segunda-feira, julho 02, 2012

Como nos sustentamos - LYA LUFT


REVISTA VEJA
Sustentar a economia sem dilapidar ou sujar a natureza é algo que países civilizados fazem há tempos. Não com perfeição. pois somos humanos, e alguns interesses menos nobres ninguém contorna. Porém, basta sobrevoar um desses países e veremos florestas de gigantescos cata-ventos usando energia eólica para gerar energia limpa. Quanto a nós, ainda precisamos abrir olhos e cabeça para entender e aproveitar essas belas florestas geradoras de energia limpa. Como precisamos retomar o estímulo ao etanol -- o etanol, que já foi valorizado - e deixar de nos esforçar tanto para lotar de carros nossas atravancadas ruas e péssimas estradas. lançando imundícies na pobre mãe natureza. Esse é um exemplo grande de como sustentamos mal o planeta. Darei dois exemplos pequenos, práticos, de minhas idas ao supermercado. Um é negativo: produtos orgânicos difíceis de encontrar, mais caros e piores do que os outros. O positivo: em lugar das chatíssimas bolsas de pano que a gente esquece em casa, não sabe onde enfiar nem quantas deve carregar a cada vez, minhas compras são colocadas em sacolas plásticas verdes, que não vão durar 100 anos.
Seguindo o fio desse tema: como grandes eventos fazem parecer que estamos realizando grandes coisas. acabamos de promover um gigantesco seminário sobre meio ambiente. cujas conclusões brilharam pela falta de propostas práticas a curto prazo. Sobraram palavras grandiloquentes, como se a utopia absolvesse nossos grandes e imperdoáveis erros. Não era hora nem lugar para literatura, para otimismo retumbante, para autopromoção ou sorrisos de fotografia. A mais alta autoridade da ONU afirmou em discurso sua decepção com o documento final: mas, surpresa, logo reviu sua afirmação e até que o achou bonzinho. Também os protestos dos ativistas presentes à Rio+20 dizem que o documento foi pífio. Autoridades afirmam que pelo menos não foi um retrocesso: há quem negue isso. Ainda por cima. cientistas famosos começam a dizer que, na verdade, o planeta nem está se aquecendo, ao contrário. Isso naturalmente não elimina a sujeira gigantesca que lançamos nos oceanos, nos rios e lagos, e nas nossas ruas, porque somos inconsequentes, alienados e infantis. Os protestos tiveram de tudo: defesa do meio ambiente. feminismo, questões sociais e econômicas, xingamentos ao FMI, aos países ricos, a Angela Merkel. aos homens, aos governos, ao capitalismo, às elites, para variar. Tiveram peitos e bundas de fora - não que não tenham razão. Nisto acho que a Rio+20 valeu: para que muita gente comparecesse, se conscientizasse, se assustasse talvez e. quem sabe, comece agora a agir no seu cotidiano. na sua família, na sua escola, no seu município, na sua empresa. Nas empresas, grandes interesses financeiros terão de ser enfrentados, é difícil a ética não perder para o bolso. Mas algumas empresas por aqui começam a pensar e agir "verde": nem tudo está perdido.

Nesses dias tenho pensando que também deveria existir uma sustentabilidade ética, moral. Alianças entre partidos fazem parte da democracia, mas a promiscuidade nas nossas alianças é chocante. Adversários ferrenhos se abraçam e se dão, mais que tapinhas nas costas. palmadinhas afetuosas nas bochechas: inimigos figadais se cortejam: nesse caldeirão se funde água com azeite. Nós fingimos que está tudo bem, Aliás, em matéria de política. lembro uma frase de meu velho pai, por ocasião de uma de suas várias decepções nesse campo: "O verdadeiro partido no Brasil é o PIP - Partido do Interesse Próprio".

Não sou tão pessimista: apesar da nossa alienação e julgamentos precários. apesar da não sustentabilidade moral, nesse tabuleiro de interesses. onde se jogam conceitos como ambientalismo e política, ainda remos restos de ideologia positiva - embora o conceito de ideologia também esteja cedendo ao da praticidade, eficiência e utilitarismo. Se algum otimismo significa autossustentabilidade para seguir em frente em qualquer campo desta vida. sejamos otimistas.

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