não as versões desencontradas que vem dando ao longo desse tempo, quando já vestiu a roupa de traído, já pediu desculpas “pelos graves erros cometidos”, já disse que se tratava de caixa dois e, por fim, prometeu provar que tudo não passara de uma “farsa” cujo objetivo final seria a sua deposição.

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