terça-feira, maio 22, 2012

Não dá para esperar - BENJAMIN STEINBRUCH


FOLHA DE SP - 22/05



As ações para destravar o crédito, que começam a ser anunciadas pelo governo, são necessárias e urgentes



Há coisas com as quais não se pode brincar. Uma delas é o crescimento da produção, principalmente nas economias ainda não desenvolvidas. Nesses países, recessões são trágicas e estagnações, como a que o Brasil viveu no primeiro trimestre, preocupam e assustam.

A indústria brasileira passa por um momento difícil e seu encolhimento é coisa séria. Já era inquietante no ano passado e continua sendo neste ano. Quem ainda não viu deveria dar uma olhada nos dados da produção da indústria no primeiro trimestre.

Em todo o país, a queda de produção foi de 3% em termos anuais, comparando o primeiro trimestre deste ano com o mesmo período do ano passado.

As cifras regionais são ainda piores. No Sudeste, há perdas fortes em São Paulo (6,2%), no Rio (6,8%), em Minas Gerais (1,4%) e no Espírito Santo (2,4%). O Sudeste, por mais que tenha havido descentralização industrial, responde ainda por 60% da produção nacional.

Não há discussão sobre a principal causa da queda de ritmo da indústria no Sudeste: é a redução de atividade nas montadoras de veículos, que se concentram nessa região e ainda são o carro-chefe do setor manufatureiro. A produção de carros caiu quase 25% em São Paulo e 40% no Rio no primeiro trimestre.

Além disso, a indústria foi prejudicada porque as chuvas torrenciais no período fizeram baixar a produção de minério de ferro em Minas. O setor da metalurgia básica, em consequência, teve queda de produção de 45% na comparação com o primeiro trimestre de 2011.

Também não há discussão sobre a principal causa do encolhimento das vendas de veículos: é a falta de financiamento. Está aí, portanto, um problema que precisa ser enfrentado. Cada vez mais os analistas se convencem de que a economia, apesar da redução dos juros, não deslancha porque o crédito cresce pouco em alguns setores, em especial no de veículos. E também porque o impacto do corte da Selic se dá muito lentamente nos juros dos empréstimos a pessoas físicas e jurídicas.

No caso dos veículos, há um marcante pessimismo entre os revendedores. O cenário atual contrasta com o de 2011, quando os financiamentos iam até 72 meses. Agora, as financeiras estão cautelosas. Praticamente desapareceu o crédito sem entrada e o parcelamento vai apenas até 48 meses. Isso tira do mercado uma ampla faixa de consumidores em potencial da classe C.

A freada na oferta de crédito a veículos se deu, segundo os bancos, porque houve aumento da inadimplência. Em março, 5,7% das pessoas que tomaram crédito para comprar veículos estavam com a mensalidade atrasada mais de 90 dias. Considerando os atrasos de 15 a 90 dias, o índice subia para 8,5%.

Diante dessa tendência, os bancos se tornaram mais seletivos para oferecer novos empréstimos. Índices de inadimplência batem direto no resultado dos bancos, porque elas precisam aumentar suas provisões na medida em que cresce o índice de pagamentos em atraso.

Olhando para o gráfico da evolução da inadimplência, as curvas não parecem tão perigosas. Nas várias modalidades de crédito, os níveis mantêm-se dentro de parâmetros seguidos nos últimos quatro anos. Mas esse é um problema cuja administração cabe aos bancos.

Na indústria, várias razões explicam o encolhimento, entre elas a concorrência externa, o câmbio que somente agora atinge nível razoável e a eterna carga tributária elevada. Um fato inquestionável é que, neste momento, o travamento do crédito assume importância maior porque atinge setores muito dinâmicos e puxadores de tendência, como os de veículos, eletrodomésticos e material de construção.

Pelo que se vê no cenário global, especialmente na União Europeia, não dá para contar com o mercado externo para ativar a economia, mesmo com o câmbio favorável. Então, mais do que nunca, o país terá de estimular seu próprio mercado para crescer pelo menos 3,5% a 4% neste ano e forjar investimentos. Foi assim que se superou a crise de 2008 e assim terá de ser agora.

Por isso, as ações para destravar o crédito, que começam a ser anunciadas pelo governo, são necessárias e urgentes.

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