quinta-feira, maio 03, 2012

A opção que parece agradar ao governo - JOSÉ RIBAMAR OLIVEIRA


VALOR ECONÔMICO - 03/05/12


Há uma grande distância entre o que desejam os governadores e o que quer o Palácio do Planalto no caso da renegociação das dívidas estaduais. Os primeiros sonham em reduzir o que pagam mensalmente ao Tesouro Nacional por conta dos encargos das dívidas e, dessa forma, abrir espaço para maiores gastos em investimentos. A presidente Dilma Rousseff parece não querer mexer nesta questão, de acordo com sinais que chegam a líderes dos partidos aliados do governo no Congresso. Há indicações de que Dilma prefere uma alternativa que garanta mais recursos para os investimentos sem que isso signifique alívio nas prestações dos governos estaduais.

É bom lembrar que a minuta de proposta de lei complementar, elaborada pela área econômica do governo e que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), não toca nessa questão, abrindo espaço apenas para a discussão dos encargos financeiros pagos pelos Estados. A minuta, como já foi divulgado pelo Valor em meados do mês passado, propõe a alteração do artigo 35 da LRF, para permitir uma nova rodada de renegociação dos débitos estaduais, mas apenas no tocante à mudança do artigo 3º da Lei 9.496, que define os encargos (juros e correção monetária) a serem pagos pelos Estados.

A minuta do projeto não prevê mudança do artigo 5º da Lei 9.496, que trata do limite de comprometimento da receita líquida real, ou seja, do montante máximo da prestação a ser paga mensalmente. A Lei 9.496 diz apenas que os contratos de refinanciamento poderão estabelecer limite máximo de comprometimento da receita líquida real para efeito de pagamento dos encargos financeiros. Os limites que os governadores querem mudar estão, portanto, nos contratos.

Governo não quer reduzir a prestação paga pelos Estados

Para alterar um contrato é necessário que as partes envolvidas estejam de acordo, o que, parece, não é o caso. Essa questão contratual joga luz sobre outro aspecto, que está esquecido até agora. Qualquer mudança na renegociação das dívidas terá que ser pactuada pela presidente Dilma e os governadores, ou seja, esse não é um assunto a ser decidido por deputados e senadores.

Os governadores sabem que se o indexador dos contratos for trocado - atualmente, é o Índice Geral de Preços (IGP) da Fundação Getulio Vargas - e mesmo que haja uma redução da taxa de juros - que hoje varia de 6% a 9% ao ano - pouca coisa vai mudar para suas administrações. Se os juros forem reduzidos e o indexador passar a ser o IPCA, os encargos serão menores e a possibilidade de que os Estados paguem suas dívidas no prazo contratado, sem deixar grande resíduo, aumentará consideravelmente. Mas isso em nada vai melhorar o fluxo de caixa dos Estados, ou seja, abrir espaço para maiores gastos.

Apenas a redução das prestações pagas ao Tesouro deixaria aos governadores mais recursos para gastar. Na verdade, a questão que está na mesa para ser decidida é se os Estados serão autorizados a adiar o pagamento das dívidas para o futuro, liberando mais recursos para gastos imediatos.

Alguns líderes políticos informam que a presidente prefere outra alternativa. Algo na linha do que está sendo proposto pelo grupo de trabalho da Câmara dos Deputados, criado para analisar o problema das dívidas estaduais. A essência dessa alternativa é que as prestações continuariam sendo as mesmas, mas a União se comprometeria a repassar uma parte dos pagamentos feitos para os Estados realizarem investimentos.

O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), muito ligado à presidente Dilma, chegou a defender essa alternativa durante uma audiência pública realizada no mês passado pelo grupo de trabalho da Câmara dos Deputados, que contou com a participação de outros cinco governadores. Para ele, uma pactuação feita pela presidente com os governadores poderia fazer com que uma parte do que é pago volte na forma de investimentos contratados por meio de convênios firmados pela União com os Estados. Wagner chegou a sugerir que os investimentos sejam definidos em comum acordo entre o governo federal e cada um dos Estados beneficiados.

A proposta enfrenta, no entanto, forte resistência de alguns governadores, que enxergam nela um enfraquecimento da federação, com uma centralização ainda maior das decisões no governo federal. Na mesma audiência pública, o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), defendeu a autonomia dos Estados para usar os recursos, mesmo sem criticar diretamente a proposta de Jaques Wagner.

Além da crítica ao crivo do governo federal na escolha dos investimentos a serem realizados pelos Estados, outro reparo que está sendo feito à proposta é em relação à definição de prioridade. Alguns governadores podem achar prioritário usar os recursos em programas de saúde e de educação, por exemplo, do que em obras de infraestrutura. A maioria deles enfrenta dificuldade, atualmente, para pagar o piso salarial dos professores.

Se alguns resistem e querem manter a autonomia, outros podem adotar uma visão mais pragmática e apoiar a proposta, pois a alternativa a ela é ficar sem nenhum recurso adicional. Como a situação atual é ruim, qualquer que seja a vantagem a ser oferecida pela presidente pode ser considerada "melhor do que nada" pela maioria dos governadores, principalmente por aqueles de partidos aliados ao governo federal.

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