terça-feira, setembro 04, 2012

Estímulos supernormais - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 04/09


SÃO PAULO - Deu na Folha que jogos on-line podem estar virando uma nova forma de dependência.
Meu alarme cético dispara sempre que uma nova doença psiquiátrica aparece na mídia, mas é preciso reconhecer que a possibilidade existe. Devido a um improvável complô entre nossa competência técnica e nossas vulnerabilidades neurológicas, essa situação está ficando mais comum. São os estímulos supernormais.
O conceito surgiu a partir de trabalhos dos etólogos Konrad Lorenz e Niko Tinbergen, que mostraram que animais frequentemente se deixam enganar por sinais manipulados para parecer mais exagerados.
Num experimento com perus selvagens, pesquisadores queriam saber qual a "unidade mínima" de perua que os excitaria. Testaram a resposta dos machos a manequins, dos quais iam retirando cauda, pés, asas etc. Descobriram que bastava espetar uma cabeça num pau para encorajar os machos. Eles até preferiam a cabeça sozinha, que lhes provocava reações mais intensas do que as despertadas por uma perua real.
Em "Supernormal Stimuli", Deirdre Barrett mostra que o fenômeno não está restrito a aves. Humanos somos vítimas preferenciais desses estímulos hiperbólicos. Na alimentação, fomos programados para acumular gorduras e carboidratos. Funcionava bem no paleolítico, mas, depois que aprendemos a fazer Baconzitos e quindins, conhecemos níveis inauditos de obesidade e diabetes.
De modo análogo, a destilação do álcool e a biossíntese da cocaína agravaram nossos problemas com essas drogas. Era relativamente difícil tornar-se alcoólatra ou cocainômano consumindo só cerveja pouco fermentada e chá de folhas de coca.
Jogos on-line, ao oferecer um ambiente onde tudo o que acontece são coisas que nossos cérebros estão programados para apreciar, acabam tornando o mundo real um lugar bem menos estimulante que o virtual. É quase uma concorrência desleal.

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